Jade acordou no hospital, totalmente entubada. Seu pescoço estava imobilizado, e ela só podia mexer os olhos. Tentou ver algo além do teto branco, mas não conseguia movimentar nada.

Lucas apareceu no campo de visão dela. Deu um sorriso esperançoso e seus olhos castanhos brilharam ao ver a esposa. Ele disse que ela não poderia falar durante um tempo. Que os médicos fizeram uma cirurgia para reparar os músculos e as cordas vocais. Por fim, ele contou que ela precisava passar algumas semanas em tratamento para recuperar a voz. Naquele instante, ela estava muda. Tinha sorte de ter escapado com vida.

Ele percebeu quando os olhos claros da mulher se encheram de lágrimas. Tocou na mão dela e tentou consolá-la.

– Nós vamos vencer tudo isso meu amor. Nós vamos vencer. Você não tá sozinha. Eu e o Cícero estamos aqui pra te proteger – com um sorriso entre lágrimas.

Não passava de meio-dia quando Lucas deixou o hospital totalmente anestesiado. Não conseguia pensar claramente. Dirigiu para casa e estacionou em frente ao imóvel. Olhou por alguns minutos a fachada daquele lugar e a única coisa que conseguia lembrar era de quando ele e Jade entraram a primeira vez ali.

Era uma manhã linda e um vento reconfortante abraçava os caminhantes que passavam por perto. Lucas estava empolgado, ele pulou do carro e ajudou Jade a descer em seguida. Ela estava com sete meses e sua barriga estava enorme. Andava com muita dificuldade.

O tio Ximenes ia adiante, enquanto o casal seguia-o admirando a vizinhança. Jade estava incomodada em viver na casa que pertencia à sua sogra, a histriônica Marieta. Ela acreditava que de alguma forma, a mulher poderia interferir na vida deles, mas ficou surpresa quando viu que suas impressões eram falsas. Marieta quase que não os visitava. Era discreta e mantinha a liberdade do casal.

Lucas não via problema em morar em uma das casas desocupadas de sua mãe. Ele ainda não podia pagar um aluguel, e seus planos futuros era de financiar um imóvel. Em dois anos ele conseguiria juntar uma grana e dar entrada em um apartamento. Mas por hora, aquele lugar estava valendo. E como estava.

Os três entraram na casa e caminharam pela sala ampla. Alguns móveis estavam fora do lugar. Um sofá cor de chumbo e uma mesa de centro amarela. O lugar cheirava a mofo, e as paredes estavam descascando. O tio Ximenes disse que o lugar precisava de alguns reparos, mas que seriam coisas simples.

Conheceram a cozinha, com armários de madeira por todas as paredes, um balcão negro de mármore e uma mesa com oito lugares. Tio Ximenes abriu a porta que dava para o quintal e mostrou a churrasqueira e a piscina.

– Essa casa é maravilhosa. Vocês cabem direitim aqui dentro – disse o tio, empolgado.

Quando voltaram para a cozinha, Lucas deu um pulo, assustado com um rato que passou voado por seus pés. O roedor dava voltas pelo cômodo, e os dois homens pululavam com medo. Somente Jade observava a cena achando tudo muito engraçado. Ela foi cruel quando segurou um cabo de vassoura, e num golpe certeiro, esmagou o bicho. Lucas e tio Ximenes apenas observavam a mulher segurando o cabo da vassoura e dominando o monstro.

– Ela é incrível, né tio? – Lucas perguntou, ainda ofegante.

– Cê é louco! Essas mulheres de hoje em dia são umas mutantes!

Dentro do carro, observando a casa, Lucas sorriu novamente ao lembrar desse dia. Pensava em Jade feliz andando pela cozinha. Em quando Cícero nasceu e falou “mamá” e “papá” a primeira vez. Queria que tudo fosse perfeito como naqueles dias. Tinha ódio do que aconteceu com Jade. Ódio de quem fez aquilo com ela. Mas não podia mudar o passado. Viveria um dia de cada vez. Esperando na recuperação de sua esposa.

 

 

EPISÓDIO: “CONSERTE A PORTA”

 

 

Ao entrar em casa, Lucas foi recebido por sua mãe, dona Marieta. A mulher de meia idade, tinha um perfume forte que anunciava sua presença à distância. Ela usava um terno de cor pastel que combinava com a calça da mesma cor. Quando abraçou Lucas, suas unhas enormes cravaram nas costas dele.

– Meu lindinho, a mamãe ficou tão angustiada quando soube do ataque. Eu vim correndo de São Paulo pra cá. Você tá bem? – ela perguntou, falando de uma forma afetada, balançando a cabeça de um lado para o outro ao final de cada palavra.

– Tô bem sim. Agradeço por ficar com o Cícero.

Falando no Cícero, ela correu até a cozinha, aonde o bebê estava comendo papa. Sentou-se diante dele e deu mais uma colherada na boquinha do pequeno.

Lucas abriu a geladeira e retirou uma jarra com suco de laranja. Ele encheu um copo e tomou um gole. Precisava de algo mais forte, pensou. Foi até o armário, na parte de baixo, e atrás de algumas panelas de inox, retirou uma garrafa de vodca que estava pela metade. Preencheu o resto do copo com a bebida, e após misturar com o dedo, tomou um gole generoso. Aquilo descia como um néctar dos deuses. Revirou os olhos com o prazer que sentiu. Suas pálpebras tremiam com aquela sensação. Queria esquecer muito do que aconteceu nos últimos dias.

– Meu filho, me conte o que aconteceu. O que foi que a Jade fez pra aquela mulher tentar lhe matar?

– Também não sei minha mãe. Também não sei. O que eu sei, era que a Jade tava tentando ajudar elas lá. Toda semana ela visitava a cadeia, levava coisas pra elas, ajudava no que podia. Eu não sei por que a mulher lá, teria motivos pra matá-la.

– Por que a Jade quer ajudar essas mulheres? Nove anos na cadeia, e o que ela ainda quer nesse lugar? Você conversou com ela? Tentou fazer com que ela desistisse dessas ideias? – ela falou como se aquilo fosse um absurdo.

– A Jade é bem grandinha minha mãe. Ela sabe o que quer e não seria eu a mudar a opinião dela – ele falou, tomando mais um gole de suco misturado com vodca.

– Você como homem deveria ter proibido ela de se meter com essa gente. Ta aí o resultado meu filho. Ela agora no hospital, com problema na voz. E você aí feito besta. Sabe que hoje você poderia estar viúvo e seu filho órfão? Tanta coisa pra se fazer na vida, e a Jade tinha que tá metida dentro da cadeia! Põe juízo nessa sua cabeça e põe juízo na cabecinha dela também. Nada de tá metida em prisão, nada de tá defendendo bandido. Quando a gente defende bandido, acontece isso: eles tentam matar a gente. Então, vê se vocês mudam o sistema tá!

Lucas não sabia explicar o que sentia em relação a dona Marieta. Ele só sabia que não queria ouví-la de forma alguma. Ela, que era a dona de uma das empresas de cosméticos mais prósperas de Pernambuco, achava que sabia conduzir a vida de todos ao redor. Isso, era o que corroía ele. Ela continuava tentando conduzir a sua vida. O que ele não precisava que ela fizesse. Marieta tinha que entender que Lucas não era mais seu bebezinho. Que ele agora era esposo e pai, e que precisava cuidar de sua família sozinho.

**
Ele subiu as escadas no corredor de paredes cinzas, e entrou no quarto de casal. A cama estava desarrumada, com os lençóis espalhados e um deles tocando o chão. Ele abriu a cortina, que iluminou todo o ambiente. Encostou no berço de Cícero que estava atrás dele, e pisou em um pato de borracha, brinquedinho do nenê. Ainda segurando o copo com suco, abriu a porta do guarda-roupa na parte de cima e, ficando na ponta dos pés, esticou os braços para pegar algo no fundo. Puxou uma caixa de papelão grande e pôs no chão, ao pé da cama.

Retirou um álbum de fotografias. Tinha saudades dos tempos que se revelavam as fotos e guardava-as em álbuns. Ele ainda era dessa época. Agora tudo era online. Tudo ficava na nuvem. As coisas pareciam mais abstratas. Antigamente as coisas eram mais concretas, mais firmes. Ele queria sentir-se assim, mais firme.

Olhou algumas fotos e viu Jade nelas. Eles estavam sorrindo, era o dia do casamento. Ela estava tão linda. Tinha um brilho no olhar tão intenso. E ele, parecia tão confiante. Ele ficava mais alto quando usava terno. Isso lhe dava uma aura de confiança, de força. Lucas sorriu vendo as fotos.

Depois abriu outro álbum com as fotos particulares de Jade. Muitas fotos de sítios arqueológicos, os chamados sambaquis do litoral. Tinha foto de pedras, artefatos, facas antigas, ossadas. Em outras, Jade aparece abraçada com um homem alto, forte e loiro. Ele parece corajoso. Ele aparece em outras fotos, sempre carregando facas e instrumentos de escavação. Em uma foto, Jade e o homem loiro parecem comemorar algo, ela está sorrindo para o bonitão com o mesmo sorriso que deu no casamento. Lucas fechou o álbum de forma brusca. Levantou-se tomando mais um gole de vodca e chutou a caixa que estava no seu caminho. Viu de relance uma pasta embaixo da cama, agachou e puxou-a.

A pasta era de Jade. Ele abriu e observou várias assinaturas. No cabeçalho, viu do que se tratava: era uma petição para abrir uma auditoria contra o Presídio de Abreu e Lima. Observou a caligrafia das mulheres e leu na última linha o nome de Olívia Costa Soares. Fora ela que tentou matar Jade. Ela que usou a mão para assinar a petição, usou a mesma mão para perfurar o pescoço da sua esposa.

Lucas desceu parecendo ainda mais chateado. Quando chegou à sala, a campainha tocou estridente. Um homem alto, barbudo e olhar bobo, estava diante dele. Lucas achou estranho.

– Dona Marieta pediu um serviço. Um conserto de uma porta. – disse o homem lendo um papel na prancheta.

– Não estamos precisando de nenhum conserto. Eu mesmo vou consertar a porta.

– Bem, ela ligou pedindo o serviço.

Marieta aparece empurrando Lucas para o lado.

– Deixe o homem entrar. Eu pedi que ele viesse consertar a porta do quintal – ela falou de forma efusiva, como se ocupasse um espaço maior que o seu corpo.

– Mãe, eu posso fazer isso. Não precisava – ralhou Lucas.

– Você? Consertando a porta? Você não sabe fazer isso! Pode entrar meu bem – dirigindo-se ao homem.

O homem entrou desconfiado, e sendo guiado por Marieta, caminhou até a cozinha. Lucas apenas observou e balançou a cabeça, parecendo frustrado.

**
Passava de meio-dia quando Bruno estacionou seu carro em frente à casa de Lucas. Bruno era amigo do casal, e há seis meses tinha sido aprovado na ordem, recebendo a habilitação para advogar. Ele era um homem branco de cabelo desgrenhado. Gostava de sorrir sedutor e tinha uma covinha no queixo que lhe dava uma aparente ingenuidade. Apesar da pouca idade, Bruno era um jovem extremamente inteligente.

Carregando uma bolsa repleta de toalhas, produtos de higiene e outras coisas mais, Lucas entrou no carro do amigo e apertou firmemente a mão dele.

– Firmeza? – Bruno perguntou, tentando ler as microexpressões de Lucas.

– Tô de boas. Mantendo a sanidade.

Bruno ligou o motor da máquina e dirigiu em direção ao Presídio Feminino de Abreu e Lima. O dia estava quente e o trânsito engarrafado.

– E aí, o que o médico disse sobre a voz dela? Ela vai voltar a falar normalmente? – Bruno perguntou, mascando um chiclete de menta.

– Ela vai falar normalmente sim. A cirurgia que reparou as cordas vocais foi um sucesso. Ela só vai ter que fazer um tratamento durante alguns meses, e não vai poder sair do hospital antes disso.

– Tá dizendo que sua mulher vai ficar fora durante meses?

– Sim. Infelizmente. Vou ter que me virar sozinho.

– Isso é uma droga.

– Eu queria ao menos saber por qual motivo aquela mulher fez isso? Entender por que tanta violência.

– Eu falei com o Defensor Público que está com o caso dela. Ele disse que a Olívia não quer falar com ninguém – explicou Bruno.

– Como ela pode ter defensor, depois de tudo?

– É só uma questão burocrática. Ela foi presa em flagrante e já cumpria pena por contrabando de medicamentos. Agora vai responder por homicídio triplamente qualificado, ou melhor, tentativa de homicídio. O defensor queria argumentar que houve lesão corporal, mas ela acertou o bisturi pra matar. A intenção de matar foi bem clara.

– Quantos anos ela pode pegar?

– Ela usou meio cruel, possivelmente um motivo torpe e atacou por trás dificultando a defesa. Além de usar arma branca dentro da cadeia. No mínimo uns 20 anos.

– Ela não vai ficar 20 anos. No mínimo uns 5 anos. Depois a justiça vai cuspir ela nas ruas novamente – Lucas, disse apertando a alça da bolsa com raiva.

Passaram por uma loja de eletrodomésticos, e viram na calçada um pinguim de plástico que se movia freneticamente. Acima da sua cabeça, uma faixa avisava sobre liquidação de geladeiras. Bruno observou aquilo e deu uma risada.

– O que foi? – Lucas perguntou, curioso.

– Lembrei de uma reportagem ontem que assisti no Globo Repórter – Bruno disse olhando para o pinguim.

Lucas balançou a cabeça sem entender e aguardando o amigo continuar a história.

– É que a reportagem era sobre os pinguins. Você sabia que eles são chamados de “os animais que amam de verdade?”. Eles escolhem uma companheira, acasalam, e não deixam as mulheres nunca mais. São fiéis pra toda vida. Daí, eles passam um bom tempo longe das companheiras, mas depois quando retornam pro lar, eles ficam com a mesma fêmea, sem nem olhar pra mais ninguém, sabia disso?

– Interessante.

– E com os filhotes! Eles dividem os cuidados com as fêmeas. Em alguns períodos eles saem pra conseguir o alimento. Mas em outras épocas, são as fêmeas que fazem isso. Interessante, não?

 

– Demais. Mas qual a moral da história? – Lucas perguntou, observando uma motocicleta que passava apressada por eles.

– É que eu vi o pinguim ali na loja e lembrei disso. Lembrei do Jorginho.

Lucas olhou para ele com os olhos atentos, como que aguardando algo mais.

– O que acontece? – Lucas perguntou.

– Você nem vai acreditar.

– Conta logo!

– O Jorginho terminou com a Claudia.

– O quê? – Lucas gritou espantado.

– Pois é! Duraram duas semanas somente.

– Eu tô chocado! O que aconteceu? Que diabos o Jorginho fez?

– Então, eu comentei com meu mozão que os dois não iriam aguentar muito tempo, mas não imaginei que fosse tão pouco tempo.

– A Jade disse a mesma coisa. Mas eu achei que ele fosse sustentar o relacionamento. Os dois, melhor dizendo. O que houve?

– Tudo culpa do Jorginho.

– Ele traiu ela!

– Exatamente! Por isso tava falando dos pinguins. Bem que a gente devia fazer estágio com a bosta desses pinguins.

– Caramba! Como o Jorginho pode ser tão vacilão! – reclamou Lucas.

– Foi pra festa da empresa. Ficou com a gata, e as amigas postaram tudo no insta!

– Que merda! Ela perdoou ele?

– Que nada! Não é toda mulher que perdoa traição não, filho. É por isso que eu digo irmão! Sustenta o negócio. Cuida do moleque e espera na esposa. É melhor não arriscar.

Lucas fica pensativo.

**
Quando Lucas e Bruno chegaram ao Presídio, já passava das 15 horas. Eles tinham uma reunião marcada com Babemco, o diretor do lugar, mas, souberam que o homem estava no pátio, acompanhado de um investigador.

Após passarem pela revista, Lucas e Bruno seguiram para o pátio de recreação. Quando chegaram, Babemco estava se despedindo do investigador da Polícia Civil. Ele pediu que os dois se aproximassem.

– Desculpe não poder atendê-los na minha sala, mas é que a polícia queria ver o local do crime, e eu tive que acompanhar – disse Babemco, enxugando o suor do buço, com uma toalhinha que retirou do bolso do paletó.

– Tudo bem, podemos falar sobre o acordo? – Bruno perguntou, sem passar firmeza na voz. Ele parecia um pouco intimidado com a presença de Babemco.

– Mas, é claro meu filho. Podemos falar agora mesmo sobre o acordo.

Lucas observava o local de forma investigativa. Ainda havia manchas de sangue no chão do pátio.

– Como não queremos abrir nenhum processo administrativo com o objetivo de indenização. Achamos mais prudente fechar o acordo extrajudicial com o senhor e pedir a homologação do juiz. O valor que queremos é aproximadamente cem mil. O que o senhor acha?

– Acho justo! E ele? – Babemco perguntou, apontando para Lucas, que no momento não parava de observar tudo ao redor.

– Lucas? Você tá escutando? – Bruno perguntou, mexendo no braço do amigo.

Lucas lembrou da assinatura de Olívia na petição que Jade estava confeccionando. Lembrou que a petição tinha o intuito de pedir uma auditoria no presídio, ameaçando dessa forma os agentes penitenciários corruptos, bem como o diretor, que pudesse estar envolvido com toda a corrupção.

– O senhor sabia que minha esposa estava fazendo uma petição para o Ministério Público? – Lucas perguntou, fixando os olhos em Babemco.

O homem apenas olhou para ele com uma expressão de nojo.

– Estamos aqui por um acordo. O que você quer afinal? – Babemco perguntou.

Nesse momento Lucas começou a suar frio. Ele poderia contar tudo sobre a petição para o Ministério Público. Podia questionar Babemco sobre os agentes corruptos. Podia até levantar a suspeita de que algum agente tinha contribuído para o ataque contra Jade. Inclusive que Babemco estivesse envolvido com o ataque. Poderia acusar Babemco de ser omisso e muito mais. Porém, ele não conseguia abrir a boca de jeito nenhum. Só em pensar em confrontar o homem, suas pernas perdiam a força. Então, resolveu falar.

– Cem mil está ótimo – soltou Lucas, enxugando o suor da testa, com as costas da mão.

– Estamos de acordo, então? – Babemco perguntou, estendo a mão para Lucas.

– Estamos de acordo! – ele respondeu, apertando a mão do homem.

Eu sou um frouxo, pensou Lucas. Sou uma merda de um frouxo.

**
Alguns minutos depois que Lucas e Bruno saíram do pátio, o senhor Capeto se aproximou de Babemco. Capeto era o braço direito do homem. Ele era grande e alto como um guarda-roupa. Usava uma jaqueta preta por cima de uma camiseta preta e sempre estava fumando. Seu rosto quadrado, tinha um corte acima do olho esquerdo. Era uma cicatriz feia que deixava seu olho um pouco baixo, como se a todo momento ele estivesse com raiva.

Capeto se aproximou de Babemco e ofereceu um cigarro. Os dois começaram a fumar em silêncio. O dia estava acabando, e uma brisa mais suave começava a passear pelo pátio.

– Que merda foi essa? – Babemco perguntou, apontando para o chão manchado de sangue.

– Eu pedi um susto. Ela entendeu que era pra matar. Não tenho culpa nisso – Capeto falou quase sem abrir a boca.

– Você não sabe o trabalhão que tá dando pra limpar essa merda.

– Eu tenho outra notícia pra te dar.

– O quê?

– O defensor conseguiu uma autorização do juiz pra levar a Olívia pra um hospital. Ela tá toda machucada. As outras detentas pegaram pesado com ela.

– Isso não é uma má notícia.

– Pra quem queria sumir com a Olívia. Isso não parece ser uma boa notícia.

– Onde está o meu filho? – perguntou Babemco.

– Tava cuidando de umas paradas na praia.

– Deixa ele cuidar disso. Quero que vocês raptem a Olívia e levem-na para o Complexo Fantasma. Garanta que essa louca seja detida. Espero que dessa vez, você faça o serviço direito, Capeto – falou, se retirado do pátio sem olhar para trás.

– Esse velho fala e deixa a gente no vácuo. Que mania feia – Capeto reclamou baixinho para si.

**
A orla de Boa Viagem estava movimentada naquele fim de tarde. Oscar, observava as garotas jogarem vôlei na areia.

Ele era um jovem alto e gordo. Tinha a pele muito branca e bochechas super rosadas. Olhando de longe, era possível confundi-lo com um portador de síndrome de down. Mas Oscar era esperto, apesar de não parecer.

Tomando água de coco e vendo o por do sol, Oscar se assustou quando Capeto se aproximou dele.

– Idiota! Tenho um serviço pra você! – avisou Capeto.

– Não vou mais por escuta na casa de ninguém – disse Oscar, sugando água de coco, através de um canudo.

– Não fode! Você não tem escolha. Nós mandamos e você obedece.

– Eu sou filho do dono. Eu que mando em todo mundo.

Capeto segurou a cabeça do garoto e começou a apertar seu pescoço.

– Me solta seu ogro filho da puta! – ordenou Oscar.

– Só se você assumir que eu mando em tudo. E que aquele idiota do Babemco não sabe cuidar de nada. Vai, assume!

– Você não manda! Eu que mando! – gritou Oscar, dando um sorriso idiota. – Tá bom, você que manda!

– Fala que o Babemco é um idiota!

– O Babemco é um gordo idiota – Oscar disse, caindo na gargalhada.

Capeto soltou o moleque dando um abraço em volta do pescoço dele.

– Você tem que aprender com o mestre – disse Capeto, batendo no peito.

– Você é um velho cansado. Qual o trabalho da vez?

– Temos que sequestrar uma mulher de um hospital! Você consegue?

– Consigo, e já sei até como fazer isso.

– Como?

– Vem com o mestre – disse Oscar, saindo sem olhar para trás, e deixando Capeto no vácuo.
– É mal de família, deixar os outros pra trás. Só pode ser – Capeto murmurou sorrindo.

**
O Hospital Português era conhecido como o melhor hospital da região nordeste. E era lá que Olívia estava. Internada no terceiro andar da ala 4. Ela estava em um leito vigiada por dois policiais.

Capeto e Oscar chegaram no terceiro andar, usando jaleco e estetoscópio ao redor do pescoço. Cada um, carregava um taser dentro do bolso. E com agilidade, eletrocutaram os dois policiais e entraram com eles dentro do leito de Olívia. Eles tinham que ser rápidos. Logo logo algum enfermeiro ou médico chegaria para verificar a paciente.

Oscar carregou os dois policiais para o banheiro do leito e em seguida foi ajudar Capeto a retirar Olívia da cama. Eles transportaram a mulher para uma maca com rodinhas e puxaram todos os acessos que estavam ligados ao braço dela.

– Rápido! – disse Capeto, preparando-se para sair.

Quando estavam prestes a sair do quarto, um médico entrou na sala e ficou paralisado quando viu os dois ali. O homem retirou a máscara que cobria sua boca e nariz, e perguntou novamente: – O que vocês estão fazendo? Onde estão os policiais?

Oscar puxou o médico pelo colarinho e fechou a porta atrás de si.

– Deixem ela em paz – disse o médico, assustado.

– Nós vamos levar ela – afirmou Oscar.

– Não vão de jeito nenhum – falou o médico indo em direção à maca em que Olívia estava.

Oscar lhe deu um empurrão, derrubando-o contra a parede.

– Eu cuido disso – disse Oscar para Capeto.

– Tem certeza? – perguntou Capeto, segurando as alças da maca.

– Absoluta.

– Volta aqui – pediu o médico, peitando contra Oscar novamente.

Capeto saiu com a maca, enquanto Oscar esmurrava o pobre homem. O médico percebeu que precisava lutar e pegou uma tesoura que viu ali próxima. Apontando o objeto contra Oscar, ele tentou machucá-lo, enfiando o instrumento no ombro do grandalhão.

Oscar se desviou e derrubou a tesoura no chão. O médico se ajoelhou, tentando pegar o objeto, mas Oscar lhe deu um chute no estômago.

– Que droga vocês acham que estão fazendo? – perguntou o médico caído.

– Não é da sua conta.

O médico conseguiu pegar a tesoura e com um chute, derrubou Oscar no chão. Em seguida subiu em cima dele apontando a tesoura para o seu rosto. Os dois mediram forças, e o bandido tentava sobreviver à investida do doutor.

– Você não tem culhões pra matar um homem – disse Oscar, segurando a tesoura que estava apontada para o seu rosto.

Oscar empurrou o médico e pegou a tesoura. Sentou-se em cima do homem e com toda força tentou enfiar a faca no pescoço dele.

O médico resistia, vendo o objeto pontudo se aproximar do seu pescoço. Ele segurava as mãos de Oscar impedindo-o de cravar a tesoura nele.

– Você vai morrer hoje – disse Oscar, com um olhar demoníaco.

– Para! – suplicou o médico.

Mas Oscar foi implacável e cravou a tesoura na jugular do homem. O sangue esguichou por todo lado. E o médico morreu engasgado com a tesoura no pescoço.

Oscar limpou o sangue do rosto com uma toalha e olhando para o homem morto no chão, fechou a porta sem olhar para trás.

**
A noite estava agradável quando Lucas e Bruno chegaram ao Hospital Português. Observaram algumas viaturas estacionadas e no hall de entrada, policiais conversavam com médicos e seguranças.

Após a identificação, os dois amigos subiram até o quinto andar, onde Jade estava instalada. Ao chegar, Lucas foi recepcionado pelo pai e pela mãe da esposa. Os dois lhe abraçaram e conversaram sobre o incidente. A mãe de Jade parecia mais preocupada. Perguntou se Lucas estava bem e se precisava de ajuda com Cícero. Já o pai de Jade parecia mais chateado. Ele olhou para Lucas de forma inquisidora e perguntou se ele não estava sabendo dessas histórias de Jade dentro do presídio. Lucas respondeu que sabia, e que inclusive era contra os projetos da esposa. Mas o sogro não parecia convencido e com algumas indiretas disse que Lucas deveria cuidar melhor da família e proteger a esposa. Lucas se sentiu ofendido com aquelas palavras, mas, não quis entrar muito no assunto. Entendeu que os sogros estavam tão chocados com os acontecimentos quanto ele.

– Eu vou convencê-la a deixar esse projeto – segredou Lucas para o sogro, falando baixinho para Jade não escutar.

– Eu estou confiando em você, Lucas. Cuide bem da minha princesa e do meu netinho – disse o pai de Jade.

Lucas saiu tarde do hospital. Quando Bruno chegou com ele em casa, já passava das 23h. A sorte, era que a babá aceitou ficar até mais tarde com o bebê.

Lucas chegou desanimado. Pagou a diária da babá e se despediu dela. Em seguida, foi até o quarto e conferiu como Cícero estava. O bebê dormia um sono tranquilo. Em seguida, ele trocou de roupa, ficando somente com um short folgado. Desceu até a cozinha e em cima da bancada de mármore avistou um prato coberto com papel filme. Arroz, estrogonofe e batata-palha, seu prato preferido. Com certeza, isso era coisa da dona Marieta. Em cima do papel filme, ela deixou um bilhete claro e objetivo: “Coma! Beijos, Mamãe”. Ele olhou aquilo com um certo desprezo. Apesar de gostar muito do prato ele jogou tudo na lata de lixo. Parecia revoltado.

No armário, na porta de baixo, pegou a garrafa de vodca e encheu o copo. Tomou tudo num gole só. Soltou um Argh com o ardor da bebida, e encheu o copo novamente. Os olhos estavam mortos, sem brilho. Jogou-se na cadeira ao lado da mesa, e olhou para a porta do quintal que estava à sua frente. Lembrou-se do homem que veio mais cedo consertar a porta. Levantou-se e abriu a porta que dava para o quintal, percebeu que ela estava em perfeito estado.

– Eu disse que iria consertar a porra dessa porta – ralhou Lucas consigo.

Agachou-se, e abrindo a última gaveta do armário, retirou um martelo. Abriu a porta novamente e começou a martelar as dobradiças, onde antes estava emperrado. Ele batia com força, causando um barulho ensurdecedor. Depois de alguns minutos martelando, a dobradiça cedeu, emperrando a porta novamente. Ele sorriu satisfeito e disse: – Eu que conserto a minha porta!

Escutou os gritinhos de Cícero, que havia acordado com o barulho.

**
Todos os dias Lucas visitava a esposa no hospital. Todos os dias, Jade recebia a visita de vários profissionais que cuidavam da sua recuperação. Toda semana ela fazia diversos exames e exercícios. Durante quatro meses, os dois viveram essa jornada de desafios e superações, até que Jade recebeu alta. Depois de vinte semanas, ela pode voltar para casa. Já podia falar sem sentir dor, mas não podia forçar muito. Nada de grito, nada de estresse e nenhuma bebida quente ou gelada demais. Deveria seguir uma dieta restrita para evitar problemas futuros, mas podia considerar-se recuperada.

No dia em que Jade recebeu alta, Lucas tentou arrumar a casa da melhor forma. Na cozinha, ele observou a porta do quintal que ainda estava emperrada, e retirando o martelo do armário, deu algumas marteladas na porta, sem sucesso. Ele deixou o martelo em cima da bancada de mármore, na esperança de consertar a porta mais tarde, assim que chegasse do hospital. No momento, tinha que correr para pegar sua mãe no aeroporto.

Naquela mesma noite, Licurgo ligou para a amiga. Os dois conversaram durante um bom tempo. Ele se desculpou várias vezes por não poder visitá-la. Disse que até tentou, mas as condições financeiras e as responsabilidades com a Fazenda Esperança, não deixaram que ele saísse. E desejou que a amiga se recuperasse o mais rápido possível. Perguntou pelo Lucas e pelo Cícero e desejou tudo de bom para a família.

– Eu estou bem melhor, graças a Deus – respondeu Jade para Licurgo.

– Eu não queria tocar nesse assunto, mas queria pedir sua ajuda – disse Licurgo, envergonhado.

– O que foi amigo? Você tem liberdade pra falar o que quiser comigo. O que tá acontecendo? – ela perguntou, preocupada.

– Não queria te envolver nisso, principalmente com você nessa situação.

– Eu estou recuperada Licurgo. Fala logo!

– Então, você sabe que eu cuido de vários órfãos, e que a fazenda é bastante onerosa para mim.

– O que foi que houve?

– É que o banco quer tomar o terreno. Meu avô tinha uma dívida e acabou hipotecando a fazenda pra conseguir um empréstimo. Eu pagava as parcelas regularmente, mas nos últimos meses, com a crise na economia, as coisas têm sido bem difíceis.

– Que chato amigo! Como posso te ajudar? De quanto você precisa?

– Na verdade Jade, não queria o seu dinheiro, queria a sua imagem. Se nós fizermos uma campanha, alguns vídeos e abrir a real. Se pedirmos aos grandes empresários os recursos que a fazenda precisa. Eu tenho 20 órfãos aqui e todos precisam de um lar, de alimentação, de medicamentos. Eu queria que a comunidade ajudasse, entende?

– Entendo. Mas, amigo, não sei se consigo fazer isso agora. Estou focada na campanha, a eleição será em poucos meses e, infelizmente não sei se consigo te dar esse apoio. Não agora.

A voz de Licurgo parecia triste, mas ele agradeceu. Jade desligou com um ar de pesar. Lucas perguntou o que ele queria e ela explicou toda a situação.

– Eu preciso voltar à campanha. Infelizmente, não posso ajudá-lo no momento.

Lucas balançou a cabeça, visivelmente contrariado.

– Até quando você vai insistir nisso? – ele perguntou.

– Preciso saber por que a Olivia fez aquilo? Preciso saber quem mandou fazer aquilo. Tenho certeza que ela não planejou me matar. Com certeza ela foi forçada a fazer aquilo.

– Não sei como você tem estômago pra querer entrar nessa podridão novamente. O que você acha? Que eu vou ficar vendo minha mulher correr risco de morte todo o dia e não fazer nada. Se for pra ser assim, prefiro acabar com esse relacionamento.

– Por que você tá falando isso? Você tá louco? – ela questionou, indignada.

– Não foi você que teve que ouvir de todo mundo que eu não te protegi. Sua mãe, seu pai, a minha mãe! Todos perguntando como eu deixava você se meter na cadeia pra falar com bandido!

– Eu não preciso de proteção ou permissão. Nós estamos em um casamento, eu e você temos liberdade. Não se preocupa que eu sei o que to fazendo!

– Você não sabia o que estava fazendo quando quase morreu no presídio. Chega disso. Chega de política, chega de presídio, chega de militância! Você tem que ser uma mulher normal! – berrou Lucas.

– Juro que não tô acreditando que ouvi isso!

– Sabe o que vai acontecer se você continuar. Você pode morrer, você pode por o Cícero em risco, você pode me por em risco. É isso que vai acontecer, porque mexer com política e presidiários dá nisso!

Jade balançou a cabeça incrédula.

– Não vou deixar de viver por conta dos seus medos. Se você não consegue me apoiar…

– O quê?

– Não quero mais falar sobre isso.

Jade só queria continuar com os seus projetos. Lucas queria manter sua família em segurança. O objetivo dos dois parecia estar em colisão.

Entraram no carro em silêncio. Somente Cícero dava gritinhos agudos. Dirigiram para casa.

**
Naquela mesma noite em que Jade deixou o hospital, Oscar e Capeto estacionaram diante da casa dela.

Passava das 23h e a rua estava deserta. Um segurança passou de motocicleta, mas não viu o carro estacionado com os homens.

 

Capeto havia acabado de entrar no carro, e logo em seguida foi atualizando o parceiro.

– Dá pra entrar pela porta do quintal. Ela parece que está emperrada. A fechadura fica mais frágil dessa forma – informou Capeto, enquanto acendia um cigarro.

No volante, Oscar observava a tela de um tablet que estava em seu colo, e um sinal vermelho piscava insistente.

– Como que isso foi acontecer, cara? – perguntou Oscar.

– Não é comum, mas às vezes as escutas superaquecem e é necessário trocá-las.

Os dois estavam com um sério problema. Uma das escutas que eles haviam implantado na casa de Jade, estava superaquecendo, e sua bateria poderia explodir a qualquer momento. Com um pouco de investigação, era possível localizar a fonte dessas escutas, então, para não correrem mais riscos, eles precisavam retirar as escutas o mais rápido possível.

– Eu vou fazer isso – disse Oscar.

– Você demora demais. É um rato lento!

– Quero meu currículo cheio de experiências pra mostrar pro meu pai. Deixa que eu cuido de tudo.

– Aproveita que não tem ninguém na casa, e que eles ainda não têm nenhum sistema de segurança – observou Capeto, dando pequenas baforadas no ar.

Capeto ficou observando Oscar caminhar ligeiro até os fundos da casa. A rua estava sombria, pois eles haviam quebrado a lâmpada de um poste que ficava na esquina. Era um serviço simples, eles já tinham entrado anteriormente, e implantado as escutas. A senhora Jade era alvo de Babemco há muito tempo, desde que começou a ameaçar o presídio e ajudar as detentas.

O que Capeto não entendia, era a cisma que Babemco tinha com o filho. Parecia que o moleque nunca fazia nada de bom. O velho sempre estava reclamando e rebaixando o garoto. Oscar até tentava não se importar, mas era visível que ele nutria algo pelo pai, e não era um sentimento bom, mas algo obscuro.

Ainda distraído em pensamentos, Capeto se assustou quando um carro estacionou diante da casa. Ele viu quando Jade e Lucas desceram do veículo carregando o bebê e um monte de bolsas. Mas que droga! Eles tinham que chegar agora? Merda. Precisava avisar o Oscar de que os moradores haviam chegado. Espero que ele tenha retirado a merda das escutas, pensou Capeto, um pouco apreensivo.

**
Jade estava louca pra entrar em casa, sentar no sofá, sentir o cheirinho que só o seu lar tinha. Ela foi a primeira a entrar e foi logo acendendo as luzes.

– Que saudades de casa! – ela disse, com um sorriso largo.

– Esse lugar não é o mesmo sem você – disse Lucas, ainda contrariado.

Jade acendeu as luzes da cozinha, deitou-se sobre o balcão de mármore e cheirou um pano de prato que estava sobre a mesa.

– Que coisa boa!

Ainda na cozinha, Jade abriu a geladeira e retirou uma garrafa d’água. Encheu um copo e tomou tudo em um gole só. Ao olhar para baixo, notou um martelo em cima da bancada. Olhou para a porta do quintal, e constatou que ela ainda estava emperrada.

– Como assim Lucas? – ela perguntou, com indignação na voz.

– O que foi? – ele perguntou se aproximando.

– Você não consertou a porta? Esse tempo todo? Como assim, cara?

– Eu…eu…

– Conserta a porta! – ela ordenou.

Prestes a subir a escada que dava acesso ao primeiro andar, Jade escutou passos ligeiros que vinham de cima. Em seguida, escutou quando algo caiu no chão, fazendo um barulho oco, como se fosse um vaso caindo, mas sem quebrar.

– Você ouviu? – ela sussurrou para Lucas.

Ele balançou a cabeça, também assustado. Em seguida, se aproximou do pé da escada e olhou para cima, com olhar apreensivo.

– Quem tá aí? – Lucas perguntou.

Jade correu até o sofá e pegou Cícero, que ainda estava na cadeirinha. Ela estava com medo.

Lucas correu até um criado mudo que ficava próximo a escada e pegou uma chave de fenda. Ele tremia as mãos quando começou a subir os degraus.

– Lucas – sussurrou Jade, sinalizando para ele voltar.

Ele balançou a cabeça sem concordar com a esposa. Precisava saber o que era aquilo. Se havia alguém dentro da casa, ele deveria pôr para fora. Não podia ficar passivo, vendo sua família correr riscos. Tinha que fazer algo.

Deu passos firmes tentando não fazer barulho. Ligou o interruptor, mas a lâmpada da escada não acendeu. Estava muito escuro e ele não conseguia ver nada que estivesse no topo. Mesmo assim, continuou subindo. Até que sentiu. Sentiu quando uma presença se aproximava lentamente no alto. Ele podia ouvir o suspiro, a expiração saindo pela boca entreaberta. Podia sentir a energia de algo ou alguém no topo da escada. Ficou imóvel. A chave tremia em sua mão suada.

Ouviu o chão de madeira ranger com o peso de algo. Queria falar, mandar que fosse embora, mas, não conseguia abrir a boca. Somente uma sombra negra lhe abraçava por trás, lhe encobrindo em medo e horror. Quase desmaiou quando ouviu os passos ganharem velocidade e peso se aproximando de si.

Apenas viu um vulto negro romper da escuridão e lhe empurrar escada abaixo. Caiu com o peso de um homem gigante que usava máscara e parecia um urso.

Lucas logo se levantou e pulou nas costas largas do homem. Porém foi jogado contra a parede e caiu inerte, mais uma vez. O grandalhão era pesado e ameaçador, mas Lucas não podia ficar parado. Levantou-se mais uma vez e com toda força que tinha, cravou a chave nas costas do monstro, que caiu com um urro de dor.

Lucas puxou a chave de fenda das costas do homem que se levantou, mas caiu em seguida, sentindo muita dor.

– Desgraçado! – gritou Lucas, pulando em cima do homem e apontando a ferramenta para o rosto do invasor.

Jade tremia ao ver a cena. Rapidamente pegou o celular e ligou para a polícia. Foi a única coisa que pensou.

Enquanto isso, Oscar lutava, segurando a mão de Lucas, que tentava cravar a chave de fenda em seu peito. O homem rangia os dentes lutando contra a força de Lucas e da gravidade. Mas, ele foi mais forte e empurrou Lucas contra a parede. Levantou-se e montando em cima dele apontou a chave de fenda para o pescoço do branquelo.

Ele iria furar o pescoço daquele idiota assim como fez com aquele médico imbecil, pensava Oscar montado em cima do homem.

Lucas estava sofrendo para sustentar a força de Oscar em cima de si. Ele até tentou, mas suas forças estavam esgotando, não iria suportar mais. Quando estava prestes a ceder e ter o seu pescoço perfurado, foi surpreendido com Jade, que chegou por detrás de Oscar com um martelo e atingiu a cabeça dele.

Oscar cambaleou, soltando Lucas. Jade segurava firme o martelo. Ela continuou, e deu mais uma martelada em Oscar. O homem caiu com os olhos mortos. Uma poça de sangue se formou ao redor de sua cabeça.

Jade soltou o martelo. Estava em choque.

– Droga! Eu matei um homem – ela disse, quase chorando.

Os dois ficaram olhando aquela cena. Não era isso que Lucas imaginava para sua família. Não era essa memória que ele queria guardar daquela casa. Jade sempre tinha que salvar o dia. Ela sempre matava os ratos.

INCOGNOSCÍVEL

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  • Excelente capítulo meu amigo. Adorei este final. As coisas estão começando a ficarem cabulosas. Babemco filho da p…
    Ahhh, Lucas emperrando a porta novamente, muito bom haha.
    Parabéns pelo episódio!

    • Sim, as coisas irao ficar ainda mais cabulosas. Babemco é uma aberração. O que ele ainda vai aprontar não tá na historia, literalmente. E o Lucas, o Lucas tem que aprender muuuuito. A história continua. Próxima terça tem mais.

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    Ahhh, Lucas emperrando a porta novamente, muito bom haha.
    Parabéns pelo episódio!

    • Sim, as coisas irao ficar ainda mais cabulosas. Babemco é uma aberração. O que ele ainda vai aprontar não tá na historia, literalmente. E o Lucas, o Lucas tem que aprender muuuuito. A história continua. Próxima terça tem mais.

  • Em estado de choque com esse episódio. Até nas cenas mais simples eu senti toda a atmosfera das cenas, diálogos bem construídos, e esse desfecho, caraaaaaa… O que é isso???

  • Em estado de choque com esse episódio. Até nas cenas mais simples eu senti toda a atmosfera das cenas, diálogos bem construídos, e esse desfecho, caraaaaaa… O que é isso???

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