ATENÇÃO!
O EPISÓDIO A SEGUIR CONTÉM CENAS E SITUAÇÕES QUE PODEM SER CONSIDERADAS EXTREMAMENTE PERTURBADORAS. NÃO ACONSELHÁVEL PARA PESSOAS MAIS SENSÍVEIS.
ATO DE ABERTURA
“… E conhecereis a verdade
e a verdade vos libertará.”
JOÃO 8:32
Existem verdades que deveriam vir à tona,
Existem verdades que deveriam continuar escondidas…
Mas o que fazer quando ambas as verdades vão acabar machucando alguém? Se ficar escondida, uma pessoa é prejudicada. Se for revelada, a outra pessoa é prejudicada.
Talvez por isso as pessoas hoje em dia vivem de enganação e nem sempre estão enganando ao próximo, mas enganando a si mesmos.
Um mundo onde a conveniência pessoal vale muito mais do que o bom senso,
Um mundo onde o amor virou ódio,
Um mundo onde a alegria deu lugar à tristeza,
Um mundo onde normalizou machucar, normalizou magoar, normalizou humilhar…
A maior verdade é que não importa o quão bom você seja… Alguém sempre vai tentar te prejudicar, não importa o dia ou a hora, ou o ano.
E o que mais temos nos dias de hoje são pessoas feridas, e até mesmo incompreendidas. Para Irene, suas cicatrizes transpareceram a sua vontade de viver… Sua vontade de ser feliz.
Belfast, Província de Ulster, Irlanda do Norte, 1983.
É noite e está chovendo em Belfast. Vemos um casal andando na rua. O homem de aparentemente uns 20 anos está indo na frente bastante incomodado, como se estivesse querendo fugir da jovem.
— Miles, espera!
A jovem em questão se trata da irmã Irene no auge de seus 18 anos e sem nenhuma pretensão de virar freira. Ela possuía cabelos pretos até os ombros e usava uma franja.
— Não, Irene! Eu disse que não iria suportar algo assim, a gente estava bem juntos e agora você me vem com essa de… Gravidez?
— O quê? Achava que você me amava, que faria tudo por mim. Este filho que está crescendo aqui dentro é fruto do nosso amor.
— Eu nunca falei que queria ser pai! Entenda de uma vez por todas… Esse filho não pode nascer.
— O quê? Você tá ficando maluco? Tá querendo que eu aborte o nosso filho? E todas aquelas coisas que você me falava? Estamos namorando desde os meus 17 anos, você prometeu que ficaria comigo pra sempre.
— É, eu até prometi… Mas mudei de ideia.
— Não, não pode fazer isso!
Irene se ajoelha e o agarra pelas pernas.
— Não vá, Miles! Por favor! Eu te amo! Eu te amo e eu preciso de você comigo!
— Me solta, Irene!
— Nunca! Nunca eu vou te soltar. Você prometeu que viveríamos juntos para sempre!
— Cala a boca!
Miles empurra Irene que cai rolando por aquela pista inclinada e molhada.
— Eu não quero nunca mais voltar a ver a tua cara de novo… Você morreu pra mim, Irene!
Irene no chão, a chuva castigando, a dor permeando em cada sentido de seu corpo.
— Não, Miles! Miles, não me deixa aqui! Miles!!
E quando as coisas pareciam que era o fim do mundo, ainda poderiam piorar.
Casa de Irene.
— O quê? Grávida?? – Esbravejou a mãe de Irene e em seguida o pai acompanhou o raciocínio da esposa.
— O que você fez da tua vida, Irene?
— Por favor, pai e mãe… Vocês precisam me ajudar.
A família de Irene era extremamente conservadora, e um tipo de “delito” desses era inaceitável para eles.
— Eu te criei com tudo o que você tinha direito, te carreguei no meu ventre pra me pagar dessa forma?
— Eu amava ele, mamãe! Eu amava o Miles! Qual o problema nisso? Por que eu não posso ter o mesmo que você e o papai?
— CALADA!
A mãe de Irene a esbofeteia, a moça cai no pé da cama horrorizada.
— Por quê? Por que estão fazendo isso comigo? Eu sou filha de vocês!
O pai dela responde:
— Não, Irene! A partir de agora não sabemos mais quem é você. Nossa filha está morta.
— Vai para um convento junto com essa aberração que você carrega em seu ventre, e espero que você e essa criança comam do pão que o diabo amassou.
O que deu errado? Irene foi amada esse tempo todo, sempre acertou em tudo, e no seu primeiro erro… Ela foi rejeitada?
Perdeu o homem que amava, perdeu os seus pais e o pior de tudo… Perdeu a si mesma.
E quando tudo parecia que já foi o limite, ela ainda estava pra conhecer o seu verdadeiro inferno. Como prometido, os seus pais a levaram para um outro local, que não era bem um convento. Na verdade era…
— Bem vindos ao Asilo Madalena!
Assim ela foi recebida pela perversa madre Lúcia.
O calvário para Irene começou.
OPENING:
EPISÓDIO 6:
” A GLÓRIA DA TERCEIRA CASA”
ATO I
Dentro do asilo, os pais de Irene estão acertando os últimos detalhes com a madre Lúcia.
— Não se preocupe, senhores. Aqui cuidaremos bem de sua filha e dessa criança quando nascer.
— Obrigada, madre! Peço que entenda a nossa situação e que tenha conhecimento de que nossa filha é uma garota rebelde e que pode dar um pouco de trabalho no princípio.
— Quanto a isso, não precisa ficar preocupada. Temos boas normas de disciplina no nosso instituto.
— Sendo assim, meu marido e eu partiremos. Obrigada pela hospitalidade!
— Disponha! Tua filha está no melhor lugar do mundo pra ela.
Quarto de Irene, Tarde.
Irene está deitada na cama e a madre Lúcia bate na porta e em seguida entra.
— Senhorita Irene? Não quer vir conhecer melhor o instituto?
— Eu não quero conhecer porcaria nenhuma! Eu não queria vir para este lugar. Meus pais me obrigaram!
— Querida, precisa entender que está sendo difícil para os teus pais lidar com tudo isso.
Ela se levanta da cama, incomodada, e responde:
— Espera aí! Tá sendo difícil pra eles? Pra eles? E quanto a mim, madre? Hein? Eu engravidei do homem que eu achei que me amava. E agora tanto ele quanto os meus pais me abandonaram… E terei que ficar aqui junto com vocês, freiras idiotas.
— Eu teria mais respeito a este local sagrado se fosse você, jovenzinha. Lembre-se que está com 18 anos e um bebê na barriga, este lugar fará bem a você.
— É, eu duvido muito.
Horas mais tarde, Irene se encontra juntamente com as mulheres da lavanderia. Ela percebe que aquele lugar consegue ser ainda pior do que ela mesma imaginou.
Irene está sozinha estendo umas roupas e uma jovem de aparentemente a mesma idade que ela, se aproxima.
— Oi, você é nova aqui, não é?
Irene não quer responder.
— Fiquei sabendo que chegou hoje pela manhã.
— Olha, está bem, você quer fazer amizade. Mas quero te dizer logo pra não se apegar, porque eu vou sair deste lugar o mais rápido o possível.
Neste momento, outro jovem rapaz chega até elas.
— Lyla? Tá tudo bem?
A moça que se aproximou de Irene é a pequena Lyla que conhecera Madeleine nos anos 70. Agora é uma jovem formosa, loira e de belos olhos castanhos claros.
O rapaz é o Mickey, agora com 20 anos e se tornou um jovem belo com o cabelo preto e liso.
— Nada, Mickey. Estava dando boas vindas à nova moradora.
— Ah, claro! Muito prazer! Eu sou o Mickey e essa é a Lyla!
Irene estranha a hospitalidade daqueles jovens, mas decide cumprimentar de igual modo.
— Meu nome é Irene.
Lyla olha atentamente à Irene e diz:
— Você… Está grávida, não é?
— Como sabe? A minha barriga ainda não tá aparecendo e nem nada.
Mickey responde:
— As fofocas por aqui correm a solta.
— Ótimo! Vim parar num lugar cheio de fofoqueiros.
— A Lyla e eu também pretendemos, algum dia, ter um bebê… Mas claro, faremos isso quando sairmos deste lugar.
— Espera, espera… Vocês dois… São… Um casal?
Lyla responde:
— Digamos que sim, mas… Não conta isso pra ninguém. Aliás… Por que a gente contou isso pra ela, Mickey?
— Eu não sei, quando me dei conta, já tinha contado.
— Enfim, não queremos que ninguém saiba que um dia pretendemos sair daqui juntamente com a mãe do Mickey.
— Estamos há anos lutando pela nossa liberdade, e falta pouco agora.
— Espera, estão aqui há tanto tempo assim?
Lyla responde:
— Quase a nossa vida toda. Desde que éramos crianças.
— Como conseguiram? Eu não imagino isso.
Mickey diz:
— Bom, tivemos que ter muita fé… Como éramos crianças e não tínhamos pra onde ir, precisávamos ter paciência. Mas agora que a Lyla e eu atingimos a maioridade, estamos mexendo os pauzinhos pra nos livrarmos deste lugar.
— O Mickey está juntando um dinheiro por fora ajudando alguns carpinteiros e coletores desde que ele tinha 14 anos. Ás vezes ele recebe uma boa mesada por isso, então ele está guardando tudo para que possamos finalmente nos mudar daqui.
— Sim, tem umas casinhas em um povoado aqui perto onde eles alugam barato. Se conseguirmos dinheiro o suficiente, podemos nos mudar pra lá e eu arrumo um emprego.
— Uau! Me admira a confiança de vocês. Enquanto eu pertencia a uma família de classe média e agora fui jogada em um lugar como esses.
Lyla, mudando para um tom um pouco mais sério, diz:
— Irene, vamos te pedir somente uma coisa: Não confie na madre Lúcia. Essa mulher já fez atrocidades conosco durante esses anos. Não deixe que ela faça o mesmo contigo.
Irene acha estranho o tom ameaçador de Lyla, não por conta dela, mas por dizer que a madre superiora poderia ser alguém cruel. Afinal, no consentimento de Irene, a madre era uma “mulher de Deus”.
Um dia se passou, vemos em um quarto, um homem abotoando a sua calça jeans e colocando um cinto. Ele anda até a porta e está sem camisa. Este homem é Daniel, agora com mais de 40 anos de idade.
Na cama onde ele acabara de se levantar, está alguém que não esperávamos… A própria madre Lúcia com uma camisola. Pelo visto, Daniel também mantinha relações sexuais com a madre às escondidas.
— Você já vai? Tá cedo?
— Já deu por hoje, madre… E outra coisa, você já está velha demais. Hoje só rolou porque eu bebi muito, senão nem encostaria um dedo em você.
— Fala isso como se ainda tivesse 30 anos, Daniel. Faça mil favores!
— Não sei como o Adolph fazia contigo tantas vezes naquela época sem ter bebido um vinho pelo menos.
— Ah, por favor, querido! Deveriam me agradecer por ter sido a única mulher a aceitar os fetiches sexuais de vocês dois. E não fale mais do Adolph! Lembre-se que aquele idiota surtou após vocês terem se livrado daquela pestinha há mais de 10 anos.
— Eu preciso trabalhar, e não me peça para vir no teu quarto de novo, porque não rola mais.
— Bom, que seja… Mas caso seja do teu interesse… Tem uma novata no instituto, ela é nova e está grávida.
— Hum… Interessante.
— Achei que gostaria de saber.
— Você é uma serpente mesmo, madre. Ainda não sei como Deus não te castigou.
Mais tarde, alguns dos homens trabalhadores se encontram na lavoura e Mickey está lá colhendo verduras. Daniel chega até ele com um capim na boca e um chapéu.
— Ei, Mickey! Qual a nova?
Mickey se incomoda com a presença dele. Deixa suas coisas de lado e sai.
— Ei, ei, ei, volta aqui, garoto!
— Eu não tenho nada que falar com você, Daniel!
— Calma, calma… Só queria ter um papinho de homem pra homem com você.
Ele segura no queixo de Mickey e diz:
— E aí, já tirou a virgindade da Lyla? Comeu ela? Como foi?
— Me solta! Fica longe de mim!
— Calma, garotinho. Ah não me diga que ainda não pegou ela? Como você é mole, garoto!
— Fica longe da Lyla e de mim! Ou eu conto pra todo mundo que você transa com a madre superiora!
Daniel se irrita e segura no braço de Mickey com força.
— Escuta aqui, seu moleque! Toma muito cuidado com o que você diz por aí. Lembre-se que você só está aqui porque a gente permitiu. Do contrário, nem você e nem aquela tua mãe negra e imunda estariam neste lugar.
— Não fala da minha mãe!
— Quê? Só porque agora tem cabelos no saco, acha que pode me desafiar, moleque?
— Fale o que quiser de mim… Mas nunca mais se atreva a falar da minha mãe.
Daniel sorri com sarcasmo e em seguida decide deixar Mickey em paz.
Enquanto isso, Irene está na costuraria e Esther, mãe de Mickey, a está ensinando a tricotar.
— Ai, droga! Eu não consigo!
— Calma, menina! Está passando a agulha do jeito errado. Precisa relaxar as mãos, tricô é uma terapia.
— Estou começando a sentir falta de um psicólogo.
— Você vai conseguir. E o melhor de tudo, vai poder fazer roupinhas para o seu bebê que vai nascer.
— É… Essa é a parte que mais me preocupa.
Lyla vêm sorridente na direção delas com um gorro nas mãos.
— Oi, olha só o que eu fiz pra você, Irene! Aliás, para o seu bebê.
Irene fica impressionada e Esther diz:
— Que coisa mais linda, Lyla! Esse gorro vai ficar uma graça.
— Espera, você fez isso? Mas… Em tão pouco tempo?
— Aprendi muito com a dona Esther. Olha, como a gente ainda não sabe se vai ser menino ou menina, eu fiz da cor branca, espero que não se importe.
— Eu… Eu… É que…
Irene segura aquele pequeno gorro e já se imagina segurando o seu bebê quando nascer. Em meio à sua dor, alguma coisa despertou sentimentos prazerosos para ela naquele momento.
Os meses foram se passando e já é 1984. Irene está no seu quarto mês de gestação. Ela de fato aprendeu rápido a tricotar durante esse período e passa grande parte do seu tempo fazendo isso.
Ela nem precisou ceder às falcatruas da madre Lúcia, pois estava muito ocupada com outras coisas.
Entretanto, nem todo mundo ali parece gostar de ver tudo no lugar, e aí é que vemos que a maldade até tira um descanso, mas ela sempre volta.
É quase 7 da noite, Lyla está no celeiro terminando de trocar a água dos cavalos. Ela teve um longo dia de trabalho e está exausta.
Quando troca a água do último cavalo, ela se assusta ao dar de cara com alguém. E não poderia ser ninguém pior do que Daniel.
— Oi, Lyla! Precisa de ajuda?
— Não, eu já terminei!
Lyla tenta sair apressada.
— Opa, opa, calma, princesa!
— Deixa eu sair, Daniel!
Ele se aproxima dela quase que esfregando seu corpo na garota.
— Deixa eu perguntar uma coisa: Como tá a tua relação com o pirralho do Mickey?
— Do que você tá falando?
— Ah pensa que eu não sei como vocês dois se olham quando estão juntos? Faça mil favores.
— A nossa vida não é da tua conta!
— Ah não? Fico me perguntando de como seria se o Mickey soubesse que… (Ele fala puxando a saia de Lyla pra cima) Outro homem foi muito mais esperto do que ele.
— Tira as mãos de mim!
— Ah, garotas, garotas, garotas! Sempre tão repulsivas. Posso te garantir que o Mickey não iria te dar nada do que eu posso oferecer a você, garotinha.
— Pode sim! Porque a diferença entre o Mickey e você… É que o Mickey é um homem, e você é um animal!
Daniel se irrita e segura o pescoço de Lyla a empurrando para a parede do estábulo.
— Então é assim, sua pivete? Eu vou te mostrar o que é ser homem de verdade, sua imunda!
— Não, me solta! Me solta!
— Ninguém me faz de palhaço, sua fedelha vagabunda!
Daniel começa a lamber o rosto de Lyla. Segurando forte, ele rompe a blusa dela e apalpa os seus seios.
— Me solta! Me solta!
— Calma, pequena… Vou deixar o caminho da felicidade livre para o Mickey depois que eu entrar.
Daniel puxa a saia de Lyla até o chão, ele tira a sua calça e está disposto a violar a garota.
— Duvido o Mickey aparecer pra te salvar.
Ouve-se uma voz.
— Seu insignificante!
Irene chega ao local acertando um rastelo na cabeça dele.
— Aaaaiii! De onde você saiu, sua vagabunda?
— Irene, graças a Deus!
— Lyla, vem comigo agora!
— Esperem! Esperem! Voltem aqui, suas putas!
Lyla e Irene saem correndo do celeiro e voltam novamente para o asilo. Esther percebe a situação e vai acudi-las.
— Meu Deus, o que aconteceu? O que aconteceu aqui?
— O Daniel! Ele tentou me estuprar.
— Maldito desgraçado!
— Como esse idiota pode trabalhar aqui e fazendo uma coisa dessas? Por que não denunciam?
— Quer mesmo saber, menina? A madre superiora e ele têm um caso.
— O quê?
— Todos os capachos que já passaram pela madre Lúcia tiveram essas “aventuras” com ela.
— Que asco! Que asco!
— Eu estava com tanto medo, dona Esther. Com tanto medo.
— Ai, minha menina! Não se preocupe, agora vai passar.
Mickey chega ao quarto neste momento e percebe que Lyla está ali chorando.
— O que foi? Lyla? Tá chorando, meu amor? O que houve? O que ela tem, mãe?
— Filho, é que…
— O quê? O que foi? Por que ninguém me responde?
Irene quebra o silêncio.
— O tal do Daniel tentou estuprar a Lyla.
— Quê?
Lyla diz:
— Mickey, calma…
— Filho, se acalme, por favor.
— Não, não, não. EU VOU MATAR AQUELE FILHO DA PUTA! EU VOU MATAR!
Mickey, carregado de ódio, tenta sair do quarto. Irene se coloca na frente da porta impedindo-o.
— NÃO, MICKEY!
— SAI DA MINHA FRENTE, IRENE! SAI DA MINHA FRENTE, EU VOU MATAR ESSE DESGRAÇADO!
— Filho, se acalme, por favor!
— ELE TENTOU TOCAR NA MINHA LYLA, MÃE! NA MINHA LYLA! EU VOU ACABAR COM ESSE MISERÁVEL, EU VOU MATAR ELE!
Irene esbraveja:
— ESCUTA AQUI, MOLEQUE! PARA UM POUCO PRA PENSAR PELO MENOS UMA VEZ NESSA TUA MALDITA CABEÇA MASCULINA! Eu sei perfeitamente bem que o que você mais quer neste momento, é se vingar daquele miserável. Pode ter certeza que eu nunca me perdoaria se tivesse chegado alguns minutos mais tarde naquele celeiro. Mas você precisa usar o cérebro! Precisa ter estratégia! Lembre-se da promessa que você mesmo fez à tua mãe e à Lyla? Lembra? Então, vocês precisam focar em sair desse maldito lugar. Enquanto isso, terão que aguentar calados algumas situações, porque eu sei que vocês têm grandes chances de saírem daqui… Mas se fizer alguma coisa agora, Mickey, vai colocar todo o seu plano a perder. Guarde um pouco esse ódio e use-o para granjear dinheiro e sair deste lugar. Eu só estou esperando o meu filho nascer para pensar no plano mais rápido pra fugir daqui, mas temos que ser espertos, eu já não tenho mais nada a perder, mas vocês tem. Então aguentem mais um pouco…
Mickey, chorando, acaba recuando e vai abraçar Lyla. Esther segura nas mãos de Irene.
— Obrigada, menina. Muito obrigada.
— Mas isso não vai ficar assim, eu mesma vou confrontar a madre superiora.
— Espere, Irene! Espere!
Minutos mais tarde, Irene já se encontra no gabinete da madre Lúcia contando tudo.
— … E foi isso o que aconteceu, quero que tome medidas por isso, madre.
— Você veio aqui na hora que eu iria me recolher e ainda quer exigir alguma coisa? Quem você pensa que é, garota? Está aqui há 4 meses e acha que têm moral pra me colocar ordens?
— Não são ordens, madre! O teu funcionário tentou estuprar uma garota no teu instituto. Não acha isso suficiente?
— E sabe lá o que essa garota não deve ter feito pra provocar ele? Com certeza ela que se insinuou, querendo um homem mais velho.
— Você se ouve quando fala? Que tipo de madre superiora você é?
— Olha o tom de voz, mocinha.
— O tom de voz que vá pra puta que pariu! Está defendendo ele porque é conveniente pra você. Tenho quase certeza que você paga a mais a ele, só pra ele meter em você.
Madre Lúcia se enfurece e acerta um tapa tão forte em Irene, que ela cai no chão.
— JÁ CHEGA! EU NÃO VOU SUPORTAR QUE ME OFENDAM DESSA FORMA! NÃO VOU SUPORTAR!
Ela bate várias vezes em Irene. Está furiosa, louca, completamente fora de si.
— SUAS IMPURAS! IMPURAS! POR CAUSA DO PECADO DE VOCÊS, NÓS ESTAMOS PAGANDO O PREÇO. POR CULPA DE PROSTITUTAS COMO VOCÊS!
— ISSO! ME CHAME DE PROSTITUTA! ME CHAME DE PUTA E DO QUE QUISER! MAS PELO MENOS EU NÃO ME ESCONDO DEBAIXO DE UM HÁBITO PRA ESCONDER A DESGRAÇADA QUE VOCÊ É.
— AAAAAAAAHHHH SUA VADIA IMUNDA!!
Ela segura no pescoço de Irene e a enforca na porta.
— Não pode me acusar pelos meus pecados, não pode me acusar, não pode me acusar, não pode me acusar. Porque… Hahahaha… Porque Deus enviou o seu filho unigênito para morrer por nós naquela cruz e assim ele levou consigo todos os nossos pecados. Eu já estou perdoada, eu já estou perdoada! Mas você não, você vai direto para o inferno, vai se assentar ao lado de satanás e fornicará com ele.
— Me… Me solta, sua louca!
— Igualzinha aquela pirralha, igualzinha a porca da Madeleine. Você tem muita sorte que está com essa criança em seu ventre, do contrário, estaria debaixo de uma cova.
Madre Lúcia solta o pescoço de Irene e se afasta. Irene se levanta tossindo muito e depois diz:
— Não sei quem é essa tal de Madeleine, mas espero que ela tenha mesmo destruído a tua vida.
Irene sai dali. Madre Lúcia fica completamente irritada e joga todas as coisas da sua mesa no chão.
— AAAAAAAAAAAAAHHHH Maldição! Maldição!
Irene é bem diferente de qualquer um dos que trabalham ali. Mesmo na dor, ela continua com coragem para enfrentar a tudo e a todos. Ela vai precisar dessa coragem toda, porque não se sabe o que pode acontecer até o momento de seu parto.
Os meses foram se passando. Irene, Esther, Mickey e Lyla precisaram aguentar calados, várias humilhações dos trabalhadores e superiores daquele local. Enquanto o tempo passava, testemunhamos cada um deles vivendo o verdadeiro inferno.
- Mickey no sol quente capinando a ponto de cair de exaustão. Daniel derrubando ele no chão para provocá-lo.
- Lyla sendo repreendida por uma das freiras severamente e apanhando nas mãos.
- Irene com a barriga enorme e se esforçando para trabalhar na lavanderia.
- Esther lavando o chão e outras pessoas chutando o balde com água e fazendo piadas raciais à ela.
Juntos, precisaram aguentar ofensas, maltratos, espancamentos, dores… E finalmente o dia mais que esperado para Irene chegou.
— AAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHH!!!
Ela entra em trabalho de parto. Esther foi deixada de fora da ocasião. As parteiras fazem todo o trabalho.
— Vamos, garota! Empurra! Força!
— Eu não consigo, eu não consigo!
— Só mais um pouco! Ele tá quase aparecendo!
— AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHH!!!
A criança nasce, a parteira pega uma tesoura e corta o cordão umbilical.
— Parabéns! É um menino!
Irene, extasiada e sem forças, segura o seu filho por uns segundos. Uma das freiras chega naquele momento.
— Ocorreu tudo bem?
— Sim, senhora.
— Deixe-me vê-lo.
Ela segura a criança e vê algo estranho.
— Tem alguma coisa errada… Ele não tá respirando direito.
— Mas… Estava agora há pouco.
— Precisamos tratá-lo em outro lugar, rápido!
Elas levam o bebê dali. Irene tenta chamar por elas.
— Es… Esperem, onde vão levar meu filho?
Irene vê aquelas senhoras levando o seu bebê para outro lado até a sua visão começar a ficar turva e ela desmaiar.
Horas se passaram. Irene começa a acordar levemente e vê Esther ali do seu lado.
— Menina! Você está bem?
— Es… Esther, cadê ele? Cadê meu filho?
— Eu… Eu sinto muito, menina. Ele… Não resistiu. A parteira disse que ficou sem ar nos pulmões do pobrezinho e…
— Não, não, não, não, não! NÃO! NÃO! EU QUERO MEU FILHO! EU QUERO MEU FILHO! NÃO! NÃO! POR QUÊ? POR QUÊ? NÃAAAO!!! NÃAAAAAAO!!
Esther abraça Irene tentando consolá-la.
— EU QUERO MEU FILHO! EU QUERO MEU FILHO!! AAAAAAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH!!!!!!!
Naquele dia, Irene descobriu a pior dor que uma mãe pode ter na vida… A perda de um filho. O que já não fazia mais sentido para a sua vida antes, agora tudo se transformou em poeira.
Ali acabou os sonhos de uma jovem de (agora) 19 anos. Acabou o seu futuro, acabou a sua alegria, acabou a sua fé.
Dois dias depois…
Irene se encontra completamente depressiva após o ocorrido e já não tem forças pra absolutamente nada. Passa o tempo inteiro em cima da cama e mal come.
Esther e Lyla sempre tentavam fazer de tudo para que ela voltasse a si, para que ela voltasse a conversar.
No quarto de Irene, vemos as roupinhas que ela fez durante esses meses tricotando, e agora já não terá ninguém para usá-las.
Em uma manhã como qualquer outra, Mickey e Lyla estão na paróquia sozinhos rezando. Ambos com seus corações puros e cheios de fé, tentam fazer o possível para ajudar a amiga.
— Querido Deus, ajude a minha amiga e irmã, Irene, a sair desse cativeiro.
— Sim, querido Deus, ela é nossa amiga e queremos ver o bem dela.
— Ajude-a a superar este momento de dor e de perda.
— Devolva a ela, a força que ela tinha quando veio pra cá.
— Nossos corações também estão angustiados, Senhor.
— Pensamos também várias vezes em desistir.
— Mas confiamos no Senhor e sei que tens o melhor para todos nós.
— Obrigado pela tua bondade e pela tua misericórdia conosco.
— Mesmo na nossa tribulação, o Senhor têm sido bom.
— O senhor têm sido Deus.
Ambos pronunciam:
— Agora e para sempre… Amém!
Eles se levantam, dão as mãos e saem da paróquia.
Minutos depois, eles vão até o quarto de Irene. Ela está ali deitada na cama sem nenhuma perspectiva de vida.
Lyla, com sua doçura, se aproxima dela primeiro.
— Irene. Você não precisa responder nada, se não quiser… Mas estamos aqui hoje por você.
Ela olha para Mickey acenando com a cabeça.
Mickey se aproxima do outro lado da cama e mostra pra Irene um girassol. O mesmo que ele fez há mais de 10 anos com Madeleine.
— Eu achei que você gostaria de ficar com esse girassol. Sabe… Ele já ajudou uma pessoa a sair de uma situação assim uma vez.
— Você se parece muito com uma amiga nossa que esteve aqui há muito tempo. O nome dela era Madeleine… Ela fugiu daqui e… Eu tenho certeza que ela está viva e está bem.
— Sim, eu também tenho. Ela era tão corajosa como você, Irene.
Irene que estava inclinada para o lado, começa a se mexer devagar e fica de barriga pra cima e com a cabeça um pouco apoiada no travesseiro. Ela olha para os dois ali, um de um lado da cama e outro do outro lado.
— Por… Por que fazem isso? Sequer me conhecem.
— Primeiro… Segure o seu girassol. (Ela segura). Segundo… Isso é o que somos! Ajudamos as pessoas que amamos. Não é, Lyla?
— É claro que sim.
— Vocês… Vocês me amam?
Lyla responde:
— Escute, Irene. Nada do que a gente fizer vai poder reparar a dor que você tá sentindo agora de perder um filho. Mas de uma coisa você pode ter certeza: Nós nunca vamos deixar de orar por você, não importa o que aconteça. E mais, você é forte, você é guerreira, vai conseguir dar a volta por cima e logo receberá uma recompensa. Mas não será aqui… Será no céu.
— Eu li na bíblia uma vez que… A glória da segunda casa será maior que a da primeira. Mas aqui já é a tua segunda casa, infelizmente, então a gente vai fazer o seguinte: A glória da terceira casa será maior que as anteriores, porque vai ser lá onde todas as nossas dores vão ter um fim. As tuas, as da Lyla, as da minha mãe… E as minhas.
Irene já a ponto de chorar, olha para os dois diversas vezes.
— Eu não acredito que eu vou dizer isso, mas… Vocês poderiam me abraçar?
Os dois nem perdem tempo, cada um fica de um lado da cama abraçando a Irene. Era a força que ela precisava naquele momento, a força que lhe faltava para sair daquele estado de luto.
Uma vez que a pureza de Mickey e Lyla ajudou a curar uma garota na década passada, a história se repete agora. E Irene jamais imaginaria que uma única vez na sua vida… Ela realmente foi amada.
Duas semanas depois…
Irene já se encontra recuperada, tanto de seu resguardo como também de sua pequena depressão-pós parto. Claro que uma dor como essas não passa em questão de dias, mas ela já se encontra forte o suficiente para agir e botar em prática o seu novo plano.
— Escutem, gente! Eu tenho quase certeza que a madre superiora possui alguma coisa escondida no gabinete dela que pode servir como provas para nós provarmos os absurdos que ela faz aqui.
Mickey pergunta:
— Mas tem certeza disso? E o que pode ser?
— Enquanto estive mal, eu ouvia alguns burburinhos por aí e parece que a madre Lúcia realiza um trabalho por fora e que a igreja e nem a justiça sabe. Se eu descobrir do que se trata, podemos denunciá-la e afundar de vez esse lugar.
Lyla a responde:
— Mas, Irene. Isso é muito perigoso, e se a madre Lúcia descobrir? O que a gente faz?
— Por isso que nós três temos que fazer com que isso dê certo. Vamos deixar a tua mãe de fora, Mickey, não queremos que ela se envolva nisso.
— Tudo bem.
— Tá, escutem bem como vai ser o plano. Primeiro nós iremos…
Mickey e Lyla ficam atentamente ouvindo o plano de Irene.
É final da tarde, a madre Lúcia se encontra em seu gabinete e alguém bate na porta.
— Entra!
Quem entra é Lyla.
— Com licença, madre superiora. Espero não está atrapalhando.
— Ah, jovem Lyla, em que posso ajudar?
— É que… É que…
— Desembucha, garota!
— Eu vi uma das mulheres discutindo feio com a irmã Adelaide, estava a desrespeitando e eu vi aquilo e fiquei bastante chateada, então achei por bem falar com a senhora.
— Mas quem foi?
— Eu não estou lembrada agora, mas elas estavam ali perto do celeiro.
— Toda vez eu preciso ficar apartando essas garotas desobedientes. Me leve até lá, Lyla. E obrigado por me avisar.
— Sim, senhora. Eu a acompanho.
Quando a madre superiora e Lyla saem da porta, esta última acena para que Irene e Mickey viessem pelo corredor até a porta do gabinete.
Os dois vêm agachados e espera que a madre e Lyla virem o corredor pra poder entrar.
Elas viram o corredor, Irene abre a porta.
— Ok, Mickey. Agora você precisa ficar de guarda pra ver se o idiota do Daniel ou qualquer outra pessoa não aparecem.
— Se alguém aparecer, o que eu faço?
— Ah, garoto! Se vira, arruma uma desculpa, tudo eu que tenho que pensar? Me poupe!
— Tá bom. Entra lá!
Irene entra no gabinete. Mickey fica na porta olhando para todos os lados pra ver se alguém aparece.
Lá dentro, Irene começa a procurar nas prateleiras, nada de estranho encontra. Ela vai à mesa, abre todas as gavetas, vê alguns papeis, mas nada que pudesse ser suspeito.
— Tem que ter alguma coisa aqui. Essa vaca precisa ter um podre a mais, ela precisa ter.
Irene continua vasculhando, anda para um lado e para o outro. Em um determinado momento ela dá um passo em cima de um tapete próximo à mesa e sente que o piso está meio solto.
— Espera!
Ela fica pisando naquela parte do piso e sente ele ranger.
— Tem alguma coisa aqui, tem alguma coisa aqui.
Ela tira o tapete de cima e vê que tem um pequeno compartimento no chão.
— É isso! Tem que ter alguma coisa escondida aqui.
Mickey cochicha pela brecha da porta.
— Achou alguma coisa?
— Achei, mas preciso arrumar uma chave, continue vigiando.
— Tá bom.
Enquanto isso, a madre Lúcia e Lyla chegam ao celeiro.
— Então… Onde elas estão?
— Estranho. Elas estavam aqui ainda pouco.
— Tem certeza que houve uma discussão?
— Sim, madre. Uma discussão feia!
— Ah, por favor, garota! Eu tenho mais o que fazer.
A madre Lúcia se retira, Lyla tenta fazê-la voltar.
— Espere, madre Lúcia, espe… Ai, ai, ai!
— O que foi, garota?
— (Fingindo) Eu senti uma dor forte aqui no pé do estômago, tá doendo muito.
— Calma, respira!
— Foi de repente, não sei o que aconteceu.
Enquanto isso, Irene encontra um molho de chaves na gaveta. Tenta abrir com várias delas e finalmente encontra a chave que abria aquele compartimento. Ela abre, encontra uma maleta, tira para fora do compartimento e coloca no chão da sala.
Ela abre a maleta e encontra a câmera, moedas antigas, o álbum de fotografias post-mortem e ainda um livro de feitiçaria e rituais macabros.
— Puta Merda! Puta Merda!
— O que foi, Irene? (Falando da brecha da porta)
— Eu encontrei o que a gente precisava, Mickey.
— Então sai logo daí.
— Espera, espera, vou ver se tem mais.
— Ai, que teimosa!
No celeiro, a madre Lúcia fica tentando acudir a falsa dor de Lyla no estômago.
— Você está no teu ciclo menstrual?
— Mais ou menos, mas não costumava doer assim.
— Calma, vai passar. Venha, vou te levar até a enfermaria.
— Não, não, só me leva até o meu quarto. Eu tomo um comprimido e logo vou estar boa.
— Tem certeza?
— Sim, sim, tenho.
A madre Lúcia leva Lyla para dentro, a garota fica preocupada querendo saber notícia dos amigos.
Mickey está na porta tentando apressar Irene.
— Conseguiu, Irene?
— Acho que não tem mais nada, já estou indo.
Ele olha pra frente e ouve barulho de passos vindo do corredor.
— Puta que pariu! Tem alguém vindo, Irene! Sai daí!
— Quê? Não dá tempo de eu sair e fechar.
— Deixa as coisas aí, vamos embora!
— Espera, espera. Ai, droga!
Irene coloca tudo dentro da pasta, devolve ao compartimento e o tranca novamente com cadeado. Ela pega o tapete e coloca de volta exatamente onde estava. Quando ela está prestes a sair, Mickey vê que a pessoa vindo no corredor está mais perto, então ele decide fingir e fica na porta do gabinete como se tivesse acabado de chegar e iria bater na porta.
— Ma… Madre superiora? Está aí?
E quem está no corredor, é justamente a madre Lúcia.
— Precisa de ajuda, Mickey?
— Ah, é que… É que… Eu…
Irene do lado de dentro:
— Ai, fudeu! Fudeu!
— Eu… Eu vim aqui porque… Ah! Eu vim procurar a Lyla, ela disse que ia vir aqui na tua sala e como ela não voltou, fiquei preocupado.
— Ai, garoto. Você sempre tão distraído com tudo.
Ela passa por ele para entrar no gabinete, Mickey fica a ponto de dar um grito. Irene percebe que ela está vindo e se esconde atrás da porta.
A madre entra e, por sorte, não olhou para trás. Ela vai até a sua mesa.
— Tua amiga estava chorando de cólica ainda agora, coitada.
Enquanto ela mexe nas prateleiras, Mickey olha pra trás e acena pra Irene sair da sala. Ela sai sem que a madre Lúcia perceba. Mickey disfarça e continua a interagir.
— Ahh, sério?
— Sim… Olhe, dê esse comprimido para ela, é muito bom para cólicas ou problemas intestinais e pede pra ela beber muita água. Não sei por que ainda sou boazinha com vocês sendo que nem merecem.
— Ah, muito obrigado, madre. Com… Com licença!
— E tomem cuidado, vocês!
Mickey sai da sala fechando a porta, Irene está no canto da parede.
— Essa foi por pouco, Irene, meu coração quase saiu pela boca.
— Sim… Mas agora temos provas, agora sabemos como fazer.
Minutos mais tarde, os garotos estão juntamente com Irene em seu quarto.
— Escutem. Eu achei esse mapa no porão. Amanhã eu espero a madre superiora sair de sua sala, pego aquela maleta e dou um jeito de sair daqui. Eu vou pegar o caminho pelo campo de centeio até às colinas. Depois das colinas, tem uma estrada que leva até umas montanhas e lá tem um asilo que se chama Sta. Agatha. Se eu levar essas coisas pra lá, vão ser obrigados a fecharem este lugar e libertar todos vocês.
Lyla questiona:
— Mas… Você vai sozinha? É muito perigoso.
— Não se preocupem… Eu volto com as autoridades pra buscar vocês… Estamos combinados?
Ambos se entreolham e dizem:
— Combinado!
Mais um dia se passou, tudo tinha que estar como deveria estar. Boa parte dos trabalhadores foram fazer trabalhos externos e só algumas dezenas continuaram ali.
Irene está sozinha na dispensa pegando alguns itens. Quando ela termina de pegar, Daniel aparece na porta.
— Ah! Me assustou!
— Por que tá aí escondidinha, menina?
— Eu não estou escondida, dá licença.
Irene tenta passar por ele e ele bloqueia a sua passagem. Fecha a porta e começa a olhá-la de cima a baixo.
— O que tá fazendo? Me deixa sair.
— Sabe… Eu deixei a poeira abaixar, simplesmente pelo fato de que você estava com um bucho enorme e eu não queria extrapolar com uma grávida. Mas agora que você não tá mais grávida e nem tem mais filho, eu pensei… Por que não? Por que não se vingar da pestilenta asquerosa que me bateu naquele dia?
— Você é um nojento e asqueroso. Como pode tentar abusar de uma menina inocente?
— Sabe por quê? Porque moças virgens me excitam, e você atrapalhou o meu momento.
— Pelo visto não é só moças virgens que te excitam, não é? Ou pensa que eu não sei que você andou colocando esse teu pau imundo na madre superiora?
— Como se atreve, sua desgraçada?
— Se enxerga, Daniel!
Ele a segura pelo braço com força.
— Não me provoque, sua garota de merda, não me provoque!
— Sabe porque você estupra as mulheres, Daniel?
— Cala a boca!
— Porque sabe que nenhuma mulher iria querer alguma coisa contigo se não fosse à força.
— Eu mandei calar a boca!
— Aceita logo que você é um fracote decrépito. Está ficando velho e logo esse teu pau nunca mais vai ficar duro de novo.
— EU MANDEI CALAR A BOCA, SUA DESGRAÇADA!
Daniel empurra Irene contra uma das prateleiras. Ela tenta se levantar e bate nele várias vezes. Ele dá um tapa nela e quando ela se levanta para alcançar a porta, ele a agarra pela cintura, a lança no chão e começa a tirar a sua roupa.
— Você quer saber se eu ainda tenho pau duro, sua puta?
Ele vira Irene de costas, tira suas calças, coloca seu órgão pra fora, ela tenta se esquivar enquanto aquele homem, sem pudor, começa a estupra-la.
— Nãaaaaaaaaooo!!
— Ainda vai me desafiar, sua desgraçada? Vai?
Daniel tapa a boca de Irene enquanto a penetra por trás.
— Eu vou te mostrar quem é que manda, sua puta!
Irene morde a mão de Daniel até sangrar.
— AAAAAAAAAAHA!!! DESGRAÇADA!
Ela ainda no chão, dá um soco no nariz de Daniel que vai para trás.
Irene se levanta, olha para a parede e vê uma machadinha de lenhador. Ela pega e segura com força.
— Vamos ver como você fica agora sem esse teu pinto, seu estuprador de merda!
Irene alça a machadinha para o alto e em seguida corta o órgão genital de Daniel. O mesmo cai rolando pelo chão.
— AAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH!!!!
Irene solta a machadinha, pega o pedaço do pênis de Daniel no chão e o enfia na boca dele sem nenhum remorso.
— ENGOLE TEU PINTO AGORA, DESGRAÇADO! ENGOLE! ENGOLE, ESTUPRADOR FILHO DA PUTA!
Daniel dá uma cabeçada na testa de Irene. Ela cai próxima à parede.
— EU VOU TE MATAR! EU VOU TE MATAR!
Daniel tenta enforcar Irene. Ela olha para o lado e vê um pedaço de tijolo se soltando daquela parede. Irene estica o braço, alcança o tijolo e acerta na cabeça de Daniel.
— Aaaaaaahh!!
Daniel cai deitado. Irene sobe em cima dele.
— ISSO É PELA LYLA!
Ela acerta o tijolo na cara dele.
— ISSO É PELA TAL DA MADELEINE!
Acerta mais uma vez.
— E ISSO… É POR VOCÊ TER ME ESTUPRADO, SEU FILHO DA PUTA DO CARALHO!
Ela bate várias vezes, não está com nenhum medo e com nenhum remorso.
— MORRE, SEU DESGRAÇADO! MORRE!
Irene afunda aquele tijolo na cara de Daniel até que ele ficasse completamente deformado. Ao dar o último golpe, ela joga o tijolo no chão e dá um grito cheio de ódio e amargura.
— EEEEEEahhhhhhhhhhhhh!!
Ela respira ofegante, rápido, quase como uma taquicardia.
Eis que a madre Lúcia entra no recinto.
— QUE GRITARIA É ESSA? O QUE TÁ…?
Ela vê o corpo de Daniel ali no chão.
— Daniel? DANIEL! NÃO! NÃAAAAAO! O QUE VOCÊ FEZ?
Irene se levanta e não está nem um pouco preocupada em ter sido pega.
— SUA DESGRAÇADA! MATOU O MEU DANIEL!
— ESSE FILHO DA PUTA TEVE O QUE MERECEU!
— SIM… E AGORA EU VOU TE MATAR!
Madre Lúcia avança pra cima de Irene. As duas ficam se atracando nos quatro cantos daquela dispensa até derrubar as prateleiras. Madre Lúcia começa a arranhar Irene e a puxar seus cabelos. Irene a empurra, dá um soco no nariz dela.
Ela a agarra por trás e puxa seu hábito arrancando a parte de cima mostrando seus cabelos.
— SUA VELHA IMUNDA!
A madre Lúcia vê a machadinha no chão, tenta alcançá-la. Irene vai atrás dela, a derruba no chão e deixa ela virada pra cima.
Irene sobe em cima da madre. Arranca o crucifixo do pescoço dela, segura-o como se ele fosse uma espécie de punhal.
— ISSO É POR TODAS AS VIDAS QUE VOCÊ TENTOU PREJUDICAR DURANTE TODO ESSE TEMPO! MICKEY! LYLA! DONA ESTHER! A MIM E TODAS AQUELAS PESSOAS INOCENTES QUE VOCÊ TENTOU MATAR!
— NÃO, ME SOLTA! ALGUÉM ME AJUDA!
— VÁ PARA O INFERNO, MADRE LÚCIA!
Irene acerta o crucifixo no peito da madre. Acerta uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, onze, doze vezes. Só descansou até ter total convicção que aquela mulher estava completamente morta.
Irene termina o feito. Está literalmente com sangue nos olhos, enfim se livrou do mal que assolava aquele lugar. Agora a passagem para ela está livre.
Irene vai até o mausoléu e pega uma espingarda. Em seguida vai para a direção do gabinete. Algumas pessoas aparecem pra tentar impedi-la.
— FICA LONGE OU ESTOURO OS MIOLOS DE VOCÊS!
Irene ameaça a tudo e a todos que está tentando ir de contra a sua vontade, ninguém entende o que tá acontecendo. Ela entra no gabinete, pega a chave, abre o compartimento, e tira aquela maleta de lá de dentro. Ela olha mais um pouco no canto e vê uma outra caixinha lá atrás. Quando abre, vê uma enorme quantidade de dinheiro guardado.
Irene não se deu o trabalho de fechar o compartimento. Vai até o seu quarto, pega o mapa, coloca dentro de uma bolsa pequena. Olha para o quarto e diz:
— Até nunca mais, inferno!
Irene vai para baixo e se encontra com Mickey, Lyla e Esther. Esta última questiona:
— Irene, o que aconteceu? Por que você tá toda ensanguentada?
— A madre Lúcia e “o porra” do Daniel estão mortos.
Todos em uníssono:
— QUÊ???
— Sim, eu os matei. Agora o caminho está livre para todos nós. Dentro dessa maleta eu tenho as provas necessárias para acusar a madre e este lugar. Livro de feitiçarias, fotografias de pessoas mortas e muito mais.
Esther diz:
— Ai que horror!
— Agora eu irei buscar ajuda no Sta. Agatha e vão mandar vasculharem esse lugar.
Lyla diz:
— Espera, Irene! Por que não espera aqui?
— Não, gente! Minha jornada aqui terminou. Ah! Tenho uma coisa.
Ela tira da bolsa, a caixinha com dinheiro.
— Mickey, aqui tem uma boa quantia em dinheiro que será o suficiente pra vocês comprarem uma casa longe desse lugar. Acho que tem uns 200 mil dólares aí.
— Mas… Mas… Onde você achou isso?
— No mesmo compartimento da sala da madre, com certeza a puta desviava o dinheiro que recebia. Agora usem bem essa grana e vão viver as vidas de vocês.
Lyla diz:
— Espera, Irene! Espera!
Irene vai até o celeiro, abre um dos estábulos e pega um dos cavalos colocando-o pra fora. Lyla pergunta:
— Espera, você sabe andar a cavalo?
— Um dos privilégios que eu tive por ser uma garota de classe média.
Esther diz:
— Espera, Irene! Por que você não vem com a gente? Fica com a gente, por favor!
Mickey também concordando, diz:
— É, Irene! Vem morar com a gente! A minha mãe adota você.
— Muito obrigada, gente! Mas essa é a vida de vocês… Eu não posso ficar nela. Mas antes de partir, quero dar um recado, principalmente pra você, Mickey.
— Eu?
— Sim.
Ela fica bem próxima do rosto de Mickey.
— Nenhum de nós vai voltar a se ver de novo. Então eu vou pedir uma coisa a você… Nunca, em hipótese nenhuma, se atreva a abandonar a Lyla. Ela é uma garota especial e ama você… Se você fizer isso… Eu juro por Deus que eu volto e acabo com você como eu fiz com o Daniel, tá me ouvindo?
Mickey sentindo o tom da ameaça, mas ao mesmo tempo emocionado, responde:
— Tá… Tá bom.
— Eu já perdi a minha fé nos homens depois que eu fui abandonada. Mas você tem a chance de ser diferente e quero que faça isso pela Lyla. Sejam felizes! E não deixe que nada venha mudar essa essência que há em vocês.
Os três começam a chorar.
— Ah não, gente. Não chorem, por favor!
Lyla diz:
— Vamos sentir tanto a tua falta!
— Se lhes servem de consolo… Eu também irei. Vocês foram as melhores coisas que me aconteceram durante a minha vida inteira.
Os três abraçam à Irene. Ela pega a espingarda e entrega nas mãos de Mickey.
— Ah toma isso. Não vou mais precisar. Você é o homem da casa agora, Mickey. Proteja essas duas mulheres quando estiverem na casa de vocês… Obrigada pelo girassol, obrigada pelas orações, Lyla, obrigada por me ensinar tricô, dona Esther… Obrigada por tudo!
Irene sobe no cavalo, ajeita a pasta e suas coisas ali. Ela olha para eles uma última vez e diz:
— Eu amo vocês!
Ela dá o galope e sai dali.
— Heia! Heia!
Os três se despedem em lágrimas e ao mesmo tempo aliviados, porque enfim a liberdade chegou para eles.
— Adeus, Irene!
— Adeus!
— Se cuida!
Irene cavalga pelo campo de centeio rumo às colinas. Os raios de sol de fim de tarde realçam a beleza de seus olhos castanhos. Os seus cabelos cortam o vento enquanto caminha para a sua liberdade.
Entrou naquele instituto uma menina e saiu uma mulher. Uma mulher guerreira, que não abaixou a cabeça, que lutou até o último segundo e que jamais será esquecida. Irene deixará um legado de superação e sabedoria jamais visto na história da humanidade.
Ela cavalga pelo campo até sumir pelas colinas, mesmo lugar onde a Madeleine trilhou para fugir dali.
E por falar em Madeleine, acho que precisamos voltar um pouco no tempo.
1984 —- 1970
A madre Cláudia pergunta à Madeleine quando ela chega a sua porta:
— A propósito, menina… Qual é o teu nome?
— Ah sim, o meu nome é…
Naquele momento, Olivia está ali do lado e ouve Madeleine pronunciando o nome para eles. Ela coloca as duas mãos na boca e fica completamente impactada.
— Não, não pode ser! Não pode ser! NÃO PODE SER!
DIAS ATUAIS
Olivia acorda no chão de seu quarto gritando muito.
— NÃAAAAAAAAAAAAAAAAAAAOOOO!!! NÃAAAAAAAAAAAAAAAAAAOOOO!!!
Ela se levanta ofegante, desesperada e completamente atônita.
— EU SEI A VERDADE, EU JÁ SEI DE TODA A VERDADE!
Ela sai de seu quarto desesperada e corre para tentar impedir algo.
— ESTÃO COMETENDO UM ERRO! EU DESCOBRI TUDO! EU SEI O MAL QUE ESTÁ ESCONDIDO NESTE LUGAR! EU SEI DE TUDO!
A verdade ainda precisava ser revelada.
E a batalha final contra as trevas começará agora.
ATO II
Corredores do Sta. Agatha.
Olivia está correndo desesperada, precisa falar algo pra alguém, algo que ela viu enquanto esteve naquele lugar.
— ESTÃO COMETENDO UM GRANDE ERRO!
As luzes começam a piscar. Olivia olha para o teto e para todos os lados.
— Essa não.
Dentro da paróquia, irmã Irene está rezando com o mexer de lábios enquanto o padre Albert e a madre Mary Hellen ficam apenas à sua espera.
Dentro do Sta. Agatha, Olivia vai até o telefone da recepção, disca o número da emergência e percebe que tá mudo.
— Droga! Não pode ser, não pode ser!
Olivia vai para fora, desce as escadas da entrada e corre pelo gramado. David está ali e a chama:
— Olívia! O que tá fazendo?
— David!
Ela corre na direção dele.
— Sabe me dizer onde o padre Albert foi?
— Ah eu acabei de ver ele entrando na igreja com a madre superiora e com a irmã Irene.
— Meu Deus! Precisamos ir até eles agora mesmo!
— Mas o que foi? O que tá acontecendo?
— David, você confia em mim?
— É claro que eu confio.
— Então venha comigo e se prepare… O que está prestes a acontecer aqui… Será pior do que imaginamos.
David sente a urgência de Olivia e decide acompanhá-la.
Dentro da igreja, Irene está terminando a sua oração e o padre olha para os lados e percebe que as luzes estão piscando.
— Estranho. Alguma queda de energia, madre?
— Não que eu saiba.
Irene termina de rezar e faz o sinal da cruz.
— Bem, acho que podemos ir agora.
O padre responde:
— Ótimo. Vamos!
Neste momento, Olivia entra impetuosa na igreja juntamente com David.
— ESPEREM! ESPEREM!
A madre Mary Hellen, estranhando, pergunta:
— Olivia, o que tá fazendo?
— Vocês precisam acreditar em mim, precisam acreditar em mim!
O padre Albert fica completamente incomodado e questiona:
— Do que você tá falando, menina?
— Estão prestes a cometer um grande erro. Eu descobri toda a verdade desse lugar.
Mary Hellen fica do lado esquerdo de Irene, enquanto o padre Albert se coloca mais na frente.
— Preciso que seja mais específica, enfermeira Olivia. A senhorita está atrapalhando um momento de…
— … NÃO, PADRE! ME OUÇA! EU VI! EU VI TUDO! DEUS ME MOSTROU A VERDADE, ME MOSTROU O QUE ACONTECEU, ME MOSTROU COMO O MAL CHEGOU NESTE LUGAR E VOCÊS ESTÃO ACUSANDO A PESSOA ERRADA!
— Quê? Do que você tá falando, garota?
— Não sabe? Então pergunte à madre superiora.
Ele olha pra madre, ela fica sem entender, ele olha pra Olivia de novo.
— Que tipo de desrespeito é esse, menina?
David, preocupado, também questiona:
— Olivia, eu não estou entendendo, o que você quer dizer?
— VOCÊS NÃO ENTENDEM!… ELA É A MADELEINE!
O baque no olhar de todos. Mary Hellen, Irene, David e o padre Albert ficam sem reação, mas Irene é a única que sabia mais ou menos do que ela está falando.
— Ma… Madeleine? Como assim, garota? O que deu em você?
— SIM! SIM, EU VI TUDO! ELA ESTEVE NO ASILO DE MADALENA NOS ANOS 70 E SOFRIA ABUSOS. TENTOU FUGIR E FOI ENTERRADA VIVA! ENTÃO ELA FEZ UM PACTO COM O DEMÔNIO PRA PODER ESCAPAR DE SUA SEPULTURA E ELA CONSEGUIU SAIR! COMO CONDIÇÃO, A ENTIDADE NO QUAL ELA FEZ O PACTO, DISSE QUE ELA TERIA QUE ABANDONAR O NOME VERDADEIRO DELA E USAR OUTRO NOME. E FOI QUANDO ELA CHEGOU NO STA. AGATHA PELA PRIMEIRA VEZ QUE…
FLASHBACK- STA. AGATHA, 1970.
A madre Cláudia questiona à Madeleine assim que ela chega à sua porta:
— A propósito, menina… Qual é o teu nome?
— Ah sim, o meu nome é… Mary Hellen.
— Que lindo nome, Mary Hellen! Entre. Será muito bem vinda aqui no Sta. Agatha.
FIM DE FLASHBACK.
— A verdade estava debaixo dos nossos olhos o tempo todo. Ela é quem fazia os rituais e atraia as entidades das trevas pra cá. O demônio ficou escondido nela durante todos esses anos para que ela pudesse ter uma vida normal sem que ninguém desconfiasse. Mas quando algo errado acontecia, a entidade usava a madre pra fazer as obras de feitiçaria aqui dentro.
Todos, absolutamente todos estão impactados diante dessa revelação de Olivia. Mas a incredulidade do padre Albert ainda permeia.
— Olha, eu já ouvi muita coisa nesses últimos dias. Mas essa é a acusação mais absurda e herege que eu já vi em toda a minha vida. Não vou permitir que falte com respeito à madre supe…
Neste momento, a madre Mary Hellen acerta o padre Albert com um punhal.
— Aahhhhhh!
Olivia e David gritam.
— PADRE ALBERT!
— MEU DEUS!
Ela continua a afundar aquele punhal no coração do padre Albert sem nenhum pudor.
— Você fala demais, padre Albert! Já me cansei de você.
O padre Albert cai no chão morto e com os olhos abertos. David e Olivia ficam completamente em choque. Irene cai no chão perto do altar, impactada.
Mary Hellen pega o punhal, limpa o sangue com o dedo e em seguida coloca-o na boca.
— Esperei 50 anos por esse momento. Obrigado por me emprestar seu corpo, Madeleine. Eu assumo de agora em diante.
O sino da igreja toca, todas as luzes dentro do Sta. Agatha se apagam. Ruth está do lado de fora e estranha o apagão repentino.
Sarah está passando pela enfermaria. Ela tenta ligar os interruptores.
— Mas que droga aconteceu aqui?
Sonia chega.
— Alguma queda de energia, será?
— Não sei.
Enquanto estão verificando as luzes. Os velhinhos que estão nas macas, pouco a pouco começam a se levantar.
Sarah está distraída e Sônia é quem percebe primeiro.
— Sarah?
— O que foi?
— Olha!
Todos os idosos estão sentados em suas macas com um olhar fixo e assustador.
— Que… Que porra tá acontecendo aqui?
Dentro da paróquia, a revelação ainda trará consequências.
— Por que você fez isso, madre? Você sempre foi uma pessoa boa, não tinha necessidade disso.
— Nem tenta, garota. A madre Mary Hellen não está no comando agora e muito menos a pobre Madeleine.
— Você é covarde! Se aproveitou que a Madeleine estava sofrendo e obrigou ela a fazer o pacto contigo.
— Minha linda, ninguém obrigou ela. Ela aceitou por nívea e espontânea vontade. Ela não ia querer morrer soterrada, né? Coitadinha! Eu poderia muito bem ter deixado ela morrer mesmo, porque o Deus dela teria deixado. Vocês deveriam me agradecer por ter salvado a vida dela.
— A troco de quê? Hein? De levar centenas de almas para o inferno contigo? Que tipo de “salvação” é essa?
— Eu deixei bem claro as cláusulas do nosso pacto à Madeleine. Ela sabia logo de início o que tinha que fazer e ela fez! Ainda sim teve uma vida normal. Eu nunca manifestava nela como agora, permiti que ela vivesse sua vida feliz e a usava somente para cumprir meus rituais.
— Você é sujo. É enganador e traiçoeiro.
— Eu sabia que você iria me trazer problemas, garota. Esse teu dom de se comunicar com o mundo sobrenatural acabou fazendo com que minhas forças diminuíssem. Por um breve momento, a Mary Hellen quase se lembrou que ela era a Madeleine. Não tem ideia do quanto eu te odeio, Olivia.
— Não encosta nela!
— Vai fazer o quê, menino David? Sequer conseguiu salvar tua filha, quiçá conseguirá salvar essa beata?
— Não fala da minha filha!
— Sabe? Eu fiquei por muitos anos adormecido no corpo dessa mulher e estou querendo uma ação. Então não vejo nada melhor do que matar vocês como eu fiz com o pobre padre Albert.
Neste momento, ouve-se gritos desesperados vindo de dentro do Sta. Agatha.
— O… O que é isso? O que tá acontecendo?
— Ops… Esqueci de avisar a vocês. Quando eu me revelei, toda a minha legião de demônios foi libertada e agora eles vão dominar todo o Sta. Agatha. E os velhinhos de vocês… Bom, eles já não serão mais os velhinhos de sempre, se é que vocês me entendem.
Irene agarra os braços de Mary Hellen por trás.
— O que você tá fazendo, sua freira imunda?
— Depressa! Fujam! Vão ajudar os outros e peçam ajuda!
— Irmã Irene! Nós…
— Depressa! Fujam vocês dois!
— Vamos Olivia, rápido!
Olivia e David saem correndo para fora da igreja. Irene continua atracada contra a madre Mary Hellen.
— Você sempre querendo ser a heroína, né Irene?
— Cale a boca e deixa a gente em paz!
— Já chega, sua velha!
Mary Hellen empurra Irene para o chão.
— Agora… Teremos um papinho nós duas.
Do lado de fora, Olivia e David estão no mais ímpeto desespero. Eles encontram a irmã Ruth e o Seu Aurélio ali no pátio.
— AURÉLIO! IRMÃ RUTH!
— MENINA OLIVIA, O QUE TÁ ACONTECENDO?
— ESCUTEM BEM! PRECISAM IR ATÉ O POVOADO CHAMAR AJUDA!
Ruth pergunta:
— Mas por que não telefona?
— TODAS AS LINHAS ESTÃO CORTADAS, E PELO VISTO ESTAMOS SEM ENERGIA, SÓ TEM DENTRO DA IGREJA! ESCUTEM VOCÊS! A MADRE MARY HELLEN É QUEM PORTAVA A ENTIDADE DAS TREVAS QUE ESTAVA ATORMENTANDO ESSE LUGAR E ELA ACABA DE MATAR O PADRE ALBERT E VAI MATAR A IRMÃ IRENE.
Ruth e Aurélio ficam completamente em choque.
— ESCUTE, AURÉLIO! PEGUE A CAMINHONETE! VÁ VOCÊ E A IRMÃ RUTH ATÉ A CIDADE. TENTEM ENCONTRAR O PADRE HENRY E CHAMEM TODA A AJUDA QUE CONSEGUIREM!
Aurélio questiona:
— Mas… E vocês dois?
— O David e eu vamos tirar as pessoas de dentro do Sta. Agatha… Receio que… Todos os nossos idosos estejam possuídos.
Ao pronunciar a última frase, um dos idosos se atira pela janela quebrando os vidros. Todos reagem.
— AAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHH!!
O idoso ainda com vida e claramente possuído, diz:
— Hahahahahaha, esse lugar agora é o inferno.
— RÁPIDO! RUTH! AURÉLIO! VÃO PARA A CIDADE! DAVID… (amenizando o tom de voz). Você tá comigo nessa?
David, firme, responde:
— Custe o que custar.
David e Olivia se dirigem ao Sta. Agatha.
Dentro da igreja, o embate continua.
— Quero conversar com a Mary Hellen. Deixa eu falar com ela.
— Muito bem, vou deixar ela te ouvir, mas sou eu que vou falar por ela. O que vai dizer? “Por favor”? “Não faça isso”?
— Não, nada disso. Quando eu cheguei no Sta. Agatha pela primeira vez e te vi… Algo me dizia que você era a garota por qual Mickey e a Lyla estavam falando.
FLASHBACK- STA. AGATHA, 1984.
Irene contou tudo o que ocorreu no Asilo de Madalena e os administradores dali estão fazendo todos os procedimentos.
— “Eu estava disposta a entregar a maleta e mostrar tudo o que eles faziam. Mas quando eu te vi, Mary Hellen… Algo fez com que eu me acovardasse.”
A madre Cláudia apresenta Irene para Mary Hellen.
— Bom, espero que conheça a Mary Hellen, ela está aqui desde pequena. Mary Hellen, esta é a Irene.
— Muito prazer, Irene!
— “Naquela época você ainda não usava o hábito, ainda não tinha se tornado noviça, eu confesso que por pouco eu não te chamei de Madeleine. A madre Cláudia me perguntou sobre essa minha pasta e eu disse que não era nada. Algo em você fez com que eu parasse”.
FIM DE FLASHBACK.
— E a que conclusão isso te levou, Irene? Desconfiar que eu, ou melhor, a Mary Hellen era na verdade a Madeleine, não tinha nada de mais nisso.
— O problema está justamente no que veio após. Já havia uma semana que eu decidi ficar no Sta. Agatha, afinal, não tinha mais pra onde ir. Foi aí que eu percebi que a maleta com o álbum das fotos dos mortos e o livro de magia negra havia sumido. Em uma determinada noite, eu me levantei e fui ao corredor, vi a sua porta semiaberta e quando espiei pela brecha… Te vi com o livro de magia negra aberto e um círculo desenhado no chão. Pensei em falar alguma coisa, pensei em gritar aos 4 cantos o que você estava fazendo, mas decidi me calar. Porque eu percebi que não era você que estava fazendo, era essa coisa que estava dentro de você.
— Nossa! A freirinha é muito mais inteligente do que eu pensei. Escondeu esse segredo durante tantos anos pra no final se entregar como a culpada?
— Eu odeio admitir… Mas eu te achava legal. E pelo tanto que o Mickey e a Lyla falaram dessa Madeleine, eu comecei a ver ela em você, foi como uma forma de gratidão pelo o que eles fizeram por mim.
— Então você era quase uma sensitiva? Já sabia que no fundo, a Mary Hellen sempre foi a Madeleine mesmo ela tendo suas memórias apagadas. Mary Hellen sequer se lembra do Mickey, Lyla e tudo o que passou no Asilo Madalena.
— Naquela noite em 1994, eu também sabia que era você.
FLASHBACK- 31 DE OUTUBRO DE 1994.
A irmã Mary Hellen entra na recepção e disca um número no telefone. As luzes do asilo começam a piscar, a ligação é cortada.
— Não, não, não pode ser!
Ela tenta de novo, coloca o telefone no ouvido, de repente ouve um barulho como se fosse um sussurro atrás dela. Ela fica gelada, suando frio, quer se virar e não consegue.
Após resistir contra ela mesma, uma mão passa no seu ombro, ela dá um grito, olha pra trás, derruba o telefone no chão, fita o seu olhar na pessoa ou seja lá o que for que ela esteja vendo naquele momento e diz:
— POR FAVOR… NÃO!!!
— Calma, irmã Mary Hellen! Sou eu!
— Irmã Irene?
— Sim, escute… Não chame as autoridades.
— O quê? Tá ficando louca? Não viu o que tá acontecendo?
— Você é burra? Se chamar a polícia, você será levada.
— Levada? Como assim? Eu não fiz nada.
— Vá para o seu quarto e comece a rezar. Não importa o que você ver ou ouvir, continue olhando pra frente e não pare de rezar. DEPRESSA!
FIM DE FLASHBACK
— Eu passei os últimos 40 anos protegendo você, Mary Hellen. Protegendo de ser descoberta pela igreja católica e você ser condenada. Por isso que eu peguei de volta a maleta com as fotos, o álbum e também aqueles totens que você fez ao decorrer dos anos.
— Que comovente, Irene! Passou sua vida inteira protegendo a mulher que roubou o seu lugar. Que se tornou madre superiora sabendo que você era a pessoa mais capacitada?
— Acho que você como uma entidade das trevas deveria saber… Que eu também sei jogar quando preciso jogar. Na noite da irmã Mônica, você foi quem veio no meu quarto e bateu na porta. E eu vi no momento em que você falou para a Mônica ir para o porão, claro que não era a Mary Hellen falando e sim a entidade. Depois disso você entrou no gabinete e adormeceu. Eu sei tudo sobre você.
Enquanto isso, Sarah e Sonia estão na enfermaria em cima de uma das macas tentando se livrar daqueles velhinhos que agora estão possuídos.
— O que tá acontecendo com eles, Sarah?
— O que seria? Eles estão possuídos, não está vendo?
— Quê?
— Escuta bem. Segura a minha mão e vamos pular para o lado e sair daqui juntas, ok?
— Quê? E se isso não dar certo?
— Vai ter que confiar em mim, Sônia. Anda logo!
— Tá bom, tá bom.
— Um… Dois… Três!
As duas pulam da maca, dois velhinhos vêm na direção delas. Sarah pega uma cuíca e acerta na cabeça deles.
— Fiquem longe de mim, seus fedidos à naftalina!
— Sarah? Você vai acabar matando eles.
— Jura? E o que acha que eles querem fazer com a gente? Vamos, Sonia! Corre!
As duas saem imediatamente da enfermaria.
Do lado de fora, David e Olívia sobem as escadas da porta principal e quando estão prestes a entrar, a irmã Claudia aparece.
— Não podem entrar aqui!
— Irmã Cláudia!
— Quem… Quem é a senhora?
— É uma longa história, David. Depois eu te explico.
— Escutem bem, vocês dois não podem entrar aqui.
— Mas irmã Claudia, a madre superi…
— … Sim, eu já sei o que aconteceu. Mas tem uma coisa, quando o nome que precisava ficar oculto foi pronunciado, a entidade das trevas liberou o seu exército e agora todos os pacientes estão sendo controlados. Qualquer pessoa que entrar neste lugar, pode não conseguir sair, por isso que eu sentia algo me bloquear esse tempo todo… Era a entidade que estava dentro da Mary Hellen.
— Mas… O que a gente vai fazer então? Queremos ajudar!
— Não! O que vocês dois precisam fazer agora é fugirem pra bem longe daqui, pra além dos portões. Se ficarem aqui, as coisas podem piorar, principalmente pra você, Olivia.
— Eu, por quê?
— Essa entidade sabe o quão poderosa você é. Ela quer se apoderar de seu dom e de suas visões. Esse demônio achou alguém tão forte quanto ele neste lugar e agora está furioso. Por tanto se ficar aqui, você corre perigo.
— Olivia! Faça o que ela pediu, vamos?
— Mas… O que a senhora vai fazer?
— Vou ajudar as nossas amigas freiras aqui dentro. Farei o que for preciso… Mas agora vocês precisam sair daqui… VÃO!
— Tudo bem.
Os dois descem as escadas, Olivia vira para a irmã Cláudia novamente.
— Irmã Cláudia! Toma cuidado, por favor.
— Não precisam se preocupar comigo… Eu já estou morta, lembra?
No céu enegrecido e com uma nevasca se aproximando, vemos um corvo voando e se aproximando do Sta. Agatha. Ele passa pelo jardim e entra em um dos corredores. A partir daí, começamos a ver tudo pelo ponto de vista daquela ave.
Ele sobrevoa no corredor e vemos uma das freiras saindo de um dos quartos e um velhinho atrás dela subindo nas suas costas. Vemos mais a frente, uma senhora mordendo a garganta de uma das freiras. Mais ali na frente, dois enfermeiros lutando contra os idosos.
Viramos o corredor, algumas freiras estão correndo e derrubam um lampião. Mais a frente, pela janela, percebemos que um dos quartos está pegando fogo.
O corvo sobrevoa as varandas, sobe o mais alto que pode e quando menos esperamos, outros corvos se juntam a ele e de repente todo o céu está tomado por aqueles corvos.
O primeiro deles se prepara para uma queda livre e atinge uma das janelas. Em seguida, todos os corvos mergulham para dentro do Sta. Agatha destruindo tudo o que está na sua frente. As chamas começam a se intensificar nas cortinas fazendo com o que o fogo se espalhe pelos corredores.
Irmã Cláudia está parada na frente de um dos corredores observando.
— Essa não… Esse é o Holocausto!
David e Olivia estão correndo para alcançar os portões. Eles olham pra trás e vê o caos que está se formando no lugar.
— Meu Deus! O que tá acontecendo lá dentro?
— Olivia, a gente precisa sair daqui!
— Não, não! O Sta. Agatha vai pegar fogo, todo mundo vai morrer!
— Se ficarmos aqui, a morte de todos eles terá sido em vão… Pela memória do padre Albert…(pegando no rosto dela) Ao menos você tem que sobreviver, Olivia.
Na estrada, Ruth e Aurélio estão na caminhonete e ela percebe o esplendor catastrófico vindo do Sta. Agatha.
— Aurélio! AURÉLIO? Alguma coisa tá acontecendo lá no Sta. Agatha. O instituto tá pegando fogo!
— Meu Deus, meu Deus, o que tá acontecendo? Espero que o David, a Olivia e todos estejam bem.
— AURÉLIO, CUIDADO!
Eles dão de frente com um outro carro vindo em sua direção. Aurélio freia a caminhonete rapidamente. Quando eles se dão conta, é o padre Henry que está no outro carro. Ele sai do veículo pra ver o que aconteceu.
— Vocês estão bem?
Ruth sai da caminhonete.
— Padre Henry? Padre Henry?
— Irmã Ruth? O que está fazendo aqui a essa hora?
— Olha lá no alto das montanhas.
O padre Henry vê o cenário de caos vindo do instituto.
— Meu Deus! O que tá acontecendo no Sta. Agatha?
Aurélio responde:
— Padre. O mal se libertou naquele lugar. O padre Albert está morto.
— O… O padre Albert?
Ruth ressalta:
— Padre Henry, precisa realizar o exorcismo com ou sem a autorização do Vaticano. A madre superiora era a hospedeira da entidade das trevas durante todos esses anos, ela é quem trouxe o mal para o Sta. Agatha.
— Meu… Meu Deus… Meu Deus, Meu Deus! Escutem vocês… Vão pedir ajuda… Eu vou até o Sta. Agatha. Essa agora é uma guerra espiritual… E precisamos estar preparados.
Dentro da igreja, o embate incessante entre Irene e Mary Hellen continua.
— Está ouvindo isso, Irene? Esse é o som do desespero. Logo, logo, todos daqui vão morrer.
— Pouco me importa o que vai acontecer.
— Disse que você também joga. A que se refere?
— Todos esses anos eu fingia que te odiava para que a entidade que estava oculta em você jamais se revelasse. Eu sabia que se eu ao menos perguntasse pra você se você era a Madeleine, talvez a sua verdadeira face iria aparecer.
— Então por que escondeu isso durante todos esses anos? Se sabia a verdade o tempo todo, poderia ter evitado muitas mortes… Mr. Harris, irmã Cecília, Judith e a todos aqueles que morreram por conta de uma manifestação demoníaca.
— É, eu pensei em fazer isso, mas o orgulho falou mais alto. E não queria levar o crédito por ter sido dedo-duro de um demônio psicopata.
— Até nessas horas você banca a esperta, não é, Irene? Desde adolescente que tem essa língua felina. Mas sabe de uma coisa? Você já está condenada ao inferno há muito tempo, querida… Cometeu o pecado da prostituição e em seguida matou duas pessoas… Pensa que eu não sei? Pensa que eu não sei dos teus pecados?
— Nunca escondi os meus pecados de ninguém. Meu único pecado foi não ter tido forças o bastante pra segurar o meu filho no colo quando ele nasceu. Porque eu tenho certeza que as coisas teriam sido diferentes e talvez eu nem aqui estaria, se meu filho não tivesse morrido.
— Ai, quanto sentimentalismo, Irene! É incrível que você o tempo todo sabia da minha existência no corpo da Mary Hellen, ou melhor, da Madeleine, mas não sabia justo do principal, justo do que mais te interessava.
— Do que você tá falando?
— Tenho uma notícia pra você, querida… Quem foi que disse que teu filho está morto?
— Quê? Que brincadeira de mal gosto é essa?
— Ah, mas não é nenhuma brincadeira, querida.
— Não! Quando ele nasceu, disseram que ele estava sem respirar e então tentaram salvá-lo, mas teve uma parada respiratória.
— Ow, pobrezinha de você, Irene! Isso foi o que fizeram você pensar, minha linda.
— O quê? Não, não pode ser possível.
Mary Hellen se agacha pra ficar na altura de Irene que ainda continua no chão.
— Quer mesmo saber a verdade, Irene? Pois eu vou te dizer, querida… Os teus pais manipularam tudo! Eles assinaram um acordo com a madre Lúcia de que quando o teu filho nascesse, eles tirariam ele de você.
FLASHBACK- ASILO MADALENA, 1984.
A criança nasce, a parteira pega uma tesoura e corta o cordão umbilical.
— Parabéns! É um menino!
Irene, extasiada e sem forças, segura o seu filho por uns segundos. Uma das freiras chega naquele momento.
— Ocorreu tudo bem?
— Sim, senhora.
— Deixe-me vê-lo.
Ela segura a criança e vê algo estranho.
— Tem alguma coisa errada… Ele não tá respirando direito.
— Mas… Estava agora há pouco.
— Precisamos tratá-lo em outro lugar, rápido!
Elas levam o bebê dali. Irene tenta chamar por elas.
— Es… Esperem, onde vão levar meu filho?
“Naquele momento, aquela freira que pegou o seu bebê, levou ele até os seus pais que estavam no carro esperando”.
— Obrigada, irmã! Avise à madre Lúcia que tudo ocorreu como planejamos.
“Seus pais o levaram dali e o deixaram em um orfanato. Depois um casal que estava querendo adotar uma criança, foi até esse orfanato e adotou o seu filho. Eles o levaram e ele cresceu em Cheslfield”.
FIM DE FLASHBACK
Irene, alterada e quase chorando diz:
— Não pode ser possível! Eu fui enganada todo esse tempo!
— A culpa foi dos teus pais e sei que deve estar odiando eles mais do que nunca agora, mas eles já estão mortos e bem mortinhos, então…
— Eu não acredito que todo esse tempo o meu filho estava morando em Cheslfield.
— Sabe o que mais me dá pena em você, Irene? É que você sequer tem extinto de mãe. Ou é muito burra em algumas coisas, porque tem que ser uma mãe muito desnaturada pra não perceber que o seu filho estava perto de você este tempo todo.
— Como? Como assim?
— Isso mesmo, querida. O teu filho estava o tempo todo aqui no Sta. Agatha e você nunca percebeu.
— Não, é algum tipo de brincadeira, só pode ser brincadeira. Quem? Quem é meu filho? Me responde! Quem?
Mary Hellen fica de pé novamente.
— Ai, nossa! Você é tão burra assim, Irene? Faça as contas, querida. Quem será que nasceu naquela época e hoje poderia ser teu filho? Não consegue nem mesmo fazer as contas da idade que ele tem hoje?
— Eu… Eu… Eu estou confusa… Eu…
— Aaaaai que saco! Ele acabou de sair por essa porta, sua imbecil!
— Quê? Não, não, não pode ser… David?
— BINGO! Finalmente a vagabunda acertou!
— Não, não, como? Isso não pode ser possível. O David não pode ser meu filho.
— Acredite ou não, querida… Ele é.
FLASHBACK, CHELSFIELD, INGLATERRA, 1984.
O casal que adotou o bebê se encontra no sofá de sua casa. O marido diz:
— Precisamos dar um nome a ele, querida.
— Sim, sim… Bom… Ele vai se chamar David… David Malcom.
FIM DE FLASHBACK
Irene está chorando desconsolada.
— Não, não, não pode ser. Como eu fui tão tola? Isso só pode ser uma piada!
— Caso ainda esteja achando que eu estou mentindo sobre isso, Irene. Eu vou te mostrar tudo… Mas já aviso que você vai sentir muita dor com o que verá.
— O que você vai fazer?
Mary Hellen se aproxima e segura no braço de Irene. Um clarão surge no meio delas e em seguida tudo fica escuro.
Dentro do Sta. Agatha, o caos continua a reinar. Sarah e Sônia estão correndo tentando escapar dali.
— Depressa, Sônia! Corre!
— Meu Deus, o Sta. Agatha… O Sta. Agatha tá pegando fogo, Sarah! O que a gente vai fazer?
— Eu só digo uma coisa: Se não sairmos desse lugar, todos nós vamos morrer.
A irmã Mônica juntamente com outras freiras estão correndo tentando se livrar daqueles velhinhos. Em várias partes do Sta. Agatha, dezenas de pessoas estão mortas. Vemos muitas delas sendo devoradas e ficando com as tripas saindo pra fora.
Sarah e Sônia se encontram com a irmã Mônica e as outras freiras.
— Irmãs? Vocês estão bem?
— Não, a gente não sabe por onde sair.
— Droga!
— ESPEREM!
A irmã Cláudia é quem aparece.
— Posso ajudar vocês, precisam vir comigo.
— A senhora é aquela freira que apareceu pra mim e pra Olivia na noite da Judith… Mas quem é a senhora, afinal?
— Acreditariam se eu dissesse que eu sou uma freira que já foi madre superiora daqui e tive um acidente em 87 que provocou a minha morte e agora estou aqui como um fantasma?
Nenhuma daquelas mulheres respondem.
— Foi o que eu pensei. Precisam vir comigo. Tem uma passagem secreta pela torre onde vocês vão sair até um bunker do lado de fora. É seguro, mas precisam ficar juntas.
Claudia guia a todas elas para irem à porta de entrada da torre. O fogo já está alcançando elas.
— Rápido! Entrem!
Todas vão entrando uma por uma. A passagem tem uma escadaria antiga em formato espiral para elas irem até lá embaixo.
Sarah é a última a entrar e pergunta:
— Você não vai entrar? O fogo vai pegar você.
— Precisa muito mais que um foguinho pra me atingir, menina.
O fogo chega até onde está Claudia e obviamente ela não é atingida.
— Agora desça! Não tente entender o que é isso, só vá!
Vemos as pálpebras de alguém incomodadas e em seguida os olhos se abrem. É a irmã Irene que está em um lugar diferente, parecia uma quadra de futebol. Mary Hellen aparece do lado dela.
— Espero que você esteja se divertindo.
— O… O que é isso? Onde eu estou?
— Relaxa, apenas uma viagem astral, querida. A tal da Olivia usou esse mesmo truque pra descobrir sobre a Madeleine. Isso é pra você ver o poder que eu tenho. Está vendo esses dois sentados aqui na arquibancada? São os pais adotivos do David. E falando nele, olha ele vindo ali. Aqui ele está com 8 anos.
David está saindo da partida de futebol e vem abraçar seus pais.
— Papai, mamãe!
— Meu campeão! Marcou quantos gols?
— Só um, papai.
— Melhor que nada, né?
— Agora vamos pra casa comer as panquecas que a mamãe fez pra você.
— Tá bom, mamãe.
Mary Hellen diz:
— Veja só que família bonita eles são, Irene!
Cortamos para outro cenário onde David está na sua casa comendo cereal na mesa. Irene e Mary Hellen sempre ficam em um canto em cada cenário observando. É como se elas estivessem viajando pelas memórias de David.
— O teu filho sempre teve tudo do bom e do melhor, querida Irene. Por sorte, sua criação foi plausível.
Em outro cenário, elas estão sentadas em um auditório e David está no palco pegando um diploma de formatura na mão.
— A vida do teu filho era perfeita até chegar esse momento da formatura dele. Após isso, minha nobre Irene… Tudo na vida dele se desmoronou.
Em outro cenário, David está em casa ouvindo os seus pais discutindo muito.
— Foi com 17 anos que seu filho precisou lidar com a dor do abandono do pai. Parece que o pai dele já não estava mais aguentando a esposa e… Bom, aconteceu!
Elas observam David aos 17 anos tentando consolar a sua mãe no sofá.
— Mas não pense que parou por aí, querida Irene. Vamos avançar mais alguns anos.
Vemos a mãe adotiva de David no banheiro coçando a cabeça e percebe que parte de seu cabelo está caindo na pia.
— A mãe adotiva do David estava com uma leucemia forte e não fazia mais tratamentos. O pobrezinho estava na faculdade de botânica na época e precisou receber a triste notícia.
David está no CAMPUS, um coordenador o chama na sala.
— Com licença, Sr. Malcom? Pode me acompanhar um minuto?
— É… Claro!
David sai da sala e fica no corredor da faculdade. Irene e Mary Hellen estão ali observando os dois.
— Foi bem aqui, minha doce Irene… Que David descobriu que a mãe que ele achou que era sua biológica… Estava morta.
David está reagindo perante ao que o coordenador diz.
— Não, não, não, minha mãe! Minha mãe!
— E foi aos 20 anos que David ficou completamente órfão.
Passamos para outro cenário, o enterro da mãe adotiva de David.
— Veja só a dor que ele está passando, Irene. Está sofrendo pela mãe que sequer era dele.
— Já chega! Por que está me mostrando todas essas coisas? Eu estou cansada!
— O quê? Cansada? Mas a festa ainda nem começou, querida. Agora é que você vai saber o que é sentir dor…
Em outro cenário, vemos David andando solitário pela faculdade.
— Por sorte, a mãe adotiva do David havia deixado uma herança e ele conseguiu os direitos sobre ela. Como ele já era maior de idade, ficou com a casa. Nessa época, o David, mesmo em seu período de luto do abandono do pai e da morte da mãe, ele estava se tornando um homem muito atraente. Conforme envelhecia, mais bonito ele ficava. Aí é que veio o ponto de ruptura na vida do teu filho… Rachel! Essa garota apareceu e mudou a vida dele, o sorriso dela e o seu charme foram o suficiente para roubar o coração do teu filho. Não demorou muito e adivinha? Eles se casaram quando David estava com 21 anos.
Vemos o cenário de David e Rachel no altar sendo abençoados pelo padre como marido e mulher.
— Veja só o teu querido filho se casando, Irene! Uma pena que você não estava lá para ver, né? Mas quer que eu te conte uma coisa bem bacana? É que dessa relação entre o David e a Rachel, surgiu um fruto… Isso mesmo, a sua neta… Janet.
— Eu… Tenho uma neta?
Em outro cenário, Rachel acabou de dar a luz. David está na sala segurando a sua filha no colo.
— É a nossa menina, meu amor. É a nossa Janet.
— Sim, meu amor.
Irene e Mary Hellen estão ali no canto da parede na sala de parto testemunhando tudo isso.
— Eu não acredito nisso! Meu filho está vivo e eu ainda sou avó?
— Eu não diria isso no presente, querida. Mas vamos chegar nessa parte, preciso te mostrar outras coisas antes disso.
Pulamos para outro cenário. Janet está crescendo aos poucos e sendo cuidada por Rachel em sua casa. David trabalhava e fazia curso e sempre que chegava em casa, dava total atenção à filha e à esposa.
— O teu filho sempre foi um homem bom, Irene. Sério, o típico marido exemplar. Era sempre presente quando podia e nunca deixou faltar nada pra filha e pra esposa. O problema é que o David era tão bom, mas tão bom, que nunca desconfiou que sua esposa o traía com um colega da faculdade.
Na casa, David chega do trabalho.
— Amor. Cheguei!
Outro homem está no quarto de Rachel e ela o está ajudando a escapar pela janela.
— Vai, rápido! Antes que ele veja.
O homem desce pela janela e sai dali. Quando Rachel vira de costas novamente, David entra.
— Oi, meu amor. Não me ouviu chamar?
— Desculpa, amor. Estava organizando umas coisas no guarda-roupa. Como foi de trabalho hoje?
— Foi tudo bem, estou confiante de que vou receber uma promoção em breve, hein?
— Sério? Sempre soube que eu tenho o melhor marido do mundo!
Rachel beija David. Irene e Mary Hellen estão ali no quarto.
— Olha, Irene, eu confesso que se dependesse de mim, eu mesma mataria essa vaca.
— Meu Deus! Meu filho…
— Sei que você deve estar entediada, mas agora vamos para as partes mais importantes. Os anos foram se passando e Janet foi ficando uma mocinha… Então o David decidiu organizar um passeio pra comemorar o aniversário de 8 anos dela. Mas nessa viagem, minha nobre Irene, que o maior inferno da vida do teu filho realmente começou.
No carro, Rachel está furiosa com a mensagem que leu no celular de David.
— Que tipo de mensagem é essa, David? Quem é essa tal de Jess?
— Calma, meu amor! Ela é só uma colega do curso.
— Colega? E desde quando você tem amigas mulheres? Hein? Admita! Você está me traindo, não está? Está me traindo com essa vagabunda?
— Não fala assim, não fala isso na frente da Janet.
— Então é verdade, né? Eu sabia! Eu sabia que você tinha outra, eu sabia!
— Para com isso, Rachel! Eu nunca te traí!
— Mentiroso! Mentiroso!
Rachel começa a dar tapas em David.
— PARA! PARA! Eu estou dirigindo!
— Seu traidor! Insignificante!
— Já chega, Rachel!
Janet se solta do cinto de segurança, tenta apartar a briga dos pais.
— Parem, parem de brigar, por favor! Parem!
David, distraído, entra na contramão e não vê o caminhão vindo em sua direção.
— DAVID, CUIDADO!
David desvia do caminhão, o carro acaba capotando e arremessa Janet pra fora. Ali na pista vemos Irene e Mary Hellen vendo a pobre garota no chão quase morta.
— Não, não, não! Minha netinha! Não!
— É, querida Irene… Aqui não foi apenas o fim da tua netinha, como… Também foi o fim do David. Aos 30 anos, ele teve a sua vida arruinada de vez.
— Isso não é justo! Não é justo! Por que isso aconteceu com ele?
— Talvez ele esteja pagando pelos teus próprios pecados, querida Irene. Você é uma pecadora e veja só! Teu filho está sofrendo tudo isso… Por tua culpa!
— Não, não, não pode ser!
— Calma, minha doce Irene. Vamos ver mais algumas coisas?
Em outro cenário, Rachel está jogando todas as roupas de David pela janela.
— Tudo isso foi tua culpa! Nossa filha morreu por tua culpa, por causa da tua traição! Eu não quero te ver nunca mais!
— Por que tá fazendo isso, Rachel? Você sempre dizia que me amava e agora isso?
— Quer que eu te diga, David? Eu não amo mais você. Se eu ainda estava com você durante todos esses anos foi unicamente por causa da Janet. Você é patético e me dá pena, fica longe de mim e da minha vida!
David pega uma mala pequena, apanha todas as suas roupas do lado de fora e sai dali… Da casa que era dele.
— O teu filho ficou em um hotel, mas após todas essas coisas acontecerem com ele. Ele acabou se desiquilibrando, perdeu o emprego e começou a beber.
Em um cenário, vemos David no balcão de um bar virando vários copos de uma vez. Irene e Mary Hellen estão sentadas em uma das mesas do bar observando ele.
— Ele nunca foi de beber, Irene. Mas veja o que essa vagabunda da Rachel fez com ele. Já não bastava o luto de perder a filha, algo que você também sentiu quando achou que o perdeu e agora ele precisou aguentar o fardo de que o “grande amor da vida dele” o abandonou… Ops, esqueci. Contigo também foi assim, não é, querida?
— Cala a boca! Eu não aguento mais tudo isso.
— Bem, vamos para outra memória.
Transitando entre vários cenários, David está se acabando em bebida, seu dinheiro se esvaindo a cada dia, já não tem mais emprego e agora tudo está indo a ruínas.
Em um outro cenário, David está sóbrio e está sentado em uma mesa de restaurante sozinho tomando um café.
— Veja só essa cena, Irene. Ele está completamente sozinho… Veja a tristeza nos olhos dele… Se quiser, sente-se e contemple ele um pouco. Ele não vai te ver e nem te ouvir, claro. Mas aproveite esses minutos, prometo que não vou interromper.
Irmã Irene se assenta na cadeira de frente para David. Vemos em um ponto de vista, eles frente a frente. David está adoçando o café com uma colher e seus olhos estão a ponto de desabar em lágrimas. Irene fica comovida ao ver seu filho ali pela primeira vez… Sabendo quem ele era.
— Eu… Eu sinto muito, filho. Eu queria ter feito diferente… Eu queria ter te salvado daqueles malfeitores, mas… Eu não consegui. Você tá sofrendo por minha culpa, pelo meu pecado.
David toma um gole do café e em seguida começa a chorar desconsoladamente. Irene, não suportando, chora e tenta ficar mais próxima possível do filho.
— Vai passar, filho… Vai passar. Eu juro!
Mary Hellen tira ela dali.
— Ok, ok, chega de sentimentalismo! Agora vamos para o Gran Finale desse ato. Preparada, Irene?
Em um outro cenário, vemos o quarto de hotel onde David se hospedou pela última vez. Ele chega ali totalmente sem rumo. Liga o rádio, pega um lençol, faz um nó e amarra na viga do teto. Mary Hellen e Irene estão dentro do quarto.
— A depressão tomou conta da vida do teu filho, Irene. E esse foi o dia onde ele decidiu colocar um fim em tudo isso, colocar um fim no seu sofrimento. Afinal pra quê viver, não é? Desgraçou a vida toda e só está existindo? Melhor a morte, não acha?
— Não, isso não pode acontecer.
David sobe na cadeira e coloca o nó no pescoço.
— Se vai tentar alguma coisa, boa sorte, querida! Pois nada vai adiantar.
— Não, não, espera!
Irene fica de frente para David.
— Filho! Escute, olha pra mim, não faz isso. Não precisa fazer isso, por favor.
— Ele vai muito te escutar, sua idiota.
— Olha, vai ficar tudo bem… Não tem que tirar a tua vida.
David está chorando a ponto de se jogar dali.
— Por favor, David! Não pode fazer isso, não pode, porque… PORQUE EU SOU TUA MÃE!
Ao pronunciar, Irene bate o cotovelo no rádio e a estação muda para outra onde estão falando sobre a vaga de jardineiro no Sta. Agatha. Mary Hellen, impressionada, pergunta:
— Tá de brincadeira?
David ouve o anúncio no rádio e desiste de se matar. Ele tira o lençol do pescoço.
Irene está tremendo e impactada. Mary Hellen se aproxima dela.
— Como você fez isso? Não pode alterar uma memória do passado, como?
— Porque eu tenho uma coisa que você nunca vai ter… O AMOR DE UMA MÃE!
Neste momento, o cenário começa a se dissolver, um novo clarão surge até cobrir o ambiente.
Voltamos novamente para a igreja e Mary Hellen solta o braço de Irene.
— Então você mesma impediu a morte de seu filho no passado? Nunca imaginei que isso fosse possível acontecer.
— Eu disse a você… Eu sou mãe! E o que estiver ao meu alcance por um filho meu… Eu farei! Não importa quantas pessoas eu tenha que matar, não importa quantos demônios eu terei que expulsar… Eu vou lutar pelo meu filho até a morte!
— Que pena, querida! Uma pena que nossa jornada esteja chegando ao fim, não é? Mas para o seu consolo… Vou deixar você viver, pra que sofra anos e anos de pura dor e solidão. Mas o teu filhinho… Sinto muito, querida, mas… Terei que matá-lo. Agora sim você vai descobrir a dor de perder um filho de verdade.
— Não! Não se atreva a tocar no meu filho, seu demônio!
— Tarde demais, querida! Já tomei minha decisão. Melhor você olhar atrás de você.
Irene olha pra trás e vê a imagem de Jesus Cristo na parede pegando fogo. Idêntica à visão que Olívia teve enquanto dormia.
— Não, não! Por tudo que é mais sagrado, não faça isso!
— Desculpa, querida… Mas tenho que matar esse David e a mosca morta daquela Olivia. Desfrute do ato final, doce Irene.
Irene, ajoelhada e sem forças clama:
— NÃO! POR FAVOR! NÃO MACHUQUE MEU FILHO! NÃO FAÇA ISSO!
ATO III (FINAL)
Do lado de fora, David e Olívia acabam de passar pelos portões do Sta. Agatha. Esta última está cansada, pois está começando uma nevasca ali.
— Espera, espera!
— O que foi?
— Eu… Eu não vou conseguir. Tá ficando muito frio e a gente não vai sobreviver do lado de fora.
— Pega minha jaqueta. Se aqueça.
Ele coloca sua jaqueta em Olivia.
— David… Tudo isso é uma loucura… Como é possível sobreviver a isso? Tudo está acabado e eu… Eu falhei! Se eu tivesse tido as visões antes, se eu tivesse descoberto desde o início onde a entidade estava, eu teria impedido a morte do padre Albert e de todo mundo.
— Ei, Olivia, escuta bem! Você foi a pessoa mais corajosa que eu já conheci… Eu já perdi a todas aquelas pessoas que eu amava nesse mundo… Eu não quero perder você.
Olivia sente o impacto das palavras de David. Talvez esse seja o incentivo que ela precisava para seguir em frente.
No Sta. Agatha, o holocausto continua. Mortes, ranger de dentes, chamas, aves mortas, sangue, gritos, desespero… A imagem que o mal queria estabelecer desde o começo.
No bunker do lado de fora… Sarah, Sônia, irmã Mônica e as outras freiras saem por ali. Elas dão a volta pelo jardim e avistam aquele cenário de caos.
Do ponto de vista de cima, vemos aquele “castelo” se transformar em um banho de sangue e chamas.
Nos olhares de cada uma daquelas mulheres… A dor, as lágrimas, o luto…
Cláudia está no terraço em sinal de oração e derramando muitas lágrimas. O céu do Sta. Agatha fica cada vez mais próximo da cor das chamas e nem mesmo a neve que caía conseguia impedir.
Dentro da igreja, Irene não consegue mais se conter.
— Já chega! Eu não vou deixar que levem meu filho de novo. Dessa vez eu vou lutar com unhas e dentes… EU VOU LUTAR!
Irene sai correndo da igreja.
Lá fora, além dos portões, Olivia se sente encorajada por David e eles começam a andar. Mesmo com a neve ameaçando o seu trajeto.
— Vem! Vamos, a gente consegue!
— Vamos!
— ONDE PENSAM QUE VÃO?
David e Olivia viram para trás sem acreditar no que estão vendo.
— Madre superiora?
— Eu sei o que vocês devem estar se perguntando: “Como ela chegou aqui tão rápido”? Eu posso dizer que se fosse a madre superiora mesmo, ela ia demorar no mínimo uns 8 minutos pra chegar aqui do lado de fora correndo, mas… Lembrem-se que agora eu estou no comando.
— Por que não deixa a gente em paz? Por que está fazendo tudo isso?
— Você é tão idiota assim, Olivia? Desde quando nós precisamos de algum motivo pra fazer o mal? Fazemos porque queremos, fazemos porque gostamos, fazemos por amar a discórdia, a tragédia, o sofrimento… Vocês humanos, me dão nojo… Se escondem por trás dessa fé que vocês dizem ter para se beneficiar de tudo.
— Não tem o direito de apontar pra nós o que é se aproveitar… Você usou uma pobre menina inocente… Enganou a Madeleine! Como pode ter sido tão cruel assim?
— Sou um espírito enganador, jovem Olivia. Tudo o que eu faço, é isso. Enganar as pobres almas de coração e oferecê-las o melhor desse mundo. Porque venhamos e convenhamos, se vocês dependessem desse “Deus” de vocês, estariam ferrados. Pra quê esperar tanto tempo por algo se vocês podem adquirir tudo fácil? Foi o que eu ofereci à Madeleine. No momento em que ela aceitou o pacto comigo, eu imediatamente a tirei de lá, não fiquei enrolando como o “Todo Poderoso” com essa balela de que tudo tem que ser no tempo dele.
— Como ousa blasfemar contra o Senhor? “Há caminhos que aos olhos dos homens, parecem bons, mas levam à perdição”.
— Acha que citando versículos bíblicos vai conseguir me impedir de alguma coisa?
— Não… Mas eu sei que a Mary Hellen está aí dentro e que ela não queria ter feito isso… Mary Hellen! Madeleine! Eu sei que você tá me ouvindo aí dentro! Você precisa lutar contra esse demônio, não deixe ele dominar o teu corpo.
— Nossa, quanta falta de criatividade, garota! Vai fazer o quê, agora? “Hocus Pocus”? “Sin sala bin”? “Abracadabra”?
— Você… Você vai deixar a madre em paz.
— Tudo bem, eu vou deixar ela em paz… Mas não antes de matar vocês dois.
David se coloca na frente de Olivia.
— Aí! Não se atreva a encostar um dedo nela.
— Ai, David! Eu tenho pena de você, sabia? Um homem adulto agindo feito um adolescente emocionado?
— Você não sabe nada sobre mim. Você matou o padre Albert… Ele era como um pai pra mim!
— Ow, pobrezinho! Você não teve direito de ter o amor de pai quando ele te abandonou, não é? Estava agora mesmo tendo uma conversa com tua mãe a respeito disso.
— Quê?
— Ai, droga! É verdade, você ainda não sabe, mas depois eu te explico. Só que a pessoa que eu mais tenho interesse em roubar a alma… É essa imbecil da Olivia. Sim! Tudo isso foi por culpa dela, por culpa de sua clarividência e sua intimidade com o tal do “Todo Poderoso”. Você foi levada ao passado para descobrir sobre a Madeleine, ninguém mais nesse milênio pode fazer isso. Como você fez?
— Quer saber como eu fiz? Eu sou filha do Altíssimo! E não é um demônio como você que vai conseguir me persuadir.
— Isso é verdade. Várias vezes tentei te persuadir enquanto estava aqui, mas sempre você conseguia se sair dessa. Mas tudo bem… Não irá fazer falta, fará companhia para a tua mamãezinha no paraíso.
David, ficando ainda mais furioso, se aproxima.
— Eu falei pra você não encostar nela!
— E o que você vai fazer, David? Hein? Eu tenho várias formas de te matar, meu jovem… Mas vou começar a te matar de um jeito que eu adoro… Esfregando umas boas verdades na tua cara.
David cerra o punho.
— Quer proteger essa novata sendo que sequer protegeu a tua filha, David? A Janet morreu por tua culpa. É um fracassado, beberrão e depravado, não é a toa que a Rachel te abandonou. Que tipo de mulher iria querer ficar com um homem fracassado, fedendo a bebida e que ainda matou a própria filha? Acha que a Olivia não iria fazer diferente? Acha que a Olivia também não iria te abandonar? Você é um fracasso como homem e como pessoa, deveria ter vergonha de si mesmo. Por favor, olhe-se no espelho! É fraco, sujo, impotente, miserável e assassino.
— CALA A BOCA!!!!
David tenta avançar pra cima da madre. Ela estira suas mãos e ele sente uma forte pressão na cabeça.
— Aaaaaaahhhhh! Aahhhhhhhhhhh!
— DAVID???
David está ajoelhado no chão sentindo muita dor na cabeça.
— HAHAHAHAHA! Acha que pode me deter, David? Acha que alguém pode me deter?
— JÁ CHEGA! PARA COM ISSO!
— VOCÊ TAMBÉM JÁ ESTÁ ME CANSANDO, SUA BEATA DE MERDA!
Ela estira a mão em direção à Olívia e ela também sente uma enorme pressão na cabeça e se ajoelha no chão.
— AAAAAAiiii!! Aaaaaahh!!
— Pobres humanos mortais… Acham que sempre vão escapar de seu destino… Mas dessa vez eu é que traço o destino de cada um de vocês. Pela primeira vez na história da humanidade, o dragão vencerá o arcanjo, a serpente será glorificada, o diabo triunfará e sim… Teremos enfim um trono de glória, para que o reino das trevas se propague no mundo! E agora… (Levantando o punhal na direção de David) Está na hora de sacrificar os cordeiros para o holocausto.
A ponto de cravar aquele punhal em David. Ouve-se uma voz.
— NÃO TOQUE NO MEU FILHO!
Todos viram para trás impactados. Irene os alcançou.
— Ora, ora, ora… A mãe pródiga chegou! Eu disse que eu ia te contar uma coisa mais tarde, David. Pois bem… Essa imunda aí… É a tua verdadeira mãe, querido.
— Quê? Não, não pode ser.
Olivia também impactada, reage:
— Mãe do David? A Irmã Irene?
— Eu também não sabia! Esse demônio fez questão de me mostrar.
— Não, não, não pode ser possível, eu… Eu tinha a minha mãe e meu pai, eu…
— … Aqueles não eram teus pais verdadeiros, rapaz. Você foi adotado após nascer porque a vaca da tua mãe te abandonou.
— CALA A BOCA! Isso não é verdade!
— Sendo verdade ou não, que diferença isso vai fazer? Afinal todos vocês vão morrer aqui e faço questão para que a passagem de ida ao inferno, seja rápida e simples.
Olivia começa a clamar.
— Madeleine! Escuta! Não deixa ele te atingir, não deixa!
— Cala a boca, beata estúpida!
— NÃO VOU ME CALAR!
— Então… Terei que fazer algo que você não queria.
Mary Hellen toca na cabeça de David, ele cai no chão.
— Da… David?
Ele se levanta, fica ajoelhado, vai levantado a cabeça levemente. Mary Hellen com um olhar fulminante diz:
— Mata ela, David!
David se descontrola e parte para cima de Olivia.
— Não! Para, David! Para!
David derruba Olivia no chão, ela tenta se esquivar dele.
— Não, David! Sou eu! Você precisa se lembrar! Precisa se lembrar!
— Agora já era, minha doce Olívia.
— O que está fazendo? Saia do corpo do meu filho!
— Cala a boca, Irene! Vamos ver esse showzinho… Teu filho está prestes a matar alguém… Igual você fez, lembra?
David está descontrolado, rangendo os dentes e tentando enforcar Olivia.
— Você é forte! Precisa se lembrar, precisa se lembrar!
— Desiste, garota. Você já era!
— Não, não, não, meu Deus, me ajude! Me ajude!
Uma voz de mulher suave e firme é ouvida.
— OLIVIA!
Olivia olha para o lado e se impacta diante do que está vendo.
— MAMÃE?
Mary Hellen igualmente, está impactada.
— Laurie?
O corpo de Mary Hellen começa a tremer, algo desestabilizou a entidade.
— Filha… Você é mais forte do que qualquer demônio que esteja neste lugar… Precisa usar isso.
— Eu… Eu não consigo.
— Faça o David se lembrar.
— Tá bom… David? David! Lembra que você me deu uma rosa? Lembra que você me contou da tua filhinha? Você não é o culpado de nada. Esse demônio só enganou você… Lute, por favor! Lute! Lute!
David ainda com sangue nos olhos e sem querer ouvir a voz de Olivia, continua tentando matá-la. Mas ouve uma voz que o estremeceu.
— PAPAI! PAPAI!
David olha pra frente, a imagem de Janet está ali. Somente ele consegue vê-la.
— Ja… Janet?
— Eu não morri por tua culpa. Ele enganou você, papai. Ele quer que você faça o que ele mandar. Não deixa! Papai, você é forte! Você é o meu herói! ENFRENTA ELE, PAPAI! ENFRENTA ELE!
As lembranças começam a voltar e os olhos de David voltam à coloração normal.
— Ahhhhhhh!!
— David? David, é você?
— Olivia, eu… Eu sinto muito, eu não queria, eu não queria…
— Tá tudo bem, tá tudo bem, você não tem culpa.
Mary Hellen se aproxima.
— Já vi que não terei outra alternativa… Diga adeus à sua vida medíocre, David.
Ela levanta o punhal e desce para atingi-lo. Olivia, no chão, grita. Sangue escorre em seu rosto. Laurie impactada. Mary Hellen com um olhar de fúria. O punhal cheio de sangue. A mão de David ao lado da cabeça de Olivia na neve. Sangue pingando de sua cabeça. Mas algo deu errado. Um elemento que não estávamos esperando. Mary Hellen fica furiosa.
— MALDIÇÃO!!!!
Abaixo de seu olhar de ódio, irmã Irene foi quem se colocou na frente e recebeu a apunhalada certeira de Mary Hellen. O sangue de seu peito respingou pelo cabelo de David que também caiu no rosto de Olivia no chão.
Irene cai para o lado. David e Olívia ficam desesperados.
— IRMÃ IRENE! NÃO!
Irene está no chão agonizando.
— Eu… Eu não ia permitir, eu não ia permitir.
Mary Hellen começa a sentir muita dor de cabeça, a entidade parece que está perdendo a força. Laurie se aproxima de Olivia.
— Escuta bem, filha. Se Deus te chamou para um propósito nessa vida, esse é o propósito. Você é a única nesse lugar que pode derrotar essa entidade.
Alguém diz:
— Isso é verdade.
— Irmã Cláudia? A senhora?
— Tua mãe está certa, Olivia. Você é a única que pode derrotá-lo. Minha Madeleine está lutando lá dentro pra tirar a entidade dela, o seu dom foi a chave pra tudo o que ocorreu aqui… E só você pode fechar.
— Eu… Eu não sei se sou capaz.
— Nós acreditamos em você, filha. Sei que é capaz.
Cláudia se aproxima de Laurie e ambas dão as mãos.
— Vamos interceder por você… Isso é o mínimo que podemos fazer.
Mary Hellen ainda está um pouco descontrolada lutando contra a entidade dentro dela.
Olivia se levanta, pega a cruz de seu colar e tira do pescoço. David tentando estancar o sangue de Irene, diz…
— Olivia… Eu acredito em você.
O sentimento de coragem pairou sobre os olhos de Olivia. Ela se aproxima. Olha bem para Mary Hellen. Um olhar de autoridade e uma força que incomodaria o próprio inferno está saindo daquela moça.
Ela olha para frente mais uma vez, tudo escurece e entramos dentro de uma memória no tempo espaço. A pequena Madeleine em um calabouço, sentada abraçando os joelhos.
Olivia se aproxima dela.
— Ei, Madeleine! Tá na hora de ir embora.
— O… Olivia? Eu… Eu não posso sair, ele não vai deixar.
— Ele não tem mais o que querer. Porque agora eu estou no comando! Deus me deu autoridade de te tirar desse cativeiro e nunca mais você será afrontada de novo.
— Eu serei livre?
— Segure a minha mão… Essa é a tua carta de alforria, Madeleine.
Madeleine toca nas mãos de Olivia, um clarão surge dissolvendo aquele lugar. Depois vemos Mary Hellen gritando e a entidade saindo dela pelas costas.
— AAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHH!!
É a mesma entidade que assombrou Olivia durante todos esses anos.
— Você foi a entidade que assolou esse lugar nos últimos 50 anos… Você apareceu pra mim no zoológico quando eu tinha 8 anos e eu não entendia o motivo… A madre superiora estava perto do zoológico e você sentiu a minha presença e foi me afrontar. Depois disso, apareceu pra mim no corredor enquanto a irmã Mônica estava possuída. Você é quem estava bloqueando a irmã Cláudia de descobrir o que estava oculto. Enganou a Madeleine, matou o padre Albert, destruiu todas aquelas vidas inocentes. Você não merece o perdão!
A entidade já na sua forma original, tenta pronunciar algumas palavras.
— EU NÃO TE DEI AUTORIDADE PRA FALAR!
A entidade estremece, fica imóvel. Não entende tamanho poder emanando de Olívia.
— Até um tempo atrás, eu não entendia. Mas agora eu sei porque Deus me trouxe pra cá. E como a minha mãe disse: Foi para um propósito. E esse propósito… É destruir o mal que estava há tantos anos aqui neste lugar. E agora… CHEGOU A SUA VEZ!
Olivia levanta a sua cruz. Uma força imensa emana naquele lugar. A nevasca fica ainda mais violenta e está toda concentrada onde Olivia está.
— EU SOU ESCOLHIDA, HERDEIRA REAL DO DEUS TODO PODEROSO. E NENHUM MAL TEMEREI, SABE POR QUÊ? (ROMANOS 8:38) “PORQUE ESTOU CERTA DE QUE NEM A MORTE, NEM A VIDA, NEM OS ANJOS, POTESTADES, PRINCIPADOS… PODEM ME AFASTAR DO AMOR DE DEUS!” O SEU PODER É BOM E SUA MISERICÓRDIA DURA PARA SEMPRE E ASSIM COMO NOS TEMPOS BÍBLICOS, HOJE A HISTÓRIA VAI SE REPETIR. A SERPENTE SERÁ ESMAGADA E O EXÉRCITO DE JESUS CRISTO VAI TRIUNFAR! E É COM O PODER E COM A AUTORIDADE QUE DEUS COLOCOU EM MIM… QUE EU TE EXPULSO, ENTIDADE DAS TREVAS. AGORAAAAAAA!!!!!!!!
A entidade grita de dor e começa a se dissipar, uma luz surge da cruz de Olivia. Aquela luz começa a se intensificar, os demais tapam os olhos. Laurie e Cláudia olham Olivia de costas e é como se uma energia celestial a estivesse cercando. O olhar de Olívia fica mais intenso, ela grita ainda mais forte, a entidade das trevas não consegue se conter e aos poucos vai se dissolvendo até ser totalmente dissipada. Um clarão expande como uma explosão branca e azulada em todo o território. A terra começa a tremer. Foi como no dia do sacrifício de Jesus na cruz, que o véu se rompeu. E toda a maldição lançada no Sta. Agatha caiu por terra. Em seguida o clarão desaparece no horizonte e a terra volta a se estabilizar de novo.
Vemos dentro do Sta. Agatha, os velhinhos e freiras que estavam possuídas, voltando ao normal e sem entender o que estava acontecendo.
Do lado de fora, Olivia chora lágrimas de sangue e se ajoelha na neve.
Mary Hellen, caída no chão, começa a se levantar.
— O… Olívia?
— Acabou, madre. Acabou.
Cláudia e Laurie se aproximam. A segunda diz:
— Eu sempre soube que você conseguiria.
— Ma… Mamãe? Como? Como você está aqui?
— Da mesma forma que você pode ver a Cláudia.
— Será que eu posso? Será que eu consigo te…
Antes de terminar a frase, Laurie a puxa para um abraço.
— Você sempre será a minha menina. Tenho orgulho da mulher que se tornou.
— Eu sinto tanto a tua falta, mamãe…
— Eu sei, filha, mas… Agora você já sabe o quão forte é. Não precisa mais de mim.
— E nem de mim, criança.
— Irmã Cláudia, não sabe o quanto eu agradeço por tudo o que fez por mim desde que eu cheguei aqui.
— De vez em quando é bom uma morta como eu tentar ajudar.
— Ah por favor! Ajudou muito mais do que muitos vivos… Agora é engraçado, mas antes era bizarro.
— Filha… Acho que agora vocês precisam de uma atenção maior… Irmã Irene.
Olivia olha para o chão. Vê que a irmã Irene ainda está ali. David está segurando na sua mão. Ela se agacha perto dele.
— Irmã Irene?
— Você… Conseguiu, não é, Olivia?
— Consegui… Eu… Eu consegui.
— Que bom… Graças a Deus… David!
David já chorando, responde:
— Sim?
— Eu quero que saiba que… Eu nunca abandonei você. Tiraram você de mim quando nasceu e me fizeram acreditar que você tinha morrido. Eu demorei 34 anos pra descobrir que você estava vivo.
— Tá tudo bem, tá tudo bem. Não tem que se desculpar, não foi tua culpa.
— Eu fui uma má pessoa, fiz coisas muito ruins, não faria bem a você ter uma mãe como eu.
— Não, não diga isso! Você ainda pode ser minha mãe. Ainda pode.
— Eu sinto muito por fazer você sofrer… Eu sinto muito por… Por não estar com você. Eu queria muito ter conhecido minha netinha, mas…
— Não, não diga isso, tá tudo bem.
— Olivia!
— Sim, irmã Irene?
— Prometa que vai cuidar do meu filho… Que vai cuidar do meu David.
— Eu… Eu prometo, irmã Irene.
— Onde tá a Mary Hellen?
— Estou aqui, Irene. Estou aqui, minha amiga.
— Eu quero que saiba que… Eu nunca odiei você. E todas aquelas palavras eram apenas para te proteger… Quando… Quando cheguei no Sta. Agatha, sabia que você era a Madeleine, então queria de alguma forma pagar a dívida que eu tinha com o Mickey, a Lyla e a dona Esther.
— Sim… Eu agora me lembrei deles… De todos eles.
— Eu queria que… Você me perdoasse por tudo o que eu fiz.
— Eu te perdoou, minha amiga. Eu queria que a gente tivesse ficado mais tempo juntas. Como melhores amigas e não do jeito que foi.
— Eu sei… Eu… Sinto muito por isso. Sabe? Acho que em 40 anos dentro desse lugar… Eu nunca conheci a Deus verdadeiramente. Vocês… Poderiam orar por mim? Eu… Estou com medo. Não quero ir para o inferno.
— Você não vai, mãe. Eu não vou deixar.
— Me chamou de mãe… Acho que agora eu… Posso descansar em paz.
Olivia toca na sua testa e diz:
— Deus está te perdoando neste momento de todos os teus pecados e está reservando um lugar de glória pra você ao lado dele. Um lugar sem dor, sem choro e sem lamento, onde um dia todos nós vamos nos encontrar também… Está perdoada, irmã Irene! O céu te espera.
Olivia tira a mão da testa de Irene. Ela dá um leve sorriso aliviada e diz:
— Obrigada.
Ela fecha os olhos e finalmente descansa para sempre.
Todos começam a chorar sem tentar se conter. David completamente em prantos a abraça.
— NÃO! MÃE! NÃO! NÃO ME DEIXA! POR FAVOR, NÃO ME DEIXA! NÃO!
O choro, a dor, as lágrimas… Cláudia e Laurie de pé, paradas e de cabeça baixa. Olivia tentando acalmar David. Ele a abraça e chora como uma criança. Mary Hellen chega aos dois e eles se abraçam ali ao lado do corpo de Irene que agora descansa em paz, depois de tantos anos de dor.
No Sta. Agatha, as pessoas que sobreviveram tentando se situar de tudo. Pela primeira vez, vemos Sarah abraçando a Sônia e a irmã Mônica em lágrimas. Ambas sentindo o peso de tudo o que ocorreu.
Em instantes, o padre Henry chegando, vendo aquela situação.
Irmã Ruth e Aurélio chegando mais tarde com vários bombeiros e paramédicos.
Ruth chora abraçando a Olivia e a madre Mary Hellen.
David abraça Aurélio e os dois desabam em lágrimas.
O padre Henry vendo o corpo do padre Albert e erguendo suas mãos aos céus em sinal de súplica, chorando, e colocando o rosto no chão.
Sarah encontrando Olivia e a abraçando com amor pela primeira vez.
O dia em que o grande holocausto veio à tona… Trouxe verdades, trouxe a libertação, mas também trouxe a dor. E mesmo agora tudo estando limpo, as cicatrizes vão acompanhar cada uma daquelas pessoas. Mas agora será diferente. Estarão blindados por uma força que nem eles pensavam que conseguiriam. Provaram que mais uma vez… O bem sempre vai vencer o mal… Não importa quantos anos demore.
Voz em OFF- Olívia:
“Aos 32 anos de idade, eu nunca pensei na minha vida que poderia testemunhar algo assim. E o mais estranho de tudo, eu não esperava que seria escolhida para uma batalha espiritual como essa. Sempre me senti tão fraca, tão insuficiente. Por vezes eu questionei a minha fé e duvidei até mesmo da existência de Deus na minha juventude… Mas hoje eu vejo tudo de outra forma, e acredito unicamente nas promessas que Deus têm para cada um de nós. Pois a glória da segunda casa, será maior que a da primeira.”
“Após o ocorrido, toda a mídia ficou sabendo e o Sta. Agatha ficou cheio de repórteres de todo o Reino Unido e do mundo. Os noticiários, as revistas e tudo qualquer mídia de divulgação, não se falava em outra coisa… A tragédia no Sta. Agatha.
O chamado “Holocausto de Sta. Agatha” foi uma comoção mundial e, segundo eles, uma tragédia tão famosa quanto Chernobyl e as Torres Gêmeas. Com o passar dos dias, o Sta. Agatha acabou virando um ponto turístico. Pessoas do mundo inteiro queriam conhecer os heróis que enfrentaram corajosamente todas aquelas entidades. Eles tiravam fotos comigo, com o David, e com todos os outros que continuaram conosco. O Vaticano se comoveu com o ocorrido e até mesmo o Papa fez questão de ir até lá oferecer o seu apoio.”
“Os bispos Gabriel e Michelangelo foram exonerados da Igreja Católica por se negarem a ajudar o padre Albert e não impedirem que a tragédia acontecesse. O Vaticano e assim como todo o Reino e Unido começaram a fazer doações para a reforma do Sta. Agatha. Imediatamente milhares de pessoas de vários países enviaram doações para que o Sta. Agatha fosse reerguido e também seria uma forma de tributo à aquelas pessoas que faleceram”.
“Bom, como já era de se esperar, o padre Henry se tornou o padre titular da paróquia. Ele prepara uma missa de inauguração, pois incrivelmente a igreja foi o único lugar do Sta. Agatha que não sofreu as consequências. Ele quis fazer essa missa em homenagem ao padre Albert”.
O padre Henry se encontra no altar, muitas pessoas estão ali para assistir a missa.
— Em nome do pai, do filho e do Espírito Santo. Meus amados irmãos… Hoje eu posso de fato afirmar a vocês que… Serei o novo padre dessa paróquia… Mas quero que saibam que não estou aqui para substituir ninguém. Afinal de contas, a pessoa que me fez chegar até aqui, é insubstituível… O padre Albert me ensinou tudo o que eu podia aprender e ainda serei eternamente grato pelo o que ele me fez… Se antes eu não duvidei do meu chamado, só confirmei após conhecer um homem de Deus como o padre Albert. Gostaria de pedir a todos, em homenagem ao padre Albert, um minuto de silêncio.
Aquele minuto de silêncio foi respeitado. O padre Albert deixará no Sta. Agatha, um legado de liderança e sabedoria.
Voz em Off- Olívia.
“A Sarah se converteu ao catolicismo. Mas ela preferiu não continuar mais no Sta. Agatha, precisava tomar um novo rumo na sua vida, mas ela finalmente deixou suas mágoas para trás e seguiu em frente”.
“O Seu Aurélio continuou como jardineiro no Sta. Agatha e inspirou muitas outras pessoas a gostarem de plantas e das flores”.
“A irmã Ruth se tornou a nova madre superiora do Sta. Agatha, e não só isso, ela é a freira mais jovem a se tornar a líder interina de uma instituição como essa. Ela fez a primeira reunião geral com as freiras.”
Irmã Ruth está na sala de reuniões. Todas as outras irmãs estão sentadas na enorme mesa.
— Irmãs… Ainda não sei como isso funciona, mas… Eu prometo que vou tentar ser uma líder tão boa quanto a nossa madre Mary Hellen foi. E não posso deixar de honrar neste momento… A memória da irmã Irene. Um exemplo de mulher. Lutou com unhas e dentes e não desistiu nem mesmo no momento da morte. É esse tipo de mulher que devemos nos tornar, irmãs! Que não se cala para o inimigo, que luta e que vence, não importa as circunstâncias… Pela irmã Irene!
Todas:
— PELA IRMÃ IRENE!
“A irmã Mônica acabou se tornando o braço direito da (agora) madre Ruth. Fiquei muito feliz que mesmo depois do ocorrido, a irmã Mônica decidiu ficar e ajudar.”
“A madre Mary Hellen foi presa. Sim… Por mais que a gente fizesse de tudo, ela mesma não quis ser ajudada. Ela disse que esse seria o seu destino desde o começo. Disse que seria uma forma de honrar a memória do padre Albert e da irmã Irene. Mas o que a madre Mary Hellen não sabia, é que Deus sempre tem uma maneira de livrar os seus filhos e se uma vez, ele me mostrou que ela receberia sua carta de alforria… Isso não foi em vão.”
Mary Hellen está na cela da prisão. A carcereira aparece e abre.
— Venha! Você tem visitas.
— Pra mim? Mas… Quem será?
Mary Hellen se aproxima da porta da cela, estira as mãos para a carcereira e estranha que ela não fez nada.
— Não vai me algemar?
— Não será preciso. Veja.
Mary Hellen olha pra frente e ali no corredor está vindo uma senhora com uma bengala e provavelmente deve ter uns 75 anos.
— Quem é…
— Já que não recebi tuas cartas, eu vim aqui pessoalmente.
— SENHORITA EMÍLIA!
— Obrigada pelo “Senhorita”. Apesar de que hoje tenho 3 filhos, quatro netos e um bisneto.
— Como? Como você veio parar aqui?
— Ah não se fala em outra coisa no mundo inteiro e óbvio que peguei o primeiro voo pra cá. Eu ia deixar a minha menina dentro de uma cela? Jamais!
— Ai, senhorita Emília! Eu senti tanta falta da senhora!
Mary Hellen abraça Emília.
— Minha Madeleine… Que orgulho eu tenho de você.
— Não deveria se sentir orgulhosa, olha o lugar onde eu fui parar.
— Falando nisso, vá arrumar as tuas coisas. Vou te levar daqui.
— O quê? Como assim?
— Paguei a tua fiança, querida. Eu não fiz uma promessa pra você que eu iria voltar pra te buscar? Lembra? De dedo mindinho e tudo? E que não importa quanto tempo demorasse? Pois agora eu vim cumprir minha promessa, menina. Vai morar comigo na minha casa na Itália, de onde você nunca deveria ter saído.
— Mas, mas é que…
— … Sem mais, garota! Ora, ora, respeite os mais velhos. Eu ainda estou bem viva, tá?
A carcereira diz:
— Mary Hellen, me acompanhe para assinar a sua documentação. Você realmente está livre.
— Tá… Tá bom.
Algum tempo depois, Mary Hellen já está pronta e ela e Emília estão saindo da penitenciária.
— Ah, menina. Esqueci de te falar que você já tem suas primeiras visitas pós-liberdade.
— Quem?
— Olhe você mesma.
Vindo na direção delas, vemos um casal de idosos muito simpáticos. O senhor está com um chapéu e um terno cinza e carregava alguma coisa nas costas. A senhora se vestia elegante e seus cabelos brancos e lisos davam um charme a mais nela.
— Me desculpe, mas… Eu conheço vocês?
O homem responde:
— Talvez assim não iria nos reconhecer, mas… Quem sabe com isso?
Ele tira a mão de suas costas e mostra à ela um girassol.
— Não… Não pode ser! MICKEY! LYLA?
Lyla responde:
— Sempre soube que um dia nos encontraríamos de novo, Madeleine.
— Bendito seja o Senhor!
Ela abraça os dois. A amizade da infância agora está mais viva do que nunca.
— Eu estou tão, mas tão feliz por saber que estão bem.
Lyla diz:
— Ficamos sabemos das notícias e Mickey e eu pensamos em vir te ver.
— Durante todos esses anos, minha mãe orou por você e nós também.
— Nós ficamos sabendo da Irmã Irene… Uma pena que não conseguimos nos encontrar antes dessa tragédia.
— Antes de partir… A Irene falou de vocês dois… Lembrou de vocês com muito amor. E agora está descansando no céu.
Lyla diz:
— Foi difícil te encontrar, porque descobrimos que você tinha outro nome, se chamava Mary Hellen.
— Não mais, meus amigos! Essa Mary Hellen está morta. A partir de agora meu nome é e sempre será… Madeleine!
Os quatro sorriem e se abraçam uns aos outros.
“Bom, quanto a mim, eu continuo ajudando aqui no Sta. Agatha sempre que posso. Mas confesso que fico meio incomodada com esses holofotes, muita gente vem fazer turismo por aqui e quer tirar fotos com a gente, pedir autógrafos e essas coisas. O que me conforta é que não é só comigo, com os outros e com o David também isso acontece. E por falar no David… Creio que ele ainda tem assuntos inacabados para resolver.”
David está no corredor e acabou de assinar um caderno para um garoto que está ali junto com o pai dele.
— Obrigado e se cuidem!
David está de costas e mais atrás no corredor, vemos a silhueta de alguém que não esperávamos.
— DAVID?
David olha para trás, fica completamente incrédulo diante do que está vendo.
— Rachel?
— Oi… Eu…
— Como chegou até aqui?
— Fiquei sabendo do que aconteceu aqui e do que aconteceu com você e… Bom, quis vim te ver. Já faz 4 anos, não é?
— Sim, faz 4 anos.
— Olha… Eu sei que as coisas entre a gente não terminaram muito bem… E durante esses anos eu fiquei pensando que talvez… A gente poderia voltar a nos encontrar e… Quem sabe?… Tentar de novo. Acho que… O que a nossa Janet mais queria neste mundo, era ver os seus pais juntos. Então… David… Vamos esquecer o passado e vamos tentar de novo?
Ela pega nas mãos de David. Ele as segura por instantes, olha por alguns segundos e depois decide soltá-las.
— O… O que foi?
— Olha, Rachel… Eu vou ser bem sincero com você. Durante esses 4 anos, desde que a nossa filha morreu… Eu não pensei em outra coisa… A não ser na dor que você me causou. Eu até pensei que a morte da Janet teria sido a pior coisa que aconteceu na minha vida, e é porque antes disso eu precisei enfrentar o abandono do meu pai e a morte da minha mãe adotiva.
— Mãe adotiva?
— Sim… Eu descobri que minha mãe verdadeira estava aqui o tempo todo… E eu também a perdi… E agora, depois do que aconteceu, eu analiso por um lado e percebo que… Eu perdi todas as pessoas que eu mais amava nesse mundo… Mas eu não perdi você, Rachel.
Rachel dá um leve sorriso.
— Foi você quem me perdeu.
A expressão dela muda e fica surpresa. David continua.
— Eu fiquei órfão aos 20 anos, me casei com você um ano depois e não por carência, mas porque eu realmente te amava. Quando a Janet nasceu, a única coisa que me veio foi: Agora sim eu tenho uma família. A família que eu sempre quis ter. E você desperdiçou. Jogou tudo isso fora. Durante os 9 anos que ficamos juntos, eu sempre fui um homem compreensível, sincero, carinhoso e nunca… Escute bem, nunca te deixei faltar nada. E como você me paga? Me insultando, me expulsando da minha própria casa, me acusando da morte da nossa filha… Antes eu me culpava, me culpava várias vezes e dizia que a morte da Janet tinha sido minha culpa, mas não! Eu sei que não foi e Deus é testemunha disso. A nossa filha morreu por um capricho seu, por uma crise de ciúmes idiota.
— David, eu…
— … E sabe o que é o pior? É que não foi só a minha filha que você tirou de mim… Você tirou de mim a vontade de viver… Você me destruiu, deixou meu coração despedaçado… Eu me afoguei na bebida, tentei me matar… Você não tem ideia, Rachel! Não tem ideia de quantas vezes eu fui dormir chorando! Chorando que nem uma criança… Por saber que a única mulher que eu realmente amei me desprezou! Me jogou no lixo como se eu fosse uma sucata descartável.
— Escuta, eu estou tentando dizer que…
— … Se você precisou me perder pra aprender a me valorizar… Eu entendo. Porque eu também precisei me perder, pra aprender a dar valor a mim mesmo. Hoje, Rachel… Hoje eu sei o homem de valor que eu sou. Hoje eu sei o quanto eu sou incrível e não porque pessoas me elogiaram, mas porque mesmo te odiando durante todos esses anos, eu nunca te desejei o mal… Porque no fundo eu ainda te amava. E isso dói! DÓI EM MIM! Só que eu também aprendi… Que amar… Também é deixar ir. Você era a coisa mais importante da minha vida e do nada… Se tornou o que mais me destruiu… Eu estou aqui cheio de feridas, e você não faz ideia de como está o meu coração agora.
— David, me perdoa, por favor! Me perdoa!
— Se fosse há uns dois anos atrás… Eu jogaria na tua cara e diria que nunca vou te perdoar… Mas hoje não. Hoje, após tudo o que eu aprendi aqui… Eu tenho a autonomia de dizer a você: Eu te perdoou, Rachel…
— Ah! Obrigada, obrigada, David, eu…
— … Mas não quero você de volta na minha vida.
— O.. O quê? Mas…
— Com o tempo a gente aprende… Que não adianta a gente voltar pra aquilo que mais nos machucou. Eu finalmente encontrei o amor que vale a pena, Rachel… E não estou falando de outra mulher. Estou falando do amor que agora brota aqui dentro do meu peito. O amor que Cristo tem por mim e o amor que eu tenho por mim mesmo. Hoje eu peço perdão a mim mesmo… Por duvidar do cara que eu sou e acima de tudo… Achar que um dia eu fui o cara pra você. Adeus, Rachel!
David se afasta.
— Não, David! Espera! Volta pra mim, por favor!
— Não, Rachel! Acabou! Eu não sou homem… Pra receber migalhas.
David vira as costas para Rachel. Pela primeira vez, ele teve coragem de encarar o seu maior pesadelo e abrir mão de continuar sofrendo. O trauma que mais lhe destruiu agora será enfim enterrado. David carrega consigo o fardo de um homem que até tentou desistir, mas a força que habitava nele era maior. E além disso, ele teve uma mãe tão forte quanto o carvalho, uma força que passou de mãe para filho… Agora finalmente David poderá viver uma vida livre de mágoas e de ressentimentos.
É tarde no Sta. Agatha, as coisas já estão voltando ao normal após meses do ocorrido. Olivia está cuidando de alguns velhinhos ali no pátio sentados no banco. Na varanda do lado de cima, a irmã Cláudia está ali observando-a. Outra pessoa se aproxima dela.
— Como ela tá indo?
Laurie é quem aparece ali.
— Acho que ela dá conta. Tua filha é bem corajosa.
— Sim… Tenho muito orgulho dela.
— E pelo visto… Ela ainda terá surpresas, olha só quem está vindo ali procurar ela.
Cláudia está se referindo a David.
— Só quero a felicidade da minha filha e nada mais. E agora, irmã Cláudia? O que vai fazer?
— Bem… Acho que a minha missão aqui acabou, né? Está na hora de eu realmente morrer em paz.
— Compartilho do mesmo sentimento. Como você conseguiu transitar entre os vivos durante tanto tempo?
— Eu tenho meus truques, querida.
— Vai precisar me ensinar esses truques depois, eu vou precisar.
— Pode deixar, jovem Laurie. Vou te ensinar.
Elas viram de costas para entrar pra dentro e desaparecem em seguida.
No pátio, David chama Olívia.
— Olívia! Pode vim aqui, um minuto?
— Já estou indo!… Vocês se cuidem aí, eu já volto (referindo-se aos velhinhos).
Ele fica no batente da área a esperando.
— O que foi, David?
— Sabe, eu… Estava pensando aqui… A minha ex-mulher veio me ver. Querendo uma nova chance.
— Sério? E aí?
— Eu a perdoei… Mas não quero mais voltar.
— No… Nossa, eu estou surpresa. Pensei que…
— Olívia!
Ele segura nas mãos dela.
— Eu falei sério naquela hora… Quando disse que não queria perder você… Pois já tinha perdido a todos que eu amava. Eu pensei… Por que não? Acho que… Não teria nada de mal nisso, não é?
— David, eu… É que…
— Eu sei, eu sei, nunca daria certo.
— Não, não é isso… É que… Ainda está muito cedo… Precisamos realocar nossas ideias, nossa vida e… Depois, quem sabe? Podemos dar uma chance um ao outro… Então se você me esperar…
— … Eu espero… O tempo que for preciso.
Olivia sorri. David devolve com o mesmo gesto. O primeiro sorriso que eles dão após tanto tempo. David beija a testa de Olivia. Ela o abraça e ficam ali por instantes. Uma borboleta azul pousa no ombro dela.
— Irmã Cláudia…
A borboleta volta aos céus. Olivia e David olham para ela e ambos começam a sorrir aliviados.
Todos eles continuaram com marcas, continuaram com feridas… Perderam pessoas queridas, mas não deixaram a fé morrer, não deixaram a esperança morrer e agora… Vão regozijar das bênçãos. Da glória da segunda casa, ou melhor, da terceira casa.
Que todas as feridas deixadas por esse mundo cruel, por um amor não correspondido, por uma falsa amizade, por uma falta de atenção, por um abandono, por uma traição… Sejam restauradas a partir de agora…
Não importa quanto tempo dure… A felicidade está logo ali e o céu… Não é mais o limite.
“NOTA DO AUTOR”
Quando comecei a escrever “Rest Home”, eu estava passando pela pior da fase da minha vida. Precisei enfrentar traições de amigos e a pessoa que eu mais amava nesse mundo, que prometeu estar comigo em todos os momentos… Me abandonou! Sim e como se não bastasse, além dela ter ido embora, levou embora também minha alegria, meus sorrisos e minha vontade de viver.
Passei dias e dias chorando todas as noites pensando no quão insuficiente, ou tão burro eu fui. E quando a gente pensa que as coisas estavam pior, eis que me deparo que as pessoas que eu mais confiava foram me deixando. E assim como a própria irmã Claudia disse… Eu fui deixado para morrer sozinho. Não literalmente falando, mas acho que vocês entenderam.
O mais incrível é que… Eu sempre fiz de tudo pra estar com as pessoas, pra ajudá-las e… Tomar todo cuidado para não magoar ninguém, mas ninguém tem esse mesmo cuidado comigo, acham que… Eu sou feito de aço, acham que eu não tenho sentimentos, então… “VAMOS BATER NESSE OTÁRIO! ELE AGUENTA LEVAR PANCADA!”
Com tudo isso acontecendo, minhas crises de ansiedade voltaram com tanta força que eu estive a ponto de entrar (pela terceira vez) em depressão. Mas eu precisava de algo para canalizar tudo isso que eu estava sentindo, então eu comecei a escrever! Eu comecei a escrever e imaginar toda aquela dor que eu estava sentindo, todo o trauma que tava dentro de mim… Por isso que cada personagem de Rest Home representa um estágio do meu luto. Talvez eu compartilho da mesma dor que o David tem… Ele foi abandonado por quem ele mais amava e quem ele mais confiava… Assim como eu fui.
A Olivia sempre foi aquela pessoa que tentava ajudar todo mundo, assim como eu sempre tentei. A Irmã Irene representa os meus momentos de raiva, mas até na amargura, ela protegeu a Mary Hellen durante anos fingindo que era sua inimiga.
Eu coloquei em Rest Home… Toda a minha raiva, meu ódio, minha dor, minha amargura, meus traumas, tudo o que eu estava sentindo nesses 3 meses de luto. Se eu disser pra vocês que já passou tudo, estaria mentindo. Eu ainda sinto, sabe? Ainda dói tudo aqui, dói você saber que não pode mais confiar em ninguém, que por mais que muitas pessoas cheguem pra mim e digam: “Você é incrível!”. Posso até ser incrível, mas nunca o escolhido… Por ninguém. Em qualquer ambiente, roda de amigos, trabalho e etc, estarei sempre como a última opção.
Então eu penso: Pra quê vou colocar as pessoas como prioridade? Elas não me tratam como opção? Podes até pensarem que eu estou sendo egoísta, mas… Ninguém me viu como eu estava, ninguém me ajudou quando eu precisei. Eu passei pela pior fase da minha vida sozinho, então não me julguem e nem me questionem “Por que eu mudei”?. Todo dia é uma guerra que eu enfrento aqui dentro e mais uma vez eu percebo que… Eu sempre estarei sozinho em tudo o que eu fizer. Então… Vou aprender a valorizar a minha própria companhia e… Me amar como eu mereço… E não amar outras pessoas, porque elas não merecem.
Concluindo… Escrever essa série foi bem doloroso, mas eu precisava colocar tudo pra fora. Então acho que essa série é o meu grito de socorro! É a dor que meu coração sentia… Não vou pedir desculpas por ter vindo com toda a minha intensidade aqui… Mas espero que algum dia vocês compreendam o que é estar no meu lugar.
Agradeço a vocês que… Estiveram comigo durante esse processo e… Me aguentaram falando demais, entupindo os stories do instagram, fazendo várias publicações e tals… Não vou citar nomes, pois vou acabar esquecendo de alguém, mas fiquem em paz, queridos! Espero que… Deus possa abençoar a cada um de vocês grandemente.
Att. Melqui Rodrigues, 2022.
“O Último asilo de Madalena, da filial de Waterford, foi fechado em 1996. Em 2011, a comissão da ONU contra tortura solicitou ao governo irlandês que instaurasse inquérito para investigar as denuncias de maus-tratos. Em fevereiro de 2013, o primeiro-ministro Enda Kenny apresentou desculpas, em nome do governo irlandês, às milhares de mulheres que foram internadas e forçadas a trabalhar nestas instituições.”
“Que a graça do nosso Senhor
e Salvador Jesus Cristo,
O amor de Deus, nosso pai,
A comunhão e a consolação
Do Espírito Santo seja
Com todos vós. Não só agora,
Mas para todo o sempre…
Amém”
FIM
REALIZAÇÃO:
WIDCYBER
PRODUÇÃO:
CO- PRODUÇÃO INTERNACIONAL:
© Copyright MMXXII
Que loucura!!! Insano, profundo, estonteante. Tem que dar um respiro entre os atos, senão não aguenta chegar até o final.
Tudo muito bem costurado, bem explicado. Que final foi essa?!
E a sua nota final tb foi tão forte como toda a história de Rest Home. E eu aqui, desejo que vc não perca a esperança na humanidade. O seu lugar está marcado na arte, definitivamente com esse trabalho.
Seu sucesso já está escrito!
Parabéns por mais esse trabalho e que venham muitos mais. Ficamos no aguardo.
Minha querida, fico muito, mas muito agradecido mesmo pelo comentário. Fico feliz de verdade que você tenha acompanhado essa história até o final e obrigado pelos bons desejos, tenho certeza que me tornarei uma pessoa melhor daqui por diante. Gratidão!
Que loucura!!! Insano, profundo, estonteante. Tem que dar um respiro entre os atos, senão não aguenta chegar até o final.
Tudo muito bem costurado, bem explicado. Que final foi essa?!
E a sua nota final tb foi tão forte como toda a história de Rest Home. E eu aqui, desejo que vc não perca a esperança na humanidade. O seu lugar está marcado na arte, definitivamente com esse trabalho.
Seu sucesso já está escrito!
Parabéns por mais esse trabalho e que venham muitos mais. Ficamos no aguardo.
Minha querida, fico muito, mas muito agradecido mesmo pelo comentário. Fico feliz de verdade que você tenha acompanhado essa história até o final e obrigado pelos bons desejos, tenho certeza que me tornarei uma pessoa melhor daqui por diante. Gratidão!
O final perfeito para coroar essa obra prima criada pelo gênio Melqui Rodrigues. Foi tão emotivo (até mais) que os episódios anteriores. Teve muitas reviravoltas. Conclusões de arcos de personagens importantes, momentos macabros e tudo muito bem amarrado igual vinha sendo desde o primeiro episódio. Simplesmente perfeita essa série.
Muito obrigado, meu amigo. Fico fiz demais que você tenha gostado. Tamo junto!
O final perfeito para coroar essa obra prima criada pelo gênio Melqui Rodrigues. Foi tão emotivo (até mais) que os episódios anteriores. Teve muitas reviravoltas. Conclusões de arcos de personagens importantes, momentos macabros e tudo muito bem amarrado igual vinha sendo desde o primeiro episódio. Simplesmente perfeita essa série.
Muito obrigado, meu amigo. Fico fiz demais que você tenha gostado. Tamo junto!
Como eu já imaginava, Rest Home teve um final impactante, surpreendente e emocionante!!! O que foi esse confronto da Olivia com a entidade?! As revelações da irmã Irene?! Estávamos vendo tudo por um ângulo errado o tempo todo. Foi genial essa sacada. A revelação de quem era a Medeleine também foi tudo e uns canudos. Que bom que ao fim ela conseguiu continuar a vida e achei tão lindo ela reencontrando a Emília e os amigos do Madalena. Aliás, choque que esse lugar realmente existiu. As cenas da Olivia adolescente foram muito bem feitas tambem mostrando que naquele lugar a maldade não tinha limites. Ela lavou a alma de todos, acredito eu, quando deu ao Daniel e a Madre o que eles mereciam!!! E por fim me emocionei bastante lendo sua nota ao fim amigo. Te desejo parabéns por essa série maravilhosa e te desejo tudo que há de bom pois você merece muito. Tem um coração incrível e para mim é uma grande alegria ser próxima a você é ter o privilégio de ler suas obras ❤
Eu fico extremamente feliz em ler essas palavras, sério. Essa série sem dúvidas ficará marcada pra sempre em mim e espero que fique em vocês também.
Obrigado de coração por acompanhar até o fim, por cada comentário e se Deus quiser, virá muitas outras obras incríveis.
Beijos!
Como eu já imaginava, Rest Home teve um final impactante, surpreendente e emocionante!!! O que foi esse confronto da Olivia com a entidade?! As revelações da irmã Irene?! Estávamos vendo tudo por um ângulo errado o tempo todo. Foi genial essa sacada. A revelação de quem era a Medeleine também foi tudo e uns canudos. Que bom que ao fim ela conseguiu continuar a vida e achei tão lindo ela reencontrando a Emília e os amigos do Madalena. Aliás, choque que esse lugar realmente existiu. As cenas da Olivia adolescente foram muito bem feitas tambem mostrando que naquele lugar a maldade não tinha limites. Ela lavou a alma de todos, acredito eu, quando deu ao Daniel e a Madre o que eles mereciam!!! E por fim me emocionei bastante lendo sua nota ao fim amigo. Te desejo parabéns por essa série maravilhosa e te desejo tudo que há de bom pois você merece muito. Tem um coração incrível e para mim é uma grande alegria ser próxima a você é ter o privilégio de ler suas obras ❤
Eu fico extremamente feliz em ler essas palavras, sério. Essa série sem dúvidas ficará marcada pra sempre em mim e espero que fique em vocês também.
Obrigado de coração por acompanhar até o fim, por cada comentário e se Deus quiser, virá muitas outras obras incríveis.
Beijos!