ESTAÇÃO MEDICINA
Capítulo 40
Traição

CENA 01/SÃO PAULO/TATUAPÉ/UNIVERSIDADE OLYMPUS/ESTACIONAMENTO/MANHÃ

Instrumental explosivo. Big-close-up em olhos midriáticos de Mateus que assistia aquela cena atônito.

Close alternado: Goram dançando com Heloísa. Volta para os lábios cerrados de cólera de Mateus. Retorna para o casal, Goram colocando nos cabelos enegrecidos da jovem nerd, uma coroa de flores. Voltar para a respiração dispneica de Mateus, ele põe a mão no peito recuperando o fôlego.

SILÊNCIO. Instrumental diminui rapidamente. Ouvimos os batimentos acelerados do vilão. Ele corre a mão para o porta-luvas do carro, abro de supetão e dele retira um revólver, com as mãos trêmulas aponta tonteante para a jovem.

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CENA 02/SÃO PAULO/JD AMÉRICA/MANSÃO DOS MOÇA/ INTERIOR/ SALA DE JANTAR/ NOITE

Mateus serve uma taça de vinho a Goram.

MATEUS -Eu estou muito feliz com seu progresso, Goram. Está brilhantemente dominando o inglês com facilidade.

GORAM – Goram não conseguiria, se não fosse a pytyvõ de Mateus, sempre tão atencioso e kyrỹi. (Ele recebe a taça e brinda, tomando um gole)

Mateus ri.

MATEUS – Sabe que eu acho engraçado o jeito que você fala, misturando o tupi com o português. O que significa kyrỹi ?

GORAM – Kuimba’e morotĩ, na linguagem de vocês, homens brancos, significa carinhoso.

Mateus se encanta com aquela adjetivação, Goram esboça um sorriso de asco. O anfitrião esgueira sobre o indígena, feito uma tarântula e sorri.

MATEUS – Você além de muito gentil, é muito bonito, Goram.

Ele tenta aproximar para roubar um beijo de Goram, mas o anti-herói é mais rápido e põe a taça na frente, saboreando mais um longo gole do bom vinho.

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CENA 03/SÃO PAULO/TATUAPÉ/UNIVERSIDADE OLYMPUS/ESTACIONAMENTO/MANHÃ

Mateus sai do transe, percebemos ele vendo a cena… destrava a arma, girando-a. Heloísa para bem no meio da cruz na lente. Big-close-up no dedo indicador de Mateus no gatilho.

CENA 04/SÃO PAULO/BIXIGA/APARTAMENTO DE JOSÉ/ QUARTO DE HÓSPEDE/MANHÃ

Fabiana acorda com o raio de sol que entra pela fresta da janela e percebe que dormiu entre os braços de Guto.

COMEÇA A TOCAR COMO VAI VOCÊ DE DANIELA MERCURY

Ela beija as mãos do rapaz e delicadamente as afasta para não acordá-lo. Ela se levanta e abre mais a janela. Volta observá-lo a dormir. Sente uma profunda tristeza por não poder viver aquele amor.

FLASHBACK: Lembra das ameaças de Samuel quando ela levava chicotadas.

Ela chora em silêncio. A porta do quarto se abre e Marcela que estava sorrindo percebe a amiga chorando, acena para ela.

CORREDOR

MARCELA – Amiga, por que você está sofrendo desse jeito ? Eu fiquei tão feliz de ver vocês juntos.

FABIANA – Eu não posso viver esse sentimento, Ma. Eu não posso. Eu preciso matar esse sentimento dentro de mim. Você não tinha nada que dizer que dormi aqui, agora eles sabem onde estou.

MARCELA – Que história é essa ? Falei sim, porque você deixa preocupado todo mundo e não é correto da sua parte, sua mãe te ama, Guto te ama. Por que você precisa fazer isso com a relação de você o que te impede de viver essa paixão ?

FABIANA – Muitas coisas, coisas difíceis… Mas agora eu não quero pensar sobre isso, eu preciso me aprontar, daqui a pouco tem prova de Medicina de Família e Comunidade lá no posto de saúde do Tatuapé.

E sai para o banheiro. Marcela fica preocupada.

CENA 05/SÃO PAULO/TATUAPÉ/UNIVERSIDADE OLYMPUS/ESTACIONAMENTO/CARRO/MANHÃ

Mateus suava frio feito uma viúva negra pronta para o abate do próprio marido. Quando vai atirar, eis que seu celular toca. Seu corpo estremece. Era Bernardo.

Ele tenta ignorar por alguns instantes, mas não consegue e atende.

INÍCIO DO DIÁLOGO SIMULT NEO

MATEUS – Alô, que raios você quer ? Não quis jogar fora um noivado de anos, para de me atazanar…

APARTAMENTO BERNARDO…
BERNARDO – Tenho sentido a sua falta, será que não podemos nos ver, pelo menos tomar um café juntos. Eu não tô bem.

MATEUS – Você acha que pode brincar com nossa história desse jeito ? Você escolheu isso, escolheu isso por um ponto final em tudo. Nós fizemos um pacto de sangue com o sangue dos meus pais. Dissemos que ficaríamos juntos para sempre depois daquela noite. Não é possível que uma mulherzinha tenha virado sua cabeça desse jeito.

Bernardo chora. Mateus se emociona e desliga o celular.

FIM DO DIÁLOGO SIMULTÂNEO

Abaixa a cabeça por um instante. SOFRIMENTO. De repente uma raiva lhe toma a alma e ele se lembra onde estava a razão para tudo, retorna a olhar para a dança indígena. Mas para sua surpresa, ela já havia terminado e Goram e Heloísa não estavam mais.

Enfurecido, esmurra o volante.

MATEUS – DROGAAAAAAAAAAAAA.

CENA 06/SÃO PAULO/PENHA/CASA DE ANDRÉ/INTERIOR/COPA/MANHÃ

ELEONOR (V.O.) – Que o senhor cura meu filho, pai. Que as palavras do pastor deem alta para meu filho e que ele possa retomar sua vida.

Ela abre o armário antigo e guarda uns trocados na moleira quando percebe que todo o dinheiro havia desaparecido.

P NICO. Ela puxa a moleira com força que se espatifa no chão, revelando estar vazia por dentro.

ELEONOR – Cadê o dinheiro que estava aqui dentro ? Havia mais de mil reais aqui dentro. Será que entrou alguém aqui ?

Ela dá uma geral pela casa e retorna desesperada.

ELEONOR – Meu Deus, onde está esse DINHEIRO ?

CENA 07/SÃO PAULO/BIXIGA/APARTAMENTO DE JOSÉ/HALL DE ENTRADA/MANHÃ

Guto desce correndo o último lance de escada. Marcela vai atrás que nem uma destrambelhada.

MARCELA – Para que você está correndo desse jeito, cara ?

GUTO – Pô cunhadinha, quero ver se ainda consigo encontrar minha donzela, sacou ? Ela ainda não deve ter conseguido chegar na estação.

MARCELA – Mas Fabiana não quer nada por agora, ela está atormentada.

Guto paralisa por um instante.

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CENA 08/SÃO PAULO/BIXIGA/APARTAMENTO DE JOSÉ/INTERIOR/SALA DE ESTAR/NOITE ANTERIOR

Fabiana e Guto se beijam apaixonadamente, ela está em cima dele no sofá, quando sorridente, deixa o corpo escorregar e cair sobre o chão. Põe a mão na cabeça.

GUTO – Que foi, princesa, por que parou ? Não estava bom ?

FABIANA – A gente precisa se afastar, Guto, para o nosso bem.

GUTO – O que é que você está falando ?

Ele passa as mãos nas costas dela, acariciando e ela dá um salto de dor.

GUTO – Eita, o que foi isso ?

Ele vê marcas nas costas dela. Fabiana percebe e tenta disfarçar.

FABIANA – Nada, só me beija forte, me beija enquanto podemos.

E ele se deixa levar pelo canto da garota.

DESLIGAR FLASHBACK

MARCELA – Você realmente vive com as cabeças nas nuvens, isso não é de hoje, dá para ver na sua cara que você curte uma droguinha…
GUTO – Foi mal, tia. Mas é que você falou em atormentar e eu me lembrei das marcas.

MARCELA – Que marcas ?

GUTO – No corpo da minha princesa, ontem a noite. Ela estava com dor.

MARCELA – Como assim ?

GUTO – Alguma coisa aconteceu, Marcela. A gente tava bem, de repente ela me bloqueou. Cara, eu preciso entender essa parada… tá muito sinistra.

E saiu desatando, Marcela não conseguiu alcançá-lo.

MARCELA – Guto, GUTO!

CENA 09/SÃO PAULO/TATUAPÉ/UNIVERSIDADE OLIMPIUS/PRÉDIO ADMINSITRATIVO/REITORIA/MANHÃ

Mateus chega em sua sala.

DANIELA – Dr. Mateus, os americanos estão perguntando para o senhor se tudo bem mantermos a reunião para hoje na hora do almoço, DR. MATEUS! DR. MATEUS!

Mas ele a ignora e bate a porta do seu escritório na cara da secretária.

Mateus senta em sua cadeira giratória e respira fundo, esmurrando a mesa.

MATEUS (V.O.) – Aquela franga quatro olhos! Primeiro seu noivo e agora Goram! Quem mais aquela desgraçada ia seduzir! Ele realmente não entendia como aqueles homens pagavam pau para aquela sem sal. Deveria ter dado um tiro naqueles miolos.

Cortar para:

CENA 10/SÃO PAULO/TATUAPÉ/CAMPUS UNIVERSITARIO OLIMPIUS/AMBULATÓRIO PSIQUIATRA/ SALA DOS PROCEDIMENTOS/MANHà

Quiteria acorda com um raio de sol que invade sua face pelo vidro da porta. Ainda sonolenta, percebe a presença de uma enfermeira.

ENFERMEIRA – Dormiu bem?

QUITÉRIA- Um pouco de dor nas costas por conta da maca.  Ocorreu tudo bem com a curetagem?

ENFERMEIRA – Seu utero demorou para contrair, os doutores da Obstétrica ficaram com receio de ter perfurado. Mas foi só um susto.

QUITERIA – E Dr Boina, onde ele está?

ENFERMEIRA – Ainda não chegou, hoje ele só vem durante a tarde, mas te desejou uma mensagem de carinho, ele te quer ver muito bem.

QUITERIA – Puxa, queria vê-lo, agradecer o que fez por mim. Eu nunca vou esquecer, ele salvou minha vida…

CENA 11/SÃO PAULO/TATUAPÉ/UNIVERSIDADE OLYMPUS/RESTAURANTE UNIVERSITÁRIO/INTERIOR/MANHÃ

GORAM – Pode ver mais um, por Tupã ?

Goram pega um pão com queijo para você e para Heloísa. Ele se senta junto a mesa com Heloísa, Suzy e Vitor.

GORAM – Kó Bé está, Goram espera que Heloísa fique calma.

HELOÍSA – Obrigada, amor.

VITOR – Fica tranquilo, Goram. Depois daquela manifestação indígena, não tem como. Acho um barato como esses povos originários possuem uma forte ligação com a natureza. Vocês viram a quantidade de instrumentos musicais feitos com materiais simples.

SUZY – Cara, a maioria é feito com material reciclável. Acho uma puta injustiça esse papo que eles se aproveitam das florestas para comercializar tudo que podem, que são exploradores tão quanto, porém, ao denunciarem os impactos ambientais são inimigos do desenvolvimento econômico.

GORAM – Não há como ter desenvolvimento econômico sem ter um olhar sustentável, senão, tudo caminha para o fim. Nosso povo é guerreiro, defende a ka’a, defende até os homens brancos das próprias enrascadas com o futuro do planeta que eles se metem. Porque poluir o rio com mercúrio, é contaminar os peixes, alimentos para muitas espécies, inclusive a humana.

HELOÍSA – Magnificação trófica!

SUZY – Quê ?

HELOÍSA (rindo) – Você não se lembra do cursinho ?

SUZY – Helô, do cursinho eu só quero uma coisa: esquecer. Foi uma fase pauleira da minha vida.

GORAM – Mas Goram fica muito feliz de ver Heloísa oryb de novo.

VITOR – Por que o que aconteceu, galera, tô por fora.

SUZY – Essa danada nos pregar uma peça e fugir que nem uma condenada.

HELOÍSA – Ai amiga, não fale assim.

SUZY – Mas meu, isso é verdade, você não pode fugir desse jeito toda vez que passar por uma situação que te aflinge, você deixa todo mundo de cabelo em pé.

DANDARA – Aff, que papo mais de gente velha e conservadora.

VITOR – Fala aí Dandara!

NARA – E ai galerinha, mais tarde, no almoço, vamos fazer um pouco de Rita Lee no palquinho, estão convidados.

GORAM – Puxa Goram, adoraria ir, mas vou ter a’ang na UBS.

NARA – Medicina da Família, né? Esqueci que vocês do primeiro semestre rodam nisso, Quem é seu professor ?

GORAM – Adilson.

NARA – Ah, é suave. Foi o meu. Ele avalia se você sabe os princípios do SUS e a integralidade do paciente. Como você o trata, é bem bacana.

HELOÍSA – Menos mal.

NARA – Bom, boa prova, pessoal. Fica para uma próxima então.

Dandara e Nara saem. Fabiana chega ofegante.

FABIANA – Nossa, achei que fosse perder o café.

SUZY – Essa aí é outra que sumiu e preocupou meio mundo também.

Fabiana faz uma cara para ela de chateação. mostrando a língua.

SUZY – Tu tá bem, nega?

FABIANA – Tô sim, tia. Eu acabei de voltar do postinho, fiz a prova de Kátia. Nossa , foi ridícula, se eu soubesse que seria isso. iria ter proposto fazer em casa.

VITOR – Por quê ?

FABIANA – Por que não foi prova oral, foi escrita, um questionário extremamente subjetivo, sobre a importância do sus para gente, diferença de um paciente para um cliente. O que eu pensava sobre tentativas do governo federal de cortar recursos para a saúde mental. Negar vacina. Achei extremamente importante e pertinente fazer essa reflexão num curso elitista como o nosso, mas teve até consulta, não precisava fazer apertado numa salinha na UBS.

Goram sente seu celular vibrar, ele vê um zap de Rita

Hoje à tarde estarei irei na psicoterapia, perto da praça do pôr-do-sol, me encontre lá. Quero te ver.

Goram sorriu e respondeu com um ok. Suzy percebeu a animação. Close em seu rosto desconfiado.

CENA 12/SÃO PAULO/TATUAPÉ/HOSPITAL ORLANDO MOÇA/ENFERMARIA DE ORTOPEDIA/MANHÃ

André com ajuda dos enfermeiros desce para cadeira de rodas. Suas costelas ainda doíam muito.

MEIRE – A Dra. Rita deixou prescrito cetoprofeno, se dor, o mais importante é repouso absoluto, evitando se movimentar muito, você pode frequentar o colégio, embora haja um atestado aqui para duas semanas, o mais importante é evitar grandes esforços.

André estava cabisbaixo.

ANDRÉ – Obrigado.

MEIRE – A fisioterapia deve te visitar nessas semanas para alguns exercícios. Seu retorno com a gente é em 15 dias.

Sua mãe chega ao quarto, seus olhos estavam marejados.

ANDRÉ – Puxa, Dona Eleonor, achei que não viesse para minha alta.

ELEONOR – Me atrasei um pouco, vamos para casa. O Uber está nos esperando.

Meire sorriu

CORTAR PARA :

CENA 13/SÃO PAULO/PENHA/CASA DE ANDRÉ/INTERIOR/MANHÃ

Eleonor agradece ao motorista que empurrava a cadeira de rodas de André.
ELEONOR – Obrigada, mas acho que agora nos viramos bem.

O homem vai embora. Ela fecha a porta.

ANDRÉ (gira as rodas da cadeira) – Nossa, eu não aguentava mais aquele hospital, nem acredito que…

Close na moleira quebrada. Instrumental explosivo.

ANDRÉ – O que aconteceu aqui ?

ELEONOR – Eu é que te pergunto, garoto. O QUE ACONTECEU COM OS QUASE MIL REAIS QUE ESTAVAM NA MOLEIRA ?

Instrumental faiscante. Close no rosto de André encurralado.

CENA 14/SÃO PAULO/TATUAPÉ/PENSÃO ESTUDANTES/INTERIOR/CORREDOR/MANHÃ

Rita olha para os lados tentando se equilibrar em seu salto alto número 15. E com jeito abre o quarto de Dona Noz-Moscada.

Ela entra de fininho e fecha a porta.

RITA – Bom, ninguém me viu entrar e também ninguém virá sair.

SALA DE ESTAR

Ela olha para o ar-condicionado bem em sua frente. Era um modelo velho, estava ligado e rangendo muito.

RITA – É amigo, você está precisando de uma boa limpeza, mas fica tranquilo que depois vemos isso, agora preciso encontrar alguma coisa que explique os sintomas : Dissociação ideo-afetiva, perda de visão súbita bilateral

COZINHA

Ela percebe que o teto também não havia sido limpo há tempos. Havia marcas de bolor impregnado.

RITA – É, percebemos que medidas de higiene passam longe por aqui há um bom tempo.

Ela sente nojo ao ver uma larva saindo de uma maçã já em estado de putrefação na fruteira. Produtos com validade vencida há meses estavam dispostos na bancada da pia.

Então constata que o bolor se estendia para uma parede onde nitidamente estava ocorrendo um vazamento. Ela se encaminha para o cômodo que se encontra atrás e percebemos se tratar de um banheiro.

BANHEIRO

Com exceção da banheira no centro, todo o resto do local, encontrava-se infestado de teias de aranhas, algumas grossas. O Bolor se estendia para parte do espelho. Mas o que mais chamou atenção de Rita nem foi a imundice, mas sim a quantidade de plantas ornamentais de todos os tipos que a velhaca possuía. Eram inúmeras e todas estavam quase que empilhadas umas sobre as outras, amontoadas.

RITA – Artemísia! SANTO DAIME! Será que essa veia está se intoxicando com essas plantas ? Ai!

Uma goteira no teto libera alguns pingos que caem sobre sua face.

Neste instante seu celular toca estridente. Era Meire.

INÍCIO DO DIÁLOGO SIMULT NEO

Enquanto Rita já com luvas, mexia nas plantas, conversava.

RITA – Alô, Meire querida, alguma novidade sobre o caso ?

CORTAR PARA:
CENA 15/SÃO PAULO/TATUAPÉ/HOSPITAL ORLANDO MOÇA/ENFERMARIA DE NEUROLOGIA/MANHÃ

INÍCIO DE INSTRUMENTAL EXPLOSIVO.

Meire olhava preocupada para Dona Noz-Moscada junto com Caio. Lentamente a CAM vira e revela a velhaca sangrando por todos os orifícios da face : nariz, boca e ouvido de forma descontrolante.

MEIRE – Ela está sangrando por todos os lugares que você possa imaginar.

VOLTAR PARA:

Close em DESESPERO na face de Rita.

CENA 16/SÃO PAULO/PENHA/CASA DE ANDRÉ/INTERIOR/MANHÃ

ELEONOR – Vamos André, eu estou esperando uma resposta. Onde está o dinheiro ?

André tenta disfarçar.

ANDRÉ – Eu não sei, mãe.

ELEONOR – Ah, você não sabe ? O Dinheiro sumiu sozinho ? Ninguém entrou aqui André. Não minta para mim.

O garoto abaixou a cabeça, envergonhado.

ELEONOR – Puxa vida, eu sempre dei tão duro para te criar, fiz tripas coração, me desdobrando como dona-de-casa e fazendo meus corres para te dar um futuro e é assim que você me retribuiu, roubando-me ?

André balbucia.

ANDRÉ – Eu não quis te roubar, mãe.
ELEONOR – Ah não. Então o que foi que você fez ? Isso se chama furto, André. Furto!

ANDRÉ – Eu sei.

ELEONOR – Se sabe, por que você fez isso comigo ?

ANDRÉ – Eu queria comprar um shape para academia. Comecei a malhar e eu não tinha dinheiro para aqueles suplementos caros.

ELEONOR- A mesma academia que te deixou desse jeito. Você não é filhinho de papai, não, como muitos naquela universidade. Você não pode se dar a esses caprichos, você precisa focar, meter a cara nos estudos para um dia poder ter tudo isso.

ANDRÉ – Eu sei, mãe. Me perdoa.

ELEONOR – Mil reais, André. Um shape de academia não pode custar tudo isso !

ANDRÉ – Eu comprei vários potes e algumas cápsulas.

Ela ficou estacada.

ELEONOR – VOCÊ GASTOU TODO O DINHEIRO ?

André abaixou a cabeça novamente em silêncio.

ELEONOR – Esse dinheiro eu demorei anos para juntar, era para uma emergência.

Ele nada respondeu.

ELEONOR – Se algo me acontecer, te acontecer, não teremos como ficar. COMO VOCÊ PODE SER TÃO IRRESPONSÁVEL ?

André não sabia como responder. Ali, naquela cadeira de rodas, estava dividido entre o sentimento de traição que sentia por ter feito aquilo com sua mãe e o desejo por mudança para que Romeu lhe notasse. MOSTRAR TUDO ISSO COM FLASHES RÁPIDOS DE ANDRÉ OBSERVANDO O RAPAZ.

CENA 17/SÃO PAULO/HOSPITAL ORLANDO MOÇA/LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS/TARDE

Rita entrega um plástico com a folha de uma planta para uma técnica.
RITA – Esse é o último. Qualquer novidade você me avisa.

RADIOLOGIA

EXTERNO

Rita avista Meire e Caio entrando na sala de Ressonância Magnética, quando uma paciente a xinga.
SENHORA – Mas esse mundo tá perdido mesmo, agora temos um traveco vestida de médica!

Rita se estaca. Instrumental explosivo. O casal se entreolha. Ela vira lentamente, deixando o cabelo se espalhar pelas costas. Encara a velhaca.

RITA – O que a senhora disse ?

SENHORA – É um absurdo um hospital desse porte permitir uma baixaria como essa !

RITA – Baixaria são pessoas como você que ficaram paradas no tempo, são movidas por ódio, preconceito, só abre essa boca comida pelo tempo para falar merda. Para início de conversa não me identifico como travesti, embora seja nítido que a senhora não saiba nem o que isso significa, sou uma dragqueen! E minha identidade é fluída! Absurdo é ver pessoas que dependem de nosso trabalho, ignorantes nos humilhando.

SENHORA – Dependo, dependo sim, por que eu pago convênio! Um dos mais caros deste país!

RITA – Bradesco?

SENHORA – Exatamente!

RITA – Pois veja bem quanto você contribui para o salário de um médico.
Rita abriu seu bloco de notas e teceu a fazer umas contas rápidas. Caio e Meire amaram a iniciativa, muitas pessoas apoiaram com sorriso a ideia, a velhaca foi se desfalecendo.

RITA – Aqui, sua maldita! O quanto você paga por mês não corresponde a 0,000017 do nosso salário.

E atirou o pedaço de papel sobre a anciã.

SENHORA – Vou denunciar você na delegacia do idoso!

RITA – Pode ir, vou usar as câmeras no Tribunal quando lhe meter um processo por agressão verbal!

A senhora ficou sem responder. Todos bateram palma para médica.

INTERIOR
Rita bateu a porta da sala da ressonância magnética.
MEIRE – Chefe, você foi MARAVILHOSA!

RITA – Que criatura asquerosa e ainda tem a coragem de vociferar algo assim! Pôs mostrei a ela o seu lugar!

CAIO – Foi demais!

RITA – E como está Dona Noz-Moscada ?

MEIRE – Acabou de ser sedada. Estamos colocando ela na ressonância.

RITA – Maravilha. Espero que tenhamos algum achado. Todos esses sinais evidenciam algo de acometimento de sistema nervoso central alto! Sobretudo próximo a região do nervo óptico. Vamos pedir para…

DE REPENTE UM ESTRONDO FAZ O TÉCNICO DISPARAR.

Eles correm para sala técnica.

SALA TÉCNICA

Instrumental suspense.

RITA – O que foi? O que aconteceu ?

TÉCNICO – Ela tinha uma prótese metálica na arcada dentária!

Rita levou a mão na cabeça nervosa. Meire pôs o marido na parede.

MEIRE – Caio, você não verificou no histórico dela se ela tinha prótese metálica antes de autorizar a ressonância?

Ele ficou gago.

TÉCNICO – Dra, eu vou chamar o Físico Médico para dar uma olhada!

RITA – Eu não acredito nisso, a direção do hospital vai me matar!

Caio estremecia sob o olhar desesperador de Meire.

CENA 18/SÃO PAULO/VISTA AÉREA

Ligar música Pacato Cidadão do Skank

Vemos vários takes da cidade. Liberdade e seus restaurantes orientais, com luminárias dentro de elipses com símbolos suspensas nas entradas. Depois vemos o minhocão com várias famílias dentro de tendas sob o elevado João Goulart. Na Barra Funda, vamos linhas de trem chegando no Terminal ligando pontos da cidade. Vai chegando próximo ao entardecer…

CENA 19/SÃO PAULO/VILA MADALENA/PRAÇA PÔR-DO-SOL/ TARDE

Suzy caminha correndo com Heloísa até o consultório de Leopoldina.
SUZY – Já estamos atrasadas!

HELOÍSA – Amiga, você tem certeza que quer ceder minha consulta para mim hoje? Eu não tenho como pagar!

SUZY – Fica tranquila. Eu pago, depois você acertar comigo.

Elas chegam na casa amarela e desatam a ressoar a campainha : Dim Dom!

Ligar campainha com cena próxima

CENA 20/SÃO PAULO/CENTRO/APARTAMENTO DE ARAPONGA/TARDE

BERNARDO – Eles chegaram!

Bernardo abre a porta ansiosamente. Vemos no fundo Araponga preparando alguns doces.

Vemos que se trata de Alexandre e José. O Vilão fecha a porta.

BERNARDO – Bom, agora que estamos todos aqui, eu preciso deixá-los a par de uma presença que retornou de longe para nos infernizar e precisamos pôr um fim neste ser pelo bom de todos.

ALEXANDRE – Você está se referindo aquele velho do Akiko, se for, eu…

BERNARDO – Antes fosse aquele velho cheio de costas quentes, mas aquele lá está controlado, eu me refiro a Giovani!

Os olhos dos dois homens se arregalaram.

JOSÉ – O herdeiro caçula dos…

BERNARDO – Exatamente! Ele está de volta a São Paulo e já descobriu tudo. Ele quer vingança de todos até mesmo do próprio irmão. Nós precisamos agir o quanto antes, na primeira oportunidade, para enterrar essa história de vez, em definitivo.

Close alternado. Alexandre convicto. José amedrontado. Araponga esperançosa.Bernardo em fúria.

CENA 21/SÃO PAULO/TATUAPÉ/UNIVERSIDADE OLYMPUS/QUADRA DE BASQUETE/INTERIOR/TARDE

Fabiana treina sozinha fazendo alguns arremessos quando percebe alguém se aproximando. Ela se vira. Era Guto.

GUTO – Finalmente te achei, guria.

Fabiana largou a bola e tentou desconversar, saindo do local.

FABIANA – Por favor, Guto, já te pedi para…

GUTO – Por que você não me contou sobre suas marcas do corpo?

Instrumental explosivo. Ela gelou. Voltou-se para ele.

CENA 22/SÃO PAULO/VILA MADALENA/PRAÇA PÔR-DO-SOL/CONSULTÓRIO LEOPOLDINA/ INTERIOR

SUZY – Nossa que calor, até mesmo com esse ventilador, estou pingando.

SECRETARIA – Nem me fala, menina. Estas ondas de calor estão me matando. São Paulo com sensação térmica de quarenta graus?

SUZY – A conta de séculos de emissão de gás carbônico está chegando… Mas vem cá, me deu uma vontade de tomar um picolé. Você conhece algum lugar por aqui?

SECRETARIA – Tem um carrinho vermelho ainda neste quarteirão na praça do Pôr do Sol. Eles vendem direto da fábrica, então o preço é bem em conta.

SUZY – Ah, fechou. Então vou dar um pulo lá. Se a Heloísa sair, diz para ela me aguardar.

SECRETARIA – Pode deixar.

CORTAR PARA:

CENA 23/SÃO PAULO/VILA MADALENA/PRAÇA PÔR-DO-SOL/CARRO DE RITA

Rita rouba o último beijo de Goram e se joga no banco do lado do indígena.

RITA – Nossa, como eu tava com saudade dos seus lábios.

GORAM – Égua mãe! Goram também.

RITA – Aí, meu amor, depois daquele incidente na ressonância de hoje, só você para me salvar…

Goram ri.

GORAM – Goram não entende como atangã fazer isso.

RITA – É que o prontuário dela estava bem simplificado mesmo e Caio não conseguiu contatar bem com ela por conta do estado mental dela. Ele achou que não havia problema.

GORAM – A coruja rabujenta ficou então sem sua dentadura de ferro?

Rita balançou a cabeça gargalhando e eles se envolveram novamente num amasso sem fim. Instrumental explosivo. A face de Rita se transformou em choque com o que estava vendo pelo vidro do carro. Goram percebeu instante depois .

GORAM – SUZY!

Ele vestiu a camisa e abriu a porta do carro. A garota estava passada.

SUZY – Então era verdade, Goram, as minhas desconfianças! Você e a Doutora Rita, vocês dois estão tendo um caso!

Rita saiu do carro envergonhada.

SUZY – Que horror, Goram, você está traindo a Helô!

Congela no rosto assustado dele.

Continua….

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