CENA 01. GALERIA DE ARTE. SALÃO. INT. NOITE.
Sonoplastia: suspense. Solange esbarra em Ivan, que conversa com Sérgio. Ivan e Solange se viram um para o outro, devido ao susto.
IVAN (preocupado)
Tudo bem com você, moça?
SOLANGE
Acho que sim. Fiquei meio zonza, só isso.
Solange se afasta, nervosa, em direção ao banheiro. Ivan mais preocupado. Helena se aproxima dele. Sonoplastia: bossa nova (até a cena 03).
HELENA
Ivan, como vai? Há quanto tempo não nos vemos?
IVAN
Há não muitos dias. É um prazer vê-la por aqui, para prestigiar meu trabalho.
HELENA
Mário falava do seu talento, mas eu não imaginava que era tanto assim. Até eu, que não sou muito chegada às artes, fico impressionada. Você sabe como despertar as sensações.
IVAN
Assim fico envergonhado com tanto elogio. Não sei nem o que falar. Só faço o que amo.
HELENA
Nada de modéstia! A exposição está lotada e os comentários estão sendo muito bons. (ambos sorriem) Como têm sido as coisas?
IVAN
Tentando levar. Não é fácil perder um filho. E você? Veio sozinha?
HELENA
Não. Trouxe meus filhos. Você os conheceu no enterro, não?
IVAN
Sim, todos adoráveis. A Solange também veio com você, não? Eu a vi agora mesmo. Estava meio zonza. Esbarrou em mim e saiu assustada para lá. (aponta)
HELENA
Sim, coitadinha. Também está sofrendo muito com tudo isso.
Um garçom passa, oferecendo bebidas para Ivan e Helena. Ele pega duas taças e dá uma para a empresária.
CENA 02. GALERIA DE ARTE. CORREDOR. INT. NOITE.
Solange encostada a uma parede, preocupada e apreensiva com o que ouviu anteriormente da sensitiva.
SENSITIVA (voz)
Menina, você está em apuros. Quer entrar no paraíso, mas na verdade você está em um caminho de muita lama, de muito sofrimento. É um caminho sem fim. (pausa) Você cutucou a pessoa errada. A consequência já está por vir. E ela está dentro desse prédio.
MARCOS (cutuca)
Solange?
Ela volta a si e abraça Marcos.
MARCOS
Você está tensa, Solange.
SOLANGE
Sim. Não consigo encarar o pintor, é isso. Estou me corroendo por dentro.
MARCOS
Por que isso? A morte do Mário não foi culpa sua. Não há o que temer.
SOLANGE
Você é um amor, Marcos. (olha-o) Me beija.
MARCOS
Como assim? Você ficou…
Ela o beija sem deixá-lo terminar a frase. Arrasta-o desse jeito para o banheiro feminino.
CENA 03. GALERIA DE ARTE. SALÃO. INT. NOITE.
Raul de volta à galeria. Vai até Nelson.
RAUL
Pronto, deixei a garota no motel. Ela vai me esperar até acabar essa…
Olha a conversa animada de Ivan e Helena. Fica enciumado.
RAUL
Mas o que ela pensa que está fazendo?
NELSON
Nem pense em ir lá. Só estão conversando.
RAUL
Conversando? Ele está dando em cima dela. Olha só o jeito de cafajeste falido desse cara.
Antes que Raul faça qualquer coisa, Virgínia e Letícia entram na conversa deles.
VIRGÍNIA
Voltou, pai? Não ia ficar com a namorada nova?
RAUL
É… mudei de ideia.
LETÍCIA
Vocês não viram o Marcos por aí? Ele sumiu desde que o Ivan entrou.
NELSON
Vi não, filha.
LETÍCIA
Vou continuar procurando. Até logo. Vem, Vivi.
As moças saem juntas.
CENA 04. GALERIA DE ARTE. BANHEIRO FEMININO. INT. NOITE.
Sonoplastia: sensual. Banheiro vazio. Marcos senta-se no vaso (com a tampa fechada), esperando Solange terminar de fazer algo no celular. Ela está com cara de sapeca. Eles se beijam de forma caliente dentro da toalete, com a porta meio encostada. Ela tira a camisa dele. Depois ele se abaixa, e levanta o vestido dela; abaixa a calcinha lentamente; faz sexo oral nela. A loira faz cara de prazer. Uma moça entra no banheiro; se coloca à frente do espelho e retoca a maquiagem. Logo sai, sem perceber nada. O sexo continua.
CENA 05. GALERIA DE ARTE. CORREDOR. INT. NOITE.
Sonoplastia (até a cena 06): bossa nova. Virgínia e Letícia passam pelo corredor. A estilista recebe uma mensagem no celular; lê.
LETÍCIA (V.O.)
Meu amor, estou preparando uma surpresinha pra você. Vem aqui no banheiro feminino. Com amor, Marcos.
VIRGÍNIA
O que é, Letícia?
LETÍCIA (sorri)
Teu irmão é doido, sabia? Ele se enfiou no banheiro feminino pra me fazer uma surpresa.
VIRGÍNIA (curiosa)
Então vamos ver o que é.
CENA 06. GALERIA DE ARTE. SALÃO. INT. NOITE.
Ivan conversa com Sophia.
SOPHIA
Vim com minha amiga. Ela adora artes e está encantada com seu trabalho. Sonha ser artista. Mas sabe como é, a mãe não quer deixar. Quer que ela seja empresária. Mas acho que a Vivi não vai ter talento pra isso não.
IVAN
Por acaso essa Vivi é a Virgínia, filha da Helena?
SOPHIA
Ela mesma. Só tira notão nos trabalhos de artes. Todo bimestre tem alguma coisa dela exposta no corredor da escola. Ela é fera nisso.
O jornalista interrompe a conversa.
SANDRO
Boa noite, Ivan. Sou Sandro Cortez, da Folha da Capital. Gostaria de uma palavra sua.
IVAN
Claro, por favor. Sophia, fica à vontade.
Sophia fica num canto, vendo curiosa a entrevista.
SANDRO
Ivan, como você descobriu seu dom para a pintura?
IVAN
Então, tudo começou muito cedo. Ainda muito pequeno, descobri que gostava muito de desenhar e pintar tudo que vinha na mente, e que fazia isso com mais desenvoltura que as outras crianças. Meus pais e professores ficavam impressionados… (fade)
CENA 07. LIBERDADE. RESTAURANTE. EXT. NOITE.
Sonoplastia: Simples Carinho – Ângela Rô Rô. Música toca na caixa de som do restaurante. Nágila e Pedro continuam sentados numa mesa de bar. O rapaz joga charme na governanta, enquanto tomam cerveja.
NÁGILA
A princípio não gostava da Solange, mas agora acho que entendi o que ela quer. Você me convenceu. Conta comigo.
PEDRO
É assim que se fala. Se você ficar do nosso lado, vai receber uma bela recompensa. Lembre-se: pra todos os efeitos, ela quer recuperar o que é de direito e o que Mário tirou dela.
NÁGILA
Sabia que ele era um calhorda, mas não tanto. (olha o relógio no pulso) Acho que já vou, está ficando tarde.
PEDRO
Nada se torna tarde demais depois que anoitece. Fica mais um pouco. Quero te conhecer um pouco melhor.
NÁGILA (sorri)
Hoje não. Adorei sua companhia, mas preciso ir. Ainda tenho coisas a resolver.
PEDRO
Pelo menos uma carona você aceita?
NÁGILA
Carona, sim. Eu aceito.
CENA 08. GALERIA DE ARTE. BANHEIRO FEMININO. INT. NOITE.
Continuação da cena 04. Sonoplastia (até a cena 09): suspense. Solange e Marcos continuam transando na toalete. Virgínia e Letícia entram rindo.
VIRGÍNIA
Preparada para a surpresa, amiga?
LETÍCIA
O que será que o Marcos aprontou?
Elas param de falar e ouvem os gemidos de Marcos. Vivi fica passada.
VIRGÍNIA
Que brincadeira de mau gosto é essa, Marcos? Aparece!
Solange abre a porta com violência, mudando totalmente sua reação. Grita histericamente e finge choro. As outras duas ficam mais chocadas ainda.
SOLANGE
Sai de perto de mim! Estuprador! Ele quer me estuprar!
Marcos sai da toalete em seguida, sem entender o que se passa. Letícia revoltada.
MARCOS
Você está louca? Você que me trouxe pra… (vê Letícia, apavora-se) Letícia?
Solange o esbofeteia e sai correndo, mantendo a encenação.
LETÍCIA
Então era essa a surpresa?
MARCOS
Deixa eu me explicar, não é nada disso que…
LETÍCIA
Canalha!
Letícia também o esbofeteia e sai furiosa do banheiro. Ele a segue do jeito que está.
VIRGÍNIA
Coloca pelo menos a roupa, Marcos! Que mico!
Marcos e Virgínia também saem do banheiro. CORTE RÁPIDO.
CENA 09. GALERIA DE ARTE. CORREDOR. INT. NOITE.
Solange se encosta em um canto. Letícia se aproxima dela, e Marcos vai atrás da segunda. As pessoas em volta ficam horrorizadas com a cena. Virgínia acode Solange. Marcos segura Letícia.
MARCOS
Deixa eu te explicar.
LETÍCIA
Me solta, desgraçado! Meu Deus! Que nojo! Como você teve coragem de seduzir e abusar dessa pobre moça, e ainda querer me mostrar?
MARCOS
Não é nada disso…
LETÍCIA
Não sei nem o que pensar. Marcos, nosso casamento já era! (joga a aliança de noivado nele) Acabou!
Nelson se aproxima, assustado com os gritos.
NELSON
Filha, pode me explicar essa gritaria?
MARCOS
Não é nada. Posso resolver a sós com ela.
LETÍCIA
Peguei esse monstro estuprando a Solange no banheiro. A Vivi está de prova.
NELSON (tom)
Do jeito que você está, Marcos, não duvido de minha filha. Vista-se, pelo menos. E resolvemos, depois do evento. Isso não vai ficar assim.
Marcos sai para o banheiro masculino. Letícia chora abraçada ao pai.
LETÍCIA
Pai, eu não merecia isso. Que nojo.
NELSON
Se ele não fosse filho da Helena, eu nem sei o que faria.
CENA 10. GALERIA DE ARTE. SALÃO. INT. NOITE.
Sonoplastia (até a cena 11): jazz. Sérgio conversa com Ivan, enquanto eles bebem champagne.
SÉRGIO
Ivan, o evento está bombando. Quase todos os quadros já foram vendidos. Só a socialite de Brasília comprou uns dez. E a mulher da Bellatex levou outros cinco.
IVAN
Maravilha! (pausa) Repara só na movimentação. O pessoal da Helena sumiu do salão, e ainda há pouco teve uma gritaria lá no corredor.
SÉRGIO
Percebi sim, Estão cochichando por aí que aconteceu algo sério.
IVAN
Perfeito para os planos. Disfarça. Vou até lá, prestar minha… solidariedade. (sorriso irônico)
CENA 11. GALERIA DE ARTE. CORREDOR. INT. NOITE.
Helena consternada e furiosa com o que acabou de saber.
HELENA
Não consigo acreditar que meu filho possa ter sido tão irresponsável e leviano, se deixar levar por… num lugar cheio de gente. Não sei nem que nome dar. Os jornalistas estão adorando o escândalo. Mas ele que se prepare. Se ele pensa que vai sujar ainda mais o nome da nossa família por causa dessa covardia…
RAUL
Covardia, Helena? Não é para tanto.
HELENA
Não é para tanto? E abusar de uma mulher na frente da noiva e da irmã é o quê? Tudo isso é culpa sua, Raul. Você e seu machismo!
RAUL
Você está exagerando. Todo homem é assim. Quando vê uma mulher bonita e não resiste à tentação, ele sai de si e faz de tudo pra ter aquela mulher. Vai por mim, é Letícia que está fazendo um escarcéu por pouca coisa. Ela nem amava o Marcos.
NELSON
Independente de qualquer coisa, minha filha foi traída na maior baixaria, Raul. Será que você não enxerga isso? Sua filha Virgínia também estava na cena. Podia ser diretamente com ela, você já pensou nisso? Você iria gostar? Duvido!
RAUL
É, vocês estão certos.
HELENA
Então aproveita para ter uma conversa madura, de homem pra homem, com seu filho. (pausa) Nelson, você leva Letícia e Solange pra mim, por favor? Vou me despedir do Ivan e levar a Sophia à casa dela. Virgínia também vai comigo.
NELSON
Deixa comigo, Helena.
HELENA
E quanto a você, Raul, estou de olho vivo. Ai de você se resolver acobertar seu filho!
CENA 12. CASA NÁGILA. FRENTE. EXT. NOITE.
Pedro e Nágila chegam de moto à casa dela. Ela desce da moto. Eles tiram os capacetes.
NÁGILA
Obrigada pela carona, Pedro.
PEDRO
A gente marca outra vez.
NÁGILA
Quando eu tiver nova folga, está bem?
PEDRO
Tá bom… Nágila.
NÁGILA
Acertou meu nome. (sorri) Até mais.
Ela para em frente ao portão e olha Pedro pôr o capacete. Ele acena para ela e sai com a moto. Nágila entra pelo portão.
CENA 13. GALERIA DE ARTE. SALÃO. INT. NOITE.
Sonoplastia: jazz. Helena se desde de Ivan. Sérgio observa de longe.
IVAN
Já vai, Helena?
HELENA
Vou sim, Ivan. Tenho mil problemas para resolver. Meu filho aprontou, acredita?
IVAN
Sinto muito.
HELENA
Nem sei o que pensar. Nem sequer sei como compensá-lo por esse escândalo.
IVAN
Não se preocupe com isso.
HELENA
Enfim… gostei de ver que você está tendo força para seguir após a morte do seu filho. Conta sempre comigo pro que precisar. Estou com a casa e a empresa de portas abertas pra você. E depois, mando um encarregado pegar os quadros que comprei.
IVAN
Ótimo! Obrigado por tudo, Helena. Foi muito importante sua presença aqui.
Helena sai, elegante e decidida. Ivan a observa. Em seguida, Solange passa com Nelson. Ivan sente um calafrio.
SÉRGIO (aproxima-se)
Acho que alguém está a fim de você.
IVAN
A Solange? Ela ia ser minha nora, Sérgio. A vida dela está um pesadelo igual à minha. Mas tem alguma coisa nela que não me convence. Não sei o que é.
SÉRGIO (ri)
Ela é estranha mesmo. Mas eu falava da Helena.
IVAN
Helena a fim de mim? De onde você tira essas coisas? Ela só vive pro trabalho. Até a visita aqui à exposição foi por motivo puramente profissional. Ela é daquelas pessoas que vivem do status, e só.
SÉRGIO
Aham, sei. Ela estava impressionada com o charme do pintor.
IVAN
Tá bom, Sérgio, Vamos voltar pro trabalho, que ainda temos muito o que fazer hoje.
Fotógrafos entram e tiram fotos de Ivan entre seus quadros.
CENA 14. MANSÃO HELENA. SALA. INT. NOITE.
Nelson, Letícia e Solange entram e sentam no sofá. Todos consternados.
NELSON
Vou preparar algo pra vocês, me esperem.
Ele sai. Letícia senta ao lado de Solange. Elas choram abraçadas. Sonoplastia: drama.
LETÍCIA
Minha vontade agora é de denunciar aquele maldito que desgraçou nossas vidas. É verdade que ele nunca foi o amor da minha vida, mas eu tinha um carinho por ele. (pausa) Você quer denunciá-lo, Solange? Se quiser, eu vou com você.
Solange finge choro compulsivo e nada responde. Letícia volta a abraçá-la. Em seguida, Nelson chega com uma bandeja de chá. Coloca-a sobre a mesinha e observa as moças.
CENA 15. APARTAMENTO RAUL. SALA. INT. NOITE.
Raul e Marcos conversam de pé sobre Solange.
MARCOS (desespero)
Pai, eu não fiz nada. Foi ela que me seduziu e, assim que a Letícia entrou no banheiro, ela começou a reagir daquele jeito.
RAUL
Foi isso mesmo? Me conta tudo desde o começo.
MARCOS
Então… vi a Solange meio abatida no corredor e fui falar com ela. Aí ela me beijou e levou para o banheiro. Transamos. Ela queria. Quando a Letícia entrou, ela saiu de cima de mim e começou a fazer aquele escândalo. Ela estava toda estranha. E aí deu no que deu.
RAUL
A Letícia falou que você mandou uma mensagem pedindo para ele ir ao banheiro, que você tinha uma surpresa pra ela. Filho, fala a verdade. Confia no seu pai.
MARCOS
Não mandei mensagem nenhuma, ela só pode estar inventando pra justificar a… A Solange fez algo no celular dela na hora da transa.
RAUL
Mas a Letícia jura de pés juntos que a mensagem saiu do seu celular, Marcos.
MARCOS
Olha aqui e vê se tem alguma mensagem enviada pra ela. (dá o aparelho) Olha! A senha é a data de nascimento.
Raul verifica as mensagens no celular de Marcos.
RAUL
Realmente não tem nada aqui. (pausa) Filho, não faz nada sem falar comigo. Agora tenta se acalmar e descansar para amanhã.
MARCOS
Se é que é possível.
A campainha toca.
RAUL
Quem será? Não estou esperando ninguém. E a recepção também não interfonou.
Raul atende. É Helena, em postura autoritária. Ela entra e encara o filho. Raul fecha a porta.
HELENA
Temos muito o que conversar, Marcos.
Closes alternados entre Marcos e Helena. Efeito de fim de capítulo: imagem congela em Marcos. Sonoplastia: rugido de leão.