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Dumas e Alexandria

ATO I

Aurora Violet

A jovem rainha Aurora Violet, da janela emoldurada do seu quarto na torre norte do castelo, admirava os campos verdes à se perder de vista do reino da Alexandria. Seus olhos castanhos fitavam o sol se pondo colorindo o céu azul de tons alaranjados, quando avistou dois imponentes cavalos galopando em direção às muralhas do castelo. Esfregou o dorso da mão em suas vistas e puxou o lenço enrolado ao pescoço sentindo o vento que insistia em soprar nos finais de tarde. Se descuidou e o lenço com detalhes dourados voou pela janela sobrevoando e caindo na calçada de pedra. Voltou sua atenção aos cavaleiros que se aproximavam. Suspirou fundo ao perceber que seus irmãos Elijah Izrra e Nicolas Martín estavam de volta depois de tantos dias fora.

Os guardas do castelo, envoltos em suas pesadas armaduras, abriram os portões para a chegada dos irmãos. A jovem rainha Aurora Violet descia rapidamente pela rampa lateral seguida de suas duas servas. Chegou no pátio apertando o grande agasalho negro de pele de lobo e suspirou aliviada. Um sorriso encantador, que lembrava muito o de sua mãe Beatrice, estampou a sua face depois de dias de sofrimento sem saber o real paradeiro dos irmãos.

Os dois jovens, com seus trajes surrados e sujos de dias vagando pelas estradas e florestas obscuras no caminho para Alexandria, apearam dos seus cavalos e apressaram o passo indo ao encontro da jovem rainha. O abraço fraterno mais sincero foi presenciado pelos servos e guerreiros que se curvavam contentes com o reencontro. Sim. Agora os três irmãos estavam juntos novamente e, unidos, eles poderiam juntar suas forças para salvar o outro reino onde seus pais estavam inaptos a saírem.

Beatrice

Longe dali, à oeste do reino de Alexandria, em um imponente castelo, mais precisamente no reino de Dumas, a rainha Beatrice despertava agitada em seus aposentos. Seu traje de dormir, assim como os lençóis brancos estavam ensopados com o seu suor. Arregalou os olhos e ficou paralisada fitando o teto com molduras e figuras abstratas. Sentiu um aperto no peito, olhou para os lados à procura do seu rei, mas não havia mais ninguém no quarto. Encarou a janela entreaberta por onde a brisa da manhã entrava balançando a cortina de cor vinho e viu que o sol já estava nascendo. Pensou consigo mesma: ” Meu rei já deve estar cuidando dos seus afazeres”. Levantou com dificuldade e caminhou até a janela abrindo as cortinas. Lá embaixo, no pátio do castelo, alguns guerreiros treinavam luta corporal enquanto outros treinavam arco e flecha. Ficou matutando com seus devaneios. Tivera mais um pesadelo. O que seria aquilo? Um aviso? Uma lembrança? Ela não conseguia distinguir aqueles sonhos que estavam lhe tirando o sono durante as últimas noites.

Beatrice atravessou a porta grande do quarto e percorreu o longo corredor. Enquanto caminhava ainda de pés descalços, observava os quadros dos antigos reis e rainhas pendurados nas paredes laterais. Uma de suas servas surgiu à sua frente lhe entregando um agasalho que ela pegou e vestiu apertando-o bem contra o corpo. Chegou à uma porta de vidraças esverdeadas e parou de repente. Do outro lado um grande jardim florido enfeitava e dava vida àqueles tempos sombrios. Abriu calmamente a porta e se parou em meio às flores. Aquele colorido acalmou o coração da rainha que colheu uma rosa vermelha e a acalentou próxima ao seu peito fechando seus olhos e esboçando um sorriso tímido em seus lábios.

Por alguns instantes Beatrice pôde se desvencilhar de tudo de ruim que a rodeava nos últimos tempos e focar em suas boas lembranças. Com os olhos cerrados, o sorriso tímido e encantador nos lábios e a rosa vermelha junto ao peito, suas memórias a levaram aos dias mais felizes da sua vida: o dia que conheceu o rei. Ela pôde sentir o que jamais imaginou acreditar. Uma antiga senhora de um vilarejo vizinho ao que ela morava lhe disse certa vez que somos todos feitos em pares. Que ao nascermos somos separados, mas que cedo ou tarde achamos a outra metade e, quando a encontramos, compartilhamos os conhecimentos, as histórias de vida, as dificuldades e os ensinamentos. Quando ouviu estas palavras da boca da senhora, que mais tarde adoeceu e morreu sozinha na floresta, Beatrice teve a certeza de que aquele homem que surgira em sua vida era a sua metade. Agarrou esta oportunidade e juntos ainda vivem uma linda história de amor e cumplicidade.

Ouviu um barulho e virou-se para a porta. Era uma serva negra e acima do peso com uma enorme cicatriz abaixo do olho esquerdo. “Amélia”, disse Beatrice surpresa com a presença da negra e um tanto desapontada por ter que fugir de suas memórias. A serva, que em nenhum momento sequer olhava nos olhos da rainha, curvou-se diante de sua majestade por alguns instantes. “Ora, Amélia, sabe que não precisa disso”, falou Beatrice ansiosa por saber o que ela tinha para dizer.

– É o rei. – disse Amélia com o olhar fitando o chão.

Os olhos de Beatrice arregalaram-se. Sentiu um aperto no peito que fez a rosa cair de sua mão.

– O que houve? – perguntou à serva.

– Está sendo levado para o calabouço pelos homens da igreja. Ele recusou-se a atacar Alexandria. – respondeu a serva negra de cabeça baixa.

Beatrice pôs a mão no peito. Sua pele ficou pálida de repente e ela tratou de sentar-se em um banco amadeirado em um canto.

– Atacar o reino de Alexandria? O bispo enlouqueceu? Sabe que nossos filhos estão à frente daquele lugar…

Beatrice ficou pensativa por alguns instantes até se recuperar do baque que a notícia lhe trouxe. Juntou forças para se levantar. Aliás, reunir energias para seguir adiante era o que vossa majestade mais fazia nos últimos tempos.

– Agradecida, Amélia. Já pode se retirar. – disse Beatrice com uma voz veemente mostrando que devia se impor para enfrentar os problemas.

Enquanto voltava para o interior do castelo, a rainha Beatrice já podia notar o alvoroço que a prisão do rei tinha causado em todos. Guerreiros sob o comando de seus generais estavam afoitos de um lado para o outro com os olhos arregalados enquanto servos e servas não sabiam mais nem para onde direcionar os seus passos.

Aurora, Nicolas e Elijah

Em Alexandria o clima era de festa. Agora com os três irmãos juntos novamente, o reino tinha muito o que comemorar. Aurora Violet, usando uma túnica acinzentada e um agasalho de pele de lobo por cima, observava o céu estrelado sentindo uma brisa noturna que insistia em soprar vindo do leste mostrando que o inverno estava por dar as caras. Sentou sobre um tronco caído, abraçou as pernas e lançou seu olhar para as estrelas identificando uma a uma. Uma lágrima escorreu do seu olho pela sua face angelical quando a lembrança de seus pais veio à tona. Sorriu para si mesma e logo ganhou a companhia de Kitara, sua loba filhote que chegou correndo aos seus pés. Enxugou a lágrima com o dorso da mão e acariciou Kitara. “Vamos, sua serelepe! Hoje é dia de festa em nosso reino”, disse Aurora levantando-se e caminhando por um estreito caminho de pedras que a levava em direção às luzes dos candelabros acesos no castelo do reino.

No interior do grande salão do castelo já se faziam presentes grande parte do povo de Alexandria. Todos em seus melhores trajes, bebendo felizes e comemorando o retorno de Elijah e Nicolas. As mesas estavam postas, coloridas e recheadas de boa comida. Aquela noite nada iria impedir que Aurora, Elijah e Nicolas esquecessem seus problemas e comemorassem por algum tempo.

Aurora Violet empurrou a aldraba dourada no centro da porta escancarando-a e chamando atenção de todos os presentes. Agora ela usava um vestido branco longo com detalhes dourados e uma grande manta enrolada ao seu pescoço. Os cabelos pretos encaracolados traziam leves adereços pendurados nas pontas e os seus olhos castanhos e vívidos brilhavam como há muito tempo não se via. Elijah Izrra estava de costas e virou-se para a irmã quando tudo silenciou. Usava uma calça bege, botas de cano alto, camisa branca e um colete da mesma cor da sua calça. Seus cabelos pretos e lisos até a altura dos ombros balançaram com a sua virada de cabeça. Sorriu ao ver a irmã, sacou a espada de sua cintura e reverenciou-a. Ao verem a cena todos os presentes fizeram o mesmo.

Giulia Emanuelle e Valentine Sarayu

As princesas Giulia Emanuelle e Valentine Sarayu estavam imponentes à frente de um povo negro que, com expressões cansadas e com as mãos cerradas para o alto, gritavam festejando sua libertação. A primeira, de cabelos mais claros e cacheados estava com as vestes sujas e ensanguentadas e empunhava uma lança. A segunda, de cabelos mais escuros e cacheados tinha as vestes rasgadas e marcas de batalhas enquanto segurava firme sua espada. Seus sorrisos de satisfação mostravam que tinha sido válida cada cicatriz de guerra que carregariam pelo resto de suas vidas.

Escutou-se um rugido ensurdecedor tomar conta de tudo e fazer com que os gritos de festejos fossem encerrados e todos àqueles negros fitaram seus olhos no céu acinzentado. Mondragon, um enorme dragão de tons alaranjados, sobrevoava o local batendo suas asas e soltando fogo para o alto. Ele era o guardião protetor da princesa Giulia e tinha ajudado a libertar aquele povo do norte. Um outro dragão, de tons escuros e mesmo porte, se parou sentado atrás das duas jovens. Era o Estrela de Fogo, o guardião protetor de Valentine. Suas enormes asas se abriram como se fizesse uma proteção ao redor das princesas. Sim, aquele povo do norte não teria mais o que temer, agora estavam protegidos pelos poderes das princesas Giulia Emanuelle e Valentine Sarayu e seus dragões guardiões.

Marcus Aurelius

O bispo Demetrius desceu o estreito corredor escuro seguido de dois guardas fortemente armados e usando armadura pesada. Virou à direita no final do corredor e logo parou em frente à uma enorme porta acinzentada, enquanto um dos guardas tomou a frente abrindo-a. Demetrius deu passos pesados para dentro do cômodo escuro e recebeu em mãos um candelabro que, imediatamente, foi aceso por um de seus guardas. A claridade iluminou o calabouço do castelo do reino de Dumas. Um lugar pequeno e mal cuidado que cheirava à queijo podre. Agachado em um canto, de costas para a porta, estava o rei Marcus Aurelius, sem camisa e com cicatrizes aparecendo no alto dos seus ombros musculosos. Virou-se para o bispo com um sorriso no canto da boca e mostrou-lhe as mãos amarradas com cordas trançadas à frente do corpo. Sua expressão demonstrava o seu descontentamento com o que estava acontecendo. Levantou-se com dificuldade e deu passos até ficar com o seu rosto bem próximo do rosto do bispo Demetrius. Então pôde se notar que grossas correntes presas em seus tornozelos limitavam os seus passos.

– Eu ainda vou juntar meus filhos Elijah, Nicolas, Aurora, Giulia e Valentine…e nós vamos expulsar destas terras todos vocês, seus vermes! – disse Marcus Aurelius com raiva em seu olhar.

Se escutou um trovão cortar o céu do lado de fora e um grande estrondo vindo de algum lugar. Demetrius ordenou que seus guardas fossem averiguar o local. Agarrou firmemente a face do rei entre seus dedos e olhou bem dentro dos seus olhos com um sorriso debochado.

– Ou você lidera um grupo que vai atacar Alexandria e pôr aquele lugar abaixo, ou eu mesmo farei isso. Tenho minhas artimanhas, rei Marcus Aurelius…e pode ter certeza que trago aqui para vossa majestade a cabeça de cada um de seus filhos…

E o bispo Demetrius empurrou o rei Marcus Aurelius que caiu sentado aos seus pés. Ele debochava de sua majestade. Ele aparentava não ter medo do perigo. O bispo, era na verdade, o pior inimigo dos reinos…ou Aurora, Nicolas e Elijah apressavam-se em tomar uma atitude ou tudo iria água abaixo. Ou Giulia e Valentine deixavam suas aventuras pelos sete reinos ou jamais veriam a família unida novamente.

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