“SINTOMAS”

CENA 01. RUA. EXT. DIA.

Continuação da cena final do episódio anterior. Júlio olha para Leila com os olhos brilhando, ela está com receio de que Célio pegue os dois conversando.


JÚLIO 
(narrando)

Eu não queria acreditar naquilo que os meus olhos estavam vendo. É ela! A “anja”. A garota com quem eu fiquei em um carnaval anos atrás. Naquele momento a minha vontade era de sair daquele lugar, levá-la para o meu apartamento e enchê-la de perguntas. Por que ela nunca me procurou? Por que ela escondeu que estava grávida? Gabriel é meu filho? Mas a minha missão naquele momento não era essa. Era saber se Gabriel sofria agressão do cara que diz ser pai dele. Então eu precisava manter o foco na frente dela. Apesar de continuar tão linda, quanto no momento em que a conheci.


LEILA

Ele não pode nós aqui.


JÚLIO

Meu carro está estacionado logo ali, se quiser eu posso te dar uma carona. Ou podemos ir para outro lugar.


LEILA

O Gabriel não é seu filho, se é essa a sua dúvida. 


Júlio leva um pequeno choque ao ouvir aquilo, mas mantém seu foco.


JÚLIO

Eu quero saber como o pai dele o trata em casa?


LEILA

Como assim?


JÚLIO

Ele não foi para a aula ontem. O pai dele informou que ele havia queimado as mãos na cozinha. Você pode me explicar como foi isso?


Leila olha para trás novamente, com receio de Célio sair e vê-la conversando com outro homem.


LEILA
 (nervosa)

Célio é o melhor pai que o Gabriel poderia ter. Não se envolva com a nossa família, por favor. Está tudo bem com a gente.


JÚLIO

Você parece que está com medo de que seu marido nos pegue aqui. Ele maltrata você? É isso?


LEILA

Só não nos procure, por favor. Se não terei que tirar o Gabriel do colégio. 


Leila segue seu caminho apressada. Júlio continua parado, por mais que queira segui-la, sabe que aquele não seria um bom momento. 


CORTA PARA


CENA 02. APARTAMENTO DE JÚLIO. SALA. INT. NOITE.


Júlio está sentado no sofá com seu notebook sobre as pernas. Roberto está na poltrona ao lado, organizando alguns papéis.


ROBERTO

Pra mim, esse cara aí já é encrenca. Você acha que devemos denunciar ele?


JÚLIO

Denunciar o que, Roberto? Que provas temos? Que certezas nos temos? Por enquanto só temos suspeitas, mas nada concreto ainda.


ROBERTO

E o que você está pensando em fazer?


JÚLIO

Tenho que pensar. Não posso me aproximar novamente da lanchonete, se não a mãe dele irá tirar o rapaz da escola. 


ROBERTO

O que complicaria a situação.


JÚLIO

Sim. 


ROBERTO

Pelo menos, a mãe dele confirmou que você não é o pai. Um problema do qual você não tem que se preocupar.


JÚLIO

Mesmo assim, eu não acreditei no que ela disse. Ela estava muito nervosa, talvez tenha falado isso só para se livrar de mim.


ROBERTO

Pode, ser. Mudando um pouco de assunto, esse não seria o final de semana que sua filha passaria com você?


JÚLIO

Sim. Ela está no quarto, estudando. 


ROBERTO

Tal pai, tal filha. (ri)


CORTA PARA


CENA 03. APARTAMENTO DE JÚLIO. QUARTO. INT. NOITE.


Lívia (15 anos, parda, cabelos cacheados, usa óculos) sentada na cama com o celular nas mãos. Está trocando mensagem com alguém.


LÍVIA 
(gravando um áudio)

Que bom que você está se recuperando. Espero que você volte logo para a escola.


GABRIEL 
(por áudio, v.o.)

Meu pai quer que eu fique mais uma semana em casa. Até se recuperar por completo.


LÍVIA 
(gravando um áudio)

Uma semana é muito tempo. Isso não vai te prejudicar?


GABRIEL 
(por áudio, v.o.)

Eu dou meu jeito. O ruim mesmo é ficar esses dias em casa, sem conseguir te ver.


LÍVIA 
(gravando um áudio)

Você não pode nem sair para dar na volta na praça?


GABRIEL 
(por áudio, v.o.)

Posso dá meu jeito aqui.


Lívia sorri. 


CORTA PARA


CENA 04. COLÉGIO SÃO RAFAEL. SALA DE AULA. INT. DIA. 


LEGANDA: Alguns dias depois.


Júlio entra e a primeira coisa que chama sua atenção é encontrar Gabriel conversando com alguns amigos. Um sorriso surge em seu rosto, caminha até sua mesa, coloca sua mochila sobre ela e se prepara para iniciar sua aula.


JÚLIO

Bom dia, turma. (a Gabriel) Seja bem-vindo de volta, Gabriel.


GABRIEL

Valeu, professor.

 

JÚLIO

Você perdeu muita coisa, hein. Tem muito o que correr para acompanhar a turma.


GABRIEL

Pode deixar, que não estou tão atrasado assim. Andei vendo algumas coisas que o pessoal me passou. 


JÚLIO

Ótimo! É assim que se fala. 


Júlio retira seu notebook da mochila e o liga. CAM destaca Gabriel conversando com alguns amigos. Em seguida, destaca Júlio observando o garoto.


CORTA PARA


CENA 05. COLÉGIO SÃO RAFAEL. QUADRA. INT. DIA.


Alguns garotos jogando bola na quadra. Roberto na lateral monitorando. Gabriel vai até ele.


GABRIEL

E aí, professor?!


ROBERTO

Opa, Gabriel! Chegou bem na hora, a aula começou agora, ainda dá para te encaixar. Vai lá trocar de roupa e se juntar com o pessoal.


GABRIEL

Vou daqui a pouco. Queria fazer uma pergunta para o senhor.


ROBERTO

Diga.


GABRIEL 

O campeonato, ele tem uma premiação em dinheiro, não tem? 


ROBERTO

Tem, sim. 


GABRIEL

Aquela proposta de participar do time, ainda está de pé?


ROBERTO

Claro que está. Nem precisa dizer mais nada, porque o seu nome eu nunca hesitei em tirar da lista. 


GABRIEL 
(sorri)

Obrigado, professor! (o abraça)


ROBERTO

Não me agradeça, agora vai logo pra quadra, vamos ver se esses dias que você ficou em casa, não te deixaram mole. 


GABRIEL

Vou lá.


Gabriel corre em direção a alguns bancos na lateral. Roberto o observa. Gabriel coloca sua mochila sobre um dos bancos, a abre e retira uma camiseta regata. Ele tira a parte de cima do uniforme. 


Neste momento, Roberto percebe umas marcas rochas na costa do garoto. Gabriel rapidamente veste a camiseta regata, senta-se no banco e troca de calçado. Roberto fica com uma expressão séria no rosto, desvia sua atenção aos garotos correndo.


CORTA PARA


CENA 06. COLÉGIO SÃO RAFAEL. REFEITÓRIO. INT. DIA.


Júlio e Roberto ao lado do bebedouro.


JÚLIO

Você tem certeza que eram hematomas?


ROBERTO

Tenho. E não eram pequenos. Parecia que o garoto havia sido espancado, não sei.


JÚLIO

Talvez seja essa a prova que precisávamos. Se conseguimos fazer com que ele confesse que aquelas manchas foram feitas pelo pai dele.


ROBERTO

Será que ele teria coragem de entregar o pai?


JÚLIO

Só podemos tentar.


CORTA PARA


CENA 07. COLÉGIO SÃO RAFAEL. QUADRA. INT. DIA.


Lívia e Gabriel estão encostados na parede ao fundo da quadra. Ambos estão de mãos dadas.


LÍVIA

Minha mãe vai chegar tarde em casa hoje. Você bem que poderia ir lá pra casa. Eu poderia te ajudar a recuperar o que você atrasou nesses dias.


GABRIEL

Eu não sei se conseguiria estudar estando sozinho com você em seu quarto. (ri, a beija em sequência)


LÍVIA

Quem disse que não dá para fazer as duas coisas? 


GABRIEL

Se eu pudesse, eu iria. Mas a questão é que meu pai…


LÍVIA

Eu sei, dificilmente ele deixaria, não é?!


GABRIEL

Sim. Mas tenho um plano que talvez se enquadre nessa situação.


LÍVIA

O que você está planejando?


GABRIEL 

Eu vou participar do time. Vou ganhar o campeonato e com o dinheiro irei embora daqui.


LÍVIA

Como assim embora?


GABRIEL

Estou de saco cheio de morar naquela casa. Minha mãe não deixa aquele cara por nada. E eu não quero passar minha adolescência inteira naquele lugar. Se minha mãe não tem coragem de sair daquela casa, eu tenho.


LÍVIA

Você deixaria sua mãe com ele?


GABRIEL

Seria por pouco tempo. Só o tempo de melhorar minha vida e busca-la.


LÍVIA

E quanto a gente?


GABRIEL

Eu também voltaria para te buscar. (ri) 


LÍVIA

E você pensa ir pra onde?


GABRIEL

Ainda não decidi. O foco agora é ganhar grana pra isso. 


LÍVIA

E passar de ano, né?!


GABRIEL

Com a sua ajuda, sei que vou conseguir isso também. (os dois riem, se beijam)


CORTA PARA


CENA 08. APARTAMENTO DO JÚLIO. COZINHA. INT. NOITE.


Júlio ao telefone falando com sua ex mulher.


JÚLIO

Claro que não tem problema a Lívia passar essa semana aqui comigo. O Joaquim vai ficar com a vó dele? Sem problema, é que você sabe que aqui cabe muito bem os dois. Mas não quero discutir, você já decidiu, fim da história. Tá, amanhã quando ela sair da escola, trarei direto pra cá. Tudo bem. Boa noite.


Desliga, pega duas cervejas que estava sobre a mesa e vai para sala.


CORTA PARA


CENA 09. APARTAMENTO DO JÚLIO. SALA. INT. NOITE.


Roberto está assistindo jogo. Júlio senta-se no sofá e entrega uma cerveja a ele. 


ROBERTO

A Lívia virá pra cá amanhã?


JÚLIO

Sim, a mãe dela terá que fazer uma viagem de trabalho e ficará três dias fora.


ROBERTO

E o Joaquim?


JÚLIO

Ficará com a vó.


ROBERTO

Tô com saudades daquele moleque, sabia?!


Júlio

Também. Os últimos dias fiquei tão focado no lance com Gabriel que acabei esquecendo dele.


ROBERTO

Esse ao menos você sabe que é seu. 


JÚLIO

Talvez amanhã eu programe alguma coisa em família, não sei.


Júlio foca sua atenção a TV, toma um gole de sua cerveja.


JÚLIO 
(narrando)

A minha vontade nos últimos dias era resolver de uma vez nessa situação do Gabriel. Só que tenho que cuidar dos meus filhos também! Não que Gabriel possa ser meu filho, enfim… vocês entenderam. O caso dele é especial e ponto. E mesmo assim, é complicado ter filhos adolescentes. Lívia mesmo, desde que entrou na adolescência, ela tem se distanciando um pouco de mim. Era adorava os nossos finais de semana, dizia até que queria morar comigo. Mas nos últimos meses ela tem se reservado. Ficado na dela. Eu respeito isso, dou o espaço que ela precisa. Ela sabe que do que precisar, pode contar comigo sempre. O Joaquim, por outro lado, ainda é meu pequeno. Já cheguei até a imaginar como seria se o Gabriel tivesse crescido junto com eles. Será que a minha vida seria diferente? Será que a Lívia e o Joaquim teriam existido se a minha anja tivesse me procurado anos atrás? Será que eu teria conhecido a minha ex? São tantos questionamentos…


CORTA PARA 


CENA 10. COLÉGIO SÃO RAFAEL. QUADRA. INT. DIA.


Lívia e Gabriel encostados na parede da quadra.


LÍVIA

Vou para a casa do meu pai hoje. Minha mãe viajou e volta só no final de semana.


GABRIEL

Você vai passar esses dias na casa dele?


LÍVIA

Vou. Você sendo aluno dele, teria uma ótima desculpa para vir estudar comigo.


GABRIEL

Somos de turmas diferentes, ele nunca iria deixar. E mesmo assim, se ele descobre que estou namorando a filha dele, é bem capaz dele me reprovar.


LÍVIA 
(ri)

Seu bobo, meu pai não faria isso.


GABRIEL

Se tratando de família, um pai é capaz de tudo.


LÍVIA

Mas estou falando, sério. Se você quiser, eu posso conversar com ele. 


Gabriel fica pensativo. Lívia sente uma leve tontura, se apoia no corpo de Gabriel.


GABRIEL 
(preocupado)

Tudo bem, Lívia? Você ficou pálida de repente. Vem vamos sentar ali no banco.


Apoiada em Gabriel, os dois vão para o banco.


GABRIEL 
(preocupado)

O que você está sentindo?


LÍVIA

Só uma tontura. Está passando, já.


GABRIEL

Tem certeza? Não quer que eu chame o seu pai?


LÍVIA

Não, não precisa. Está passando. 


Um enjoo súbito chega, ela se levanta e sai correndo da quadra. Gabriel vai logo atrás dela.


CORTA PARA


CENA 11. COLÉGIO SÃO RAFAEL. SALA DOS PROFESSORES. INT. DIA


Júlio a mesa, arrumando sua mochila para voltar pra aula. Seu celular toca, ao vê quem está ligando, atende imediatamente.


JÚLIO

Alô! 


LÍVIA 
(v.o.)

Será que eu poderia falar com você?


JÚLIO 
(animado)

Claro! Quando?


LÍVIA 
(v.o.)

Hoje à tarde. Vou te mandar a localização. 


JÚLIO

Tudo bem. 


A ligação se encerra, chega uma mensagem em seu celular na sequência. Júlio sorri e sai da sala animado.


CORTA PARA


CENA 12. COLÉGIO SÃO RAFAEL. BANHEIRO FEMININO. INT. DIA

Gabriel está ao lado da porta do banheiro feminino, ansioso.


GABRIEL 
(tom alto)

Lívia, você tá bem? Eu vou entrar.


LÍVIA 
(v.o.)

Estou saindo, Gabriel.


Gabriel anda de um lado para o outro. Momentos depois, Lívia sai do banheiro e se encosta na parede ao lado. Parece fraca.


GABRIEL

Se quiser eu vou chamar seu pai.


LÍVIA

Não precisa, estou bem. Deve ter sido alguma coisa que eu comi. Estou bem agora.


GABRIEL

Você tem certeza?


LÍVIA 

Tenho, sim. Melhor voltarmos para nossas salas.


GABRIEL

Vem, se apoia em mim, eu te ajudo.


LÍVIA 

Eu estou bem, Gabriel. Não precisa se preocupar. 


Se afasta da parede, caminha devagar em direção a sua sala. Gabriel fica ao lado dela, preocupado.


CORTA PARA


CENA 13. CAFETERIA. INT. DIA.


Júlio em uma mesa, ansioso. Pega seu celular algumas vezes, entra no aplicativo de conversa, hesita em mandar alguma mensagem para Leila. Bloqueia a tela do aparelho, olha para entrada e vê Leila se aproximando. Se levanta no mesmo instante.


JÚLIO

Já estava pensando que você não veria.


Os dois sentam-se, Júlio a percebe preocupada.


JÚLIO

Tudo bem? 


LÍVIA

Eu menti pra você! Eu devia ter sido sincera desde o início. 


CLOSE no rosto de Júlio, seus olhos se arregalam em expectativa do que Leila tem para revelar.

FIM DO EPISÓDIO.

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