Estela abre a porta, e com a mão na garganta fala em voz rouca – Doutor Custódio.
Custódio – Então não é mesmo mentira, você está com dor na garganta.
Estela – Desde madrugada.
Custódio – Porque não falou? Desculpa! Acho que não teve tempo. Vou pegar a maleta de primeiros socorros no carro e dou uma olhada. – Ele no carro, pega a maleta e volta no quartinho, depois de olhar – Estela você mora nesse cômodo apertado?
Estela – É o mais próximo que achei perto do hospital, e dá pra pagar, sem apertar o meu salário.
Custódio coloca a maleta em cima da mesinha, onde tem uma foto encostada em um objeto – Preciso lhe dar aumento, assim aluga um lugar maior. – Ele pega a foto que caiu, ao lado da maleta, para colocá-la de pé novamente, e fica surpreso. Vira-se para Estela – O que a foto do meu pai está fazendo aqui com você?
Estela se senti sufocada, sem conseguir respirar, com a garganta se fechando de vez.
Custódio segura-a, para que não cair ao perder os sentidos. Chama-a – Estela? Estela?
No hospital Tereza e Adalberto conversam.
Tereza – Eu não estava aqui naquela época, e as enfermeiras antigas dizem que antes da esposa do doutor Custódio falecer ele era muito exigente. Chamava a atenção de todos se encontrasse uma agulha fora do lugar. E mudou totalmente o comportamento depois disso… Descobriram que não foi a morte da esposa do doutor que o fez mudar, mas sim Estela. Meses depois, Estela fez uma viajam, ficou 15 dias fora, e dizem que todas as vezes que o doutor Custódio entrava nesta enfermaria, levantava as mãos para cima e pedia: Meu Deus, traz a minha assistente de volta, antes que eu começo brigar com todos aqui dentro. E tem mais! Todos dizem que ele entrou em crise quando a esposa dele morreu, porque a Estela não estava aqui. E quando um não está aqui no hospital o outro também não. Como o doutor viu o que aconteceu hoje, o doutor Custódio saiu e a Estela saiu atrás.
Naquele instante a sirene toca. Adalberto se apressa – Emergência.
Tereza pega a maca e no corredor Custódio entrar com Estela nos braços. Ela é colocada na maca, e levada para a emergência.
Na porta da igreja, Luiz e Maria conversam com uma senhora.
Mulher – Se tivessem chegados meia hora antes, encontrariam o padre Miguel. Ele foi numa fazenda 30 quilômetros daqui.
Luiz – Ele volta quando?
Mulher – Depois de amanhã.
Luiz olha Maria – Bom, voltamos depois de amanhã.
Mulher – Padre Miguel está com uma viagem marcada para a Itália, e pretende voltar daqui seis meses.
Luiz desapontado – Brincadeira! – olha Maria – O que vamos fazer agora?
Mulher – Se quiserem ir atrás dele, não é longe daqui. A estrada está boa.
Luiz – O que você acha?
Maria – Você decide! Por mim, podemos procurar outro padre.
Mulher – Padre Miguel vai adorar fazer o casamento de vocês. Tão jovens e já querendo se unir ao matrimônio. O amor não tem mesmo idade para começar.
Luiz e Maria entreolham emocionados. Luiz – Vamos atrás do padre Miguel? Dá tempo de ir e voltar. O dia está mais cumprido e demora escurecer. A senhora passa o endereço?
Mulher – Eu explico! Não tem erro. – Logo depois Luiz e Maria entram no carro e saem.
A mulher sorri, observando o tempo formar nuvens escuras. Ela se torna numa sombra e desaparece, aparecendo ao lado de Estela, sendo preparada a cirurgia. O aparelho apita.
Custódio se apavora. – Vamos perdê-la. – pega das mãos da enfermeira uma ferramenta, e se irrita. – Não foi essa que pedi.
Adalberto segura a mão dele que está tremulo – Calma, doutor! O senhor está muito nervoso. – entrega a outra ferramenta – Quer que eu faça a cirurgia no seu lugar?
Custódio, transpirando muito, o encara nos olhos.
Adalberto sorri tranquilamente – Estou aqui para ajudá-lo.
Custódio procura se acalmar. – Não! Eu mesmo faço!
Adalberto – Então vá com muita calma! Estou mesmo aqui para ajudá-lo.
Custódio fecha os olhos. Suspira fundo e volta a cirurgia.
Anjos de luz descem fazendo um círculo entre eles. A sobra da morte se afasta.
Entre os anjos estão Ezequiel, Cristovam e Sara.
Maria e Luiz param o carro ao lado do casarão da fazenda. Luiz fala com um empregado – Estamos procurando padre Miguel. Ele se encontra aqui?
Empregado – Ele já foi embora. Foi fazer uma visita na fazenda vizinha. Vai passar a noite lá. Vocês tem que voltar na estrada, seguir 12 quilômetros e entrar em outra. A entrada da fazenda fica 5 quilômetros após a segunda estrada. Tem uma trilha, tem que ficar atento, se não, você passa direto.
Luiz – Obrigado – retornando o carro e vão embora.
Logo depois estão na estrada, e, despercebidos passam pela trilha. Bem à frente Luiz percebe e para o carro. – Maria, acho que passamos a entrada da trilha, andamos quase o dobro do caminho. Vamos voltar – Ao contornar o carro, ele para. Luiz insiste, e o carro não volta a funcionar. – Só essa que faltava, o carro pifou.
Maria em desespero – E agora? O que vamos fazer?
Luiz olha o tempo – Pior que está começando escurecer. Vamos voltar a pé, a entrada da trilha não deve estar longe, e até a fazenda são 5 quilômetros. Temos que pedir ajuda. – Tranca o carro e seguem de mãos dadas. Depois de uma longa caminhada, percebem nuvens escuras surgindo atrás da mata.
Maria – Chuva. Luiz vai chover e não vai demorar muito. O pior que já está esfriando.
Luiz – Tem uma capa de chuva do Eduardo no banco de trás, eu vi quando peguei o carro. Vamos voltar e pegar, assim, pelo menos você não se molha tanto.
Maria desapontada – Não acredito que está acontecendo isso. Luiz, acho que fizemos loucura, eu já estou cansada de andar.
Luiz nota um tronco de arvore caído na beirada da estrada – Senta e descansa enquanto busco o capa. Vou e volto correndo. – Beijando-a, sai correndo.
Maria, senta no tronco, vê quando ele desparece, descendo a ladeira.
Antes de chegar no carro, sem perceber, correndo, Luiz pisa em falso, virando o pé. Ele cai, sentindo fortes dores.
Maria olha o tempo escurecer rapidamente com a chuva chegando. Ela vê uma mulher atravessar a estrada, e rapidamente vai atrás, para na entrada da trilha que deveriam seguir. Vendo a mulher indo longe, ela corre, gritando. – Minha senhora, espere?
Luiz, mesmo com dor, pula de um pé, até chegar no carro. Senta no banco e sente desespero. – Meu Deus e agora? Eu não vou conseguir voltar? E Agora? – Olha a chuva desabar, pega o casaco e tenta pular, escorrega e cai novamente, machucando novamente o pé. Ele se arrasta, e volta no automóvel, fica sentado no chão, sem conseguir levantar.
Maria, seguindo a mulher, entra em meio a floresta. Sai em outra estrada e segue um bom pedaço. Sem ver a mulher volta e não encontra a trilha. Caminha pela estrada, sem rumo.
Custódio deixa o hospital. Logo chega em casa e entra pela porta da sala. Tenta encarar a foto do pai, ampliada, na moldura, pendurada na entrada. Consegue se aproximar e tocar com a palma da mão. O pensamento em Estela e na foto encontrada junto aos pertences dela, o leva ao quarto e na gaveta da cômoda, encontra outra foto.
Na rua, ele entra no carro e, no quartinho de Estela, pega a foto que deixou de lado, ao socorrê-la, e compara as duas. Vasculha, encontrando debaixo do travesseiro um caderno, senta-se na ponta cama e desfolha, sem pressa, encontrando anotações de ruas e bairros. Ele lembra das vezes que Estela menciona a respeito do pai e do irmão.
Na casa de Afonso mostra-as, para o pai.
Custódio — O que o senhor me diz das duas fotos?
Afonso — É a mesma. Onde encontrou a outra? Sei que tinha só uma.
Custódio — Com Estela.
Afonso — Sua assistente?!
Custódio — Não quero acreditar no que estou pensando.
Afonso — Que ela fez a cópia? Qual seria o interesse? — balança a cabeça — Não! Ela não teria como mandar fazer uma cópia idêntica e você sabe disso! E porque não pergunta a ela que poderá lhe dar a explicação certa?
Custódio se coloca de pé. Sente tristeza em dizer: — Não sei se um dia Estela volte a falar. Nem mesmo sei se ela vai sobreviver. — e depois de explicar os acontecimentos, desabafa: — Eu nunca tive a curiosidade de perguntar a ela de onde veio. Quem eram seus pais, como se a vida dela não fosse importante para mim, vivendo ao meu lado, todos esses anos, me ajudando em tudo que precisei, dentro daquele hospital, principalmente com Giza, os meses que ela ficou internada. Estela cuidou dela melhor que ninguém. — sem conseguir esconder o desespero. — Estela não pode morrer!
Afonso pega-o aos ombros, para que o olhe. — Precisa ter fé, filho. Acredite que o pior já passou, e que ela vai conseguir. Não fique, pensando no que aconteceu com a sua mulher. Estela vai ser forte. Vamos rezar, para que ela consiga viver e explicar a razão de ter uma foto do seu pai.
Custódio — O senhor está pensando a mesma coisa que eu?
Afonso — Hoje, na hora do almoço você me disse que tem pela Estela um carinho de irmão. Quem garante que não seria a voz do sangue lhe dizendo isso.
Luiz, ainda sentado no chão, apoiado as costas no carro, sente desespero: – Maria, por que não vem aqui? Já era pra você ter vindo atrás de mim.
A escuridão toma conta do lugar.
Moreira, sentado ao lado da mesa, inconformado fala com Dora. – O Luiz não devia ter feito isso! Onde se viu levar a Maria pra jantar na casa do pai dele, se nem com ele o Geraldo está conversando direito. Você não devia ter autorizado, e devia ter ido na igreja junto. Não é porque vão se casar que podem ficar andando por aí sozinhos.
Dora – Moreira, você está com ciúmes do Luiz com a nossa filha?
Moreira – Ciúmes, mulher? Para de falar besteira. Não é nada disso.
Luiz – Se eles quisessem aprontar antes do casamento, você acha que teriam voltado para casa, depois de fugirem?
Moreira – Dora, você não conhece o Geraldo. Eu só não quero que ele maltrate a nossa filha. – Levanta – Sabe de uma coisa, prometi que vou estar do lado dela em tudo, e é isso que vou fazer. Vou lá saber como que o Geraldo está tratando os dois.
Dora – Moreira volta aqui? Moreira…? – e sai atrás.
Chegam na casa de Geraldo.
Mirtes atende. – Os dois não apareceram ainda, e confesso que estou preocupada. O Luiz sempre cumpre o que fala. Já eram para terem chegado.
Geraldo, sentado ao lado da mesa – Quem sabe o Luiz seguiu o meu conselho e está com a tua filha por aí, no meio do mato.
Moreira – Eu não me preocupo com isso não Geraldo, sabe por quê? O seu filho já voou do ninho, e mora em um quarto de pensão, então, ele não precisa levar ela para o meio do mato, levaria para pensão. E se não apareceram aqui, fico mais tranquilo, significa que o Luiz não vai trazer a minha filha pra morar debaixo do seu teto, como escreveu na carta.
Geraldo – Se conheço bem o filho que tenho, nem na sua casa ele vai morar.
Moreira – Não estou preocupado com isso. E quer saber de uma coisa, você não merece o filho que tem? A senhora me desculpe em dizer isso, mas é a verdade.
Mirtes – Será que vocês dois não conseguem parar pra pensar? Dora, eu pensava que o Luiz estava lá com vocês.
Dora – Eu pensava que estavam aqui.
Mirtes – Se o Luiz não apareceu aqui e nem levou Maria pra casa, alguma coisa de errado aconteceu com os dois.
Moreira e Geraldo se olham sérios. Moreira com Dora – Dora vai pra casa e fica esperando lá, caso eles apareçam. Eu vou na casa do senhor Eduardo. Quem sabe o Luiz resolveu devolver o carro, e por causa da chuva, ainda estão por lá.
Mirtes – Se eles aparecerem aqui eu aviso vocês, e me avisem também se eles aparecerem lá.
Geraldo levanta e fala com Moreira, já saindo. – Eu vou com você Moreira, procurar os dois.
Na casa de Eduardo, de pijama ele abre a porta.
Moreira – Luiz veio de lhe devolver o carro?
Eduardo – Não! Falei que ele podia me devolver amanhã cedo. Mas o que aconteceu?
Geraldo – Os dois saíram naquela hora para ir na igreja e não voltaram pra casa até agora. Não temos ideia para onde foram?
Eduardo ri – Vai ver os dois resolveram dar um susto nos dois, para ver como agiriam, e pelo jeito deu certo. Os dois parecem que estão numa boa procurando eles.
Geraldo – O Luiz nunca ia brincar com uma coisa dessa, eu conheço o meu filho, ele não ia fazer esse tipo de brincadeira.
Moreira – Eu também conheço a minha filha, ela não ia fazer isso.
Eduardo – O Luiz não ia mesmo fazer isso, estou brincando. No hospital, vocês procuraram por lá?
Moreira – Não! Como o Luiz estava com o seu carro viemos direto para cá. Vamos passar lá agora.
Eduardo – Vou com vocês procurar por eles. Vou avisar a Francine e trocar de roupa, ela já está dormindo.
No hospital Custódio fala com Eduardo – Não! Aqui não deram entrada. Mas o que aconteceu?
Luiz – O Luiz saiu depois daquela hora, e ninguém sabe onde ele e Maria estão.
Custódio – Ele não está morando numa pensão? Talvez tenha ido para lá com ela.
Eduardo – O Luiz ficou de jantar na casa do pai dele hoje e não ia esquecer o compromisso com a mãe. E também não ia sumir, sem mais sem menos. E… Bom, eu vim pensando naquela conversa de hoje do doutor Adalberto. Lembra ele dizer que viu uma nuvem escura, envolvendo o Luiz e a Maria, quando ele viu os dois lá na pensão. Comecei a pensar no sumiço dos dois e confesso que estou preocupado, por ter emprestado o meu carro a eles. Se eu não tivesse feito isso, talvez, eles não teriam desaparecido.
Custódio – Talvez! Você disse. Isso pra mim significa que se eles tiverem que passar por alguma coisa, isso não iria interferir. Então, não se sinta culpado. O melhor agora é não pensar no pior. Nosso pai vive dizendo que tudo está escrito, e que ninguém passa o que o outro tem que passar… Custei, mas estou começando acreditar nisso. E devo ter feito muita coisa errada na minha vida, e só pode ser mesmo em outras, porque nesta, estou colhendo os frutos amargos que plantei, muito mais ainda dos que já plantei nesta vida.
Eduardo – Por que está falando assim?
Custódio – Venha comigo? – e saem, enquanto Custódio entrega a ele uma máscara. Logo depois estão no quarto, onde Estela inconsciente respira por um aparelho.
Eduardo abalado – O que aconteceu com ela?
Custódio – Teve que ser feito uma traqueotomia. A garganta dela fechou e não conseguia respirar.
Eduardo – Ela está fora de perigo?
Custódio – Estela não pode morrer. Tem muita coisa a me explicar.
Eduardo – Como assim?
Na sala de atendimento, Custódio pega as duas fotos na gaveta e estende para Eduardo.
Eduardo – Onde conseguiu outra foto do seu pai?
Custódio – Estela é a única pessoa que pode me explicar. O pior que algumas vezes ela mencionou que veio para São Paulo procurar o pai e o irmão. Na ultimas vez que falamos nisso, ela me disse que havia perdido a esperança de encontrá-los. E eu, em nenhum momento, tive a curiosidade de perguntar como se chamava o pai dela.
Eduardo – Meu Deus, como esse mundo é pequeno e as coisas acontecem tão estranhamente.
Custódio – Estela é minha irmã, eu não tenho dúvidas disso. Ela levou um choque muito grande, quando perguntei o que a foto do meu pai fazia com ela.
Eduardo – Estou surpreso, feliz por você ter uma irmã de sangue e triste pelo que aconteceu com ela.
Na pensão. Rafael conversa com Moreira. – Não! O Luiz saiu cedo para ir na fábrica e não voltou. Mas o que aconteceu?
Adalberto chegando ouve a conversa. – O Luiz saiu da minha casa com a Maria não eram três horas da tarde, e já é quase meia noite e ainda não voltaram. Já procuramos os dois por todos os lugares e nenhum sinal deles. O que sabemos é que saíram para ir na igreja falar com o padre e não voltaram.
Adalberto lembra o momento em que vê Luiz e Maria na sala, e a sombra escura atrás deles e murmura para si mesmo – A morte. A morte que estava rodeando os dois. Só pode ser isso!
Rafael fala com Moreira – Só pode ter acontecido alguma coisa muito grave, o Luiz não ia sumir assim! Qual motivo levaria o Luiz e Maria sumirem?
Adalberto – Procuraram no hospital?
Moreira – Sim! O doutor Custódio ficou de avisar caso apareçam por lá.
Maria, no chão, encolhida treme de frio e medo.
Luiz começa a tossir, se sentindo agoniado.
A sombra passa ao redor dele e depois de Maria, que cobre a cabeça com os braços, rezando.
Luiz também reza. O tempo ainda desaba, em meio a raios e trovões.
Dora, no quarto da filha, acende uma vela e se coloca de joelhos, pedindo proteção ao casal.
Moreira, na cozinha, também pede pela filha – Meu Deus, protege minha filha onde quer que ela esteja nesse momento. O Luiz também.
Eduardo, na casa dele, também se coloca de joelhos e faz oração.
Adalberto, no quarto, pede pelo casal e por Estela.
Custódio na sala de recuperação, depois de examinar ela, observa-a, em silêncio. Ele relembra todo o seu passado. Com semblante entristecido, caminha pelo corredor escuro, chegando a capela. O fogo da vela acesa chama-lhe a atenção. Ele lembra o dia em que Afonso entrega a ele, a Beto e a Dudu, cada um, um livro sagrado.
Afonso — É um presente igual aos três. Quero que leiam com muita atenção, sem pressa. Leia uma página por dia, vocês têm a vida inteira para entender a palavra. Uma coisa é certa. Nada na vida de uma pessoa acontece simples porque tem que acontecer. Tudo tem um significado. Muitas vezes, não encontramos respostas, que está guardada no coração de Deus, e ele é quem irá nos revelar quando estivemos ao lado dele.
Eduardo (7) — Quando a gente morrer?
Custódio (8) olhos cheios d’água — Não gosto da morte! Não queria que ninguém morresse.
Afonso coloca as mãos no ombro dele — Preste atenção no que vou lhe dizer, filho. A morte faz parte da vida.
Custódio — Por que as pessoas morrem?
Afonso — Você já me fez essa pergunta antes, e não vou lhe responder a mesma coisa — pega a bíblia e lhe aponta: — Um dia, você irá encontrar a resposta que procura dentro deste livro.
Custódio — A Ba me disse que as pessoas morrem porque ficam velhas ou doentes.
Afonso — O verdadeiro significado não é bem assim. Quando ficarmos velhos, já vivemos o que seria em nosso direito de viver, e o descanso é uma dádiva de Deus. Para os doentes a cura pode ser encontrada através da fé e dos médicos que ajudam amenizar a enfermidade e viver até chegar a velhice.
Beto (7) faz careta, não gostando do comentário. — Acabamos morrendo do mesmo jeito!
Afonso — A velhice é receber a alegria de viver muitos anos, ao lado das pessoas que amamos.
Custódio, cabisbaixo e com as lágrimas escorrendo pelo rosto. — Meu pai, então estaria vivo se um médico tivesse cuidado dele? Meu pai não era tão velho.
Afonso — Sim! Talvez sim!
Custódio — Quando eu crescer, vou ser médico. Vou cuidar das pessoas para que elas não morrem cedo, e criança nenhuma vai crescer sem o pai.
Afonso pega-o, no queixo — Filho, olhe para mim? Não é bem assim? A morte vem…
Noemi — Deixe ele pensar como quiser Afonso? Deixe o menino ter esperança. Ele vai crescer e um dia vai descobrir que a morte vem para todos, quando chega a hora.
Custódio deixa as lembranças, olhos fixos nas chamas da vela. Suspira profundo antes de olhar a imagem de Jesus na cruz, se aproxima e se coloca de joelhos: — Perdoe-me por perder a minha fé. Eu ainda quero acreditar que a vida é a esperança para todos. — fecha os olhos e reza em silêncio.
Uma enfermeira passa no corredor, fica surpresa, vendo-o, na capela.
Na enfermaria, comenta com a outra. — A fé do doutor Custódio está voltando. Ele está na capela, rezando. Lembro que ele fazia isso, antes da esposa morrer. Rezava diariamente pedindo que ela se salvasse. Depois que ela se foi, ele não voltou a rezar, não diante o santíssimo. Nunca mais vi.
Enfermeira 2 — Ele deve estar rezando pela Estela.
Enfermeira 1 — Que Deus não a leve embora também. Caso isso acontecer doutor Custódio vai perder a confiança em si próprio, como médico, como fez antes, e conseguiu se reerguer após a morte do irmão. Você não se encontrava aqui, na época.
Enfermeira 2 — Decidi ser enfermeira porque tenho medo da morte. Quero estar dentro do hospital quando ela passar, assim, não me leva para as trevas, estarei usando branco. — e riu.
A outra também. — Nunca parei para pensar nisso. A partir de hoje usarei roupas brancas até mesmo quando estiver dormir.
Mirtes, entrando no quarto, acende outra vela, colocando junto a outra, quase chegando no fim, e reza: – Cuide do meu filho, meu Deus. Envie anjos de luz para protegê-lo. Meu filho está precisando de ajuda, nesse momento, sei que está! Maria também.
Geraldo, na sala, escura, sentado observa a chuva cair, enquanto toma uma dose de bebida. Ele vê Mirtes chegar. – Devia estar dormindo, Mirtes.
Mirtes – Não consigo. Não consigo parar de pensar um minuto no Luiz e na Maria. Estou tão preocupada, Geraldo. Não quero imaginar o Luiz debaixo desta chuva. Lembra quando ele era garotinho? Um vento frio que pegava logo estava com o pulmão fechado. Outro dia ele reclamou que estava com dor no peito e nas costas, até pedi a ele que procurasse o doutor Custódio, mas ele não quis.
Geraldo – Mirtes, o Luiz nunca mais volta pra casa. Perdemos nosso filho para sempre. Estou sentindo que alguma coisa de ruim vai acontecer com ele.
Mirtes – Não, eu não vou pensar no pior. Eu já acendi uma vela ao anjo de guarda dele que vai protegê-lo com a toda a permissão de Deus. Então, vou dormir e não pensar no pior. Vou colocar a minha fé em Deus. Nada vai acontecer de ruim.
Ezequiel se aproxima de Estela, no leito hospitalar e chama-a, pelo nome. A moça abre os olhos e ele pede – Precisa vir comigo. Sua amiga Maria precisa da sua ajuda.
Maria, encolhida no chão, levanta a cabeça, ao sentir uma mão lhe tocar. Ela e Luiz com emoção se abraçam, as lágrimas se misturam com a água da chuva, caindo sem cessar.
Maria — Como me encontrou?
Luiz — Vamos sair daqui? Venha, comigo?
De mãos dadas seguem um rumo, sem conseguirem enxergar o caminho, entre um raio e outro. Se deparam com um rancho de sapé, e na porta gritam. — Tem alguém aí?
Estela abre a porta. Ela sorri vendo o casal. Pede que entram.
Maria e Luiz entreolham surpresos. O lugar simples e aconchegante. Na mesa um prato de milho cozido, e numa chaleira encima da chapa do fogão.
Estela prepara um chá, ao lado de um caldeirão, borbulhando uma deliciosa sopa de legumes.
Sentados ao lado da mesa, comem sem cerimônias.
Estela segura forte a mão de Maria – Estou tão feliz em vê-la, até parece que estou sonhando. Eu encontrei você. ¬– Olha Luiz – Como está o seu pé?
Luiz – Não estou sentindo dor.
Estela olha o emplasto – Melhor trocar, ainda está muito inchado.
Ela levanta, pega ervas em outra vasilha e coloca num tecido, troca com o que envolve, um dos pés de Luiz.
O dia amanhece.
Na delegacia o delegado de pé, arruma o suspensório e fixo em Moreira. — Sua filha saiu com o namorado ontem, depois do almoço para irem na igreja marcar a data do casamento, e não voltaram para casa até agora. Tem certeza que o senhor está procurando os dois nos lugares?
Moreira — O doutor está querendo me dizer o quê?
Delegado estica os lábios em um tom malicioso. — Convenci minha mulher dormir comigo antes do nosso casamento. Quem garante que a sua filha não está…
Geraldo grita, segurando ele — Moreira, está maluco!
Um policial também ali segura Moreira.
Delegado grita. — Prende esse maluco. Ele vai apodrecer atrás das grades se depender de mim.
Policial – Vamos, o senhor está preso.
Moreira – Delegado me escuta…
Delegado grita com o policial — Leve ele daqui. – Apontou Geraldo — E o senhor também, some da minha delegacia, antes que vai com ele atrás da grade também.
Geraldo — Delegado o Moreira é louco mesmo. Ele briga comigo por causa da filha faz 16 anos.
Delegado — Quantos anos tem a filha dele?
Geraldo – Dezesseis anos.
Delegado — Se fosse filho meu, envolvido com a filha desse maluco, não aceitaria essa união nunca. Mandaria meu filho para outro país se fosse preciso. Mas com a filha dele, não casava.
Geraldo — É um caso de se pensar. Ele vai matar o meu filho, caso acontecer alguma coisa de ruim com a Maria. Essa é a segunda prova que tenho.
Delegado que ameaça deixar a sala, retorna — Isso não vai acontecer, se depende de mim, aquele homem vai apodrecer na cadeia. Ele é um perigo para a sociedade.
Geraldo – Eu concordo com o senhor.
Na casa de Dora, Geraldo acrescenta as palavras do delegado. — Se depender do delegado, o Moreira vai passar o resto da vida na cadeia.
Dora se deixa sentar na poltrona da sala — Meu Deus, o Moreira perdeu o Juízo. Como pode dar um soco na cara do delegado? E agora, o que vai acontecer? E onde está minha filha? O que aconteceu com ela?