A brisa marítima batia em seu rosto, o cheiro do mar invadia o barco enquanto a viagem prosseguia calma e vagarosamente movido pelas ondas do oceano. Depois de deixar cada um dos amigos em uma das quatro regiões de Exus, Lucca e os outros tripulantes do Esplendor da Manhã – nome dado ao barco por Milla – rumavam de volta para Nova Tecnus, na tentativa de destronar Az e retomar o controle do reino, enquanto seus amigos lutavam para restaurar o equilíbrio dos quatro reinos das quatro regiões e reunir forças capazes de derrotar Zaon de uma vez por todas.

Enquanto o garoto recolhia e estudava as informações de cada local onde deixara os amigos, Milla, Arthur e Arendhel se esforçavam ao máximo para manter o barco em ordem, concertando avarias, recolhendo provisões e remédios para possíveis ferimentos ou até mesmo venenos, que seriam usados como armas numa possível batalha. 

Eles deveriam estar prontos para todas as possibilidades.

Enquanto estavam no mar, Arthur guiava o barco, as garotas aproveitavam o tempo para brincar e se divertir, além de paquerar o forasteiro em segredo. Lucca notara certos olhares, risinhos e segredinho por parte das duas garotas, mas decidira não ter qualquer tipo de envolvimento com elas, a não ser que fosse estritamente necessário. O sucesso de sua missão era primordial.

A questão que ainda pairava em seu pensamento era o porquê de Az usar seu pai para chegar até ele. Tendo em vista que Lucca nunca havia recusado um desafio dele. Os dois já haviam travado batalhas tanto físicas, mentais e virtuais. Ele já havia ganhado e perdido batalhas contra o garoto, mas nenhuma dela envolvera a vida de ninguém.

Não até aquele momento.

E mesmo estudando todas as possibilidades possíveis, Lucca não conseguia chegar a uma resposta satisfatória. Sua única alternativa era aceitar as peças que o jogo movia e fazer tudo o possível para acertar nas escolhas que ele faria daquele momento em diante.  

– Uma moeda pelos seus pensamentos. – Arendhel estendera uma moeda de ouro para ele sorridente.

– O que?

– No que está pensando? – Ela questionou mais uma vez.

– Em tudo e em nada ao mesmo tempo. – Respondeu ele em um sorriso forçado. – Estou tentando entender o que está acontecendo aqui.

– Às vezes não se preocupar é a melhor saída. – Rebateu ela.

– Eu não consigo esperar que as coisas aconteçam. Sempre tive tudo sob controle, e essa sensação de impotência acaba comigo.

– Entendo…

– Não, nenhum de vocês entende. Meus amigos estão correndo perigo por minha causa, meu pai sumiu, eu acabei descobrindo por tabela que tenho uma irmã e uma mãe que eu pensava estar morta. – Ele disse de uma vez.

– Pelo menos uma boa notícia. – Ela interrompeu.

– Nada disso faz sentido. – Continuou ele. – Eu me sinto impotente, eu o garoto que sempre soube de tudo, que sempre teve uma solução para tudo. Não sei como sair dessa.

– A vida nem sempre é feita de coisas boas. São os autos e baixos que nos fazem quem somos. – Respondeu Arendhel sentando-se ao lado dele. – Viva cada uma das situações, da melhor maneira possível, só assim você vai evoluir e aprender com elas.

– Como eu faço isso?

– Simplesmente pense fora da caixa. – Ela disse beijando-lhe os lábios. 

 

***

 

Arendhel olhou para ele com ternura, acariciou seu rosto antes de se levantar e sair, deixando-o sozinho com seus pensamentos. As palavras dela agora reverberavam em sua mente “Pensar fora da caixa”!  O que aquilo queria dizer realmente.

O garoto tinha um jeito diferente de lidar com as coisas, seu intelecto era superior aos demais garotos da sua idade, ele estava acostumado a pensar fora da caixa, pensar em inúmeras possibilidades e escolher a que tem a melhor porcentagem de chances de dar certo. Tudo friamente calculado.

Agora mesmo com todos os cálculos, todas as projeções tudo estava dando errado, sua vida se tornara um caus, desde que Sam caiu de paraquedas perto dele. O guardião tirou dele tudo o que era certo e o enchera de dúvidas sobre tudo. 

A magia dos homens, o maldito grimório dos anjos, o antes, durante e depois, tudo estava lá, escrito nos mínimos detalhes a medida que as coisas iam acontecendo as páginas em branco eram preenchidas pelos fatos. Aquele era o segredo toda a história estava ali escrita. Se ele quisesse aprender a lidar com tido aquilo ele só teria de estudar.

Foi o que fez desde que recebera o livro das mãos de Samuel, e desde que chegara aquele mundo estranho, ele sabia de todos os fatos, para onde ir e o que fazer, mas nada estava saindo como ele esperava. 

Nada estava dando certo, e essa sensação de impotência estava acabando com ele. 

O caminho de volta era longo e o tempo curto demais, mesmo que o tempo deste mundo fosse diferente do vivido no mundo deles, eles precisavam terminar com isso o mais rápido possível, os dados de monitoramento de Rob, seu robô de estimação chegava a todo tempo, sua cidade estava um caus, Ezius sofria com a exploração desenfreada de recursos, monstros de todos os tipos estavam escravizando os humanos sobreviventes em Nova Tecnus.

Se Lucca estivesse certo, coisa que ele agora duvidava com todas as forças, a chave para acabar com toda aquela loucura estava justamente ali, a arvore da vida, a fonte de todo o poder milenar existente em todo o multiverso. 

– Terra à vista! – Arthur gritou tirando-o de seu devaneio.

– Mantenha o curso Arthur! – O garoto gritou de volta. Vamos desembarcar e seguir viagem a pé. Não podemos ser vistos.

Lucca fechou o livro em suas mãos levantou-se e vislumbrou o oceano, dois feixes de luz despontaram no horizonte, a luz branca vinda do leste significava que Airo estava livre, a verde vinda do oeste dizia que Adam havia cumprido sua missão em Teron.

Pelo menos para eles as coisas iam bem.

Finalmente eles haviam retornado a Nova Tecnus, depois de atracarem em terra firme, arrumarem as provisões e se despedirem das duas garotas Arthur e Lucca seguiram sozinhos pela floresta densa até encontrarem o templo dedicado a Akvo na região assim os dois souberam que estavam indo na direção certa rumo ao castelo. 

O templo, assim como os outros três era dedicado a fera que comandava a região gelada de Akvo, para aqueles que acreditavam ali era um lugar sagrado onde seus visitantes vinham pedir proteção para adentrar no oceano, ou sofreriam consequências severas. Era uma construção minimalista assim como todas as outras, feita de pedras empilhadas e coladas com argila crua. Das paredes vertiam agua límpida e clara que se transformava em um pequeno lago que corria em todas as direções formando riachos  

– É daqui que vem toda a agua doce de Nova Tecnus. – Explicou Arthur ao notar o interesse de Lucca. – O lugar foi construído há muito tempo em cima de uma fonte milenar criada pelo monstro marinho que governava Akvo antes da retomada dos homens.

– Entao se seguirmos o rio chegaremos em poucas horas ao castelo? – ele perguntou conferindo o mapa mais uma vez.

– Sim. – Respondeu Arthur. – Posso saber para que tanta pressa meu rapaz.

Lucca parou por um segundo, se abaixou e bebeu da agua que o templo oferecia. Levantou-se e começou a caminhar na direção que o mapa indicara.

Um tremor sacudiu toda a terra, pássaros saíram voando sem destino, algo errado estava acontecendo.

– O que esta acontecendo? – Perguntou Milla olhando as arvores murchando pouco a pouco a sua frente.

Lucca se abaixou e tocou o solo concentrando-se fechou os olhos, feixes de luzes começaram a surgir diante dele, pontos luminosos se enfraquecendo. Como naquele dia ele podia ver todo o fluxo magico que corria pela terra.

Ele estava se esvaindo aos poucos

– Nós estamos ficando sem tempo. – Disse ele por fim. – Esta terra está morrendo.

 

***

 

Invadir o castelo e toma-lo de volta. Esse era o plano.

O que ninguém havia dito era que ele teria de escalar uma montanha de quase trezentos e cinquenta metros sem nenhum equipamento de segurança, com duas garotas a tira colo, depois subir os muros mais altos de um castelo antigo cheio de guardas armados para então adentrar a fortaleza, vasculhar todos os cômodos a procura de um maluco que sequestrara seu pai.

Libertar Ézius não parecia uma tarefa tão simples agora. Na verdade se ele pudesse escolher, estaria no sofá de casa assistindo a uma maratona de series antigas das quais ele e o pai adoravam, com uma vasilha gigantesca de pipoca e refrigerante.

Nenhum deles teve tempo para descansar depois daquela subida. Aredhel os guiou até a entrada por onde ela havia saído, a alguns dias atrás revelando a ele um ponto cego entre as torres de observação do castelo. Uma saída de esgoto nos fundos do castelo que dava acesso ao penhasco por onde eles haviam subido.

O ataque dos bestiais deixara um rastro de destruição no ar, corpos em decomposição jaziam inertes em meio àquela paisagem, o odor proveniente da morte era insuportável. A guerra parecia ter acabado, mas algo dizia a todos eles que aquilo era apenas o começo.

Não existia honra em tudo aquilo.

— Eu não fazia ideia do que estava acontecendo aqui. — Disse Milla enquanto forçava o estomago a não colocar sua refeição mais recente para fora.

Era desumano demais ver todos aqueles corpos espalhados cobertos por sangue, homens, mulheres e crianças mutiladas para saciar a vontade de um homem sem honra. 

— Ele vai pagar pelo que me fez passar. — Aredhel disse segurando o choro.

— Para onde princesa?

— O segundo túnel a direita vai dar direto no corredor da sala do trono. Creio que ninguém tenha conseguido entrar lá.

— O que faremos quando chegarmos a sala do trono? 

— Vocês eu não sei, mas eu vou matar aquele desgraçado que acabou com a minha vida.

Como num filme em preto e branco todas as imagens dos mortos na batalha passou diante dela, nenhum deles merecia aquele fim. Pessoas deram suas vidas para que Aredhel Tazardur reassumisse o trono.  E ela não iria decepciona-los.

— Onde está todo mundo? — Milla perguntou de repente.

— Devem estar nas masmorras ou mortos. — Respondeu Aredhel com o semblante triste.

— Vamos liberta-los princesa. Eu prometo. — Lucca parecia resignado em salvar todo mundo.

Eles atravessaram sem nenhum problema os estábulos vazios, o pequeno conjunto de casas que pertencia aos inúmeros criados, a capela destinada as quatro nações antigas tudo estava vazio. Não havia ninguém em parte alguma. Chegaram a entrada de serviço por onde todos os trabalhadores entravam, ela dava acesso a uma saleta pequena que ligava a cozinha e o salão de jantar  

Haviam poucos guardas de plantão naquele momento, o que facilitou muito a vida de Lucca. O garoto retirou de um de seus inúmeros boldos algumas substancias e um frasco fechado.

— Essa é uma poção do sono. Prendam a respiração o máximo que conseguirem, não sei quanto tempo vocês podem ficar desacordadas se inalarem ela. — Disse ele mostrando o liquido de cor avermelhada. — Aredhel onde fica exatamente a sala do trono?

Eles haviam acabado de atravessar a cozinha

— No fim do segundo corredor a esquerda.

— prendam a respiração o máximo que conseguirem. — disse ele atirando o frasco onde os dois guardas estavam.

Uma cortina de fumaça encobriu todo o lugar, fazendo os dois guardas caírem em sono profundo. Os tres correram pelo corredor torcendo para que seu plano desse certo.   

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