CENA 01. MANSÃO HELENA. BANHEIRO. INT. DIA.

Continuação imediata da última cena do capítulo anterior. Solange manda um mensagem para Pedro, pelo celular: “E todo mundo caiu direitinho no meu golpe. Até o embuste da Helena. Acesso livre à mansão da ricaça. Parte um finalizada com sucesso.”. A vilã dá um sorriso de orelha a orelha, de frente ao espelho. Em seguida, finge um choro escandaloso. Ouve-se Nágila do lado de fora.

NÁGILA (voz)
Dona Solange? Tudo bem aí? Abre a porta. (pausa) Dona Solange? Vou chamar dona Helena.

A megera continua o fingimento.

CENA 02. MANSÃO HELENA. SALA. INT. DIA.

Nágila desce as escadas e vai até a patroa, que lê uma revista de negócios no sofá.

NÁGILA
Dona Helena, com licença. Acho que dona Solange precisa de ajuda. Está chorando no banheiro.

HELENA
Deixe-a lá o tempo que precisar. Solange precisa desse momento para desabafar. Está sofrendo muito com tudo que aconteceu com o noivo.

NÁGILA
Ele tinha todo um futuro pela frente. Ia ganhar até prêmio. Jamais pensaria que ele fosse um lobo em pele de cordeiro.

HELENA
O sucesso sobe à cabeça das pessoas, Nágila. E aí, elas revelam quem são. Mas a vida tem que seguir. Assim que passar o período de luto, vamos organizar o casamento do Marcos. Quero que seja o quanto antes.

Virgínia desce as escadas com o material da escola, apressada. Para perto de Nágila.

HELENA
Filha, onde você vai a essa hora, com esse material?

VIRGÍNIA
Estudar com minhas amigas e pegar a matéria que perdi hoje.

HELENA
Pelo menos poderia se arrumar melhor, filha.

VIRGÍNIA
Mãe, eu não vou a um desfile de moda. Só vou estudar. Tchau, Nágila. Tchau, mãe.

A menina dá um beijo no rosto da mãe e sai apressada.

HELENA
Está vendo, Nágila? Minha filha se recusa a dar valor às coisas importantes da vida. Coisas como a aparência.

VIRGÍNIA (carinhosa)
Nem tudo mundo é igual à senhora, dona Helena. Virgínia é uma filha de ouro e tem muitas qualidades. Queria eu ter uma filha assim. Ela pode não ser tão bonita quanto a senhora deseja. Mas é doce, bondosa, bem educada e com muito talento para as artes.

HELENA
Artes não enchem barriga de ninguém. Ganha dinheiro num dia, perde no outro. Não há estabilidade. Isso não é vida, Virgínia.

CENA 03. BELLATEX. SALA NELSON. INT. DIA.

Nelson e Letícia conversam, sentados à mesa.

LETÍCIA (chocada)
Não tenho nem cara pra trabalhar hoje. Até outro dia, a gente cruzava com o Mário. E agora, essa situação estúpida.

NELSON
Que ele provocou.

LETÍCIA
Não sei. Continuo não acreditando que ele possa ter feito essa barbaridade. Apareceram provas, mas elas podem ter sido plantadas, sei lá. Meu coração me diz que tem fio solto nessa história.

NELSON
Você gostava muito dele, não é, filha?

LETÍCIA
Era um bom amigo. Gostava, sim. Espero que tenha ido para um bom lugar, apesar de tudo.

NELSON
Acho difícil. Ele se suicidou, filha.

LETÍCIA (calafrios)
Não gosto nem de imaginar a cena. O Marcos me contou o que viu, e estou arrepiada até agora.

Marcos bate à porta e entra. Dá um beijo na testa da noiva. Entrega umas pastas a Nelson.

MARCOS
Aqui estão os documentos pra a reunião com os russos. (a Letícia) Levanta essa cara, não adianta ficar se lamentando por quem não merece. Seja forte.

LETÍCIA
Eu tento, mas não consigo.

Marcos a abraça.

MARCOS
Fica assim não. Logo você vai superar a morte dele. Afinal, nosso casamento será em breve. Precisamos nos preparar…

LETÍCIA
Pra atender aos caprichos da sua mãe. Marcos, não estou com cabeça pra pensar nisso agora. Me desculpa. Vou deixá-los a sós. Dar uma volta e arejar as ideias. A gente se fala.

Ela dá um selinho no noivo, pega a bolsa e sai.

NELSON
Tenha paciência com ela, Marcos. Isso logo vai passar.

MARCOS
Ela continua defendendo o Mário.

NELSON
Ela só está confusa. Agora, vamos voltar ao trabalho, que ele não pode parar. Senta aqui.

Marcos senta. Nelson lhe mostra papéis de outra pasta. Conversa em FADE.

CENA 04. MANSÃO HELENA. SALA JANTAR. INT. DIA.

Helena e Solange sentadas à mesa do almoço. A segunda não toca na comida. Helena fala sem notá-la assim. Nágila de pé, ao fundo.

HELENA
O casamento do meu filho vai colocar as coisas nos eixos. Letícia trará um novo ar para esta casa e para os negócios. Por isso, quero a festa do século. Com os melhores bifês, as melhores costureiras, os melhores fotógrafos. (vê Solange) Me desculpa, Solange. Estou falando, falando, e sem perceber que você nem tocou na comida. Come alguma coisa.

SOLANGE
Não quero, estou sem fome.

HELENA
Querida, assim você vai ficar fraca.

SOLANGE
Não importa. Acho que vou deitar um pouco. Com licença.

Solange sai.

NÁGILA
Pobrezinha!

CENA 05. MANSÃO IVAN. FRENTE. EXT. NOITE.

Sonoplastia (até a cena 10): Ah, Como Eu Amei! – instrumental. Anoitece. Fachada da mansão.

CENA 06. MANSÃO IVAN. ATELIÊ. INT. NOITE.

Ivan acaba de voltar de viagem. Entra no ateliê e acende a luz. Vai até o autorretrato que fez dias antes. Olha o quadro e se perde nos pensamentos.

CENA 07. MANSÃO IVAN. SALA. INT. DIA. (IMAGINAÇÃO)

Ivan, vestido de branco e com um avental todo sujo de tintas, entra pelo corredor. Vê Mário entrar pela porta, com uma mala. Ivan abre um sorriso enorme. Vai em direção ao filho e lhe enche de beijos e abraços. Alberto assiste de um canto.

IVAN
Filho, você voltou! Senti tanto a sua falta.

MÁRIO
Também estava com saudade, pai. Tem alguma coisa pronta? Estou faminto.

ALBERTO
Não sabíamos que você vinha, Mário. Vou agora mesmo preparar alguma coisa.

IVAN
(a Alberto) Algo especial, como sempre. (a Mário) Enquanto isso, vou te mostrar uma coisa que fiz. Não via a hora de te dar. Vem comigo.

Ivan e Mário saem abraçados.

CENA 08. MANSÃO IVAN. ATELIÊ. INT. DIA. (IMAGINAÇÃO)

Ivan e Mário entram no ateliê. O autorretrato de Ivan está encostado num canto, tampado com um pano.

MÁRIO
O que é, pai? Outro quadro? Não me mata de curiosidade.

IVAN
Outro quadro, não. O quadro. Esse eu fiz com amor de pai. (tira o pano) Pra você me levar aonde você for e sempre se lembrar de mim.

MÁRIO (abraça Ivan)
Nem sei como agradecer pelo quadro. Por ter você como pai.

IVAN
Não agradeça, filho. É de coração, só fiz pra te agradar.

MÁRIO
Me agrada mais você indo junto comigo. Vim aqui justamente pra isso. Pra te tirar desse vazio que você vive.

CENA 09. MANSÃO IVAN. ATELIÊ. INT. NOITE.

Fim da imaginação. Volta a Ivan de luto, olhando para o quadro. Falando para o quadro como se fosse a Mário.

IVAN
Vazio estou vivendo agora, meu filho.

Ivan pega o quadro. Apaga a luz. Sai com a pintura e fecha a porta.

CENA 10. MANSÃO HELENA. SALA JANTAR. INT. NOITE.

Helena, Virgínia, Marcos, Nelson e Letícia jantam. Nágila entra para anunciar uma visita.

NÁGILA
Com licença, dona Helena. É um amigo da Solange.

HELENA
Ah, sim, o Pedro. Ele ligou mais cedo pra ela. Veio dar uma força. Leve-o ao quarto.

NÁGILA
Sim, senhora. E aproveito para levar algo pra ela?

HELENA
Sim, por favor. Quem sabe o Pedro não a faz comer. Não colocou nada na boca desde que voltamos do enterro.

CENA 11. MANSÃO HELENA. QUARTO SOLANGE. INT. NOITE.

Nágila bate à porta. Solange corre para a cama e segue com seu fingimento.

SOLANGE
Entra.

Nágila entra e coloca uma bandeja de comida numa mesinha.

NÁGILA
Trouxe o jantar pra você. E aqui fora está seu amigo Pedro. Posso mandá-lo entrar.

SOLANGE
Por favor, quero vê-lo.

Pedro entra e Nágila sai. Pedro vai à porta; olha para fora e espera Nágila se afastar. Entra novamente. Fecha a porta e senta na cama, perto de Solange.

PEDRO
Pronto, ela já foi.

SOLANGE (muda a expressão)
A jabiraca não ficou enchendo teus ouvidos com o papo chato dela, não?

PEDRO
Quem, Helena? Não, ela está jantando. E você dando seu bote, né, sua naja? Só quero ver te pegarem no pulo.

SOLANGE
Não vão pegar, não. Tudo está como planejado. Fica frio. (sedutora) Ou melhor, fica quente.

Ela acaricia o peito do amante, por fora da camisa. Ela faz cara de safada, ele de prazer.

PEDRO
Não brinca com fogo, senão eu te faço gritar tanto, que aí sim todo mundo descobre a pantera que você é.

SOLANGE
Aqui não. Mas um beijo gostoso, eu topo.

Sonoplastia (até a cena 12): À Francesa – Marina Lima. Eles se deitam, ele por cima de Solange. Beijos ardentes.

CENA 12. SÃO PAULO. EXT. DIA.

Letreiro: “Semanas depois.”

Imagens do trânsito em alguns pontos São Paulo.

CENA 13. MANSÃO HELENA. SALA JANTAR. INT. DIA.

Marcos termina de tomar café da manhã. Solange entra e se senta ao seu lado.

MARCOS
Bom dia, Solange. Dormiu bem?

SOLANGE
Consegui. Até que enfim.

MARCOS
Você continua de luto pelo Mário, não?

SOLANGE
Um pouco. Mas já estou superando, graças a sua mãe… A vocês.

Solange acaricia a mão de Marcos por baixo da mesa. Ele releva, achando que ela está carente.

MARCOS
Sei como tem sido duro. (pausa) Você ainda sente alguma coisa pelo Mário, depois que…

SOLANGE
(corta) Mário já era. (pausa) Sabe, Marcos? Estou até com vergonha de falar. Não deveria, pois acabei de perdê-lo. Mas te acho um cara gente boa, bonito. (finge vergonha) Ai, meu Deus, por que estou falando isso? Você é noivo.

MARCOS
Não fique assim. Pra você eu posso falar. Eu não amo a Letícia.

SOLANGE
E porque está com ela?

MARCOS
Você já deve ter percebido o porquê. Minha mãe.

SOLANGE
Se é por isso, eu podia te ajudar. Convencer sua mãe…

MARCOS (corta)
Muito obrigado de coração, mas não vai adiantar. Dona Helena é irredutível nessas coisas.

SOLANGE
Percebi. (ri)

MARCOS
Olha só! Você sorriu.

SOLANGE
Marcos, é melhor você ir. Sua mãe pode descer e não gostar de nos ver juntos. E desculpa de novo o mau jeito.

MARCOS
Não tem de quê. Me procura sempre que quiser.

Marcos beija a testa da moça e sai. Ela fala sozinha, rindo. Sonoplastia: suspense.

SOLANGE
O peixe caiu mais fácil do que eu pensava no meu anzol.

Ela se serve e toma café da manhã.

CENA 14. MANSÃO IVAN. QUARTO IVAN. INT. DIA.

Ivan de pijama, deitado na cama. Está acordado e deprimido.

Sonoplastia: dramática. Alberto entra e olha o patrão. Senta-se ao lado dele, na cama.

ALBERTO
Doutor Ivan, há dias o senhor está deitado aí. Só sai rápido para o ateliê e volta.

IVAN
Estou sem ânimo, Alberto. Queria estar com meu filho agora. Pensei até em acabar com minha vida, só pra…

ALBERTO
Não diga isso, doutor. De onde estiver, ele precisa do senhor de pé, firme. (pausa) Já sei! Acho que vou preparar aquela lasanha de que o senhor tanto gosta.

IVAN
Quem sabe ela me faz reagir?

ALBERTO
O senhor não resiste ao cheiro e vai direto lá pra baixo, se bem o conheço.

IVAN
É verdade. Está bem. Vai na frente, que num instante eu me arrumo.

Alberto sorri de boca, satisfeito.

CENA 15. MANSÃO HELENA. SALA. INT. DIA.

Raul conversa com Nágila, ambos de pé.

RAUL
A Helena está? Queria dar uma palavrinha com ela.

NÁGILA
Chegou tarde, doutor Raul. Ela acabou de sair.

RAUL
Puxa, que pena. Vou lá na empresa falar…

Solange desce as escadas. Raul olha pra ela e sorri com desejo. Nágila sai em direção á cozinha. Ele se aproxima de Solange.

RAUL
Oi, você é amiga da Virgínia?

SOLANGE
Não. Sou Solange, viúva do Mário.

RAUL
Ah, sim, meu filho comentou comigo. Sou Raul, prazer. (sorri) Você vai sair?

SOLANGE
Sim, vou dar uma volta. Passar na minha casa; encontrar uns amigos lá.

RAUL
Aceita uma carona?

SOLANGE
É… Por que não?

Raul sorridente. CORTE RÁPIDO.

CENA 16. PRÉDIO SOLANGE. FRENTE. CARRO RAUL. EXT. DIA.

Raul e Solange chegam no carro dele. Param em frente ao prédio. Ele tenta seduzi-la com o olhar.

SOLANGE
Muito obrigada pela carona, Raul.

RAUL
Não tem de quê. Estou às suas ordens.

Ambos saem do carro. Ela o beija no rosto e entra pelo portão do prédio.

RAUL (fala sozinho)
Que mulherão!

Ele coça o saco por fora da calça. Entra no carro e pega um jornal que está no porta-joias. Na manchete está escrito “Justiça veta prêmio póstumo a empresário suicida da Bellatex”. Expressão de satisfação.

RAUL
Melhor, impossível. Era só o que me faltava esse salafrário ser homenageado como se fosse um santo.

CENA 17. MANSÃO IVAN. SALA JANTAR. INT. DIA.

Ivan está sentado à mesa, lendo a mesma manchete. Alberto fica preocupado.

ALBERTO
Doutor, não leia isso. Vai machucá-lo ainda mais.

IVAN
Meu filho sendo vítima dessa injustiça. Isso não é certo.

Alberto serve lasanha para Ivan, que põe o jornal sobre a cadeira ao lado.

ALBERTO
Bem cozida, como o senhor gosta.

IVAN
Almoça comigo, Alberto. Senta aí.

Alberto obedece. Serve vinho nas taças. Ivan mastiga devagar, como um leão ao comer a presa. Bebe devagar, como se bebesse o sangue da caça. Instantes de silêncio. Depois, Ivan volta a falar, com expressão séria e decidida.

IVAN
Não posso ficar sem fazer nada, Alberto. Não posso.

ALBERTO
Isso mesmo. Reage, Ivan Rangel.

IVAN
Não vou só reagir. Vou fazer mais. Penso em ficar em São Paulo por uns tempos. Você me ajuda a arrumar as coisas? Deixo você aqui cuidando de tudo.

ALBERTO
Estou muito surpreso agora. O que te fez colocar a cara no mundo?

IVAN
Meu filho, Alberto. Vou limpar o nome dele, custe o que custar. Ninguém destroça meu menino e fica por isso mesmo.

ALBERTO
O senhor está pensando em fazer justiça?

IVAN (entre tristeza e raiva)
Justiça não, Alberto. Mais do que justiça. Eu quero vingança, ouviu bem?

Alberto se assusta. Close no olhar sombrio de Ivan.

IVAN
Vingança!

EFEITO DE FIM DE CAPÍTULO: imagem congela. Sonoplastia: rugido de leão.

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