Uma Oferta, Você Recusa? | Final de Temporada

ATO DE ABERTURA

NILO
(V.O)
Eu me sentia vencido. Um homem de ferro dopado pela minha própria vaidade,
prestes a atravessar os limites da escuridão até o local d
e origem de todo esse mal.

SIRENES de polícia e ambulância.

FADE IN

CENA 1 EXT. – RUAS DA CIDADE – DIA

As SIRENES se misturam ao caos deixado pelos traficantes na noite anterior. TAKES diversos apontam para a banca de jornal, com as manchetes:

– “Nilo Rodrigues declara guerra aos traficantes”;

– “Nilo mata um dos traficantes procurados pela polícia, e povo ovaciona”;

– “Jornalista da Carioca News causa tumulto no centro da cidade, e povo já pede boicote ao filme em sua homenagem”;

– “Jack Freitas lançará Anti-Herói sem pré-estreia no mesmo dia que a sua inspiração está envolvida com o tráfico”.

CAM vai direto nos ambulantes, arrumando as barracas; carros de polícia rondando algumas áreas; fachada da NOVO DIA.

CENA 2 INT. – REDAÇÃO NOVO DIA / SALA DE REDAÇÃO – DIA

Agitação no local. Redatores trabalhando, telefone TOCANDO, SOM e teclas a mil.

THALES
(O.S) Eu podia ter morrido e a essa hora tá estampando este jornal!

CENA 3 INT. – REDAÇÃO NOVO DIA / ESCRITÓRIO – DIA

Thales nervosão, como sempre. Amora em pé, fazendo-se de indignada.

AMORA
Você foi assaltado? Apanhou? (se aproxima e tateia seu corpo)
Deixa eu vê aqui se você se machucou.

Thales se esquiva, ríspido.

AMORA
Não foi assaltado, não se arranhou. (volta para a mesa, senta)
Tá vivinho da silva pra comemorar comigo essa manchete
gloriosa no dia do lançamento daquele filme.

THALES
Você tem ideia de como tá o meu emocional, tem?

AMORA
Não, Thales, não tenho ideia. Aqui a sua vida pessoal e o seu emocional
não podem comprometer o trabalho. Você já devia saber disso.
Agora vá atrás do Murilo e da Paulinha. Preciso deles na coletiva de imprensa.

Em Thales, engolindo a raiva.

= = CORTE DESCONTÍNUO = =

Thales sai resmungando, ora com as mãos na cintura, ora esfrega a mão no rosto.

THALES
(resmunga) Filha da puta! Por isso que o Brasil não vai pra frente.

Alguns colegas observam.

THALES
(bate palmas)
Que é? Bora trabalhar! Bora!

CENA 4 INT. – REDAÇÃO CARIOCA NEWS / SALA DE REDAÇÃO – DIA

A agitação é a mesma da redação anterior.

CORTA rapidamente para a COPA

Murilo não sabe de que lado fica, mantém as mãos na cintura, todo estressado. Lila ENTRA nervosa e dispõe um laptop sobre a mesa.

ROGER
E o Nilo? Ele tá sumido há mais de 12 horas!

LILA
Ele não tá nos hospitais nem no IML. A minha cisma é de que ele
esteja em Valquíria.

MURILO
E vamos ficar aqui? Isso é coisa daquela Moni Botafogo, certeza disso.
Ela enredou com aquele papinho mole de querer ajudar. Deu nisso.

ROGER
É Moni Vasco, Murilo. E você quer voltar lá? Se quisessem matar
o Nilo já o teriam feito. (vacila) Acho.

MURILO
Então liga pra essa Moni. Vamos ver se ao ouvir tua voz ela amansa.

Lila já demonstra estresse com aquelas suposições. Bate nas teclas do laptop com força.

ROGER
Cê tá nervoso por quê, cara? Nunca foi com a cara dele.

MURILO
Eu sou um ser humano, sabia? Não sabia. Tá sabendo agora.
E se ele foi morto e enterrado como indigente? (para Lila,
com expressão fechada) E aí? Teu herói morto numa vala qualquer.

Lila larga o laptop e vai pra cima dele com o dedo em riste.

LILA
Tu cala a tua boca! Se não quer ajudar, a porta fica ali.
Já to cheia desse teu amargor, cheia!

Todos estupefatos pela perda de controle da jornalista. Paulinha, sentada, abaixa a cabeça percebendo o clima pesado. Tenta disfarçar ao abrir a caderneta de Vince Lemos.

PAULINHA
Gente…Vamos nos concentrar aqui enquanto a polícia faz o seu trabalho?
Ó, isso aqui é claramente um esquema de organização criminosa.
Grana que entra, grana que sai. Códigos de drogas…
Esse Vince Lemos era metido com coisa errada ou ele roubou de alguém.

ROGER
Da Moni, quem sabe? Ela pode ter mandado matar.

Lila e Murilo se encaram. Ela retorna ao laptop e engata o cartão de memória no dispositivo. Roger esfrega as mãos, ansioso.

ROGER
Vamos saber o que esse Vince escondia.

Eles mal têm tempo de descobrir, e um redator aparece da porta.

REDATOR #1
Lila, tem uma pessoa /

Thales dá um chega pra lá no redator e passa a sua frente.

THALES
Eu não sei por quê, mas eu sabia que ia encontrar vocês aqui?
Que é? Mudaram de emprego?

MURILO
Cara, cê já ouviu falar em celular?

THALES
Cê já ouviu falar em chefe mal humorada? Ela quer vocês na
coletiva de imprensa de Anti-Herói.

Paulinha se levanta, apanha a bolsa sobre a mesa.

PAULINHA
Melhor a gente ir, Murilo. Depois de ontem, não é bom vacilar.

Thales, incomodado, olha ao redor, procurando por alguém.

THALES
Num tá faltando ninguém nessa trupe, não?

LILA
Tá falando do Nilo, Thales? (em Thales, curioso, mas disfarça)
Ele sumiu, mas já comunicamos a polícia. Tem gente nossa fazendo a busca também.

THALES
Só? O seu heroizinho desaparece no meio de um tiroteio, e você
age como se nada de estranho tivesse acontecido?

PAULINHA
Que é, Thales? Cê tem alguma coisa pra contar?

Thales ainda hesita, mas todos já estão encarando-o à espera de algo. Thales desmonta.

THALES
Nilo foi baleado /

Lila se levanta, alarmada.

THALES
Ele matou um bandido lá, e depois foi levado por aquele Raul /

LILA
E por que você não falou antes?!

ROGER
Mas a gente procurou nos hospitais!

Lila apanha o laptop e vai saindo do local.

LILA
Você me conta essa história no caminho, Thales. Vamos, Roger!

CENA 5 EXT. – HOSPITAL CENTRAL – MANHÃ

Fachada. Ambulância parada. Carros chegando.

CENA 6 INT. – HOSPITAL CENTRAL / QUARTO – DIA

Uma médica de costas, diante de uma cama.

MÉDICA
A bala não perfurou nenhum órgão vital. Seu amigo vai ficar bem.

A médica se vira para alguém fora da tela, sorri e SAI, revelando Nilo, adormecido e com tubo no braço. Nilo, então, DESPERTA. Confuso, olha ao redor, até se ASSUSTAR.

NILO
O que aconteceu?

CAM, enfim, revela Raul diante de seu ídolo.

RAUL
Salvei a tua vida, cara. Heróis também são salvos, né, não?

NILO
(receoso) Eu…eu não lembro de nada desde /

RAUL
(por cima) Desde que tu matou o Butuca (Nilo engole a seco).
Lavou minha alma, sabia disso? Mas pra quem já matou peixe
grande, matar o Butuca foi como tirar doce de criança (ri).

NILO
Peixe grande? Cê tá falando…?

RAUL
Do Russo, claro. O maior traficante de drogas da região e
rival do Vinnie. Tu é o cara, rapá!

NILO
Eu lembro de algumas coisas, mas…Eu matei mais alguém durante o…?

Nilo pensa um pouco, seu olhar ganha tons de perplexidade. Franze as sobrancelhas, expressão de quem não quer acreditar.

NILO
Você num tá falando de ontem à noite…

RAUL
Já tá na hora de tu saber, camarada. Tu matou Vince Lemos,
mais conhecido nas quebradas como Russo, sacou?
Tu mandou o Russo pro inferno, amigão! Pro inferno!

Raul gargalha, enquanto um super CLOSE em Nilo deixa evidente um misto de surpresa e desalento no rosto do jornalista. As coisas começavam a fazer sentido a partir de agora.

FADE OUT

FIM DO ATO DE ABERTURA

EPISÓDIO 15

UMA OFERTA, VOCÊ RECUSA?

Final de Temporada

PRIMEIRO ATO

NILO
(V.O)
Ter matado o maior traficante de drogas poderia ter feito de mim
um brilhante jornalista investigativo
em defesa do povo. Mas o medo
de ser descoberto como o assassino de um líder comunitário,
fez de mim um covarde
.

FADE IN

CENA 7 INT. – MOONLIGHT PICTURES – DIA

Paulinha e Murilo acabam de entregar suas credenciais na portaria junto de outros jornalistas. Eles atravessam a tela com cara de poucos amigos.

CENA 8 INT. – MOONLIGHT PICTURES / AUDITÓRIO – DIA

Forte presença da imprensa. Flashes em cima da equipe do filme “Anti-Herói”, todos sentados atrás de uma grande mesa com microfones e copos d’água. Atrás deles, um painel do longa, estampando Marcos Jones empunhando sua arma.

Jack pega microfone, animadão, diante dos jornalistas.

JACK
Eu reuni todos vocês aqui para anunciar a estreia do longa “Anti-Herói”
em todos os cinemas do país. Infelizmente, não teremos tempo de fazer
uma exibição teste. Todos sabem os obstáculos enfrentados durante as
gravações (ri, safado), e com tudo terminado há 5 dias, só nos resta estrear.

JORNALISTA #1
Vocês pretendem estrear no mesmo dia em que Nilo Rodrigues foi
acusado de provocar um tiroteio ontem na região?

JORNALISTA #2
Essa é uma forma de camuflar o que ele fez ou marketing para alavancar o filme?

JORNALISTA #3
Onde estará Nilo Rodrigues?

Murilo olha para Paulinha, preocupado. Jack, sem graça, apanha o copo e bebe a água num gole só. Outros da equipe cochicham algo entre si.

JACK
(pigarreia) Amigos, ahn…eu sei que o filme tem causado forte expectativa,
mas as gravações terminaram 5 dias antes da data do lançamento, e
isso porque corremos contra o tempo depois de ficarmos 1 mês sem gravar.
Não poderíamos adiar nem supor o que ia acontecer ontem.

BETÃO
Anti-Herói reúne a trajetória real do jornalista Nilo e os
fictícios enredos nos aclamados livros de Lila Machado.
Reservamos um final surpreendente. Espero que todos possam gostar.

JORNALISTA #1
Saberemos se Nilo matou ou não matou Cipriano Zacarta e o
pastor Josué na Igreja Mão Divina há 3 anos?

JACK
Anti-Herói é uma obra de ficção e não um documentário.
Abordaremos aquilo que nos foi dado saber, nada mais.

Jack encara o pessoal de sua equipe, disfarçando o descontentamento.

CORTE DESCONTÍNUO

Jack, Betão e Marcos estão ao lado de uma mesa contendo alguns quitutes e bebidas.

JACK
Mas que merda, Betão! O que esse Nilo tinha que se meter nessa confusão,
me diz? E aquelas perguntas? Por que você liberou?

BETÃO
Porque se não nem teríamos coletiva de imprensa, Jack. Eles querem as
respostas que nem nós temos! Mas se a gente recusasse, poderia pegar mal.

MARCOS
Desculpe, mas vocês se esquecem o título do próprio filme?
(Jack e Betão não entendem) Ele é um herói controverso. Cês deviam
ficar felizes que o Nilo resolveu causar um caos justo ontem.
Interpretem como uma pré-estreia.

MURILO
(O.S) Ele tem razão.

JACK
Como assim, garoto?

MURILO
Use o sumiço de Nilo para promover ainda mais o filme. Tudo que
menos precisamos é a mídia em cima do Nilo agora.

PAULINHA
Assim a mídia vai cair matando em cima de vocês, vai chamá-lo de
aproveitador, mas tudo bem, isso cê já tá acostumado.

Jack coloca as mãos na cintura, indignado.

JACK
Como é que é, garota?

MARCOS
(debocha) Não chora, não, Jack. Solta esse teu jeito espalhafatoso
e mostre que Anti-Herói pode ser o filme do ano.

Jack olha para Betão, sem acreditar.

CENA 9 INT. – HOSPITAL CENTRAL / RECEPÇÃO – DIA

Lila, Roger e Thales adentram, e vão direto para o balcão. Lila bate a mão no vidro, impaciente, cabeça erguida. Thales faz pouco caso, mãos na cintura. Camisa já caindo para fora da calça.

LILA
Por favor, preciso confirmar mais uma vez se Nilo Rodrigues está internado aqui.

A atendente faz que vai responder, mas Lila, apressada, saca seu celular, digita alguma coisa e mostra para a atendente.

CLOSE na foto de Nilo no celular de Lila. No rosto da atendente, mantendo um olhar suspeito.

ATENDENTE #1
Não, senhora. Ninguém com essas feições deu entrada aqui.

ROGER
Como assim “ninguém com essas feições”, amiga? É Nilo Rodrigues!
Ninguém olha para Frank Castle e fala “ninguém com essas feições”.

THALES
Deixa de ser besta, Roger! Acha que todo mundo se liga
nas aventuras de um justiceiro?

Nesse momento, CAM descobre Raul quase cruzando o mesmo corredor, mas ele vê os jornalistas a tempo. Lila se aborrece, dá as costas, e atravessa a tela. Roger e Thales se entreolham e fazem o mesmo. CLOSE em Raul.

CENA 10 EXT. – HOSPITAL CENTRAL – DIA

Lila anda apressada até o carro, tensa, preocupadíssima. Roger segura seu braço e a abraça.

ROGER
Calma, amiga! Ele já enfrentou inimigos sem nenhum código de ética,
e até onde sei, esse Raul é seu fã. Não faria nada contra ele.

Lila deixa escapar uma lágrima. Reúne forças, mas desaba em desalento, deixando até Thales comovido.

LILA
E se você estiver enganado? E se nunca mais a gente vê-lo? (T)
Eu nunca poderei dizer que não o considero covarde. Ele é a melhor
coisa que aconteceu na minha vida.

ROGER
Depois de mim, né?

Lila consegue achar graça. Meneia a cabeça, deixando a dúvida no ar.

THALES
Vamos indo, né? Já deu pra perceber que o Nilo deve tá em alguma UPA dominada.

Thales, Lila e Roger entram no carro. Enquanto Roger dá a partida, Thales, com aquela cara de quem perdeu um tempo valioso, se distrai, mas vê algo que muda sua expressão.

POV de Thales

Um sujeito de óculos escuros, boné e roupas simples (camiseta e calça jeans) saindo do hospital. Trata-se de Raul.

VOLTA em Thales

Que nem tem tempo de nada. O carro parte e ele some da tela.

SONOPLASTIA: Ô Jorginho Me Empresta a 12 – MC Carol

CENA 11 EXT. – BAIRRO / MORRO VALQUÍRIA – DIA

VISTA AÉREA. Close em um poste de luz com uma pipa agarrada. Calçadas pintadas de verde e amarelo prenunciam a Copa. BARULHO de moto zarpando pelas ruelas.

Na fachada de um Centro Comunitário, paredes brancas, algumas poucas pichações.

FIM DA SONOPLASTIA

CENA 12 INT. – CENTRO COMUNITÁRIO – DIA

Raul chegando com o celular no ouvido em um ambiente movimentado.

RAUL
Deixei o herói em boas mãos, chefia. De lá, ele vai direto pra onde tu quiser.

Um sujeito com pinta de malandro faz sinal para Raul. O bandido acena.

RAUL
Beleza, chefia. A gente vai se falando.

Raul desliga. Percebemos um local típico de escritório: mulher fazendo anotações em um computador, um jovem colocando uma papelada em ordem numa prateleira. Cenário em cores neutras, bem organizado.

Um cartaz de um candidato qualquer na porta; outro cartaz anuncia um culto evangélico SHOW DA FÉ, estampando a foto de um pastor.

RAUL
Fala aí, irmão! Que houve?

BANDIDO #2
To sabendo que o pessoal da Moni tá furando com a gente, parça.

RAUL
Que que aquela lá aprontou dessa vez?

BANDIDO #2
Tá cobrando 200 pila, irmão, pros mané circular com as van.
E isso tá há dias, sacas?

Raul esfrega as mãos no queixo, contrariado.

RAUL
Vadia! O combinado era 400 pra nóis e 100 pra ela.
Isso num vai ficar assim não, irmão. Vinnie vai saber disso.

No bandido #2 assentindo.

CENA 13 INT. – REDAÇÃO NOVO DIA / ESCRITÓRIO – DIA

Murilo e Paulinha, sérios e tensos. Amora contorna ambos, analisando-os dos pés a cabeça com aquele olhar crítico.

AMORA
O que vocês faziam com o carro da empresa ontem após o expediente,
que devolveram perfurado à bala?

Murilo e Paulinha engolem a seco.

AMORA
Estão pensando numa resposta?

MURILO E PAULINHA
A culpa foi minha!

Os dois trocam olhares cúmplices. Amora percebe. Senta na beirada da mesa, posuda.

AMORA
To esperando.

PAULINHA
É que…Eu precisei levar meu irmão pra casa e…

MURILO
Eu achei que seria jogo rápido, até que ficamos no meio do fogo cruzado.
(T) Desculpe. Isso não voltará a se repetir.

Amora assente, insatisfeita. Levanta, contorna a mesa e senta.

AMORA
Ok…Sendo assim, vou descontar no salário dos dois no fim do mês,
tá bom pra vocês?

Murilo e Paulinha sorriem, sem graça.

= = CORTE DESCONTÍNUO = =

Paulinha e Murilo SAINDO do escritório.

PAULINHA
Essa foi por pouco…

MURILO
Relaxa, cê foi ótima. A propósito, você tem irmão?

Paulinha só lhe dá uma olhada. Os dois passam por Thales, encolhido em sua mesa, enquanto tenta disfarçar uma ligação.

THALES
(murmurando)
Não vou não, Roger. Te vira! Já dei a informação, agora você vai lá
resgatar o herói de vocês, vai. (T /cara de indignado) Nada disso!
É por isso que o Brasil não vai pra frente, viu? A gente ajuda um
pouquinho e já acham que somos amiguinhos. Ah, vá!

E Thales desliga o celular, chateado.

CENA 14 EXT. – HOSPITAL CENTRAL – DIA

Roger está encostado a um corrimão de ferro, próximo à entrada. Disfarça, acompanhando os transeuntes. Uma enfermeira (morena, 25 anos, com a cara rebocada de maquiagem) acaba de sair. Roger espera ela passar.

ROGER
Moça! Moça, por favor!

ENFERMEIRA #1
To no meu horário de almoço. Qualquer informação é só ir na recepção.

A enfermeira já dando as costas.

ROGER
(mente) Não, é que…Eu já estive aí e disseram que não permitem
visitas ao meu amigo. Só que…eles devem estar fazendo
isso por motivo de segurança.

ENFERMEIRA #1
Por quê? Seu amigo é famoso?

Roger retira do bolso seu celular e mostra para a moça. A enfermeira sorri ao ver a foto de Nilo.

ENFERMEIRA #1
Ah sim, João Jacob*.

*Referência ao personagem John Jaqobis, interpretado por Aaron Ashmore em Killjoys.

ROGER
João Jacob?

ENFERMEIRA #1
Sim, quer dizer, esse é o nome que registraram aqui.
Disseram que era pra evitar a mídia. (receosa) Mas…
você não é da mídia, né?

Roger sorri, vitorioso.

CENA 15 INT. – HOSPITAL CENTRAL / QUARTO – DIA

Nilo dá seu jeito para sair da cama. Sente o corpo, geme de dor, seu dorso envolvido por uma faixa, mas ele nem se importa; retira o tubo de soro do braço e consegue pôr os pés no chão.

Nilo segue até a porta, abre apenas uma fresta.

VÊ UM SUJEITO MAL ENCARADO, ESCORADO NO FINAL DO CORREDOR.

Nilo fecha a porta rapidamente. Resmunga.

NILO
Como é que vou sair daqui?

O SOM de rodinhas no corredor anuncia que alguém pode abrir a porta a qualquer momento. CLOSE na porta. Ela se abre, revelando uma faxineira com o seu carrinho de limpeza.

FAXINEIRA #1
Bom dia! Vou limpar aqui rapidinho, tá?

CAM pega Nilo deitado na cama, fingindo-se de bom paciente. A faxineira fecha a porta cautelosamente.

FAXINEIRA #1
Sejam rápidos!

Nilo não entende. A cortina do carrinho abre, revelando Roger, todo desajeitado para sair.

ROGER
Tcha-ram!

NILO
Roger!

Roger se esforça, vai ao chão.

ROGER
O que eu não faço por você, hen?

Roger se levanta e vai até Nilo. Forte abraço.

NILO
Você se arriscou demais, Roger. Certeza que ninguém te viu?

ROGER
Pagando cenzinho? (ambos olham para a faxineira, que pisca para eles)
Pagando eu entro e saio sem ser visto. Mas e aí, cara? Como é cê tá?

NILO
Como pode ver, preso.

Roger coloca a mão por dentro da camisa e retira a camisa do Superman embalada em um saco.

ROGER
A gente vai arrumar um jeito de te tirar daqui, brother.
Mas o que aconteceu ontem, hen? Você e o Thales tavam juntos?
Ó, fui no seu apartamento e peguei pra você.

NILO
Ahn…(olha estranho para a estampa) Tá, quero saber da Lila. Ela tá bem?

ROGER
Ela tá preocupada contigo, cara. Mas eu preferi não contar ainda
que você tá aqui. Nem pra ela (espia a faxineira distraída)
nem pra polícia. Não sabemos quantos informantes da Moni têm lá, né?

NILO
Vocês acessaram o cartão de memória? Vocês já…?

ROGER
(corta) Não. Nem tempo tivemos. Mas não se preocupe, amigo,
vamos montar esse quebra-cabeças juntos.

NILO
Não vai ser necessário, Roger. Eu tava certo o tempo todo.
No fundo, eu tava certo.

ROGER
Do que cê tá falado, amigo?

NILO
(murmura) Eu não matei um cidadão de bem. Eu matei o traficante mais procurado do Rio.

ROGER
(ri, incrédulo) Mas o maior traficante do Rio era o /

NILO
(por cima) Russo.(os dois se fitando) Eu matei o Russo!

Na reação de Roger.

CENA 16 EXT. – DELEGACIA – DIA

Fachada. Nas bandeiras flamejantes.

CENA 17 INT. – DELEGACIA / VESTUÁRIO – DIA

Rafael entra, como quem não quer nada, cumprimenta os colegas. Em seguida, os policiais SAEM. Rafael espera um pouco, até que tira um celular do bolso da calça. Disca.

RAFAEL
(ao tel.) Fala aí.

VOZ MASCULINA
(voz malandra) E aí, parça? Só vo te passar a ideia: Nilo tá
naquele hospital Central sob os cuidados do Raulzão.

RAFAEL
(animado) O quê? Quem mais sabe disso?

VOZ MASCULINA
(V.O) Ninguém que seja problema pra nós, irmão (ri).

Em Rafael abrindo um sorriso, malicioso, olha ao léu. Ele desliga o celular, com uma expressão de vitória.

RAFAEL
Agora eu te encaçapo, filho da puta!

Sem perceber, Toninho está à espreita.

FADE OUT

FIM DO PRIMEIRO ATO

SEGUNDO ATO

NILO
(V.O)
Passei tempo demais especulando se o meu crime compensava.
Compensava, mas agora é um pouco tarde saber disso…

FADE IN

CENA 18 EXT. – CRACHÁ VERDE – DIA

Fachada do local. Baixo movimento.

CENA 19 INT. – CRACHÁ VERDE / LABORATÓRIO – DIA

Emília está curvada sobre a mesa, concentradíssima na análise de uma fórmula verde situada no interior do balão volumétrico. Assim que ela se ergue, encontramos Moni Vasco logo atrás.

MONI
Búu!

Emília se assusta e encara a traficante. Moni sorri, sapeca.

MONI
Saudades de mim, dona Emília do (cantarola) sítio do pica-pau amarelo? (ri).

EMÍLIA
(sarcástica) Veio conseguir seu emprego de vigia de volta, Moni? Perdeu a vez.

Moni tateia a mesa, segura um tubo de ensaio sob o olhar temeroso de Emília.

MONI
Mas tu é desagradável, hen, Emilinha. Vim fazer uma visita de
cortesia e tu fala em empreguinho de merda? (coloca o tubo à luz, observa)
A tua sorte é que to de bom humor.

Emília apanha o tubo de suas mãos e o coloca no lugar.

EMÍLIA
Isso não é brinquedo, Moni! Diz logo o que você quer.

Moni eleva as mãos, como quem diz “calma aí”.

MONI
Tá com medo de um incêndio? Pena que não dá tempo de chamar o Nilo, né?

Gargalha. Emília fecha a cara.

EMÍLIA
(provoca) Isso ainda é por conta de Vince? (Moni não gosta, olhar maquiavélico)
Já te falei que fui obrigada. Era isso ou a minha cabeça que ia rolar.

MONI
Vacilo teu, mercenária filha da puta! Ficou de graça na frente do teu irmão,
e olha o que ele fez? Passou a mão na fórmula DP e entregou pro Vinnie.
Devia ter tido mais cuidado, a gente tinha um plano!

EMÍLIA
O plano era matar o Vince. Já tá morto, não? Falei pra você que
eu não queria passar a vida vendo o meu laboratório
produzindo a merda da DP.

BAQUE na revelação.

MONI
Tu fala como se fosse virar crente agora. Tu armou pra cima do
seu primo porque recebeu coisa melhor em troca, garota, sei disso.

EMÍLIA
Você faria a mesma coisa, Moni. Todos têm as suas necessidades.

MONI
Eu falo isso antes de bater uma gilete. O que tu tem é pressa de morrer,
sua vadia. (aponta o dedo) Vinnie não confia tanto em você, não.
Nem Vince confiava! Tanto é que quem produzia a droga aqui era ele e
os comparsas dele, que também não foram confiáveis (ri). Tu mermo nem
sabia decifrar a fórmula. Uma química feito tu, formada sabe Deus onde.

Moni ainda ri, mas Emília se enfurece. Pega no braço da traficante, que recua subitamente.

EMÍLIA
Escuta aqui!…

MONI
Ei! Pega leve aí, garota! Vim na paz. Já te falei mil vezes que
tu não tem futuro com eles não. Tu sabe disso, num sabe?

Emília se afasta, olhando para ela de cima a baixo.

EMÍLIA
(irônica) E eu teria futuro contigo, né? Entendi. O que você
ganha explorando os motoristas de vans e vendendo as drogas na cidade,
é pinto perto do que o Vince faturava.

MONI
Debaixo da terra, ele deve tá faturando uns vermes (ri / Emília revira os olhos).
Vo te falar na boa? Fortuna alguma compra a tua paz de espírito.
Porque tu gosta da grana, não do tráfico, né, não?

Emília vacila o olhar. Fecha os tubos, dá uma disfarçada para não encarar a traficante.

EMÍLIA
O que você quer afinal, hen?

MONI
Tu sabe bem o que quero. Sempre soube. Eu quero a fórmula do amor.
(sorri, travessa) Mentira. Quero a fórmula original da DP. Basta essa
missão pra tu ter a grana e a consciência de uma freira.

Emília ainda hesita.

EMÍLIA
Não tinha um jeito mais fácil?

Moni se aproxima, apoia a mão na mesa, mantém o tête-a-tête.

MONI
Tinha. Era o Nilo, mas não deu muito certo não. Vai tu mermo.

Em Emília, indecisa.

CENA 20 INT. – MANDRAKE PUB / DEPÓSITO – DIA

Homens abrem as caixas e apanham os engradados, enquanto William anota e acompanha tudo que chega. Na ponta da escada, surge Vinnie, observando o movimento.

VINNIE
A encomenda chegou?

WILLIAM
Em perfeito estado.

William olha para um dos ajudantes e aponta para uma das caixas.

WILLIAM
Por favor, abra essa caixa aqui.

O ajudante não hesita; com um canivete, ele rasga o lacre da caixa, abre e revela poucas garrafas para uma embalagem grande. Até o momento em que o ajudante retira algumas dessas garrafas e se ergue, dando passagem à Vinnie.

Vinnie, então, se abaixa, ficando de costas para a CAM. Pega alguma coisa. Avalia.

VINNIE
Hmmm, o aroma desse parece mais interessante.

É quando ele sai da frente da CAM e nos mostra uma pistola Desert Eagle dourada. Bonita, grande e de aspecto surpreendente.

VINNIE
Vou estrear hoje, meu amigo. Em grande estilo (sorri).
E as outras? Chegaram vivas?

Vinnie ri, charmosíssimo como sempre. William faz um sinal para o ajudante, que rapidamente abre outras caixas, retira as bebidas e vai revelando as armas, cada um de calibre diferente. Uma submetralhadora está entre eles. Vinnie vibra.

VINNIE
Perfeito!

Na risada de William.

SOBE A SONOPLASTIA: Revolution RoulettePoets of the Fall

MONTAGEM

Takes de vários pontos da cidade:

– o semáforo marcando sinal vermelho;

– os moleques fazendo malabarismo com bolinhas;

– homens e mulheres trajando roupas sociais, atravessando a Rio Branco;

– os caras trocando baseado em alguma esquina;

– traficantes dando uma geral em suas armas.

FIM DA MONTAGEM

CAM flagra uma rajada de relâmpagos cobrindo as nuvens.

Na fachada da redação Carioca News /

MUSIC FADE

CENA 21 INT. – REDAÇÃO CARIOCA NEWS / COPA – DIA

Lila anda de um lado para o outro, sem saber o que fazer. Roger está sentado, observando a amiga.

LILA
A gente precisa avisar o Moreira, Roger! O negócio é pegá-lo sozinho.

ROGER
Lila, não estamos falando apenas do Rafael, mas de qualquer
pessoa que pode tá infiltrado na polícia. Até o faxineiro é suspeito!

Lila debruça sobre a mesa, ávida e convicta de sua decisão.

LILA
O Moreira tá por dentro da história, e na situação do Nilo,
ninguém melhor que a polícia pra ajudá-lo.

ROGER
Você se esquece que quem alçou o Nilo no estrelato foi a nossa mídia,
mesmo ele sendo visto como fora da lei pela polícia? (segura em suas mãos)
Amiga, Moreira pode ter simpatia pelo Nilo, mas não vai arriscar a
carreira dele ajudando um assassino!

MOREIRA
(O.S) Ninguém me consultou sobre isso.

Roger se levanta no susto.

ROGER
Delegado?

MOREIRA
Já arrisquei a minha carreira ao deixar o Nilo solto.
Por que eu não continuaria arriscando?

Em Lila e Roger, na dúvida.

CENA 22 EXT. – HOSPITAL CENTRAL – DIA

Rafael surge a frente da CAM, cismado, dando uma conferida ao redor. O investigador segue para a entrada do hospital.

Corta para o INTERIOR

Moreira acaba de vir de um corredor cercado por mais dois policiais, incluindo Toninho. Ninguém percebe, mas os caras da turma de Raul estão ali, só espiando.

ROGER
E aí? Bora resgatar o Nilo?

MOREIRA
Não ainda. O médico disse que ele foi para a sala de exames.
Parece que o quadro dele não se estabilizou.

LILA
O quê? (para Roger) Cê não disse que ele tava ótimo?

Roger mal sabe o que dizer. CAM DESFOCA deles e pega Rafael, assistindo a tudo, preocupado. Ele pega outro caminho sem ser visto.

CENA 23 INT. – HOSPITAL CENTRAL / SALA DE TOMOGRAFIA – DIA

Nilo (trajando a camisa do Superman) está deitado em uma maca, próximo à máquina de tomografia. Quando uma enfermeira (a mesma da cena 14) joga um uniforme de médico no colo dele.

ENFERMEIRA #1
Vista, e rápido!

Nilo se levanta, sem entender.

NILO
Que isso? Não me trouxe pra fazer um exame?

ENFERMEIRA #1
Aqui é o um dos poucos lugares que aqueles caras não podem entrar.
Eles estão no início do corredor. Você veste esse uniforme e
vai direto pro necrotério.

NILO
Quê?! Como assim?

ENFERMEIRA #1
To fazendo isso a pedido do seu amigo Roger. E é bom que você seja
um excelente ator, porque não posso me ferrar nessa.
Presta bem atenção.

= = CORTE DESCONTÍNUO = =

CENA 24 INT. – HOSPITAL CENTRAL – DIA

As cenas a seguir alternam com o áudio instrutivo da enfermeira #1. CAM seguindo pelo corredor.

ENFERMEIRA #1
(V.O) Você vai seguir pelo corredor principal e virar à direita.

CAM vira à direita e encontra uma porta de vidro, ao lado de uma espécie de guichê e um segurança.

ENFERMEIRA #1
(V.O) Passe pela porta. Ninguém vai barrar um médico.
Siga até o fim do corredor e entre por uma porta.

CAM ENTRA e vaza pelas escadas até alcançar o NECROTÉRIO.

ENFERMEIRA #1
(V.O) Você vai descer as escadas até o necrotério. Encontre um
portão de saída. Do outro lado, um carro te espera.

O portão se abre. Damos de cara com Murilo dentro de um Uber.

CORTA IMEDIATAMENTE EM

Nilo SAINDO da sala de tomografia com o uniforme e a máscara cirúrgica, pronto para seguir as instruções. Pelo seu PONTO DE VISTA, os dois bandidos o aguardam do outro lado da porta, no início do corredor.

Nilo se volta para a CAM. Passa pelas pessoas, algumas estranham a máscara cirúrgica, mas nada dizem. Nilo vira à direita, cumprimenta com a cabeça a atendente do guichê e o segurança. Passa pela porta, vai até o fim do corredor. Finalmente, SEGUE pelas

ESCADARIAS

Já confiante, desce a galopes, CLOSE em seu rosto. Tensão total. Até ele ESBARRAR em Rafael, que esboça um sorriso de vitória. O policial arranca sua máscara cirúrgica, furioso.

RAFAEL
Bingo! Melar o plano do seu amigo foi fácil fácil.

Em Nilo, sem ação.

CENA 25 INT. – REDAÇÃO NOVO DIA / SALA DE REDAÇÃO – DIA

Thales encolhido no canto da mesa. Segura um pen-drive e engata no PC. Olha ao redor para ter certeza de que ninguém está olhando. Ao clicar em um arquivo, o vídeo que incrimina Nilo ABRE em tela cheia. Thales se desespera, tenta minimizar a tela, minimiza demais. Quase soca a mesa.

THALES
(fala baixo) Merda!

O jornalista olha para os colegas. Ninguém ouviu. Thales torna a abrir o vídeo, dessa vez, em tela menor.

= = CORTE DESCONTÍNUO = =

A mesma tela sendo visualizada em outro ambiente. Suspense, enquanto a CAM, lentamente, descobre Amora, extasiada, diante do vídeo em seu ESCRITÓRIO.

AMORA
(soletra) O-que-é-isso?!

No impacto da cena.

FADE OUT

FIM DO SEGUNDO ATO

ATO FINAL

NILO
(V.O)
A única coisa que eu precisava era provar a culpa de Vince Lemos.
Mas eu não tinha como explicar a minha covardia.
Ele era um morto culpado; eu ainda to vivo.

FADE IN

Um forte trovão RIBOMBA pelas nuvens negras /

CENA 26 INT. – HOSPITAL CENTRAL / ACESSO AO NECROTÉRIO – DIA

Rafael prensa Nilo de contra a parede forçando os punhos em seu pescoço.

RAFAEL
Sabe que o seu prazo de validade já venceu faz tempo, né, malandro?
Tu tem o quê? Pacto com algum vingador, filho da mãe?

Nilo esboça dor, mas segura no braço do inimigo, sem pestanejar.

NILO
Qual é o teu problema comigo, afinal?

RAFAEL
Ah, o heroizinho de merda não sabe? (prensa-o mais forte) Você posa de herói,
salvador de merda dessa pátria, dá de uma de sofredor pela perda
de sua esposa, luta por justiça e estampa jornais, mesmo fingindo que
isso não é importante pra você. Aí vem o Vinnie, despenca lá da Rússia
pra te ver, fala, baba e esfrega na minha cara o quanto te deseja e idolatra.
(chega a cuspir ao falar) E tu ainda tem a petulância de me perguntar
qual o meu problema contigo?

Nilo já quase sacando qual era o tal problema, quando /

RAFAEL
O Vinnie é meu! Só meu! Entendeu? MEU! E tu vai aprender isso agora!

Rafael vai acertar um SOCO, mas Nilo desvia, e o policial acerta a mão na parede. Urra de dor. Nilo CHUTA a barriga do rival, que nem se abala, e empurra Nilo na direção do seu curativo. Nilo se contorce de dor, e prova sua resistência ao pegar Rafael pelos ombros e jogá-lo pelas escadas. Rafael rola lindamente, dando tempo para Nilo correr e alcançar o

NECROTÉRIO

Os funcionários nem entendem. Nilo abre o portão e encontra o

UBER

Murilo, de dentro do carro, abre a porta.

MURILO
ENTRA, RÁPIDO!

Nilo entra. Rafael vem atrás, com raiva estampada na cara.

MURILO
(para o motorista)
TOCA DAQUI! TOCA!

Rafael SOME dali. Moreira, um policial, Lila e Roger tentam chegar a tempo, mas é tarde demais.

MOREIRA
Droga! Pra onde o Nilo foi, Roger?

ROGER
Confesso que eu só pensei em tirá-lo daqui. (sem graça) O roteiro final eu não sei.

Lila e Moreira bufam.

CENA 27 EXT. – HOSPITAL CENTRAL – DIA

Rafael avista o carro da polícia, se aproxima e força para abrir a porta. OUVE-SE um bip e a porta destrava. Rafael olha para trás e dá com Toninho, de sorriso maroto.

TONINHO
Tentando furtar um carro da polícia, Rafael?

RAFAEL
(irado)Olha, escuta aqui…!(pensa melhor) Ahn…a gente tem que ser rápido,
Toninho! Moreira pediu pra gente ir atrás do Nilo.

TONINHO
Sério?

Rafael aponta para o carro, impaciente.

RAFAEL
Vamo com isso?

Os dois entram no carro, e nem sacam os dois bandidos na calçada tendo escutado tudo.

CENA 28 EXT. – RUAS DA CIDADE – DIA

Takes de um engarrafamento. Pessoas tentam se proteger da forte ventania. Uma chuva fina já espanta os ambulantes do Largo da Carioca.

Uma trovoada estrondosa se confunde com TIROS pelo céu da Capital.

CORTA IMEDIATAMENTE para uma agitação em torno de Valquíria.

CENA 29 EXT. – MORRO DE VALQUÍRIA – DIA

Vários takes mostram os moleques armados até os dentes com os seus fuzis e pistolas. Os caras saltam em lajes, metem BALAS em direção aos rivais, atingem caixas d’água, TOMBAM um ou dois caras que despencam da laje. Gente correndo para dentro de suas casas. Um homem acaba de ser MORTO pelas costas antes de se refugiar em um bar. A guerra entre as facções é iniciada.

Até que, do alto de uma casa, a porta se ABRE. Dela sai Moni Vasco, de batom mais vermelho que nunca, portando uma submetralhadora. Atrás dela, Branco e mais dois caras armados.

MONI
Se não entra na cabeça de Raul que Valquíria é minha, (engatilha a arma) entra bala.

CLOSE em sua expressão sedenta.

SONOPLASTIA: Whispers in the Dark (instrumental – iniciado a partir de 0:20min) – Skillet

MONTAGEM

  1. Sites fazem manchetes sobre o filme Anti-Herói e Jack Freitas:

    – “Nilo Rodrigues não seria um anti-herói perfeito se fosse certinho, disse Jack Freitas sobre o sumiço de Nilo, causando espanto nas redes sociais”;

    “Anti-Herói tem estreia conturbada, mas bate recorde nas vendas de ingressos no primeiro dia”;

  2. O tiroteio continua em Valquíria:

    – Moni mira sua arma por trás de uma mureta e acerta uma rajada de TIROS na direção de uns malandros. Tomba todos. Vibra.

    Raul coordena uns rapazes. Cinco caras correm pelos becos, mata alguns rivais pelo caminho.

  3. Sites continuam pipocando notícias sobre Nilo:

    Sumiço de Nilo Rodrigues pode ser marketing para divulgar filme, aposta um crítico de cinema”;

    – “Jack Freitas se aproveitar do caos em torno de Nilo Rodrigues não o torna cúmplice de seus atos, diz especialista”.

  4. O longa Anti-Herói sendo exibido no cinema:

    – Carros cercam Marcos Jones diante do jornal. Uns caras descem e apontam a arma em sua direção. Marcos fica frente a frente com um sujeito loiro, todo de branco, fazendo clara referência a Vinnie Ludwig.

  5. Mais notícias sobre o longa:

    – Anti-Herói faz insinuações sobre possível ameaça sofrida por Nilo Rodrigues, e fãs acreditam que o ídolo corre perigo.

  6. O tiroteio em Valquíria continua. Corpos ensanguentados pelo morro; janelas quebradas; paredes perfuradas a balas. Moni, lá no alto de uma SACADA, mira em alguém cá embaixo. CAM enquadra outra submetralhadora, desliza pelo braço, até encontrar Raul mirando em Moni. No cara a cara. No tudo ou nada.

FIM DA MONTAGEM

Na tela da NOVO DIA estampando a foto de Nilo e Vince em uma grande manchete: “Nilo Rodrigues é o assassino do traficante Russo! – O herói de Lila Machado escondeu a verdade por achar que havia matado um cidadão de bem; assista ao vídeo!”.

CENA 30 INT. – REDAÇÃO NOVO DIA / SALA DE REDAÇÃO – DIA

Ainda sobre a manchete anterior na tela de um PC. Thales diante dele, incomodado. Logo atrás dele, segurando seus ombros, está Amora bastante satisfeita, fazendo a pressão.

Paulinha e Thales trocam olhares. Ela, inconformada; ele, frustrado.

FIM DA SONOPLASTIA

FADE OUT

FADE IN

CENA 31 EXT. – RUAS DA CIDADE – DIA

TEMPORAL INTENSO e ATÍPICO acompanhado de um forte vendaval tornam o cenário mais escuro e nebuloso. Outdoors despencam, latões de lixo rolam pelo asfalto; buzinas ecoam no meio da trovoada.

Na Presidente Vargas, o Uber faz manobras, enquanto o carro da polícia vem atrás apitando sua SIRENE. O motorista do Uber se preocupa.

CENA 32 INT. – UBER – DIA

MOTORISTA #1
É a polícia. (olha pelo retrovisor) Ei! Cês tão fugindo da polícia?

MURILO
Toca isso, irmão! Essa polícia não tá pensando em cumprir lei alguma.

NILO
E ser for o Moreira, Murilo? E se for a Lila naquele carro?

MURILO
Não pira, Nilo! Não daria tempo deles virem atrás de nós. Só pode ser o Rafael!

NILO
Por que você tá fazendo isso? (Murilo nem encara)Se antes você tinha
medo de ser preso, agora não tem medo de ser morto? Isso não faz sentido.

MURILO
(nervoso) Nada faz sentido nessa história. Não era pra eu tá aqui,
não era pra isso tá acontecendo, era pro Moreira tá te esperando do
lado de fora do hospital. Roger fez tudo errado!

NILO
Mas você topou, não topou? (T) Eu já te perguntei isso várias vezes.
A gente pode morrer nessa estrada, Murilo! (fita o colega) Por que você
tá me ajudando se tudo o que você queria era derrubar a minha reputação?

Murilo sente a pressão. A chuva cada vez mais forte batendo na janela. O ribombar do trovão assusta. Nilo não tira os olhos dele.

MURILO
(explode) Você matou o Vince porque eu tava lá, foi pra me salvar,
enquanto eu só tava preocupado em conseguir um furo de reportagem!
Tá bom pra você ou quer mais?

Em Nilo esbabacado.

NILO
Então…tudo isso por consideração? Por consciência pesada?

MURILO
Que é? Tá achando pouco? Então tá. Você achava que podia ter evitado
essa morte, mas, na verdade, tu agiu em legítima defesa, mas taí,
se sentindo culpado porque se acostumou com a fama de herói,
e heróis são bonzinhos demais, né? Dá nisso mesmo.

Nilo ri, deixando Murilo chateado.

MURILO
Sabia que tua ia rir da minha cara.

NILO
Não é isso. Eu to rindo porque mais uma vez estamos em perigo juntos.
Talvez você seja o meu carma.

MURILO
Igualmente.

Um TIRO cala os dois. Nilo olha para trás e vê um carro emparelhando com o da polícia.

CENA 33 EXT. – RUAS DA CIDADE – DIA

Rafael tenta mirar sua pistola no carro ao lado, mas a chuva atrapalha.

RAFAEL
Segura firme isso aí, Toninho, que eu não vou deixar esses bandidos pegarem o Nilo.

TONINHO
Mas eles tão mirando na gente, cara!

RAFAEL
Fica quieto aí, seu idiota! Tu não vê que eles querem impedir a nossa ação.

TONINHO
(desconfia) A gente não tá aqui a mando do Moreira, né? Filho da puta.
Essa guerrinha é ciúmes do seu amante e você me enfiou nessa!

RAFAEL
Agora aguenta, otário!

Rafael se distrai, ATIRA contra a lataria do carro inimigo, mas nada efetivo. Enquanto isso, Toninho abre o porta-luvas e retira seu revólver calibre 38. Aponta para o colega.

TONINHO
Eu não vou morrer por sua culpa, maldito!

Rafael se amedronta.

CORTA PARA o EXTERIOR

Um dos bandidos coloca a cabeça para fora e MIRA uma submetralhadora na direção do carro de polícia. Rajada de TIROS cobrem a lataria, perfuram janelas, o carro derrapa na pista, faz zigue-zague até capotar duas vezes.

SÉRIE DE PLANOS

  1. Nilo e Murilo assistem a tudo, e se entreolham chocados.

  2. Os bandidos avançam, um deles com a cabeça pra fora, grita e ri vitorioso.

  3. O carro de polícia finalmente EXPLODE.

FIM DA SÉRIE DE PLANOS

Os bandidos emparelham com o Uber, que desliza pela pista, quase derrapa, sobe numa calçada e freia bruscamente.

Os bandidos saem do carro e abrem a porta do Uber na violência. Nilo e Murilo não têm o que fazer; se encaram já temendo pelo pior.

FADE TO BLACK

FADE IN

Uma faixa preta é retirada dos olhos de Nilo e Murilo. Aos poucos, é revelado que ambos estão sentados, lado a lado, com as mãos amarradas para trás, ainda ensopados. ZOOM-OUT até um cartaz com a imagem de Mandrake ser enquadrada logo atrás deles.

CENA 34 INT. – MANDRAKE PUB / CASA DE VINNIE / PORÃO – NOITE

Cenário bastante atraente para os amantes dos quadrinhos: cartazes e objetos de diversos personagens de HQ (Liga da Justiça, Justiceiro, Wolverine, Vingadores, etc…); paredes tomadas por imagens, incluindo fotos de Nilo em um mural; mesas repletas de objetos temáticos; almofadas seguindo o mesmo estilo.

Três homens armados e bem vestidos fazem a guarda. Eis que Vinnie desce por uma escada com seu habitual terno branco, segurando a sua desert eagle. Em seguida, vem Emília, classuda em um vestido preto. Nilo e Murilo mal conseguem acreditar.

VINNIE
Sejam todos bem-vindos! Espero que tenham sido bem tratados.

NILO
Emília?

EMÍLIA
(altiva) Surpreso? Bom testar suas habilidades investigativas.
Precisa melhorar (ri).

Vinnie sorri, com um olhar sinistro sobre ela.

NILO
Por que fez isso? (para Vinnie) Se tem algo contra mim, deixa o Murilo.
Ele não tem nada a ver com essa história.

Vinnie analisa sua própria arma, brincando com o imaginário dos convidados.

VINNIE
Mas é claro que ele tem muito a ver com isso. Ao que me consta,
vocês estavam juntos quando meu irmão mais querido morreu. Não é?

MURILO
Cara, isso é acerto de contas? Olha, quer matar, mata logo.
Não vou implorar pela minha vida não.

Vinnie ri, sádico. Os presentes gargalham.

EMÍLIA
Olha só! Corajoso esse teu amigo, hen. Pena que este lugar não cabe a sua coragem.

VINNIE
Sim, minha cara Emília. A coragem dele não cabe neste lugar.
(engatilha a arma dourada) Nem você.

Emília não entende, e Vinnie aponta a arma para ela.

VINNIE
Quero que você mande um recado para Moni Vasco.

Ela nem tempo tem de reagir, e ele ATIRA contra a sua cabeça. Sangue espirra nos jornalistas. Reação de horror. Emília no chão, MORTA.

VINNIE
Desculpe por essa cena, cavalheiros, mas como diria Moni Vasco,
“se tem uma coisa que entra fácil na cabeça do inimigo, é bala”.

William dá sua risadinha. Os comparsas riem.

VINNIE
Mas como eu estava dizendo, a sua coragem, Murilo, não cabe
neste lugar, mas, sim, nos meus negócios. (suspira) Talvez,
se eu tivesse te conhecido há alguns meses, Vince teria morrido
facilmente naquela chacina.

NILO
O quê? Então era verdade que você matou a família dele?

VINNIE
Confesso que teria sido um ato falho da minha parte, afinal…

Vinnie contorna os jornalistas, acaricia a barba mal feita de Nilo com a sua arma dourada. Na tensão de Nilo.

VINNIE
(cont.) Como eu faria você chegar até a mim, não é mesmo?

NILO
O que você quer com a gente?

Vinnie abraça ambos por trás.

VINNIE
Esse é o tipo de pergunta que eu gosto. Eu tenho uma oferta para vocês.

Vinnie contorna mais uma vez. Faz um gesto para um comparsa, que rapidamente pega uma cadeira. Vinnie se senta diante dos convidados.

VINNIE
A situação de vocês não é nada animadora lá fora. A Novo Dia revelou
o vídeo do seu crime, Nilo (no espanto de Nilo). E já sabe do seu
envolvimento, Murilo. Mais do que perder o seu emprego, caro amigo,
ambos serão rechaçados e vistos como criminosos.

MURILO
Diz logo: a gente tem que matar quem?

Vinnie e William riem.

VINNIE
Calma, amigo. Não será necessário ainda matar alguém. Você será
promovido a editor-chefe da coluna policial. Era esse seu sonho, não era?
O mundo precisa de jornalistas como você. Eu mais ainda (sorri, despudorado).
Não quero meu nome atrelado a nada que possa comprometer meu trabalho.

Murilo engole a seco. Vinnie sorri, sedutoramente.

VINNIE
Enquanto a você, meu nobre amigo Nilo, você não pagará pela morte
do meu irmão. Ora, você o matou em legítima defesa, e por motivos de
sigilo profissional, não pôde revelar nada até investigar e descobrir
que Vince chacinou a própria família e pretendia manchar a reputação do
jornal com mentiras contra mim. (Nilo esboça fúria) Justo eu, um homem preocupado
com o bem-estar da população, sócio majoritário de um dos laboratórios mais
respeitados do Brasil, e onde pretendo incluir doses mínimas do
meu melhor trabalho: a DP.

NILO
Você é louco! Por que tem que ser eu?

VINNIE
Porque você é a pessoa mais importante da minha vida (Nilo arregala os olhos).
Claro que essas ofertas são passíveis de recusa. (balança a desert eagle na
direção de Murilo) Vocês recusam?

Fecha em Nilo e Murilo sem alternativa.

FADE TO BLACK

CONTINUA NA PRÓXIMA TEMPORADA

FIM DO EPISÓDIO

A Widcyber está devidamente autorizada pelo autor(a) para publicar este conteúdo. Não copie ou distribua conteúdos originais sem obter os direitos, plágio é crime.

Pesquisa de satisfação: Nos ajude a entender como estamos nos saindo por aqui.

Publicidade

Inscreva-se no WIDCYBER+

O novo canal da Widcyber no Youtube traz conteúdos exclusivos da plataforma em vídeo!

Inscreva-se já, e garanta acesso a nossas promocionais, trailers, aberturas e contos narrados.

Leia mais Histórias

>
Rolar para o topo