Kapittel ni

XVII – O plano cristão

Resguardando-se pela brisa fria do período matutino, o gigante muro que protegia Merliensen rangia conforme suas moléculas iam se apertando em busca de calor. Merliensen era a vila onde ficava o castelo do Rei Estherood. O lugar mais protegido das redondezas e única vila que os nórdicos nunca haviam tentado saquear na região. Guerreiros armados com espadas faziam a guarda nos quatro portões ao redor da vila. Em pontos estratégicos no alto, arqueiros estavam sempre atentos com seus arcos e flechas.

Com um pesado agasalho negro sobre os ombros e caminhar altivo, o rei Estherood andava apressado pela principal rua da vila seguido de três guardas. Seu destino era a pequena igreja de pedra de Merliensen, onde a missa do padre Miexller já estava pra acabar.

A igreja de pedra de Merliensen era pequena e singela. Seu interior decorado com artefatos de ouro eram considerados os bens mais valiosos de toda a região. As imagens de santos penduradas nas laterais eram obras de um artista local e o altar em tons dourados trazia um ar de paz com a imagem de Cristo pendurado na cruz.

O padre Miexller, um homem calvo de meia idade, olhar calmo e voz suave, estava à frente do altar diante dos seus fiéis. O rei Estherood entrou pela porta principal com seus guardas sem se fazer notar. Parou escutando as palavras proferidas em outra língua por Miexller.

– Adesto supplicationibus nostris, omnipotens Deus, et quibus fidutiam sperande pietatis indulges, intercedente confessore tuo atque pontífice, consuete misericordie tribue benignus effectum. Per dominum…- pregava o padre.

Na primeira fileira estava a rainha Freges, uma mulher serena e madura, apesar da pouca idade que tinha. Linda em seu vestido azul claro e xale de lã sobre os ombros, ela mantinha os cabelos sempre soltos para esconder uma pequena deformação na sua orelha esquerda. Miexller finalizou a missa com o sagrado sinal da cruz e ficou arrumando seu altar enquanto os fiéis se retiravam do local. O rei Estherood fez sinal para os guardas ficarem onde estavam e caminhou pelo corredor até o altar onde sua rainha Freges já se posicionava junto ao padre Miexller.

– Meu lorde. – disse o padre reverenciando Estherood.

Freges se aproximou do rei com um leve sorriso nos lábios e o reverenciou.

– Padre, eu resolvi. Já está decidido. Nada que o senhor me disser vai me fazer mudar de opinião. Eu vou contra atacar estes malditos nórdicos. – disse Estherood.

Miexller parou seus afazeres.

– Acha mesmo que é o certo à se fazer? Você viu o que foram capazes de fazer com Baliensen e Nielisen no passado e novamente com Nielisen recentemente. Será que um ataque é a coisa certa? – respondeu o padre sabendo que poderia expôr sua opinião ao rei, embora talvez fosse em vão.

– Eles já foram longe demais. Chega de se curvar à estas bestas. O que fizeram com Nielisen não pode se deixar assim.

– Talvez Miexller esteja certo. – disse a rainha Freges com sua voz doce e suave.

– E o que você sabe sobre batalhas e guerras? – esbravejou Estherood. – seu pai foi incapaz de derrotá-los por puro medo. – completou o rei.

Freges baixou a cabeça. Era o que ela fazia há anos desde que seu pai cedeu o reino aos nórdicos do leste.

O casamento com o rei Estherood foi arranjado muito antes por seu pai e, embora com o passar dos anos, ela tenha se afeiçoado por Estherood, este não a via como sua mulher, embora ela fosse linda demais e fosse desejo de todos os homens da região.

– Padre, eu conto com a sua benção no próximo amanhecer antes de partirmos. – disse o rei.

Estherood se virou e seguiu para a porta principal. Parou no meio do caminho.

– Você não vem, minha rainha?

Freges ainda permanecia parada diante do altar.

– Eu preciso me confessar. – respondeu ela com a cabeça baixa.

– Que seja. – disse Estherood seguindo seu trajeto e saindo da igreja seguido de seus guardas.

Alguns soldados de confiança do rei reuniam um grupo de homens em frente ao palácio principal quando Estherood chegou.

– Estes são todos os que conseguimos, Alteza. – disse um soldado se aproximando e reverenciando o rei.

– É o suficiente. – respondeu Estherood olhando um grande grupo de homens fortes à sua frente.

Estherood pôs a mão direita debaixo do peito esquerdo sentindo uma forte pontada. Se inclinou um pouco para a frente causando um certo medo em quem estava por perto. Quando um soldado fez menção de ajudá-lo, ele abriu a palma da mão em sinal que estava tudo bem. Já fazia mais de cinco semanas que o rei Estherood começou a sentir estas pontadas abaixo do peito esquerdo preocupando Freges e todos que o cercavam.

– Onde está o príncipe Estherood II? – perguntou o rei quando sentiu-se melhor.

Neste momento, o jovem príncipe Estherood II, cabelos loiros e olhos azuis, aproximava-se sorridente e disfarçando o andar cambaleando.

– Bebendo denovo, meu filho? – disse o rei.

– Calma, pai. Está tudo sob controle. – respondeu o príncipe sacando a espada.

Ele parou em frente ao rei e fez uma reverência usando sua arma.

– Às suas ordens, meu rei.

XVIII – Nórdicos e Cristãos

O mar estava calmo naquele final de tarde e o sol alaranjado estava se pondo no horizonte. As ondas serenas beijavam as areias brancas chegando aos pés de Dimithria e do monge Bishesmun sentados olhando encantados para o sol que desaparecia aos poucos.

– Sabe monge…eu ouvi algo que me chamou muita atenção durante nossa invasão à sua vila… – disse Dimithria sem tirar os olhos do horizonte.

– O que ouviste, minha filha? – Bishesmun falou mantendo os olhos fixos também no horizonte.

– …deixa eu ver se me lembro…era mais ou menos assim: “Proteja-nos, Senhor, da fúria dos homens do Norte. Eles devastam nosso país, matam nossas mulheres, crianças e velhos.” – Dimithria virou o rosto para o monge que sorria ao ouvir as palavras proferidas pela jovem escudeira.

– Essa prece se tornou comum nas igrejas, capelas e nos lares durante as invasões vikings. – respondeu Bishesmun.

Dimithria deu uma gargalhada que despertou uma seriedade no olhar do monge lhe encarando.

– Desculpa Bishesmun, mas isso é um tanto engraçado. – se justificou a jovem loira.

– Não entendi sua atitude, minha jovem.

– Em uma Igreja, na qual mulheres, crianças, homens, sacerdotes e padres estão louvando ao seu Deus e Jesus Cristo, como é possível que nós, armados até os dentes, entremos neste recinto sagrado e massacremos todos os fiéis de forma brutal e sem sensibilidade? – disse Dimithria tentando conter o riso.

– Em tudo há um propósito de Deus. – respondeu Bishesmun encarando a onda que alcançava e molhava seus pés.

– Por que Deus deixou que tal massacre ocorresse em um local de culto e louvor? Por que em um ambiente de paz e adoração? – Dimithria continuou com suas dúvidas.

Bishesmun olhou para a jovem ao seu lado.

– Assim como os seus deuses, nosso Deus tem um propósito para cada um de nós. Talvez àqueles que foram massacrados sem piedade por vocês, precisavam pagar suas dívidas para com Ele.

– Então ter acontecido o massacre significa que Deus puniu todos os pecados do povo e dos seus antepassados? Ou Deus não existe e tudo que ocorre no mundo é pelas circunstâncias reais criadas pela ação do homem? – retrucou Dimithria.

O monge Bishesmun estava sendo colocado contra a parede por aquela jovem escudeira nórdica. Ele estava encurralado, mas por dentro estava admirando toda aquela sabedoria.

– O homem faz coisas que vai precisar pagar diante do Pai.

– Nosso destino está nas mãos dos deuses. Odin, Thor, Freya…todos eles nos ajudaram a invadir, ajudaram a saquear. Eles não nos puniram nenhuma vez.

– Então você está dizendo que os seus deuses são melhores que o meu Deus? – agora era a vez de Bishesmun questionar.

Antes que a jovem pudesse falar algo, o monge se ajeitou de frente para ela.

– Eu não critico os seus deuses. Cada povo cria seu Deus, ou os seus deuses, cada povo grita um ao outro: “ Deixem seus deuses, e venham logo adorar os nossos deuses! Senão, morte a vocês, e aos seus deuses!” Assim será até o fim do mundo, quando até os deuses desaparecerem da face da Terra. Não importa: os povos querem cair de joelhos diante de seus ídolos. – disse Bishesmun.

A jovem escudeira loira ficou pensativa. Kaira e Castelli se aproximaram e estranharam as reações dos dois.

– Está tudo bem? – perguntou Kaira.

Dimithria a encarou sorrindo.

– Sim. Apenas uma conversa sobre deuses. – respondeu Dimithria.

– Teremos problemas. – falou a jovem de cabelos vermelhos. – Sigmund não vai sossegar enquanto não encontrar eles. – ela complementou.

Houve troca de olhares preocupados entre os quatro. No fundo as duas escudeiras sabiam que não poderiam esconder os dois ali para sempre. E no fundo eles sabiam que poderiam serem pegos à qualquer momento. Kaira olhou para o horizonte e respirou fundo absorvendo o último raio de calor antes do sol se pôr em definitivo. Ela precisaria pensar no restante do seu plano para salvar Castelli ou tudo teria sido em vão.

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