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O Diário de Lucca: Capítulo 12 – O Diário de Arthur

Enquanto Lucca estava com seus problemas de namoro escondido e sexualidade presa no armário para os familiares, Arthur passava por alguns problemas também, afinal quando a vida de um caminha a do outro não para. Desde quando entrou no ensino médio, primeiro que Lucca, o rapaz estava passando por alguns momentos de turbulências sentimentais e isso influenciava diretamente a sua vida pessoal.

Mesmo que não demonstrasse muito e, de vez em quando, deixasse Lucca em dúvida várias vezes sobre a sua amizade, Arthur tinha um apresso muito grande pelo seu melhor amigo e gostava muito de ter sua companhia no dia-a-dia. Com o namoro as escondidas de Lucca e seus encontros com Dario na universidade federal, os dois estavam se vendo pessoalmente cada vez menos, mas continuavam conversando quase todos os dias via WhatsApp.

Vamos voltar para o dia em que Lucca mentiu para os seus pais que estaria na casa de Arthur, entretanto foi para o campus da universidade federal passar à tarde com Dario. — A tarde estava passando tranquila, lá fora um sol forte brilhava no céu azulado e livre de nuvens, mas as temperaturas se encontravam baixas como sempre acontecia em toda época de inverno no estado e Arthur trancado em seu quarto jogando videogame.

Em um certo momento o rapaz ouviu seu cão latir e alguém batendo palmas em frente a sua casa, pausou o game que jogava e quando se preparava para sair do seu quarto e ir lá fora ver de quem se tratava percebeu pelo seu reflexo do espelho que não estavam com as roupas certas para sair de casa. Vestiu suas calças e um blusão. Quando chegou ao portão da frente viu que se tratava da mãe de Lucca, sentiu seu sangue correr mais rápido pela sua corrente sanguínea.

— Oi, Arthur. — disse Julieta sorrindo e tremendo de frio. — Pode, for favor, chamar o Lucca para ir ao supermercado comigo?

— O Lucca?

— Sim, o Lucca… Ele disse que ia vir aqui. — depois de alguns segundos em silêncio a ficha da mãe caiu. — Para onde o Lucca foi, Arthur?

— Ahm… Ele foi se encontrar com alguns amigos no campus da universidade federal.

— Que amigos?

Julieta perguntou cruzando seus braços.

O adolescente começou a procurar no fundo da sua mente uma desculpa que soasse convincente aos ouvidos da mais velha, mas tudo lhe escapava ou não lhe parecia certo dizer algumas das coisas que passaram pelos seus pensamentos. Quando Arthur abriu a boca saiu a seguinte frase:

— Ele foi se encontrar com um rapaz, um amigo nosso, mas eu acho que isso é um assunto que tem que ser resolvido entre vocês.

Julieta ficou em silêncio, seus olhos ganharam um ar calmo e isso deixou o jovem mais aliviado. Será que falou a coisa certa?

— Tudo bem. Quando ele chegar em casa, vou conversar com ele.

A mulher deu as costas e se afastou do portão, pegando o caminho para o supermercado. Quando Julieta virou a esquina, Arthur correu de volta para o seu quarto e pegou seu aparelho celular, enviou uma mensagem a Lucca.

— Espero que dê tudo certo… — sussurrou.

Ele só voltaria a falar com o amigo cara a cara na semana seguinte, o final de semana passou todo na casa de sua namorada Letícia, depois que conheceu os pais dela formalmente as coisas entre os dois se tornaram mais calma, um namoro do cotidiano. Como já foi dito anteriormente nessa história, Letícia é uma grande fã de mangás e animações japonesas que buscam contar histórias extremamente românticas entre indivíduos do sexo masculino, como se fosse uma pornografia sentimental para garotas japonesas. Esse gênero em especifico é geralmente escrito por mulheres para mulheres.

— Eu não quero ver isso. — disse Arthur para a namorada que havia voltado para o quarto.

— Por que não? Vai por mim Arthur, você vai gostar. A história é boa. Você assiste anime shoujo que tem romance. É basicamente a mesma coisa, mas com dois homens. — Letícia disse enquanto se sentava ao lado do namorado com uma bacia de pipoca. — Eu prometo que você vai gostar, tudo bem?

— Vai ter cena de sexo?

— Explicito não.

Arthur suspirou e em seguida respondeu, já se arrependendo:

— Tudo bem, dá play aí e vamos assistir.

Sorrindo de felicidade, Letícia deu um selinho em Arthur que correspondeu com outro. A garota deu play no vídeo e o episódio do anime começou, muito rosa e dramático já nos primeiros minutos de arte. Em um dado momento o olhar de Arthur se virou para a sua namorada, a beleza de Letícia enchia seus olhos. Alguns dias atrás, nem o adolescente sabe dizer exatamente quando começou, mas estava se sentindo não merecedor de ter uma namorada como Letícia.

Não era só pela a beleza da jovem moça, mas também o seu temperamento, sua personalidade, completamente opostas ao que Arthur estava sentindo nos últimos dias. Não se achava merecedor do amor da garota, sentia uma raiva dentro de si mesmo que estava ficando difícil de controlar e só se tornava calmo quando estava ao lado da namorada. Tinha medo de que em algum momento fosse explodir, sabia que isso iria acontecer em algum momento, mas não sabia como. Não queria que fosse na frente de Letícia.

Em sua casa a relação com seus pais estava desgastada. Sentia raiva de ambos, não sabia explicar os seus motivos, mas havia momentos em que queria partir para agressão física e se controlava muito para não fazer. Tinha dias que também queria socar Lucca, principalmente quando o amigo passava mais tempo no chat falando sobre Dario do que qualquer outro assunto que tinham em comum antigamente. Tinha se arrependido de ter os apresentados, porém, ao mesmo tempo sentia culpado por pensar assim.

— Está gostando? — perguntou Letícia enquanto o episódio quatro estava na abertura.

— Sim… É diferente de tudo que já vi, mas legal. — sorriu Arthur.

A garota deixou o seu notebook de lado e em seguida depositou um beijo nos lábios do namorado, seus lábios deixaram os de Arthur ainda mais vermelhos. As mãos do rapaz foram até a cintura de Letícia, onde seguraram com firmeza enquanto o mesmo seguia com o beijo, sua língua brincava com a da sua namorada. O gosto doce dela deixava seu corpo mais acesso. Aos poucos se colocaram deitados na cama, com Arthur por cima.

Na segunda-feira Arthur se encontrou com Lucca durante a tarde em sua casa. Os dois estavam jogando videogame quando o assunto do encontro de Lucca com Dario e Julieta ter descoberto a mentira surgiu pela a boca de Arthur. O adolescente pediu desculpas para o amigo se havia o metido em alguma confusão com os pais, mas Lucca respondeu deixando claro que ele não precisaria se preocupar com aquele acontecimento que não havia sido sua culpa.

— Eu acho que vou contar para a minha mãe que sou gay. — disse Lucca olhando fixamente para a televisão.

— É sério isso? — perguntou Arthur pego de surpresa e continuando com o assunto.

— Sim. Eu não quero mentir para os meus pais para poder me encontrar com o Dario, sabe? Então primeiro eu vou sair do armário para eles e depois de um mês, se estiver tudo bem, contar que tenho um namorado. — sorriu Lucca ao terminar de falar.

Ficou com vontade de falar a verdade, a verdade em seu ponto de vista, não gostava quando Lucca era tão… Tão otimista assim. Com certeza seus pais não o aceitariam tão fácil como ele estava pensando e seu namoro com Dario continuaria as escondidas por muitos anos, isso se durasse muitos anos. Por que ser tão feliz? Por que achar que o que ele tem com Dario iria durar tanto assim? Sentiu seu sangue ferver e quando levava seu olhar em direção a Lucca a sua vontade de depositar um soco em sua face aumentava cada vez mais. Não sabia se iria conseguir se segurar.

— Você pode ir embora? — disse Arthur largando o controle de lado.

— Ir embora? — perguntou Lucca confuso e surpreso.

— Sim. Eu… Eu to um pouco casando, tudo bem? Só quero ir descansar um pouco. — disse Arthur tentando sorrir, mas no final o que fez foi morder o lábio inferior.

— Tudo bem.

Lucca deixou o controle de lado, levantou da cadeira e acenou para o amigo com um sorriso simpático e deixou o quarto. Então, a Arthur levanta rapidamente e tranca a porta do seu quarto e fecha a janela, senta em sua cama e fica observando a única luz no cômodo, a televisão. O que estava acontecendo com ele? O que era essa raiva que crescia de repente dentro dele e queimava como um incêndio descontrolado.

— Você está bem, Arthur? — perguntou Letícia observando o namorado.

O rapaz, antes de responder parou para pensar, já havia se esquecido do que estavam conversando, já tinha alguns dias que a sua memória estava assim. Em algumas situações se esquecia rapidamente do que foi dito, do que iria fazer ou do que estava fazendo. Letícia esperava ansiosa a resposta do namorado. Arthur olhou ao redor, estavam na praça dos bombeiros, conhecida por esse nome por ficar perto do Corpo de Bombeiros. Tinha muitas pessoas usando roupas com temática de anime, toucas e perucas, era um dos encontros do grupo de anime.

— Sim. Eu to. — respondeu Arthur e em seguida sorriu.

— É que você ficou em silêncio, de repente. Fiquei preocupada. — explicou a namorada. Ela segura a mão do adolescente com firmeza. — Está tudo bem mesmo? Já tem uns dias que você anda meio estranho, não é verdade? A gente pode ir embora se você quiser.

— Não, que isso. Tá tudo bem… E o Lucca? Para onde ele foi? — perguntou procurando o amigo pelos cantos da praça.

— Foi embora quando começou a escurecer. — respondeu Letícia com olhar de curiosidade sobre o namorado.

— Ah sim. — Arthur respondeu rindo.

— Acho melhor a gente ir indo, não acha? Amanhã eu e você temos aula…

— Tem razão. Vou ligar para o meu pai. — respondeu o rapaz enquanto tirava seu aparelho celular do bolso.

Os dias foram se passando e conforme isso acontecia os demais conseguiam notar cada vez mais mudanças, às vezes, sutis no comportamento de Arthur durante algum ciclo de dias. O rapaz não notava, mas sabia que havia noites em que ele não conseguia dormir porque uma euforia enchia seu corpo. Para não ficar com a cabeça desocupada durante as noites sem sono, Arthur as passava assistindo animes ou, então, na frente do seu videogame tentando terminar algum dos seus jogos que estavam guardados a tempos. Porém, ainda tinham madrugadas que além de não conseguir dormir, o jovem não conseguia se concentrar em nada que se propunha a fazer.

Em outros ciclos de dia, Arthur ficava com o corpo exausto e a mente, não conseguia ficar acordado por muito tempo durante a manhã mesmo que sempre fosse para a cama por volta das seis horas da tarde por causa do seu cansaço exaustivo. Uma coisa que não se alterava durante esses períodos de muito sono e muito cansaço era o apetite de Arthur, sempre estava alto e isso começava a influenciar no seu peso. Começou a ter uma imagem diferente de si mesmo quando encontrava seu reflexo do espelho, não tinha mais a admiração que tinha antes pelo seu corpo, estava com raiva… Não só da sua condição física, geralmente tinha raiva de tudo e de todo mundo.

Letícia e Lucca conseguiam ficar perto dele, por enquanto. Se perguntava por quanto tempo a namorada e o melhor amigo conseguiriam ficar ao lado dele. A essa altura do seu problema psicológico, Arthur já tinha deixado de ter contato com seus amigos de sala de aula, havia brigado com eles e tinha sido expulso da escola. Estava estudando durante a noite em outra instituição no centro da cidade, mas ainda pública.

— Eu acho que não dá mais. — disse o adolescente não conseguindo encarar sua namorada nos olhos.

— O que você está falando, Arthur? — perguntou Letícia.

— Eu não estou bem, sabe? Já tem um tempo que isso acontece e eu sei que você também percebe… Olha, Letícia… Eu não quero machucar você e eu sinto que em algum momento vou fazer isso, então… Então é melhor a gente dar um tempo… É melhor a gente terminar.

Arthur sentia vontade de chorar, mas as lágrimas não vinham de forma alguma.

— Tem certeza?

— Vai ser melhor para nós dois.

Quando Arthur finalmente olhou para a sua namorada a encontrou com os olhos vermelhos e as lágrimas saindo uma por uma. Sentiu um peso em seu peito, pensou em voltar atrás e continuar com ela, mas sabia que o seu pavio estava terminando e em algum momento iria explodir. Não queria machucar a garota por quem era apaixonado.

— Tudo bem… — Letícia tentou sorrir e limpou suas lágrimas. Levantou do banco em que estava sentada, sorriu para Arthur e se afastou caminhando de vagar. Ela queria olhar para trás, mas não o fez.

O pavio de Arthur estourou de verdade em uma noite na sua cassa. Lucca estava presente assim como outro amigo dele. Tudo aconteceu tão rápido que a memória do adolescente não conseguia juntar as peças para formar uma lembrança nítida, porém, Arthur se lembrava que estava em seu quarto quando, de repente, sua raiva explodiu como um vulcão e faltou pouco para que conseguisse agredir sua mãe. Não conseguiu porque a mulher havia conseguido se defender com o seu braço.

Naquela noite Arthur não gostou do que poderia ter feito com a sua mãe, sentia como se uma luz havia se acendido na sua mente, um sinal… Um aviso, soando em cores vermelhas intensas avisando que ele deveria procurar por algum tipo de ajuda profissional para o que ele estava passando. No dia seguinte foi, ao lado de sua mãe, ir atrás de uma psicóloga no SUS.

Os dois foram para o Centro de Saúde do bairro, onde solicitaram atendimento a um psicólogo e a atendente do centro agendou um horário para Arthur em um CAPSi, centro destinado a atender crianças e adolescentes para o dia seguinte. Arthur ficou um pouco aliviado ao notar que poderia existir para ele uma luz no final daquele túnel, havia sido um ano difícil para ele, porém ainda havia um pouco de esperança no final das contas. Se afastou dos seus amigos, principalmente de Lucca, queria retomar sua antiga amizade. Acreditava que uma amizade de longa data como a deles não deveria acabar assim.

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