Você está lendo:

Saber Amar – Parte 2

Conto: SABER AMAR (parte 2)
Autora: Isa Miranda

 

No apartamento de Pedro, depois de tomar um banho, Eva volta à sala, e todos já estavam comendo algo quando ela se aproximou quieta e sem jeito.

— Estraguei o dia de todos. Me desculpem.

— Não se preocupe tanto. Venha logo, Pedro me deixou preparar uma bela macarronada para almoçarmos. – Jessica pegou a mão de sua amiga e a fez sentar à mesa ao lado de Pedro e Jeferson.

Todos comiam em silêncio. Eva começava a se sentir mal com aquilo e de repente começou a falar chorosa.

— Eu perdi minha filha. Por minha culpa, todos me odeiam. – Eva mal conseguia falar a frase.

— Eva, se acalme. Seja lá o que aconteceu, somos teus amigos. – Pedro afagou as costas dela confortando-a.

— Eu preciso falar.

— Fala logo, mulher. Se isso te faz sentir melhor, solta tudo… – Jeferson sorriu tentando amenizar a situação com seu jeito brincalhão.

— Cala a boca! É assunto sério, e você de piadinha. – Jessica deu um soco no braço de Jeferson.

— Ai, mulher, está forte, hein?! Vou denunciar você. Tem delegacia de proteção ao homem? – Jeferson perguntava a Pedro.

No fim todos riram, e o clima ficou ameno. Eva inspirou fundo e contou tudo que passou nos últimos anos com o casamento e as idas e vindas de internações, além dos incidentes que fizeram perder a guarda da filha. No final, todos olhavam para ela. Por um momento Eva temeu que eles se afastassem.

— Eu sou uma maluca e neurótica. Eu vou entender se…

— Neurótica e maluca é a Jessica. Viu o que ela faz comigo? – Jeferson cortou Eva apontando para Jessica.

— Começou de novo? Vou te socar de novo. – Jessica virou para Eva e abraçou-a – Homens deixam a gente assim. Vê só eu. Sempre fui calma e centrada, mas depois que essa tralha entrou na minha vida, vivo querendo matar um. Culpa de quem? – Olhava torto para Jeferson.

— Eiii…?

Pedro estava observando tudo e vez ou outra ficava pensativo. Por fim levantou-se e foi até a cozinha, trazendo de lá mais latas de cerveja e suco.

— Eva, amiga, acho que tudo que nos contou foi importante. Pelo menos quando acontecer algo como o que rolou na praia, saberemos como agir – disse Jessica. – Obrigada por confiar em nós e por contar algo tão pessoal.

— Parei com as brincadeiras; agora é sério. – Jeferson pigarreou antes de continuar a falar. – Olha, mulher, eu acho que se você está se cuidando é porque quer nova vida, e tenho certeza que as pessoas que te viram a cara hoje vão se arrepender lá na frente de terem feito isso, e tenha fé em que uma hora tudo se resolve e em que vai ter sua filha de volta. – Jeferson sorriu no canto dos lábios, olhando provocativo para Jessica. – Ah, e me passa o contato de seu médico. Vou levar Jessica para uma consul…- Abaixou a cabeça quando viu a almofada voar em sua direção. Saiu rindo pegando a lata de cerveja da mão de Pedro.

— Tudo vai se resolver. Dê tempo ao tempo… – Pedro estendeu um copo de suco de laranja para ela.

— Obrigada – sorriu emocionada para eles. – Obrigada mesmo, estou aliviada por ter contado.

Pedro aproximou e cochichou a ela:

— Passe o fim de semana comigo.

Ela olhou-o surpresa e, mesmo que não devesse, concordou.

****

Eva ainda não estava certa de se deveria ter aceitado passar o fim de semana com Pedro. Mas como dizer não, já que tinha sido prestativo e a apoiava naquele momento delicado? Não havia como e, por fim, concordou em eles irem até seu apartamento buscar algumas peças de roupas para passar o fim de semana com ele.

— Eva, agora que estamos aqui e tudo mais calmo, quero lhe falar algumas coisas. – Pedro colocava a pequena mala de Eva no quarto, voltando e a convidando a sentar no sofá ao seu lado.

Eva sentou-se ainda apreensiva com o que ele tinha para lhe falar.

— Lembra-se do último dia em que nos vimos? Estávamos nos despedindo de alguns colegas e sentamos nos bancos em que ficávamos sempre na praça perto do colégio. – Pedro iniciou a conversa.

— Lembro-me de alguns detalhes, não de tudo que aconteceu naquele dia. Todos estávamos tão eufóricos, tínhamos entrado para as faculdades que queríamos…

— Em um determinado momento eu te chamei e disse que queria te dizer algo, mas a Priscila puxou-a pelo braço levando para o grupo onde Rodrigo estava.

— Sim, disso eu lembro. – Eva sorriu. — O que era que queria me falar?

Pedro sorriu. Encostado no braço do sofá, estendeu a mão para segurar a dela.

— Eu perdi o momento. Depois fiquei sabendo que você e o Rodrigo ficaram. – Afagou a mão de Eva. – E alguns dias depois que estavam na mesma faculdade. – Deu de ombros. – Eu realmente perdi o momento.

Eva olhava-o confusa.

— Pedro, me diz logo, não estou entendendo.

— Eva, eu queria ter dito que a amava, que queria ficar com você.

Eva arregalou os olhos e inspirou prendendo o fôlego.

— Hoje cedo quando contou tudo que passou, fiquei pensando: “E se eu tivesse insistido?”. Se tivesse ido até você e dito o que sentia, poderia receber um fora, talvez… – Fez uma breve pausa olhando-a com carinho. – Talvez tudo o que passou não tivesse acontecido.

Eva soltou o ar do peito lentamente pensando nas palavras dele.

— Falei besteira. Sou idiota. Você sempre me viu como seu melhor amigo… – Pedro soltou a mão de Eva e receoso voltou a falar. – E na certa deve estar pensando que …

— Talvez tudo que eu passei poderia ter sido com você… – Ela olhou-o entristecida. – E assim como Rodrigo, você estaria nesse momento me odiando.

— Talvez… Porém, talvez estivéssemos juntos e felizes.

Eva desviou o olhar e inspirou fundo pensando em todas aquelas possibilidades.

— Eva quero te levar em um lugar.

— Ah, sim… Aonde?

Ele se levantou e pegou sua carteira e a chave do carro.

— Você vai ver. Vamos.

Alguns minutos depois, ambos estava em frente a um prédio. Ao entrarem, foram direto para o quinto andar; ao saírem do elevador, Pedro levou-a a uma sala. Nesse lugar havia um grupo reunido, e Eva pôde notar que parecia um grupo desses de dependentes que se encontravam em sessões, lembrando muito aqueles grupos de Alcoólicos Anônimos. Ela olhou para todos e depois para Pedro, confusa por um momento.

— Olá, Pedro. – Uma senhora se aproximou na recepção.

— Olá, Virginia. Desculpe vir assim fora de hora.

— Você é sempre bem-vindo. – Olhou então para Eva.

— Essa é Eva. Ela é uma amiga e está me acompanhando.

Eva se aproximou e sorrindo sem jeito cumprimentou a mulher.

— Elisa veio sozinha dessa vez. Estranhei, mas ela veio, o que já é um grande progresso. – Virou-se para o salão onde havia muitas mulheres conversando.

— Isso é bom; não quero que ela fique só dependendo de mim para trazê-la.

— Fiquem à vontade. Vou buscar alguns documentos. Podem assistir à reunião se quiserem.

Eva olhava para o grupo, tentando entender o que acontecia. Silenciosa, ficou ouvindo as pessoas relatarem diversas situações que viveram, todas relacionadas a relacionamentos e às formas como se portavam diante de todos.

— Aqui é uma organização que ajuda mulheres com algo que você contou para nós lá em casa. – Pedro falou baixo a ela.

— Eu notei… – Eva estava séria e murmurou em resposta.

— Eva, lembra da Elisa, minha prima?

— Lembro. Ela era bem problemática. Ela está aqui pelo que dona Virginia lhe falou.

— Sim, Elisa está em terapia e faz tratamento há poucos meses. Foi uma luta trazê-la aqui, mas conseguimos.

Eva engoliu em seco, e em seu peito o coração batia rápido. Estava tensa e nervosa com todos aqueles relatos. Eram absurdos e ao mesmo tempo tão familiares, que ela chegou a ofegar sentindo uma dor no peito.

— Eu quero sair daqui…

Pedro observou-a e em seguida segurou sua mão a levando para fora. Fez um aceno para Virginia e, depois de dizer que não era para falar a Elisa que esteve ali, saiu do lugar com Eva.

Durante o caminho, no carro, ficaram em silêncio, Eva não conseguia conter as lágrimas que escorriam sem parar pela face. Pouco depois estavam de volta no apartamento.

— Eva, perdão, deveria ter dito antes, acho que…

— Deveria sim… – Eva ofegou e murmurou chateada. — Já me levaram a tantos lugares, que não vejo por que me levar a mais um… – Caminhou para o banheiro onde se trancou.

— Eva, desculpa. Acho que errei, desculpa. – Pedro parou na porta tentando amenizar a situação. – Sabe, eu só queria te mostrar que entendo você.

Eva não respondeu. Sentou-se sobre a tampa do vaso e continuou a chorar. Por tanto tempo ficou aguentando as pressões de seus erros, que desejava sumir, desaparecer de uma vez.

— Eu quero ir embora.

Pedro ouviu-a do outro lado da porta, entristecido pela sua falha concordou.

— Eu levo você para casa.

****

Em seu apartamento, depois de ser deixada por Pedro, Eva mergulhou em sua própria dor. Ver sua filha, descobrir que mentiram para ela, depois ter que falar tão abertamente de seu problema e a atitude de Pedro. Tudo isso só resultou em mais dor.

Por tanto tempo evitou ao máximo se entregar. Queria mudar, mas sempre que tentava, tudo conspirava para que afundasse mais e mais.

Eva sabia que ninguém a entenderia. Seria uma perda de tempo tentar. Mais uma vez era como se estivesse sozinha no quarto frio da clínica psiquiátrica em que fora internada.

— Eu não sou louca.

Dizia para si mesma várias vezes até adormecer.

Na manhã seguinte, de volta ao trabalho, preferiu manter as aparências. Tratou todos normalmente, se desculpou com Pedro e seguiu sua rotina durante o dia de trabalho. No final da tarde, já perto da hora de ir embora, recebeu uma chamada de seu ex-marido Rodrigo.

— Eva, o que disse a Bia?

— Boa tarde, Rodrigo. Antes de mais nada…

— Escuta, Eva: não tenho tempo para seus mimimis. O que disse a Bia? Sei que se encontraram na praia. Responde!” – Rodrigo estava gritando no telefone.

“— O que eu poderia dizer? Sua prima estava com ela como cão raivoso. – Eva inspirou fundo e nervosa, afinal algo aconteceu e precisava saber. – Afinal de contas o que aconteceu?

— Você é o problema. Sempre é e nunca vai deixar de ser…

— Rodrigo, espera. Aconteceu algo com a Bi…a?” – Eva foi interrompida com o som da ligação encerrada.

Nervosa, tentou retornar, mas não foi atendida em todas as tentativas, até ouvir a mensagem que estava desligado ou fora da área de cobertura.

Eva estava desnorteada, sem saber como fazer. Decidiu ir até a casa de Rodrigo. Chegando ao prédio, ficou de longe sondando. Tinha que descobrir como saber se sua filha estava bem.

— Eva?

Assustada, Eva ouviu seu nome e virou-se rapidamente. Uma senhora de cabelos grisalhos se aproximou. Era a avó de Rodrigo. Ela estava acompanhada de uma jovem que Eva não conhecia.

— Dona Olga, eu… Desculpa, eu vou embora…

— Espera, Eva. Deve estar aqui por causa da Bia. — A senhora segurou no braço de Eva, puxando-a para seguir junto com ela.

— Dona Olga, acho melhor não entrar lá. Rodrigo me odeia. Eu só quero saber como ela está?

Eva parou a senhora e olhou-a ansiosa.

— É claro que você vai entrar. Rodrigo não lhe contou? Estamos todos procurando por Bia. Ela não voltou para casa desde a hora da escola.

— O quê?!! Meu Deus… – Eva estremeceu colocou a mão sobre os lábios atordoada. — Ela sumiu…?

— Calma! Vem comigo, que estamos todos procurando.

— Não, Dona Olga, tenho que procurá-la… – Eva estava nervosa olhando em todo local, tentando imaginar aonde a filha poderia ter ido.

— Eva, espera. – A senhora segurou a sua mão. – Eu dei seu endereço para Bia. Acho que ela pode ter ido para sua casa, mas eu não disse ao Rodrigo. Meu neto é nervoso demais.

— Dona Olga…

— Eu não imaginei que ela fosse fugir. Ela disse que queria escrever uma cartinha para você. – A senhora suspirou, mas podia se notar uma certa alegria naquelas palavras. — Acho tudo tão injusto. Ela precisa de uma mãe.

— Dona Olga, eu vou correndo para casa. – Eva abraçou a senhora e sem muita demora chamou um uber para levá-la.

Durante todo o trajeto, ela pedia para que a filha estivesse em sua casa, que nada lhe acontecesse. Cerca de 40 minutos, e estava no condomínio onde morava. Desceu do carro e rapidamente passou pela portaria principal.

— Dona Eva. – Josivaldo, o porteiro, a chamou.

— Ah, que bom, Josivaldo! Por um acaso alguém chegou aqui me procurando… Na verdade uma menina…

O homem mal conseguia falar, Eva atropelava as palavras nervosa quando sentiu pequenos braços envolver a cintura apertando-a.

— Mamãe!!!

— Meu Deus… Meu Deus… – Eva esqueceu do porteiro e agarrou a filha desesperada apertando-a nos braços.

Chorando, ela afastou-se da menina e examinou-a, para ver se não tinha nenhum ferimento.

— Calma, mãe, estou bem. – A menina tinha um ar inocente e sorridente. – Eu vim te ver, mamãe.

— Filha… – Eva enxugou os olhos e levantou olhando para o porteiro.

— Dona Eva, a menina está aqui já tem quase 2 horas. Ela disse que é sua filha.

— Obrigada, Josivaldo! Essa é minha filha Bia. Obrigada por olhá-la até eu chegar.

Ambas seguiram para o apartamento de Eva. Bia estava radiante e tagarelava sem parar. Aassim que entraram, Eva desabou no sofá e chamou a filha para sentar ao seu lado.

— Bia, o que você fez foi errado. Vou ligar para seu pai e dizer que está aqui. Estão todos te procurando.

— Mãe… Eu queria te ver. Todos diziam que não podia.

— A mamãe fez um monte de coisas erradas. Por isso não pode ficar comigo. Mas eu prometo que vou arrumar tudo, e um dia vamos ficar juntas.

— Promete?

Eva levantou a mão e sorriu.

— Prometo.

Levantou e pegou o seu telefone para fazer a chamada. Inspirou fundo enquanto o sinal tocava, até que ouviu a voz de Rodrigo.

— Ela está bem?

— Sim, chegou bem.

— Estou chegando, vovó contou o que fez. Só quero pegar a Bia e voltar.

— Ela é minha filha e você omitiu que havia sumido, egoísta.

— Sua filha? Deveria ter lembrando antes de tentar matá-la.

Eva inspirou fundo, tentando manter o controle. Engoliu em seco a raiva e falou com a voz embargada.

— Estamos esperando.

Desligou a chamada antes que ouvisse outro desaforo. Fungou baixo e andou até a cozinha, falando com a filha que lhe observava o tempo todo.

— Papai está com raiva.

— Infelizmente não vai escapar de uma bronca e na certa de um castigo. – Olho-a com suave sorriso. – Está com fome? Vamos comer uma pizza requentada?

— Melhor pizza.

Ambas lancharam aquela pizza, mesmo sabendo que o Rodrigo estava a caminho. Ainda demoraria um pouco para chegar, então aproveitaram os poucos minutos que tinham.

Eva sentiu-se bem. Estava com sua filha, e toda aquela dor que estava sentindo sumiu. Não tinha mais nenhuma razão para se entristecer, afinal havia algo maior que ela mesma para cuidar. Estava decidida a ter a guarda de Bia de volta.

****

— Nossa, Eva! Você passou por tudo isso ontem e não me falou? – Pedro chateado sentou ao lado de Eva.

— Desculpa. Não tinha muito tempo para falar com alguém, mas terminou tudo bem e Bia voltou para casa. – Eva abria a marmita sobre a toalha que forrava a mesa para a refeição.

— Que situação! Rodrigo poderia ao menos pegar leve.

— É. Boa parte disso é minha culpa; então, finjo que não ouço. Pelo menos pelo bem de Bia.

— Vai mesmo pedir a guarda dela?

— Vou. Sim. Estou bem e posso cuidar dela. Tenho emprego estável. Meu terapeuta disse que estou bem e até suspendeu dois remédios que tomava. Agora só um para controlar a ansiedade, algo que a maioria das pessoas “normais” tem. Acho que consigo a guarda de Bia.

— Vai conseguir, sim. Estou do seu lado.

Os meses passaram. Pedro sempre ajudando da melhor forma que podia e que Eva permitia. Sabia que era um pouco complicado chegar em seu coração, mas ainda tinha esperanças.

A audiência finalmente começa, e a defesa de Rodrigo continuava alegando que o transtorno de Eva era muito perigoso para a criança. A cansativa disputa no tribunal por muitas vezes deixava Eva chateada. Sabia que iriam expor tudo que fez de errado e inclusive o acidente que aconteceu no apartamento.

Regina estava acompanhada de Olga. A senhora queria ver toda a audiência e estava certa de que Eva teria condições de ficar com a filha; mas ainda assim, ouvia a neta reclamar.

— Faça-me o favor, vó. Eva é uma neurótica desequilibrada. Nunca que vai poder cuidar de Bia.

— Não fale assim, minha neta. Eva está bem, e toda menina precisa de uma mãe.

— Rodrigo está certo. Tem que mantê-la afastada da filha. – Regina inspirava fundo, demonstrando raiva de tudo que estava acontecendo.

— Vamos parar. Quem decide a guarda é o juiz.

— Ela tinha que ter morrido naquele dia, tomando todos aqueles remédios.

— Deus me livre! Para de falar bobagens.

— Era bem melhor. Nossas vidas eram um inferno com Eva. Rodrigo estava a ponto de surtar junto com essa neurótica. É uma pena que o remédio não fez o efeito. 800 mg deveriam tê-la apagado de vez…

— O que você disse, menina? – Dona Olga estranhou.

— Nada, vovó… Pensando alto…

— Já que começou, continua… – Rodrigo chegara à sala alguns minutos antes e ficou intrigado com o que Regina falara.

— Ah, Rodrigo, já acabou a audiência? Então, a guarda da Bia é sua, certo?

— Ainda não. Estamos no intervalo. Vão ouvir a Bia depois… – Rodrigo olhava Regina sério.

— Entendi. – Sem jeito sentou ao lado de Dona Olga.

Rodrigo continuava olhando-a sério.

— Algum problema, Rodrigo? – Regina tentava demonstrar aparente calma.

— Eu acreditava que tinha, mas algo começou a clarear. Primeiro me diga como você sabia que eram 800 mg do medicamento que Eva tomou naquele dia?

— Ué, todo mundo sabe que ela tomou remédio demais, tentando se matar… – Regina se ajeitou na cadeira mostrando-se chateada.

Rodrigo sentou ao lado dela e continuou a questioná-la.

— Ninguém sabia além de mim qual era a dosagem da medicação que Eva tomava. Me diga: como sabia que eram 800 mg?

Regina ficou tensa, aparentemente sem saber o que responder, quando Rodrigo voltou a falar.

— Eva realmente tinha começado a tomar uma medicação por conta própria, mas uns dias antes consegui levá-la à consulta, e o remédio foi passado tinha a dosagem de 500 mg. E sabe quem os comprou?

Regina ficou pálida e engoliu em seco.

— Eva estava perturbada. Estava realmente em surto e claramente precisava de ajuda, era neurótica e desequilibrada, podem chamar do que for. Mas uma coisa eu sei que Eva não é: mentirosa.

Nesse momento, o advogado de Rodrigo entra na sala para lhe informar que o juiz retornará, e ambos vão até a sala da audiência.

****

O sol estava sorrateiramente se pondo, Eva e Pedro estavam sentados na canga olhando o mar, em um dia típico de final de verão, com temperatura amena e brisa suave.

— Eles vêm. Tenha paciência. – Pedro sorrindo e notando a aflição nos olhos de Eva.

— Estão demorando.

— Calma. Agora falta pouco.

Eva tentava inutilmente enxugar as lágrimas que teimosas rolavam por sua face.

— Qual o receio?

— E se tudo for um sonho, eu não quero acordar.

— Deu tudo certo, é assim que tem que pensar. – Ele encostou o ombro no ombro dela.

— Não é sobre Bia.

— Ah? Não? Então qual é o problema?

Eva olhou para Pedro e suspirou, virando a face para o olhar o mar.

— É sobre o que me disse de ficarmos juntos.

— Desculpa, não quero te forçar a nada…

— Não é isso, é que eu não quero estragar tudo de novo.

— E por que estragaria? Digo, acha mesmo que não daria certo?

Eva encolheu-se e suspirou sem saber o que dizer. Realmente gostava muito de Pedro, mas tinha medo de voltar a ser como antes, quando estava com Rodrigo, e por isso sempre negava o pedido de namoro de Pedro.

— Eu gosto muito de você…

— Eu também.

— Mamãe!

Bia apareceu correndo na areia gritando por Eva. Logo atrás dela vinha Rodrigo.

— Bia! – Eva levantou e estendeu os braços agarrando apertado a filha. Olhou para Rodrigo. – Pegaram trânsito para chegar aqui?

— Não muito. – Rodrigo estendeu a mão e cumprimentou Pedro.

— Mamãe, vamos à beira da água? – Bia puxou Eva, correndo em direção às pequenas ondas.

Rodrigo e Pedro observavam, quando Rodrigo:

— Valeu pela dica no tribunal. Depois de tudo, nem tivemos tempo de conversar.

— Tudo bem. Era estranha a história dos remédios quando Eva me contou, mas o importante é que tudo se esclareceu.

— Regina vacilou, e eu de cabeça quente só piorei tudo.

— Deu tudo certo no final.

Rodrigo olhava Eva e Bia brincarem de pular ondas na beira do mar. Uma pequena pontada de saudades bateu em seu coração.

— Bom, vou já. – Despediu de Pedro e chamou a filha. – Bia. vou indo. No fim de semana te busco. – Deu um beijo no rosto da filha e olhou para Eva.

Ambos somente se olharam sem trocar palavras, mas sabiam que estava tudo bem e que, com a guarda compartilhada da filha, poderiam viver suas vidas sem arrependimentos.

O sol estava se pondo. Eva e Pedro olhavam o mar e também Bia, que brincava fazendo castelinho de areia.

— Pedro?

— Hum?

— Sim.

Pedro que tomava um gole de cerveja, parou e olhou-a um tempo. Um largo sorriso brotou em seus lábios, e ele voltou a tomar a cerveja normalmente.

Daquele dia em diante, Eva soube que acima do amor que ela acreditava dar, precisou entender que, antes de mais nada, saber amar é amar a si mesma, encher-se desse sentimento para depois transbordar a todos sem amarras, culpas e dores.

 

FIM

 

 


MINHA VISÃO

Quando meus olhos pousaram sobre cada frase formando cada história, eles riram e choraram. Contos excepcionais de conteúdo romântico, misterioso, de autoestima, contos com suas visões.
Quando minha caneta pousava no papel, deslizava em palavras que decifrava (ou tentava), cada personagem e os sentimentos que eles traziam.
Quando escrevia seus nomes no fim de cada história, imaginava o “por que”, “quando” e “como” surgira o enredo que encerrará agora; mesmo sem resposta, sabia que felizes estariam naquela hora.
E quando assinava meu nome, fazia-o com imensurável satisfação, encabeçando memoráveis contos de autores de alta dimensão.
Guardada na memória ficará cada história, e cada uma em meu coração.

(Ellen dos Santos)


 

Borderline: doença psicológica de mulheres que amam demais

 

A palavra borderline vem do inglês. Como substantivo, indica o limite entre duas áreas, a delimitação de uma fronteira. Como adjetivo, significa hesitante, incerto. À luz da medicina psiquiátrica, o termo borderline é usado para denominar o transtorno de personalidade limítrofe, também chamado transtorno de personalidade borderline (TPB), uma doença psicológica grave, que reúne uma série de comportamentos considerados inadequados do ponto de vista social e amoroso.

Segundo dados da Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP), acredita-se que o transtorno de personalidade borderline atinja de 1% a 6% da população mundial, sendo bem mais comum em mulheres (estima-se que sejam 90% dos casos) do que em homens. Entre a principal característica desta doença encontra-se a angústia intensa sofrida durante um relacionamento amoroso.

“Esse distúrbio costuma a dar seus primeiros sinais durante a adolescência, intensificando na idade adulta. Sua origem é muito relacionada a componentes genéticos, mas experiências traumatizantes durante a infância podem desencadear o quadro clínico”, explica a psicóloga e professora da Faculdade de Medicina de Petrópolis, Camila Aloísio Alves.

 

Características do borderline:

A doença costuma ser difícil de tratar justamente por suas caraterísticas de intensidade de bons sentimentos. Como controlar alguém que parece apenas estar amando intensamente? Mas é preciso alertar para os sinais de desequilíbrio apresentados por quem sofre do transtorno de personalidade borderline.

“As principais características de quem sofre do transtorno são: oscilação severa de humor, baixa autoestima, sentimento permanente de abandono, vazio interior, medo do abandono e da solidão. Sem contar a tendência à automutilação, incapacidade de sentir prazer, comportamentos impulsivos (como gastar dinheiro de forma descontrolada ou consumo exagerado de comida ou drogas). Nos casos mais graves, aparece a ideação suicida”, lista a Dra. Camila.

No relacionamento amoroso é quando os sintomas do distúrbio costumam ser mais evidentes. Alguns comportamentos são recorrentes entre as mulheres borderline, como:

  • Apaixonam-se continuamente por homens perturbados, distantes, temperamentais. E sempre justificam as atitudes de seus parceiros como ‘normais’;

  • Costumam ser obcecadas por homens emocionalmente indisponíveis. Frequentemente entram em relações com homens casados ou comprometidos com outras mulheres, workaholics ou dependentes de drogas;

  • Abrem mão dos seus amigos e dos seus próprios interesses para estarem disponíveis ao parceiro na hora que ele demanda;

  • Sentem um vazio imenso quando não estão com o parceiro, sendo incapazes de distraírem-se com qualquer outra atividade.

 

Tratamento indicado:

“Como se trata de um distúrbio que afeta a neuroquímica cerebral, é fundamental que se combinem psicoterapia e acompanhamento psiquiátrico para administração de antidepressivos e estabilizadores de humor”, como indica a psicóloga e professora da Faculdade de Medicina de Petrópolis.

Grupos de apoio como o MADA (Mulheres que Amam Demais Anônimas) também podem funcionar como complemento da terapia formal. Lá a mulher encontrará outras pessoas diagnosticadas como borderline e poderá, através da troca de experiências, aprender a controlar os sintomas autodestrutivos da doença.

Mais informações em https://grupomadabrasil.com.br/.

 


 

A equipe Cyber TV agradece de coração a vocês, leitores, por acompanharem os 18 belos contos que enfeitaram a primeira temporada desta série idealizada por Isa Miranda e desenvolvida por ela e por outros 17 escritores de altíssima qualidade, além de Ellen dos Santos nos delicados poemas, de Well Vianna nas artes gráficas e dos revisores de textos Fabiana Prieto e Marcelo Delpkin.

Não esqueçam: SABER AMAR é a coisa mais bonita e importante do mundo. Por isso amem muito. Amem sem preconceitos. Amem sem limites. Amem a Deus e a si mesmos. Amem a vida, as pessoas, os animais, os sonhos, os desejos, as emoções… Simplesmente amem.

A Widcyber está devidamente autorizada pelo autor(a) para publicar este conteúdo. Não copie ou distribua conteúdos originais sem obter os direitos, plágio é crime.

  • Pesquisa de satisfação: Nos ajude a entender como estamos nos saindo por aqui.

    Leia mais Histórias

    >
    Rolar para o topo