“Lobos”

 

O sol acorda lento, espantando os medos da madrugada. Um raio entra na ponta dos pés, e ilumina o rosto de Jade. Ela é exótica. Tem uma pele branca e lisa como seda. Os fios do cabelo são tão dourados, quanto os raios do sol que repousam no quarto.

Ao abrir seus olhos azuis, Jade se depara com Licurgo encostado à parede lhe encarando.

Ela tenta levantar, mas percebe que seu pulso direito está amarrado à cabeceira da cama.

– Quem é você? E, por que me amarrou? – pergunta Jade.

– Eu te tirei do avião e não quero fazer nenhum mal. Você pode ficar tranquila. Eu só quero saber por que você estava armada? – pergunta Licurgo imparcial.

– O avião é do meu tio. Ele sempre anda armado. Me solta daqui! – ordena Jade.

– Eu não posso fazer isso! Eu não sei quem você é! – diz Licurgo.

– Então isso é um sequestro? Eu não quero nada cara! Eu só quero ligar pro meu pai e pedir pra ele vir me buscar! Dá pra me soltar?!

– Você não vai conseguir ir a lugar nenhum. Os seus tornozelos estão bem machucados – diz Licurgo.

Jade observa seus pés enfaixados.

– Olha, eu tenho dinheiro e posso te recompensar. Eu não quero nada seu, eu só quero ir embora! – ela barganha.

Licurgo aponta para uma bandeja que está do lado da cama.

– É melhor comer. Eu preciso sair. Quando retornar vou te levar até a vila. E, só te peço uma coisa, enquanto estiver nessa casa, mantenha-se em silêncio.

Ele sai do quarto deixando Jade intrigada. Ela continua amarrada.

LICURGO

– Eu caminhei determinado em direção aos túmulos. Eu não gostava de ir até lá. Sempre fazia lembrar minha mãe.

Mas, ele fez questão de ligar pedindo que eu o encontrasse. Eu não queria desapontá-lo.

Eu não gostava de sair do perímetro das cercas, mesmo sabendo que durante o dia não teria nenhum problema. À noite é que o terror começava.

Eu cheguei aos túmulos e esperei por ele. O sol do meio-dia iluminava a floresta. Mesmo sabendo que não tinha perigo, ficar ali me dava arrepios.

O som dos rosnados que ecoavam de madrugada, pareciam ecoar agora também. Qualquer barulho era motivo para espanto.

Andei alguns metros e me aproximei da lápide de minha mãe. No local, uma placa de madeira estava cravada na terra, e na placa estava escrito: “Cave aqui”.

– Qual é! Não estou para mistérios! Dá pra vir logo?! – gritei.

Ainda sem saco para joguinhos, finquei a pá na terra e comecei a cavar. Qual é? Agora eu iria desenterrar a minha mãe? Isso não estava certo!

Mesmo reticente, cavei durante toda a tarde, e grande foi minha surpresa ao não encontrar nenhum corpo. Onde será que estavam os restos mortais de minha mãe?

Deveriam estar aqui nesse buraco! Isso não estava nada agradável!

 

 

O buraco já tinha uns três metros de profundidade.

Deitei-me naquela cova olhando para a copa das árvores.

De alguma forma eu também era um homem morto. Um homem morto para a vida. Um homem morto para tudo.

Tentei chorar, mas não consegui.

Desisto e volto para casa. Ao me aproximar, percebo que o lugar está diferente. A casa parece falar comigo, e ela avisa: “algo está fora do lugar”.

JADE

O San Marino Hotel é um dos lugares mais caros da capital pernambucana. É lá que dona Marieta Severo gosta de jantar nas noites de quinta-feira.

Lucas e Jade sobem as escadas que dão para a cobertura.

Eles entram em um salão moderno com teto espelhado e colunas banhadas a ouro.

– Mais uma vez eu te digo, a minha mãe não é uma mulher muito fácil de engolir – avisa Lucas.

– Pode deixar! Eu sou boa pra engolir sapos – brinca Jade.

Os dois se aproximam da mesa no momento em que Dona Marieta levanta para cumprimenta-los.

 

 

– Meu Deus como você é linda! As fotos não mentem! – elogia Dona Marieta.

Marieta é uma mulher na casa dos 50. Seus cabelos são loiros e armados, cheios de ondas. Seus lábios finos são contornados com um batom roxo. Ela está completamente reluzente com brincos e correntes douradas. Uma mulher decerto vaidosa.

– É um prazer conhece-la Dona Marieta!

– Jade! Que nome inspirador! Sem ornamentos, sem qualificações! Somente Jade, e nada mais. Não é doutora, não é duquesa e nem princesa! Somente Jade! Muito prazer em conhecê-la. Pode me chamar de Marieta! Não sou doutora e muito menos Dona! Entendidas?! – disse Marieta abrindo um largo sorriso.

Jade concorda e senta ao lado de Lucas.

Um garçom traz um prato com sopa e deixa diante de Marieta.

– Desculpem, mas eu não resisti e pedi uma sopa para a entrada! Vocês fiquem à vontade!

– Mãe, eu queria que vocês se conhecessem, pois o passo que eu e a Jade vamos tomar, será decisivo em nossas vidas – diz Lucas um pouco nervoso.

– Eu acredito! Acredito muito! Assim como acreditei nos outros passos decisivos que você deu! Sem querer ofendê-la – diz Dona Marieta para Jade – Mas eu creio que você já deve saber.

– Eu sei sim Dona… desculpa, Marieta! É por isso que achei importante estreitar as relações – diz Jade confusa.

– Mãe, agora é diferente. Nós temos uma ligação muito forte, mas também é algo muito puro. A Jade, ela foi diferente em todos os aspectos. Ela sabe se valorizar e me valorizar. Sem falar que as crianças a amam. Sabe, a Bruninha amou a Jade, e olha que ela não se dá com todo mundo não viu.

– Isso é lindo querido! Isso é muito lindo! Eu realmente admiro isso nas pessoas! A capacidade de ter empatia, de ser amigável e de seduzir. Confesso que tenho inveja dessas características, quem sabe eu não aprenda, não é mesmo Jade? – pergunta Dona Marieta tomando uma colherada da sopa.

O telefone de Lucas toca, e ele levanta para atendê-lo. Jade e Marieta ficam sozinhas na mesa.

– O que você faz da vida? Me desculpe a pergunta, mas é que ele foi muito superficial pra falar de você. Só falou de um orfanato e restauração de artefatos – diz Marieta.

– Não é um orfanato. É uma instituição que cuida de crianças psicologicamente abaladas. E nas horas vagas, eu dou uma ajuda a um amigo arqueólogo, nada demais.

– Um amigo! Você e o Lucas eram amigos também? Quer dizer, vocês se conheceram, ficaram amigos e depois começaram a namorar. E, agora estão querendo casar. É isso? – ela pergunta engolindo mais uma colherada.

– Olha Marieta, eu não estou entendendo? Quer dizer, eu até entendo, mas eu não vejo o motivo de toda essa…

– Essa o quê querida? Pode continuar – diz Marieta indiferente.

– Bem Marieta, o que eu quero dizer, e quero que a senhora saiba, é que eu estou interessada em ser feliz com o Lucas, nada mais!

– E há outro interesse? – pergunta Marieta enchendo mais uma colher de sopa.

Jade tenta administrar as palavras com as emoções.

Uma mosca perdida no espaço cai na colher de sopa.

Jade observa Dona Marieta mexer a colher enquanto a mosca se debate morrendo afogada.

– Você tem algo mais a dizer Jade? – pergunta Dona Marieta, alheia à mosca que morre afogada na sopa, e se esconde entre a batata e a cenoura cozida.

– Tem uma… – Jade para e sorri para Marieta – Nada a declarar, DONA MARIETA! – diz Jade levantando-se da mesa.

 

 

Dona Marieta abre bem a boca e enfia a colher dentro. A mosca ainda se debate quando escorrega na língua e percorre o céu da boca cheio de saliva. Dona Marieta mastiga a mosca entre os dentes e engole suas asinhas.

Jade encontra-se com Lucas e os dois descem as escadas.

– E aí? Como foi? – pergunta Lucas.

– Acho que dá pra engolir ela! – brinca Jade com um sorriso faceiro.

Depois de horas forçando; a corda que prende Jade à cama rompe com um puxão violento. Ela está livre.

Ela tenta andar, mas sente muita dor nos tornozelos. Caída no chão, ela percebe uma ripa, embaixo da cama, que está levemente levantada.

Jade se arrasta para debaixo da cama, puxa a ripa, e se assusta ao retirar uma bomba de dentro do compartimento.

– Mas que merda esse louco tá fazendo? – pergunta com a bomba na mão.

Licurgo, desconfiado, se aproxima da entrada da casa, abre a porta devagar, e olha o interior do imóvel. Tudo parece estar no lugar. Só parece.

Ele anda silencioso até o quarto de hóspedes. Abre a porta, e entra, somente para levar uma pancada na testa, e cair tonto.

Jade o amarra à cabeceira da cama com a mesma corda que ele a amarrou.

Apoiada em uma cadeira, ela vai até o quarto dele, e procura a chave da caminhonete que está estacionada nos fundos.

Sem conseguir achá-la no quarto, Jade vai até a cozinha e pega as chaves que estão penduradas na parede. Na sala, ela tenta fazer uma ligação, mas o telefone está fora de área.

Com a chave em uma mão e a faca na outra, Jade sai da casa apoiada em uma cadeira e vai em direção à caminhonete.

 

 

Licurgo acorda e percebe que está amarrado. Ele retira um pequeno canivete que tem no bolso e corta a corda.

Da janela, ele observa Jade entrar na caminhonete e tentar ligar o carro.

A chave entra na ignição, mas não gira. Jade entra em desespero.

Licurgo aparece na frente da caminhonete. Em sua mão direita, está uma chave que ele segura na altura da cabeça.

Jade aponta a faca ameaçando.

Licurgo se aproxima da janela do motorista e joga a chave no colo dela.

Uma chuva pesada começa a cair. O sol declina trazendo sombra para a fazenda.

Jade dá partida e começa a dirigir. A caminhonete só aguenta andar alguns metros e uma fumaça branca começa a sair do motor. O carro estanca no meio da fazenda.

Licurgo se aproxima da porta do motorista e diz: – Eu não sei o que você quer! Mas eu, não quero machucar você!

– Então porque me amarrou? – grita Jade.

– Existem coisas que você não pode e nem deve saber. Mas, você estar armada, foi um dos motivos!

– Quero sair daqui e voltar pra casa, só isso! – Jade fala com a voz embargada.

– Tudo bem, eu vou te ajudar. Mas, agora, a melhor coisa a fazer é voltar pra casa. Amanhã eu prometo que te deixo na vila. Tem um amigo que pode nos ajudar. O que você acha?

– Que merda de opção eu tenho?!

– Olha me desculpe por te amarrar, mas, eu juro que não queria te fazer nenhum mal. Vamos começar direito agora tá bom! Eu me chamo Licurgo e essa é minha fazenda!

– Tá! Me tira logo daqui!

– Como você se chama?

– Esmeralda! Meu nome é Esmeralda!

Licurgo entra em casa carregando Jade nos braços. Ele vai até a oficina que fica nos fundos e traz duas muletas.

– Acho que isso vai servir – ele diz entregando para ela.

Após lhe entregar roupas limpas. Ele espera ela entrar no banheiro, para em seguida sentar-se na cadeira ao lado do telefone.

Ele aguarda até que o aparelho toca estridente. Licurgo atende e diz: – Onde você estava? Eu te esperei a tarde inteira! E, aquele aviso no túmulo, não teve graça! O que você quer afinal?

– Vinho branco, por favor – pede Marieta ao garçom.

Ela põe uma foto de Jade sobre a mesa e encara o homem à sua frente. Ele é negro e careca, seu corpo musculoso disfarça os seus 40 anos.

Um vento frio percorre a cobertura do San Marino Hotel. Tomas encosta na cadeira enquanto analisa a foto.

– Ela é mais bonita do que a última – diz Tomas admirado.

– Elas sempre são muito bonitas e muito ordinárias. Aparência para mim só é útil quando me dá prazer. Quando pode dar prejuízo, não vejo nenhuma beleza.

– O mesmo serviço de sempre? – pergunta Tomas.

– O mesmo serviço de sempre. Se tiver alguma novidade me liga. Quero você 24 horas na cola dessa aí, entendeu?! Não vai ser tão fácil como ela pensa! – diz Marieta pegando uma taça de vinho.

As ruas da periferia de Recife ainda estão molhadas da última chuva, quando Tomas encosta seu carro a alguns metros de um HB20 preto. Ele acende um cigarro, e espera.

Tomas observa Jade sair do carro e andar desconfiada para uma casa velha à esquerda. Ela toca a campainha e aguarda. Um homem com a camisa do flamengo abre a porta. Ela mostra uma foto para ele e logo em seguida saca um revólver atirando no flamenguista.

Jade corre, entra no carro, e foge rapidamente do local.

Tomas pega o celular e faz uma ligação.

– Eu estava prestes a desistir. Mas parece que a loirinha deu um vacilo. Você não vai acreditar no que eu acabei de ver! – ele diz excitado.

 

 

A cozinha de Licurgo é uma mãe amorosa. Um espaço que cheira a tempero e consolo.

Ele corta os legumes, tempera o porco e experimenta um vinho no percurso.

Jade entra na cozinha se apoiando nas muletas. Seus cabelos loiros ainda estão molhados.

– Eu não sou muito boa na cozinha, mas eu posso te ajudar em alguma coisa? – ela pergunta ressabiada.

Licurgo deixa tomates, cenouras e uma faca na mesa. Ele puxa a cadeira, e com o olhar, pede que Jade se sente. Ela senta-se, pega na faca e começa a cortar os legumes. Enquanto isso, Licurgo retira um caderno de receitas, deixa em cima da mesa e sai.

Jade abre o caderno, e o cheiro de comida caseira exala de dentro dele. As páginas mostram receitas e mais receitas, até que, no fim do caderno, uma foto envelhecida está perdida no meio das folhas.

Jade olha a foto que contém uma família numerosa, com velhos, jovens e crianças, todos enfileirados em frente a casa em que ela se encontra.

No verso da foto está escrito a seguinte legenda: “Aniversário de 60 anos da Vó Biza. Antes da seca”.

Ao baixar a foto, os olhos de Jade cruzam com os de Licurgo. Ele toma a foto da mão dela, e, guarda no bolso de trás da calça.

Lá fora, a noite abraça a casa em uma escuridão terrível. A única luz mais próxima vem da cozinha de Licurgo.

Ele estende a toalha de mesa, bordada pela Vó Biza para as ocasiões especiais.

Organiza os pratos de porcelana, os copos de cristal (presente de 30 anos de casamento da Vó Biza e do Vô João) e, abre a garrafa de vinho tinto. Tudo com muito capricho e esmero.

A cena é impecável. As velas iluminam a mesa dando um ar rústico e ao mesmo tempo elegante.

O cheiro de limpeza, o brilho da cerâmica no chão e o aroma do porco temperado com ervas e legumes, dançam na cozinha em uma orquestra de encher os olhos.

Licurgo senta em uma ponta da mesa e Jade na outra. Ela inadvertidamente começa a servir-se. No entanto, Licurgo a repreende com os olhos.

Ela resiste à fome e aguarda os movimentos do anfitrião.

Ele baixa a cabeça, e parece fazer algum tipo de prece. Depois de alguns segundos, ele volta do transe e começa a servir-se.

Ela acha tudo muito estranho.

– Espero que goste – ele diz servindo-se.

– Eu quero te agradecer por me tirar do avião e me ajudar com os tornozelos. Você fez muito por mim. E,… desculpa por bater na sua cabeça. Isso não foi legal.

– Sem problemas. Mas, o que aconteceu? O avião?

– Pane no motor! Meu tio vai me matar! – ela diz enquanto mastiga um pedaço do porco.

– Ele vai gostar de te ver viva – brinca Licurgo.

– Você mora sozinho?

– Antes isso era repleto de gente. Agora só sou eu e os bichos. Meu cachorro morr… – ele para e toma um gole de vinho. Jade percebe o estranhamento.

– Aqui é tão… silencioso. O que aconteceu? Onde estão os outros?

Ele mastiga para depois tomar mais um gole do vinho.

– É uma longa história.

– Você não se sente só, vivendo assim tão isolado? – pergunta Jade.

– Eu me mantenho ocupado. Essa terra é minha origem e manter isso tudo em ordem é a minha missão.

– E, seus pais? – pergunta Jade.

– A Vó Biza e o Vô João são a minha única referencia de pai e mãe. Eles me ensinaram tudo na vida. Me protegeram de um mundo cruel – diz Licurgo.

– Que bom!

– Ahh, já ia me esquecendo. Ele te visitou ontem, e disse que os seus tornozelos estarão bons pela manhã – diz Licurgo de forma natural.

– Ele? Ele quem? – ela pergunta intrigada.

– Isso você não pode e nem deve saber. É melhor comermos – ele fala encerrando o assunto.

Jade fica confusa. Mas, quem é ‘ele’? Será que isso tem haver com a bomba? Pensa Jade.

Enquanto eles comem, o som de um uivo agudo, vindo da floresta, invade a cozinha assustando-os.

Jade para de mastigar e Licurgo impede o percurso do garfo à boca. Ele se levanta e vai até a janela.

O vento raivoso joga os galhos das árvores para os lados, e as sombras da floresta rastejam sorrateiras em direção à fazenda. A noite pragueja males e pesadelos para a casa de Licurgo.

Ele volta para mesa e continua a comer.

– São lobos? – pergunta Jade.

– Não tem lobos por aqui. É outro tipo de bicho! – diz Licurgo sentando novamente.

A noite profunda e silenciosa cobre a casa com um manto de frio e escuridão.

O som de um casco batendo no chão se aproxima da casa como uma locomotiva do mal.

O rugido de um bicho feroz aumenta gradativamente e os copos de cristal começam a se bater uns contra os outros

A mesa de madeira treme assustada e o lustre da cozinha balança de um lado para o outro

A garrafa de vinho cai deixando o chão vermelho.

Uma presença maligna se aproxima e é possível sentir o seu ódio.

Como uma avalanche negra, um bicho grande de quatro patas, explode a janela da cozinha, caindo sobre a mesa de jantar.

Os copos de cristal caem e se quebram todos. Os pratos de porcelana se destroem no chão.

O bicho é grande, marrom e peludo. Seus chifres altos lembram um alce adulto. Ele grunhe como um porco no abate.

Agonizante e desesperado ele corre espalhando sangue e pêlos pela cozinha. Seus olhos vermelhos e possessos procuram uma saída.

Licurgo vai até o balcão e segura uma faca. Jade cai no canto da parede e se protege com as mãos.

O animal corre para a sala. Derruba a mesinha, e pisa o telefone, esmigalhando-o. Logo o bendito telefone vermelho de Licurgo.

Mas de repente ele para, e, arquejando, cai morto no meio da sala.

Licurgo desfere um golpe no pescoço do bicho para ter certeza de sua morte. Vai até seu quarto e pega a espingarda, para em seguida observar a floresta através da janela.

– O que foi isso? Você tá bem? – pergunta Jade.

Licurgo confirma com a cabeça que está bem. Após o susto, ele termina de lacrar a janela da cozinha com ripas de madeira. Jade observa assustada.

Ele pega uma cadeira, põe em frente à porta de entrada, senta e mira a espingarda para a porta.

Jade, ainda com as muletas, se aproxima do bicho morto que está no meio da sala.

– Olha, vem cá! Você precisa ver isso – Jade fala.

Ele a ignora, e apenas observa a porta, apontando a espingarda, em total estado de alerta.

Ela insiste novamente.

Licurgo se aproxima, e, na pele do bicho, na região da barriga, uma área está raspada e é possível ler as seguintes palavras: “KEREMO A MULHER”.

– O quê significa isso? De quem eles estão falando? Não sou eu né? Olha por favor, me diz alguma coisa! Eu tô ficando assustada! – pede Jade.

– Eu não sei. Só vamos ficar aqui até o amanhecer!

– Quem tá lá fora? Quem são essas pessoas? E, por que fizeram isso? – questiona Jade.

– Não são pessoas. São monstros. E, eu não sei por que fizeram isso.

– Monstros tipo esse que acabou de morrer?

– Não, isso é um bicho do mato! – diz Licurgo.

– Mas, o que é que eu tenho a ver com tudo isso? Pelo que entendi eles me querem! – Jade fala angustiada.

– Eu não sei! Você me enche de perguntas! – reclama Licurgo estressado.

– Talvez se você explicasse alguma coisa, eu não faria tanta pergunta. Quem são esses monstros? – pergunta Jade.

– Eles rondam a fazenda toda noite, e vão embora ao amanhecer. Mas, não podem ultrapassar a cerca por causa disso – Ele retira do bolso um saquinho de pano contendo um pó vermelho – Isso é o pó do diálobu.  É radioativo pra eles, mas não é nocivo pra nós. Esse pó está em todo subsolo da fazenda. Satisfeita? – diz Licurgo.

– Meu Deus que coisa confusa, e ao mesmo tempo fantástica. Monstros, pó! Isso tudo é surreal! – diz Jade.

– Existem mistérios debaixo do sol que ultrapassam nosso entendimento e nossas experiências. Mas, não deixam de ser reais. Os monstros lá fora, fazem parte dessa experiência que você nunca teve e acha que não existe. É preciso ter um pouco de fé pra acreditar no que eu digo e se proteger desses monstros. E aí? Vai vir comigo ou não? Vai entrar na história ou vai ficar duvidando? O que eu falo é a mais pura verdade. Você não precisa acreditar! Porque eu já acredito! – diz Licurgo.

– Eu não quero mais ficar aqui! Você precisa me levar pra vila.

Licurgo vai até a oficina e volta com uma bolsa gigante. Ele retira um rojão, sai da casa indo para o quintal e acende o fogo de artifício. Um guarda-chuva de fogos se abre no céu.

– O que é isso? – pergunta Jade

– Um pedido de socorro. Há uns 20 km daqui mora um velho amigo meu. Nós temos fogos de artifício pra sinalizar que precisamos de ajuda. Ele virá pela manhã quando for mais seguro. Se meu carro não funcionar, ele vai te levar até a vila – informa Licurgo.

Ele volta pra casa e continua sentado, apontando a espingarda para a porta de entrada. Jade está acomodada no sofá. Ela retira uma aliança do bolso e começa a girá-la entre os dedos.

– Você pode me fazer um favor? (Olhando para Jade). Você pode organizar essa bagunça? Juntar essa louça (apontando para a cozinha), varrer todos esses cacos. Eu não quero sair daqui até o amanhecer, então se você puder ajudar eu agradeço – diz Licurgo.

Jade levanta e começa a arrumar a bagunça. Ela junta os pedaços do telefone e põe aos pés de Licurgo. Ele olha para o objeto, e vemos os seus olhos cheios de lágrimas.

 Licurgo carrega a espingarda e encara a porta com fúria.

 

Enquanto os dois tentam entender o que aconteceu na sala. No quarto de Licurgo, uma mosca curiosa sai voando e pousando nos móveis.

Ela continua perdida procurando alguma coisa pra se encostar, até que ela para em um bolso da jaqueta de Licurgo, que está pendurada atrás da porta.

Dentro do bolso da jaqueta, que tem milhares de bolsos, está uma bomba que insiste em sussurrar: tic-tac-tic-tac-tic-tac-tic-tac.

 

 

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  • Excelente! Adorei a Dona Marieta, ela é sem noção kkkkkkk. Nossa, e que dilema esse monstro ter aparecido para o Licurgo e a Jade, curioso pra saber o que vai acontecer.

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  • Excelente! Adorei a Dona Marieta, ela &#233 sem no&#231&#227o kkkkkkk. Nossa, e que dilema esse monstro ter aparecido para o Licurgo e a Jade, curioso pra saber o que vai acontecer.

  • Excelente! Adorei a Dona Marieta, ela é sem noção kkkkkkk. Nossa, e que dilema esse monstro ter aparecido para o Licurgo e a Jade, curioso pra saber o que vai acontecer.

  • Uma quebra de ritmo. Esse capítulo é bastante distinto do anterior. Gostei do diálogo entre Licurgo e a Jade.

  • Uma quebra de ritmo. Esse capítulo é bastante distinto do anterior. Gostei do diálogo entre Licurgo e a Jade.

  • Pesquisa de satisfação: Nos ajude a entender como estamos nos saindo por aqui.

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