CENA 1. EXTERNA |DIA |PRAIA DE IPANEMA.
CONTINUAÇÃO DO CAPÍTULO ANTERIOR.
Bia empurra Lenita que ficou muda olhando a mão dela sangrar, e vai correndo embora. Mas quando chega ao calçadão, ela olha para trás e vê a festa de Helô e o anúncio final.
LEONEL – Bom, acho que não restam dúvidas meus amigos… A vencedora do concurso Garota de Ipanema 1995 é Heloísa Bittencourt, a nossa Helô! (Gritou por fim).
Bia atravessa a rua apressada, sem olhar… Um carro chega a brecar bem em cima dela, que nem dá bola e continua correndo até chegar à portaria do seu prédio, segurando a mão sangrando, que esta enrolada em sua canga.
CORTA PARA:
CENA 2. EXTERNA |DIA |PRAIA DE IPANEMA.
{Começa a tocar: Garota de Ipanema – Melim}
Todos na praia parabenizam Helô, e Pedro abraça e beija sua amada. Depois ele a pega no colo e sai correndo com ela direto para o mar… Eles se jogam e continuam comemorando a vitória de Helô entre um mergulho e outro, com beijos ardentes e apaixonados.
CORTA PARA:
CENA 3. INTERNA |DIA |COBERTURA DOS BITTENCOURT |SALA.
Celina esta na sala lendo uma revista, quando Bia chega apressada e bate a porta. Ela sobe as escadas correndo.
CELINA – Bia aconteceu alguma coisa? Bia… (Celina fica pensativa, com um olhar questionador e decide ir atrás dela).
CORTA PARA:
CENA 4. EXTERNA |DIA |PRAIA DE IPANEMA.
Pedro e Helô conversam abraçados e sentados na areia, debaixo de um guarda – sol.
PEDRO – Finalmente… Agora é oficial, você é a Garota de Ipanema. A mais linda não só de Ipanema, mas de todo Rio de Janeiro… E minha, só minha garota! Você lembra que eu já te chamava assim né? (Diz sorrindo e acariciando os cabelos dela).
HELÔ (Pensativa) – Claro que eu me lembro… Eu até ria disso achava engraçado… Agora o senhor é pretensioso hein, de achar que eu sou só sua? (Indagou com ar de mistério, olhando pra ele sorrindo).
PEDRO (Sarcástico) – E não é? Poxa, e eu crente que estava abafando… To precisando rever os meus conceitos mesmo…
HELÔ (Séria) – Você sabe que eu sou toda sua. Não precisa rever nada não. Eu só espero que você seja todo meu também viu Senhor Pedro Gouveia… E ai de você se me disser que não.
PEDRO – Mas é claro que eu sou todo seu! Sua boba… Eu te amo!
HELÔ – Eu também te amo muito… (Disse dando um selinho nele) – Nossa e eu que nem queria ter participado desse concurso, só aceitei mesmo pra dar uma força pra Lenita… E aqui estou eu agora com contrato assinado, sessão de fotos pra fazer pra marca Garota de Ipanema, desfiles, certamente terei que dar entrevistas também. E o chato disso tudo é que eu nunca quis isso, essa não sou eu… (Expressão preocupada) – Eu confesso que tenho até medo de onde isso tudo pode me levar…
PEDRO – Você vai tirar de letra meu amor, são só seis meses de contrato. Depois você decide se quer renovar ou não, o Leonel deixou isso bem claro. E também eu estarei do seu lado te apoiando em tudo que você precisar.
HELÔ (Sorri) – Obrigada por ser tão fofo comigo e cuidar de mim. Eu vou precisar mesmo de todo o seu apoio.
PEDRO – Agora se você não queria ter ganhado esse concurso, a sua irmã por outro lado já estava cantando vitória. Ela saiu daqui feito um furacão de tão possessa que ela ficou.
HELÔ – Meu Deus! A Bia, eu havia até me esquecido dela… Ainda tem isso, ela sonhava em ganhar esse concurso, estava muito confiante, só falava disso o tempo todo nas últimas semanas. Ela deve ta morrendo de raiva de mim… Eu preciso ir lá falar com ela. (Close no rosto de Helô chateada).
CORTA PARA:
CENA 5. EXTERNA |FOCO NO PRÉDIO BELA VISTA |COBERTURA DOS BITTENCOURT |(DEPOIS CORTA DIRETO PARA O QUARTO DE BIA).
{Instrumental Tensão}
Bia está enlouquecida, ela joga no chão todos os seus perfumes, maquiagens, batons, que estavam em cima da penteadeira, depois pega um vaso de vidro e o arremessa com flores e tudo na parede. Ela chora e grita de ódio ao mesmo tempo, como se quisesse extravasar todo o ódio que sentia da irmã.
CELINA (Preocupada, batendo na porta) – Bia abre essa porta, o que esta acontecendo? Fala comigo, por favor! Bia…
Ela não ouvia Celina e continuava chorando desesperada, jogada no chão e toda descabelada. O ferimento na sua mão continuava sangrando e ela parecia nem se importar.
CELINA (Séria) – Bia eu estou ficando preocupada com você, abre essa porta agora! Se você não abrir eu vou mandar chamar o seu pai, ele foi no vizinho jogar pôquer, mas eu mando a Maroca chamar ele rapidinho e pra ele você vai ter que abrir de qualquer jeito.
Celina escuta o barulho da chave girando na porta, mas Bia não abre. Ela então entra de supetão e fica horrorizada com o que vê… O quarto está uma bagunça, todo revirado, roupas, perfumes, batons, tudo jogado pelo chão, cacos de vidro… E Bia esta sentada na cama, com o olhar perdido, abatida e chorando. Ela segura a mão ferida e gotas de sangue caem pelo tapete branco… Só então Celina volta a si.
CELINA – Bia do céu! O que foi que aconteceu com você, minha filha? Olha a sua mão está sangrando… Como foi que você se machucou? Porque você chegou tão transtornada da rua assim… O seu pai não pode ver isso.
Bia continua imóvel e nada responde, mas Celina insiste.
CELINA – Se abre comigo Bia, confia em mim, quem sabe eu possa te ajudar? (Diz sentando-se ao lado dela e fazendo um carinho no rosto de Bia).
Bia que até então estava muda, começa a rir sem parar… Ela da gargalhadas altas e descompensadas. Celina até se assusta e fica sem reação.
BIA (Irônica) – Me ajudar Celina? Logo você? (Fala se levantado e rindo) – Essa é boa. Você não pode fazer nada por mim, aliás, nunca pôde. Você é só uma pobre coitada que nem vida própria tem e que vive dizendo amém pra tudo o que meu pai fala. Parece até um robô controlado por um controle remoto, e que foi programada apenas para assentir e servir o senhor Anselmo Bittencourt… Igual aquela sonsa da Helô é, ou pelo menos era, já que agora ela resolveu botar as manguinhas de fora, ou seriam garras? As mesmas que me apunhalaram pelas costas hoje, sem dó nem piedade, na primeira oportunidade que ela teve… Eu odeio a Helô, Celina. Eu odeio a Helô! (Grita).
CELINA (Nervosa) – Você está fora de si Bia, não sabe o que esta falando. Procure se acalmar agora, se você quiser conversar depois, nós conversamos ta bom. (Falou pegando ela pelo braço e a apoiando) – Agora nós temos que tratar de você, do seu ferimento. Vem comigo, vamos lá pro meu quarto tirar essa roupa suja, tomar um bom banho e fazer um curativo nessa mão.
Celina a levou até o seu quarto e a sentou na cama. Depois chamou Maroca.
CELINA – Maroca, Maroca… Sobe aqui no meu quarto agora, rápido. E traz o kit de primeiros socorros. (Gritou do alto da escada e depois voltou para o quarto) – Fica calma Bia, nós já vamos cuidar de você. (Fala apreensiva).
CORTA PARA:
CENA 6. EXTERNA |DIA |PRAIA DE IPANEMA.
Helô resolve ir embora e se despede de Pedro.
HELÔ (Preocupada) – Eu tenho que ir agora Pedro… Me desculpa. A gente se vê mais tarde. Eu to muito preocupada com a Bia. Do jeito que você falou que ela saiu daqui, eu nem sei o que pode ter acontecido…
PEDRO – Claro meu amor, eu entendo. Vai lá sim… Só não fique se justificando muito pra ela, você não teve culpa de nada, poderia ter sido ela a vencedora e nem por isso você ficaria do jeito que ela ficou… Ela vai ter que aceitar isso, mais cedo ou mais tarde.
HELÔ – Jamais, eu iria é ficar muito feliz por ela. Mas também não cabe a nós julgar as atitudes da Bia, afinal esse era o sonho dela e não o meu, e por ironia do destino quem acabou ganhando fui eu. Sabe-se lá o que ela esta sentindo agora, coitada…
LENITA (Afobada) – Helô, ainda bem que te encontrei… O Senhor Leonel ta te procurando feito doido, ele quer falar com você. Ele vai te entregar o cheque e quer agendar uma entrevista pra amanhã.
HELÔ – Mais essa agora…
LENITA (Brincando) – Vida de celebridade não é fácil amiga, é melhor ir se acostumando.
PEDRO (Rindo) – A Lenita tem toda razão meu amor… Daqui a pouco sou eu que vou ter que marcar horário na sua agenda pra poder te ver.
HELÔ (Sorri) – Não será preciso, você e a Lenita terão sempre prioridade na minha vida.
LENITA – Bom saber disso. A linha esnobe nunca combinou com você.
HELÔ (Rindo) – Não mesmo. Agora deixa eu ir que o Leonel ta esperando, a gente se vê a noite. (Diz dando um beijo rápido em Pedro) – Depois eu vou direto pra casa ver a Bia. A Lenita fica te fazendo companhia mais um pouco, beijos.
Lenita e Pedro se olham incrédulos pela atitude de Bia, enquanto Helô se afasta, mas nada falam.
CORTA PARA:
CENA 7. INTERNA |DIA |COBERTURA DO BITTENCOURT – QUARTO DE CELINA.
Bia está sentada na cama de Celina, usando um roupão e com os cabelos molhados, ainda em estado de choque. Ela parece estar longe e não esboça nenhuma reação, muito menos parece prestar atenção ou ouvir o que falam a sua volta. Depois de ajudar ela no banho, Celina esta fazendo curativo em sua mão.
MAROCA (Pasma) – Que será que aconteceu hein dona Celina? Pra ela chegar nesse estado, quebrando tudo, fora de si, coisa boa não deve ter sido… Chega me dar pena…
CELINA – Eu não faço nem idéia… Eu não tive nem tempo de pensar direito. Ela chegou tão transtornada, parecia até outra pessoa. Ainda bem que o Anselmo não estava em casa…
MAROCA (Fazendo o sinal da cruz) – Virgem Maria! Deus é mais… Ainda bem mesmo. A senhora já pensou no fuzuê que seria? Mas não demora muito ele chega ai hein…
CELINA (Preocupada) – E a Helô que não chega… Ela deve saber o que aconteceu pra Bia ficar desse jeito.
MAROCA – Será que não é justo por causa da irmã que ela esta assim? Vai ver elas brigaram e por algum motivo a Bia surtou… Coitada da Helô, a Bia nunca me enganou…
CELINA (Espantada) – Como assim Maroca, o que você esta querendo dizer com isso?
MAROCA – Ah vai me dizer que a senhora nunca percebeu dona Celina?
CELINA (Séria) – Nunca percebi o que Maroca? Do que você esta falando?
MAROCA – Da maneira como a Bia sempre olhou torto pra Helô… Séria, umas vezes com ódio, outras com desprezo, um olhar de superioridade até eu diria…
Celina se levantou na mesma hora e puxa Maroca para longe de Bia.
CELINA (Brava) – Quer fechar essa matraca Maroca! (Fala sussurrando) – A Bia ta ouvindo tudo. Isso que você esta falando é muito grave… Você nunca mais repita isso. Pra ninguém, você ta me entendendo?
MAROCA – A garota não to ouvindo nada, dona Celina. Não percebeu o estado dela? Ela esta catatônica assim faz mais de uma hora. Depois eu não sou papagaio não pra ficar repetindo nada, eu só falo uma vez e quem quiser me acompanhar que preste atenção… Agora tudo isso que eu falei, eu venho percebendo não é de hoje, e sabia que essa história um dia não ia terminar bem, mas ninguém me escuta mesmo, ta ai… Ta na cara, só um cego não enxerga o quanto a Bia sente inveja da irmã.
CELINA – Agora chega! Calada! Vá já fazer o que eu te pedi antes que o Anselmo chegue. Arrume o quarto da Bia, dá uma geral naquela bagunça toda. E bico calado, eu não quero ouvir mais nada do que se passou aqui em casa hoje hein… Vai anda logo.
MAROCA – Eu vou. Mas depois não diga que eu não avisei… Eu hein, ta achando que aqui é bagunça? Aqui não é bagunça não. (E sai bicuda).
CELINA – Bia fala comigo, que foi que aconteceu? Olha toma esse tranqüilizante, toma… (Diz dando um comprimido pra ela beber e depois pegando um copo com água) – Vai ser bom, você vai relaxar e dormir um pouco minha querida. Eu nunca te vi tão nervosa desse jeito…
Bia toma e permanece quieta, depois sem Celina esperar, ela volta a si.
BIA – A Helô acabou com a minha alegria hoje… É sempre assim, desde quando éramos pequenas que ela toma tudo de mim, que ela rouba tudo o que é meu. A atenção do papai, as minha bonecas, as melhores amigas da escola… Todo mundo sempre gostou mais dela do que de mim, é sempre Helô pra cá, Helô pra lá… Até os garotos do colegial, os meus paqueras ela roubava. Bastava ela aparecer, e pronto. Eles nem me notavam mais… Eu sempre vivi á sombra dela, das migalhas dela. Mas hoje ela foi longe demais, até o concurso ela me roubou Celina. (Diz olhando pra Celina com olhar enigmático, sério e frio).
Celina fica sem saber o que falar. Ela fica chocada com a maneira como Bia fala da irmã e tenta ponderar.
CELINA (Emocionada) – Não fala isso Bia. A Helô adora você, vocês são irmãs. Meu Deus, ela sempre gostou de ficar grudada em você pra baixo e pra cima, queria ir com você a todo lugar. Para e pensa como você esta sendo injusta com ela, e limpe o seu coração de tanta mágoa e rancor minha filha, isso não vai te fazer nada bem…
BIA – Você não sabe de nada Celina, eu é que sei a irmã que eu tenho. Vai me dizer que você não percebe como o papai a idolatra, sempre cercando, preocupado, cheio de cuidados com ela… Comigo ele não ta nem ai. É só esporro, é só cobrança o tempo todo. Eu estou farta disso tudo. Ela sempre foi a queridinha do papai, por mais que eu me esforçasse para agradá-lo, de nada adiantava. E ela é a sua queridinha também, que eu sei…
CELINA – Agora você esta sendo injusta comigo Bia. Eu sempre tratei vocês duas iguais, e sempre gostei das duas também da mesma forma. Assim como o seu pai… O que você acha que é predileção da parte dele, não existe. O que acontece é que cada filho tem um jeito de ser, um temperamento diferente, e os pais acabam cuidando de cada um de uma forma, às vezes dando mais atenção pra um do que para outro. A Helô sempre foi mais sensível, frágil, delicada, enquanto você sempre foi a mais forte, segura de si, não se deixava abater por nada… E o seu pai percebendo isso, de uma maneira errada, sempre foi mais atencioso com ela, porque com você ele sabia que não precisava se preocupar tanto. Você entende?
BIA (Inconformada) – Forte, segura, dona de si… Só Deus sabe o quanto me custa transparecer tudo isso às vezes. Mas por dentro ninguém sabe os caos que eu estou. Muito bonita essa sua maneira de maquiar as coisas Celina. E eu agradeço de verdade os seus elogios, conselhos e cuidados comigo, mas só eu sei é que a minha vida não é cor de rosa há muito tempo… Meu Deus, o que custava ela ter me deixado ganhar esse concurso, ela tinha que ter participado também e tudo pra agradar a amiguinha dela, aquela sonsa da Lenita. Se ela pensasse mais em mim, se eu fosse tão importante pra ela assim, como você diz, ela não teria passado nem perto desse maldito concurso.
CELINA (Confusa) – Mas que concurso é esse, do qual você tanto fala?
BIA – O concurso Garota de Ipanema, que estava tendo na praia. Era só pra eu ter concorrido, mas ela se inscreveu a pedido da Lenita, e adivinha quem ganhou? A sonsa da Helô… Agora ta conhecida em todo bairro, na praia toda… E ainda faturou vinte mil, uma viagem com acompanhante pra um final de semana num hotel fazenda em Teresópolis com tudo pago, e de quebra um contrato com uma marca de roupas de praia pra qual ela vai desfilar, sendo garota propaganda… E o engraçado nisso tudo é que ela nunca gostou dessas coisas, mas agarrou com unhas e dentes. Sabe o que teria acontecido se ela não tivesse se inscrito? Eu teria ganhado esse concurso, eu seria agora a Garota de Ipanema. (Grita).
Celina fica atônita com tanta informação e com o rancor de Bia.
MAROCA (Angustiada) – Dona Celina, o seu Anselmo chegou e esta vindo ai…
CELINA – Vai pro seu quarto, o seu pai não pode nem desconfiar do que se passou aqui.
Quando menos esperam Anselmo surge e ouve Celina.
ANSELMO (Sério) – Do quê que eu não posso desconfiar hein Celina? Ou será que eu devo perguntar a você Bia?
BIA – A mim o senhor não tem que perguntar nada… Pergunta pra sua queridinha Helô, quando ela chegar. É ela quem esta escondendo as coisas do senhor, não eu. (Diz enfrentando o pai e vai para o quarto batendo a porta).
Close em Anselmo que esta furioso.
ANSELMO (Grita) – Celina! Você quer fazer o favor de me explicar o que esta acontecendo aqui?
CORTA PARA:
CENA 8. EXTERNA |DIA |CALÇADÃO.
Helô e Lenita caminham pelo calçadão e Helô se despede dela para ir pra casa.
HELÔ – Confesso que eu já fiquei nervosa com essa história de sessão de fotos de biquíni, eu nem comentei nada ainda com o Pedro.
LENITA – Vai dar tudo certo Helô, você vai ver… O Pedro não faz a linha ciumento. E depois tirar fotos pra quem ganhou um concurso na praia e vai representar uma marca, faz parte né. Não tem nada demais nisso.
HELÔ – Você fala isso porque não é contigo. Eu sempre detestei qualquer tipo de exposição. Agora é torcer pra que esses seis meses passem rápido, e eu cumpra esse contrato pra depois me ver livre disso tudo e seguir com a minha vida. Bom agora eu vou pra casa, porque do jeito que a Bia saiu daqui mais cedo, a essa hora o meu pai já deve estar sabendo de tudo e me esperando na sala pra uma conversa daquelas, como de costume.
LENITA (Sorrindo) – Bom, eu te desejo sorte pra enfrentar a fera.
HELÔ – Obrigada, eu vou precisar mesmo.
LENITA – Amiga eu queria te falar uma coisa… Toma cuidado com a Bia, não se deixe enganar por ela.
HELÔ (Espantada) – Por que você esta me dizendo isso agora Lenita?
LENITA – Me desculpa falar isso assim, eu sei que ela é sua irmã, mas eu não confio nela. Sei lá, ela te olha de um jeito as vezes, parece que ela sente ciúmes ou inveja de você.
HELÔ (Rindo) – Da onde você tirou isso agora Lenita? A Bia é linda, alegre, tem personalidade, ela não precisa ter ciúmes de mim, muito menos inveja. Essa sua implicância gratuita com ela já esta indo longe demais, você não acha? Bom eu vou indo, depois eu te ligo qualquer coisa, fui…
LENITA (Pensando alto, vendo a amiga se afastar) – Antes fosse só implicância minha amiga, antes fosse…
CORTA PARA:
CENA 9. INTERNA |DIA |COBERTURA DOS BITTENCOURT |SALA.
Anselmo e Celina estão sentados e esperam ansiosos a chegada de Helô. Ele não consegue disfarçar o seu nervosismo depois que Celina lhe contou sobre o concurso Garota de Ipanema.
Anselmo (Inquieto) – E essa menina que nunca chega? Eu sabia… Eu sempre disse que essa história da gente vir morar na cidade grande não ia dar certo. (Diz se levantando) – Nós devíamos ter ficado lá mesmo na fazenda. Eu pagava dez vezes mais os professores se fosse preciso pra eles irem até lá dar aula pra elas…
CELINA – E a faculdade Anselmo? Iria levar todo um curso de uma instituição e os professores acadêmicos também? Dinheiro não compra tudo, você sabe disso. Agora se acalme e pare de falar besteira.
Anselmo olha feio pra esposa, depois continua andando de um lado para o outro desinquieto. Até que finalmente a porta se abre e Helô entra…
ANSELMO (Irônico) – Muito bem dona Helô. Até que enfim você resolveu dar o ar de sua graça.
HELÔ – Bom-dia pro senhor também pai. Bom dia Celina.
ANSELMO – Senta que nós temos que conversar sério agora.
Helô se senta, coloca a sua bolsa de lado e respira fundo, olhando séria para o pai.
HELÔ – Pode começar…
ANSELMO (Bravo) – Que história é essa de concurso que você ganhou? Ficar em cima de uma passarela, se exibindo de biquíni? Você perdeu a vergonha minha filha?
HELÔ (Ri) – Pai… Com todo respeito, como o senhor acha que as pessoas vão à praia? De casaco, moletom e chapéu? O senhor não achou que eu e a Bia íamos à praia todas vestidas né?
ANSELMO – Uma indecência isso sim! Por isso eu detesto cidade grande, é uma falta respeito danada.
CELINA (Pondera) – Também não é assim Anselmo. Nem todas as pessoas são desrespeitosas, na cidade também tem pessoas de caráter e respeito, assim como no campo, nas fazendas existem pessoas que não respeitam nada e nem ninguém. Não se pode generalizar.
HELÔ – A Celina tem toda razão pai… E depois respeito é a gente que dá, que impõe. A roupa que a gente usa não tem nada a ver com falta de respeito. O senhor acha mesmo que eu ou a Bia seríamos capazes de ficar nos expondo por ai, com falta de respeito?
Anselmo fica calado, sem saber o que falar e Helô se aproxima do pai, sentando-se perto dele.
HELÔ (Terna) – Eu amo o senhor pai… E também o respeito muito. (Falou fazendo um carinho no rosto de Anselmo) – O senhor só precisa entender que nós crescemos, não somos mais duas crianças indefesas e perdidas… Somos mulheres e temos nossos sonhos e vontades, e temos que lutar por eles e viver as nossas vidas. A gente sabe se cuidar, o senhor e a mamãe nos educaram e nos prepararam pra vida muito bem…
Anselmo abraça Helô emocionado e Celina também se emociona com a cena. (Cam mostra Bia no alto da escada observando tudo e também com lágrimas nos olhos, mas de ciúmes); Depois ela sai e volta para o quarto, onde tranca a porta e fica chorando sozinha. Anselmo e Helô se recompõe, enxugam as lágrimas e Anselmo continua…
ANSELMO – Tudo isso é muito bonito de ouvir, eu admito, mas não pense você que me dobra não Helô. Sobre esse concurso, eu quero saber… Você vai ter que ficar desfilando por ai de biquíni agora minha filha? Me explica isso direito…
HELÔ – É normal pai, eu entrei nessa de brincadeira, a Lenita que insistiu pra que eu participasse… Enfim, eu acabei ganhando um contrato que eu já assinei para representar a marca Garota de Ipanema, serão seis meses que eu terei que fazer desfiles, fotos, dar entrevistas, tudo pra divulgar a marca e os modelos novos de biquínis, maiôs, cangas, roupas de praia no geral. O salário é muito bom, vai dar pra eu terminar de pagar minha faculdade, fora que eu ganhei um cheque de vinte mil e mais um fim de semana com acompanhante e tudo pago pra um hotel fazenda em Teresópolis… Eu não curto essas coisas pai, ser modelo, tirar fotos e desfilar não é comigo, eu terei que me esforçar muito pra cumprir esse contrato, mas depois eu não irei renovar mais com eles, e prometo ao senhor que nunca mais participo dessas coisas. O senhor confia em mim? (Fala pegando na mão do pai).
ANSELMO – Ta bom minha filha. Eu prometo também fazer um esforço tremendo pra não me aborrecer mais com você, até o fim desse bendito contrato. E é claro que eu confio em você Helô, eu sempre confiei. O que acontece é que eu te amo demais, tenho ciúmes de você e cuidados excessivos, como todo bom pai que zela por uma filha, é normal. Mas essa história de pagar a faculdade eu não aceito. Você não precisa disso, eu que sempre paguei os seus estudos e vou continuar pagando, disso eu faço questão. Agora eu vou tomar um banho e descansar um pouco, e vê se não esconde mais nada de mim Helô, por favor.
HELÔ – Pode deixar pai, eu nunca mais irei esconder nada do senhor.
ANSELMO – E outra coisa… Combina depois com a Celina ai, o dia tudo certinho, pra você trazer o seu namorado aqui em casa pra jantar com a gente. Assim você o apresenta pra família e eu fico conhecendo melhor esse rapaz e as intenções dele.
Helô vai até o pai e o abraça…
HELÔ – Muito obrigada pai. O senhor me deixa muito feliz com essa atitude. Eu tenho certeza que o senhor vai adorar o Pedro.
ANSELMO – Assim espero… (Fala e olha pra Celina que sorri pra ele e dá uma piscadinha, depois sobe as escadas e vai para o quarto).
HELÔ (Sussurra) – Celina cadê a Bia? Eu preciso muito falar com ela. Eu estava preocupada, ela saiu da praia muito nervosa, quando soube que eu ganhei o concurso.
CELINA – E eu não sei… Ela chegou aqui em casa transtornada, eu fiquei até com medo. Eu nunca via a Bia daquele jeito. Mas eu dei um calmante pra ela descansar, fiz um curativo na mão dela, agora ela deve acordar só amanhã de manhã.
HELÔ (Surpresa) – Curativo? Que história é essa? Ela se machucou aonde?
CELINA – Eu também não sei, ela não me disse. Mas chegou aqui com a mão sangrando, fez um corte feio precisava ver… Mas agora ta tudo bem. O melhor que você faz é tomar um bom banho e descansar também, em uma hora o jantar será servido e eu te chamo. Amanhã você fala com ela, quando os ânimos tiverem mais calmos, vai ser melhor assim.
HELÔ (Triste) – Tomara, Deus te ouça. Eu não queria ter magoado a Bia. Se eu soubesse que iria ganhar esse concurso, eu nem teria participado, Era o sonho dela… E eu acabei estragando tudo. Só espero que ela me perdoe.
CELINA – Ela vai te perdoar sim, ela te ama. Isso passa você vai ver… Depois mesmo que você não tivesse participado do concurso, não significa que ela seria a vencedora né?
Helô ficou pensativa, depois deu um beijo no rosto de Celina, e subiu. Celina ficou apreensiva com tudo o que vira e ouvira de Bia, ela ainda estava chocada, mas esperava que tudo passasse e fosse só um momento de raiva da parte dela.
CORTA PARA:
CENA. 10 EXTERNA |DIA AMANHECENDO |CLIPE DE IMAGENS.
{Começa a tocar: Esquecimento – Skank}
Cam abre em fade in lentamente, nesse momento, aparece o sol nascendo, as ruas do Rio, o calçadão. Close no Cristo Redentor, praias, mar… Depois cam foca no edifico Bela Vista.
CORTA PARA:
CENA 11. INTERNA |DIA |COBERTURA DOS BITTENCOURT – QUARTO DE HELÔ.
Helô está se arrumando para descer e tomar o café da manhã. Ela penteia os cabelos, depois se olha uma última vez no espelho e sai do quarto. Ao passar pelo quarto de Bia, ela ouve um barulho e resolve chamar a irmã pra elas conversarem, ela espera um pouco, pensa e depois decide bater na porta, mas antes que ela bata, a maçaneta gira, e Bia abre a porta. As duas ficam cara a cara, sem saber o que dizer uma para a outra e sem graça. Por fim, Helô quebra o gelo e toma a iniciativa.
HELÔ (Sem graça) – Oi Bia. A gente precisa conversar…
Bia olha para a irmã séria e nada responde, as duas se encaram num clima tenso. (Cam foca em Bia, depois dá um close em Helô).
FIM DO CAPÍTULO.
(A imagem congela. Depois se transforma em um cartão postal, jogado sobre Ipanema).
{O capítulo se encerra com a música: Um Amor, Um Lugar – Fernanda Abreu & Herbert Vianna}.