Tudo era escuridão. O único som que chegava aos ouvidos de Jade era o ronco do motor de um carro. Parecia ser de um caminhão.

Jade abriu a boca em um O pequeno. Sentiu um pano úmido encostar em seus lábios, e pelas frestas do pano, notou lampejos de luz dentro do ambiente em que estava. Alguém segurou o pano e o puxou de sua cabeça. Ela deu um pequeno grito assustada.

Um homem estava sentado diante dela. Ela percebeu que estava na carroceria de um caminhão grande, e uma lona vermelha cobria a carroceria por completo, tornando o lugar um pequeno forno. O homem segurava um violão antigo. Tinha um rosto quadrado, barba por fazer e olhar sedutor. Parecia ser mexicano, com nariz e queixo longos.

– Onde eles estão? – ela perguntou, enchendo os olhos de lágrimas. – Onde está o meu bebê?

– Não sei de nada, senhora – ele disse, com um tom de voz grave e relaxado.

– Me solta, por favor, nós podemos resolver tudo sem violência.

– Só tô obedecendo ordens, e a senhora não deve se mexer muito – ele falou, olhando para a barriga dela.

Jade estava algemada, mas assim que ele disse aquilo, ela tocou em seu abdômen. Fez careta de dor.

 

– Meu Deus, por que vocês estão fazendo isso com a gente? Foi por causa daquele homem que invadiu meu apartamento? Foi por causa dele? Me diz alguma coi… ahhh – ela parou, segurando a barriga e fazendo ainda mais careta.

– Te disse pra não se mexer muito.

Ele se aproximou e levantou a camiseta dela. Um hematoma roxo cobria toda a região abdominal. Os punhos também estavam enfaixados.

– Você não pode fazer pressão no abdômen.

– Você é o quê? Médico? – ela perguntou, com os dentes cerrados.

– Sou sim. – disse se afastando novamente, e voltando para o banco do outro lado. – Fica quietinha e você vai ficar boa. Assim que chegarmos vou te dar uns analgésicos.

Ela encostou a cabeça em uma barra de metal e chorou. Precisava saber como seu filho e marido estavam.

 

EPISÓDIO: CONFIANÇA

 

A estrada de terra estava deserta. O chão vermelho brilhava com pequenos grãos de urucum. O cheiro do mato inundava a paisagem que levara chuva da ultima noite. Tudo estava verdinho.

Em uma curva fechada, sons de passos trôpegos foram ouvidos. Um homem claudicante tentava manter-se de pé, enquanto caminhava segurando-se em um pedaço de galho.

Lucas estava em péssimo estado. Um ferimento no ombro e outro na mão. Ele havia perdido muito sangue.

Continuou andando enquanto o sol da manhã começava a lhe queimar a fronte. Ele fazia caretas de dor, caminhando sobre a terra batida.

Se aproximou de um barranco que levava a um riacho. Tentou descer o barranco em busca de um pouco de água, mas seu pé derrapou na lama e ele despencou lá de cima.

 

Rolou pelo barranco como um barril solto e na queda, bateu com a cabeça em uma rocha. No mesmo instante desmaiou. Somente o som da água passando pelas costas de Lucas, podia ser ouvido, o resto era silêncio.

**

Aquela era uma manhã estranha. O céu antes brilhante se apagou e se encheu de nuvens negras e mal encaradas. Dentro do caminhão, Jade percebeu que a luz do sol fora interrompida pelas negras nuvens. Ela tentava respirar normalmente, mas aquela mordaça em sua boca tirava-lhe o fôlego. Além de parte do seu rosto que parecia estar destroçado.

Naquele momento, o caminhão havia parado e o médico tinha descido. Foi ele mesmo quem amordaçou ela. Sem saber o que estava acontecendo, ela tentou enxergar o exterior através de alguns buraquinhos que tinha na lona. Com alguma dificuldade, conseguiu ver o suposto médico conversando com uma senhora de cabelos brancos e de aspecto cansado. Olhando ele assim, de pé, Jade percebeu como ele era alto e atlético. Poderia muito bem ser um jogador de vôlei ou de basquete, quem sabe?

Jade viu quando ele retirou um equipamento para aferir a pressão. Depois enrolou uma faixa no pulso da senhora, e aguardou o resultado por uma tela digital. Ele parecia tão calmo, e a senhora preocupada. Depois, ele pegou um estetoscópio e ouviu o coração da mulher.

 

Ela não parava de apontar para a cabeça, depois para as pernas, e também para a coluna. No mínimo, estava contando aonde sentia dor. Coisa de anciã.

A consulta somente terminou quando uma chuva pesada começou a cair. As gotas faziam um barulho ensurdecedor batendo na lataria do caminhão. Era decerto, uma chuva bem pesada.

Foi com essa visão do médico conversando com a senhora e da chuva caindo insistente sobre a terra, que Jade lembrou de um dia quando ainda estava grávida de Cícero.

Antes de se mudarem para um apartamento na beira da praia. Jade e Lucas moravam em uma casa localizada em um bairro nobre de Recife. Naquele inverno, as chuvas caiam constantes, e o trânsito sempre engarrafava.

Naquela noite em especial, o céu sombrio brigava com raios e trovões. Dentro da casa, Jade estava sozinha, pois Lucas estava preso no engarrafamento.

Ela estava com nove meses completos. A criança iria nascer a qualquer momento, e ela detestava ficar sozinha em casa.

Após a quarta ligação, Lucas atendeu preocupado.

– Oi meu amor. O sinal está oscilando, não consigo te ouvir direito – ele disse, enquanto tirava o embaçado do para-brisa.

– Lucas, vem logo pra casa. Eu tô com medo – Jade falou, observando pela janela, como o vento raivoso castigava as árvores.

– Fica tranquila minha tapiocazinha. Eu chego já já.

Jade desligou, e correu para o quarto. Trancou a porta e se escondeu embaixo das cobertas.

– Vamo ficar guardadinhos aqui, tá bom coisa linda? – Jade falou em direção à sua barriga.

E assim, ela continuou, até que Lucas chegou em casa. Ele a encontrou dormindo um sono profundo. Não quis acordá-la, mas ao levantar-se da cama, Jade abriu os olhos e lhe deu um sorriso brilhante.

 

– Me abraça – ela pediu dengosa.

– Tá tudo bem agora – ele disse, abraçando e alisando a barriga dela.

Os dois dormiram agarradinhos àquela noite.

**

Lucas acordou em um quarto branco. Quis se levantar, mas sentiu muita dor nas costelas e na cabeça. Voltou a deitar-se. Observou o ambiente simples. Um teto de telhas, uma mesinha de madeira rústica de cor azul e nada mais. No canto da parede perto do caibro, havia uma casa de aranha. Ele viu quando uma mosca caiu na teia e se estrebuchava para se livrar.

Uma jovem entrou no quarto. Era morena com tranças que caiam nos ombros. Tinha um rosto redondo e olhar angelical. O mais interessante era a forma como andava, como se não tocasse o chão. Ou como se bailasse enquanto se movimentava.

– Tudo bem com você? – ela perguntou, com uma voz baixinha, mas muito firme.

– Onde que eu tô?

– Sítio dos Sonhos – ela respondeu, mexendo em alguns remédios que havia em cima da mesinha.

Lucas estava estranho. Não conseguia pensar direito. Não sabia o que estava fazendo ali, ou como chegara ali.

– Eu… eu… espera, não sei o que…Como cheguei aqui?

– Te encontrei desmaiado no riacho. Você tava sangrando muito. Tinha um machucado bem aqui no seu ombro. E um corte na testa.

– Tá…e… espera…Quem é você? A gente já se conhece?

– Eu sou Eva. E a gente nunca se conheceu não.

– Eu, não consigo lembrar como vim para aqui! Não sei… como eu… – ele respirava com dificuldade, suas mãos tremiam e peito subia e descia acelerado. – Quem sou eu? – ele perguntou assustado.

– Você não lembra de nada?

– Eu… não, eu não lembro de nada! Meu Deus!

Lucas ficou desolado. Ele havia perdido a memória.

 

**

MEMÓRIAS DE JADE

O Hospital Português, em Recife, era considerado um dos melhores hospitais da região Nordeste. E foi para lá que Jade foi levada, em trabalho de parto.

Ela entrou no quarto, deitada em uma maca, pronta para parir. Lucas veio logo atrás, filmando tudo com sua câmera. Através da tela, ele observava emocionado, sua esposa ofegante e com a testa suada. Ela tentava, mas mesmo em agonia, continuava linda.

O médico entrou na sala e foi logo pondo as luvas e uma touca. Ao notar que a presença do médico, Jade deu um pulo e logo questionou.

– Cadê a doutora Karine? – Jade perguntou, engolindo a saliva.

– Infelizmente, a doutora Karine não fará seu parto, senhora Jade. Eu fui designado de ultima hora – ele disse com uma voz grave que passava segurança.

– Por favor, chama minha médica. Eu não posso fazer isso sem ela. Nós estamos nisso desde o começo – Jade, disse tentando manter a calma.

– Infelizmente, a doutora Karine sofreu um acidente. Eu irei fazer seu parto.

Jade quis correr dali, mas se fizesse isso, aquele médico estranho iria lhe pegar pela cintura e lhe arremessar na cama como uma bola de basquete. Isso não seria difícil para ele, pois altura ele tinha, pensou Jade.

– Não, não, você não vai fazer isso. Minha médica, só ela sabe tudo.

– Eu estou a par de tudo também.

– Calma meu amor – Lucas disse para a esposa, tentando acalmá-la.

– Você não sabe de nada. Você não sabe tudo o que eu passei pra ter esse filho. Por favor, eu não posso por a vida do meu filho em risco.

– Você e seu filho estão em ótimas mãos. Fica tranquila, pois seu estresse não vai auxiliar. – disse o médico.

– Meu Deus – ela derramava lágrimas.

– Olha, você precisa confiar em mim Jade. Eu já fiz mais de quinhentos partos na carreira. Eu tenho experiência como nenhum médico aqui tem. Eu sou qualificado o suficiente pra colocar o seu filho no mundo com segurança. Eu só peço isso: confia em mim, você consegue fazer isso – ele disse, segurando a mão de Jade e olhando profundamente em seus olhos.

Ela exitou, mas disse: -Tá! Só traz o meu filho com saúde, por favor – ela disse chorando.

– Vai ficar tudo bem, Jade. Eu prometo.

Ela balançou a cabeça para trás e segurou mais forte a mão de Lucas.

 

**

Dentro do caminhão, a estrada em que eles estavam parecia esburacada. Jade remexia de um lado para o outro como um relógio de pêndulo. Mais uma parada, e o médico com altura de jogador de vôlei, com pinta de cantor mexicano, desceu mais uma vez.

Dessa vez não demorou muito. Ele subiu em seguida com dois picolés na mão. Retirou a mordaça de Jade e entregou um picolé pra ela.

– Picolé de manga. O melhor de todos. – ele disse dando uma mordida gigante, que quase destruiu todo o picolé.

Jade ficou segurando aquilo por um bom tempo, até que retirou a embalagem e começou a lamber o picolé.

– Já que você não sabe onde está o meu filho e o meu marido, posso saber pra onde estamos indo? – ela perguntou inofensiva.

– Se você não quiser, eu quero – ele apontou para o picolé.

Ela entregou pra ele.

– Olha, eu não sei. Na verdade, eu sei mais ou menos. Mas, de qualquer forma, não posso te contar.

Ela olhou intrigada pra ele. “O que um cara como ele estava fazendo metido nessa confusão toda?”, pensou.

– Eu não vou te fazer nenhum mau tá! Na verdade eu só quero que você fique bem.

Ele se esticou para jogar as embalagens do picolé fora, e Jade notou o cabo de uma arma escondida na cintura dele.

– Por que você deixou presa? – ela perguntou baixinho.

– Oi? O que você disse? Não te escutei?

– Se você quer que eu fique bem, por que está fazendo isso, comigo e com a minha família?

– Eu sou médico. Só quero seu bem estar.

– Eu não tô nada bem. Meu abdômen doi pra caramba.

– Deixa eu dar uma olhada – ele se aproximou e levantou a blusa de Jade. – Isso tá ficando ruim – tocando na pele roxa.

Ele deu as costas para Jade, para pegar sua maleta. Ela aproveitou aquela distração e pulando em cima dele, passou as algemas por cima de sua cabeça e começou a enforca-lo com as correntes.

Ele caiu por cima de Jade, e ela apertava o pescoço do homem com toda força do mundo. Ele lutava tentando dar cotoveladas nela, até que parou, tentando pegar a arma.

Jade apertou ainda mais o pescoço do homem, que já começava a ficar com a pele vermelhar. Jade podia sentir, o sangue do homem preso, prestes a explodir dentro da cabeça, mas ela não podia parar. Tinha que acabar com aquilo, agora que havia começado.

 

O homem se jogava de um lado para o outro, pedindo socorro. Ele tentava segurar o braço de Jade, mas não tinha mais, força. Seus olhos estavam vermelhos e em seguida, começaram a chorar gotas de sangue. O sangue preso, explodiu, e o homem morreu estrangulado nas mãos de Jade.

Ela estava caída e quando percebeu que havia matado o homem, se afastou com medo. Pânico e horror passavam diante dela. “Como pode fazer isso?”, ela se perguntava.

O caminhão parou. Jade ouviu quando a porta se abriu e quando passos se aproximaram da porta da carroceria. Ele não pensou duas vezes. Sacou a arma do médico, destravou e apontou a porta.

Quando o homem abriu a porta, Jade disparou em sua testa. Um tiro certeiro e homem caiu duro no chão de terra.

Jade segurava a pistola com firmeza aguardando mais alguém. Não escutou mais nada. Somente sua respiração ofegante, e o canto dos grilos lá fora.

 

INCOGNOSCÍVEL

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  • Agora a p*#@ ficou séria !!! Lucas perdeu a memória e Jade meteu o louco em todo mundo. Caracas, a bicha tá ficando fodaaaa!!!

  • Agora a p*#@ ficou séria !!! Lucas perdeu a memória e Jade meteu o louco em todo mundo. Caracas, a bicha tá ficando fodaaaa!!!

  • Jade é demaiss. Torço por ela em todos os momentos. A coisa tá ficando complicada, estou adorando. Colocando em dia minha leitura de Incognoscível. Obrigado por proporcionar esta experiência!

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