ESTAÇÃO MEDICINA
CAPÍTULO 11
A Falsa Amante
CENA 01/MAUÃ/RODOVIA MOVIMENTADA/MANHÃ
CAM FICA DESEMBAÇADA. CONTRA PONGLEÉ.GRAMA. Levanta. Percebe-se que alguns carros buzinam rindo. Começa a andar até perceber que está nu.
CAM REVELA. PLANO GERAL. VITOR ESTÁ NU NO MEIO DE UM RODOVIA MOVIMENTADA.
CEN 02/SÃO PAULO/TATUAPÉ/UNIVERSIDADE OLÍMPIUS/INSTITUTO DE FISIOTERAPIA/NEUROLOGIA/ MANHÃ
Uma professora com nanismo entra na sala, trazendo alguns livros, ela sobe em cima da mesa. Todos ficam em silêncio.
MIRIAM – Bom dia, calourada da quebrada, tudo bem com vocês?
A quebra de expectativa foi grande. Viviane ousou.
VIVIANE – Tudo bem sim professora e com a senhora?
MIRIAM – Maravilhosamente bem, exceto por aquele episódio de Black Mirror que a mulher é perseguida na rua e depois mostram que ela é culpada pelo assassinato de uma criança com requintes de crueldade e ela tá sendo julgada como se tivesse em um purgatório. Eu achei bem estruturada.
FABIANA – Foi muito bom! Trataram essa questão do poder paralelo, né? Do fazer justiça com as próprias mãos.
Guto entra na sala, voltava da academia.
GUTO – Você é a professora?
A Sala riu. Miriam fez uma dancinha em cima da mesa.
MIRIAM – O que você acha? Te choca uma professora anã?
Guto fica sem saber o que responder, mas consegue.
GUTO – É que a gente não vê todo dia, né, Fessora? Não é tão comum para mim. Uma pena.
MIRIAM – Garoto esperto! Entra e se senta, não começamos ainda.
Sala riu. Guto entrou, alguns garotos zoaram ele. Eliane o fitou com o olhar encantada com seu gingado, sua maleabilidade, Fabiana corou-se. Eliane ficou achando que ele fosse sentar ao seu lado, num lugar vago, mas ele se sentou ao lado de Fabiana, instrumental crescente. Close na face de Eliane invejosa.
GUTO – Tá fugindo de mim, gatinha?
FABIANA – Quem tá afirmando isso, é você, não sou eu.
GUTO – Marrentinha como sempre.
MIRIAM – Sem mais delongas, vamos começar nossa aula, definindo neurônio. O que é um neurônio?
HELOÍSA – São células responsáveis pela transmissão de impulsos nervosos.
MIRIAM – Por enquanto está bom. Como são essas células?
Heloísa espera para ver se mais alguém responde. Ela então interrompe o silêncio.
HELOÍSA – Possuem três estruturas básicas: corpo celular, dendríto e axônio.
MIRIAM – Perfeito, teremos 3 aulas para estudar cada uma dessas características, não é a toa que vocês possuem 4 horas-aula da minha matéria.
Eliane e Viviane bufam entediadas.
MIRIAM – Vou escrever isso na lousa
Ela desce da mesa, sobe na cadeira de rodas e começa a escrever no quadro negro.
MIRIAM – Bom. Lembrando que esta semana ainda não vamos de tarde para o laboratório de neuroanato, só semana que vem. Vamos começar então falando dos três tipos de neurônio: Bipolar, Pseudounipolar e Multipolar. Alguém sabe me definir os três?
Ela se vira para os outros e finge não ver a mão de Heloísa levantada para ver se mais alguém sabe, quando não encontra, pisca meigamente para Heloísa que começa a falar.
CORTAR PARA:
CEN 03/SÃO PAULO/SANTO AMARO/BURACO QUENTE/CASA DE PÂMELA/MANHÃ
Bernardo estaciona seu conversível. Ângela percebe um movimentação estranha e constata ser Bernardo.
ÂNGELA – Parou um carrão em frente casa!
PAMELA – Ele aqui? Mas não combinamos de nos encontrarmos na mansão?
ÂNGELA – Mansão?
Pâmela abriu a porta para Bernardo que entrou.
BERNARDO – Olá.
Ele cumprimentou timidamente Ângela.
PAMELA – Essa é minha, mãe. Ângela.
BERNARDO – Prazer, Bernardo.
ÂNGELA – Quem é esse cara, PÂMELA DE JESUS?
PAMELA – Um amigo, vamos para o meu quarto, a gente tem mais privacidade.
BERNARDO – Por favor, com licença, dona Ângela.
E eles entraram no quarto dela. Ângela ficou na porta do lado de fora a escutar.
QUARTO DE PÂMELA
PAMELA – Pensei que tínhamos marcado na mansão!
BERNARDO – Eu não marquei nada com você, Mateus roubou meu celular, ele queria marcar um encontro com você para descobrir quem era o nickname: Minha Princesa.
PAMELA – Então é assim que estou salva no seu celular?
BERNARDO – Sim.
Ela o rouba um beijo molhado.
PAMELA – Bom saber disso. Espero que assuma a sua paternidade também como prova de amor daqui há alguns meses.
BERNARDO – Nós já conversamos sobre isso, não tem jeito. Posso te ajudar financeiramente.
PAMELA(incisiva)– Com quanto?
BERNARDO – Um salário!
PAMELA – UM SALÁRIO?
Do lado de fora, Ângela fica revoltada. Big-close-up.
CENA 04/IMAGENS AÉREAS DE SÃO PAULO/TARDE
Imagens de prédios de São Paulo. Avenidas Principais. Indicando que entardeceu.
CENA 05/MAUÃ/RODOVIA MOVIMENTADA/TARDE
Vitor sofre atrás de uma moita num canteiro, consegue esconder a parte da frente, mas alguns carros que passam atrás buzinam ridicularizando ele.
VITOR – Malditos! Desgraçados! Como vou para casa assim?
Ele estava com hematomas pelo corpo. Um casal de velhinhos que passavam se compadece e para o carro.
IDOSA – Hey, menino.
Vitor se vira esperançoso.
VITOR – Oi!
IDOSA – O que aconteceu?
VITOR – Armaram para mim, roubaram minha roupa.
IDOSA – Entra aqui, vem, te levamos até minha casa, te ajudamos.
Vitor sorri.
VITOR – Obrigado.
CORTAR PARA:
CENA 06/SÃO PAULO/TATUAPÉ/HOSPITAL ORLANDO MOÇA/ENFERMARIA DE NEURO/TARDE
Heloísa e os outros alunos se encontram na enfermaria para visitar Goram que se recupera do atropelamento. Rita termina de avaliar a escala de coma de Glasgow.
RITA – Abertura ocular espontânea. Orientado quanto a resposta verbal. Obedece a comandos quanto a resposta motora. 14 pontos. Está perfeitamente bem.
Goram sorri para ela. Heloísa puxa assunto.
HELOÍSA – Ele poderá ter alta ainda hoje?
RITA – Vou deixa-lo em observação ainda esta noite, mas amanhã de acordo com o resultado da tomografia e sem sinais clínicos, poderá sim.
GORAM – Égua! Não sabia que vocês estavam planejando me tesá. Meu braço na Tipoia, com certeza, não seria como eu jemotará que me vissem.
RITA – Vaidoso…
GUTO – A gente não liga não, irmão, ficamos preocupados porque você não foi a aula e sentimos falta do crânio da sala.
FABIANA – Com certeza, mas a Heloísa respondeu por você, manjava tudo na aula de neuroanato.
E a jovem corou. Guto e Fabiana trocaram olhares.
SUZY – Lacrou mesmo.
GORAM – Ani, vocês já tiveram neuroanato? Goram não queria ter perdido, é uma matéria que anseio muito em ter na faculdade.
RITA (entusiasmada) – Pensa em se especializar em que área, querido, não vai me dizer que neuro também?
Ele acena positivo. Ela vibra. Heloísa se incomoda um pouco.
ANDRÉ – Vai ser um excelente neuro, igual a Doutora Rita!
RITA – Que isso, sou tudo isso não.
ANDRÉ – Não é o que falam pela facul, você tem uma linda fama.
GORAM – Égua! Nossa gente, mas estamos falando tanto de mona, vamos falar de situações mais leves, não conheço quase nada de pee, que time vocês torcem?
Rita recebe uma ligação da recepção. Instrumental de suspense.
RITA – Heloísa, seu irmão está lá fora do hospital, ele precisa falar com você.
HELOÍSA – Meu irmão? Quer falar comigo? Pera aí, gente dá licença.
Goram se surpreende com a saída repentina dela.
EXTERIOR DO HOSPITAL ORLANDO MOÇA
HELOÍSA – Que surpresa boa! Tá tudo bem? Do jeito que a recepcionista falou, parecia que estava acontecendo alguma coisa. Agora que vi a mensagem no seu celular.
BERNARDO – Aconteceu sim, vou precisar muito da sua ajuda.
CLOSE ALTERNADO. FACE DELE NECESSITADO. FACE DELA PREOCUPADA.
CENA 07/SÃO PAULO/MINHOCÃO/EDIFÍCIO MARIAN/APARTAMENTO 74/ TARDE
Guilherme abriu a porta para Cacau.
CACAU – Você me deixou preocupada em não querer adiantar o assunto pelo telefone.
GUILHERME – Eu prefiro dizer essas coisas, pessoalmente, Cacau. Voltei depois de anos no Paraguai, os negócios não deram certo por lá.
CACAU – Você também vendia bicho exótico!
GUILHERME – Isso não vem ao caso, eu não te contei toda a verdade quando nos encontramos nestes dias, mas o motivo de querer fazer as pazes com o passado, não é apenas porque me arrependi de tudo que fiz a você e o quanto ausente fui quanto pai para Fabiana, mas porque tenho pouco tempo de vida!
CLOSE-UP em Cacau. Instrumental explosivo.
CACAU – O Quê?
GUILHERME – Eu tenho câncer de cabeça de pâncreas.
CORTAR PARA:
CENA 08/SÃO PAULO/IMAGENS AÉREAS/NOITE
Imagens de carros na rodovia. Avenida Paulista de Noite. Praça Roosevelt. Holofotes em Prédios. Baterias de escola de Samba treinando nos clubes. Anoitece.
CENA 09/SÃO PAULO/TATUAPÉ/HOSPITAL ORLANDO MOÇA/ORTOPEDIA/NOITE
Suzy estranha Heloísa não ter respondido sua mensagem. PREOCUPADA.
SARA – Suzy! Você prestou atenção no que eu falei?
SUZY – Não professora, me desculpa, tava pensando na saída repentina da minha amiga. Mas agora, voltei.
SARA – Tudo bem, mas fica aqui comigo. Então o resultado do coprocultura apontou o quê?
ALUNA 1 – Estranhamente Salmonella enteridis.
ALUNO 2 – Isso casa com a tetraciclina ministrada contra a sepse.
SARA – Bingo! O que uma maionese caseira não pode causar?
ALUNO 1 – Na história clínica do paciente, na alimentação ele admitiu que comia muito fast-food em trailers perto de casa. Poderia ter se infectado num deles.
SARA – Perfeito.
ALUNA 1 – Mas algo me intriga… e a hiperceratose? Não há nenhum achado na fisiopatologia da doença que encaminhasse para isso.
SARA – E então, como vamos ligar ao fato? Suzy? Você quer falar.
SUZY – Oi gente, tudo bem? Professora Rita já foi e nem avisou, mas eu sou do primeiro semestre, então não sei de muita coisa, por favor não riem de mim, mas eu pesquisei a hiperceratose, apareceu algumas doenças autoimunes que nem sei pronunciar o nome.
ALUNO 1 – Ele teve também osteoporose.
SARA – Enquanto Suzy cita alguns nomes, vou projetar aqui na tela, um detalhe importante que deixaram de perceber.
SUZY – Ceratodermia palmoplantar, Síndrome de Papillon-Levefré, Unna-Thost,…
SARA- Suzy, temos um doença rara e reumatóide.
Ela sorriu.
ALUNA 1 – Como assim?
SARA – Vocês se esqueceram de um detalhe muito importante. Alguém fez exame da conjuntiva ocular do paciente?
Eles negaram.
ALUNO 2 – Acho que não, professora.
SARA – Pois comparando a foto dele anteriormente com uma pessoa hígida, o que temos na imagem?
Instrumental explosivo.
ALUNA 1 – Meu Deus! Está inflamada. Como não vimos isso?
SARA – O paciente tem uma doença rara, o que comprovamos no de teste de histocompatibilidade antigênica para B-27.
ALUNO 1 – Mas B-27 não é MHC de classe 1? Então foi uma infecção viral que promoveu essa resposta?
SARA – Todas as células nucleadas possuem MHC Classe 1. Ele foi infectado pela Salmonella, provocando a uma resposta imunológica descontrolada por ele ter essa predisposição genética, levando a hiperceratose, a psoríase, osteoporose e a inflamação da conjuntiva.
ALUNA 2 – Ual! Que caso top!
SUZY – Mas afinal qual o nome da doença rara que ele tem?
SARA(Riu)- Ele tem Síndrome de Reiter!Atualmente chamada de artrite reativa.
CLOSE ALTERNADO NO ROSTO DOS ESTUDANTES. FECHAR EM SUZY.
CENA 10/SÃO PAULO/TATUAPÉ/HOSPITAL ORLANDO MOÇA/ESTACIONAMENTO/NOITE
Rita está encaminhando para seu carro quando três caras mascarados a abordam.
HOMEM 1 – TU É TRAVECO?
Rita olhou assustada.
HOMEM 2 – Responde, a Doutora tem um pau no meio das pernas?
RITA – ME deixe em paz, o que isso? Me larguem!
Eles a jogam no chão.
HOMEM 1 – Sabe o que a gente faz com traveco, a gente bate, bate muito, porque vocês pensam que são mulher e estragam nossas famílias
Rita começa a gritar desesperada, eles a espancam furiosamente.
CORTAR PARA:
CENA 11/SÃO PAULO/JD AMÉRICA/MANSÃO DOS MOÇA/SALA DE ESTAR/NOITE
Foco na BIG-CLOSE-UP mão de Mateus com um copo de Whisky na mão. O resto desembaça com o tintilar da campainha.
MATEUS – CATARINA! O PORTÃO!
Ela chega apressada.
CATARINA – Já estou indo, seu Mateus.
Ela some pela porta da frente, deixando-a entreaberta.
CAM SUBJETIVA. Mostrar alguém caminhando para o interior da mansão. Na escada, Mateus desce com Bernardo com uma face surpresa.
MATEUS – E então, xeque-mate nos pombinhos? Você não vai me apresentar a sua amante, amor?
Bernardo segura o riso. Close em Mateus satisfeito. Fechar na pessoa que chegou encenando a amante, era ninguém menos que Heloísa bem vestida.
FADE OUT
CONTINUA…