“ENTRELAÇOS DO TEMPO”
CENA 01. FLORESTA. TARDE. EXT.
Legenda: Bamberg, Alemanha. Março de 1381.
Domênia (com 10 anos) e Bridget (com 37 anos) andam pela floresta. Cada uma carrega consigo uma pequena cesta com algumas ervas dentro. A garotinha caminha logo atrás, atenta ao que sua tutora está falando.
BRIDGET
O tempo e o espaço eles andam juntos, menina. Em sintonia. Assim como o dia e a noite. O sol e a lua. A vida e a morte. Ambos estão interligados por uma força invisível. Força qual chamamos de magia.
Enquanto colhe algumas ervas, Bridget repara o jeito curioso que a garota a observa.
BRIDGET
As pessoas acreditam que tudo tem um começo e um fim. (se agacha) Tudo nasce… (puxa uma margarida) …e morre.
A flor murcha assim que é puxada. Bridget se levanta, vira-se para Domênia e aponta para o lado. As duas veem uma Gérbera nascendo e desabrochando.
BRIDGET
Eu já penso o contrário. Tudo que nasce, morre… (pausa) …e renasce novamente. Em um ciclo infinito de novas possibilidades, novos mundos e novas formas.
DOMÊNIA
Quer dizer que quando eu morrer, eu vou nascer como uma flor?
BRIDGET
Não, menina. (ri) Somos diferentes das flores. (se agacha em frente a garota) Você ainda é pequena para entender, mas daqui um tempo, isso que estou te contando fará todo o sentido. (sorri)
Bridget se levanta, volta a colher algumas plantas. Domênia a observa, ao mesmo tempo que a admira. Uma mulher de aparentemente 35 anos, corre em meio às árvores.
MULHER (grita)
Bridget! Bridget! Bridget!
Bridget para de andar, tem um mal pressentimento. A mulher se aproxima delas, cansada.
MULHER (ofegante)
A Igreja. A Igreja descobriu tudo.
Bridget imediatamente deixa a cesta de ervas cair no chão. Domênia olha para sua tutora e pela primeira vez a percebe assustada.
MULHER
Eles estão indo em direção a sua biblioteca!
BRIDGET
Desgraçados!
Rapidamente pega no braço de Domênia.
BRIDGET
Eu sei muito bem o que eles querem. Mas não vou deixar que ponham a mão no cubo.
Corre, puxando o braço da garota na direção contrária de onde veio a mulher.
MULHER (tom alto)
Eu vou avisar as outras irmãs!
Corre na direção Leste da floresta.
CORTA PARA
CENA 02. BIBLIOTECA DE BRIDGET. TARDE. INT.
Bridget entra em uma ampla sala circular. Várias prateleiras repletas de livros, itens mágicos e frascos preenchidos parcialmente com líquidos coloridos. Solta a mão de Domênia no centro da sala e caminha apressada até um pequeno altar ao fundo do ambiente. Domênia nunca viu Bridget daquele jeito e isso a deixa nervosa.
DOMÊNIA
O que está acontecendo senhora? Onde estamos?
BRIDGET
Esta é a minha biblioteca, menina. É aqui onde eu guardei os mais diversos conhecimentos sobre magia e ciência.
Domênia olha brevemente a sala. Direciona sua atenção para Bridget.
DOMÊNIA
A Igreja descobriu este lugar?
BRIDGET
Descobriu. Mas eu sei o que eles querem.
Puxa uma gaveta da mesa a sua frente. Retira dela uma pequena caixa de madeira.
BRIDGET
Eu não vou deixar que eles ponham a mão nisso.
DOMÊNIA (curiosa)
O que tem na caixinha, senhora?
BRIDGET
Talvez o item mágico mais poderoso que existe neste universo. Eu ainda não tive tempo pra estudá-lo por completo.
Desce do altar, caminha com a caixinha de madeira na palma da mão. Observa a caixinha como se segurasse algo extremamente valioso
BRIDGET
Há muitos mistérios que ainda rodeiam este objeto. Pensei que fosse encontrar todas as respostas aqui neste lugar, mas fui descoberta antes do tempo.
DOMÊNIA
Posso ver?
Bridget sorri, entrega a caixinha nas mãos de Domênia. A garotinha fica com os olhos arregalados, curiosa para ver o que tem dentro da caixa. Bridget a abre, revelando em seu interior um cubo colorido, com uma esfera azul no centro. A esfera não brilha.
DOMÊNIA
Que lindo!
BRIDGET
Eu sei, menina. Antes de fugirmos, preciso pegar mais algumas coisas.
Se afasta de Domênia, caminha até algumas prateleiras e pega alguns livros velhos. Os coloca dentro de uma bolsa de couro.
DOMÊNIA
Como este objeto funciona, senhora?
BRIDGET
Ainda não descobri. A esfera no interior deveria brilhar, mas todos os feitiços que eu usei, não funcionaram. É como se a pedra dentro do objeto estivesse adormecida. Esperando o momento certo para despertar.
Pega a caixinha das mãos de Domênia e a coloca dentro da bolsa de couro.
BRIDGET
Precisamos ir agora, menina. Logo a Igreja e seus cães estarão aqui.
Segura no braço da garota e a puxa até a saída. Antes de ir, olha para a biblioteca e pronúncia.
BRIDGET
Ignis Nunc!
Tudo imediatamente pega fogo. Sai apressada do local, puxando o braço de Domênia. As chamas rapidamente consomem a biblioteca.
CORTA PARA
CENA 03. BECO. TARDE. EXT.
Bridget anda calmamente em um beco sujo e estreito. Domênia está logo atrás, a passos leves.
BRIDGET
Preciso ver minha irmã. Por favor, fique com a bolsa, enquanto me despeço dela. Me espere aqui, está bem?
Domênia acena que sim com a cabeça, recebe a bolsa de Bridget.
BRIDGET
Volto logo.
Sai do beco calmamente e de cabeça baixa. Coloca seus longos cabelos ao redor de seu rosto. Domênia corre em direção a alguns barris, se esconde atrás deles.
DOMÊNIA (preocupada)
Volte logo, senhora!
Abraça a bolsa que recebeu de Bridget, em forma de proteção.
CORTA PARA
CENA 04. RUA. TARDE. EXT.
A rua está vazia. Bridget estranha, mas acredita que todas as pessoas estejam na praça da cidade para o espetáculo de queimar bruxas.
Verifica frequentemente se não está sendo seguida. Se esconde em um determinado ponto. Olha para ambos os lados e atravessa a rua. Observa mais uma vez se não há ninguém seguindo-a, entra direto na casa a sua frente.
CORTA PARA
CENA 05. BECO. TARDE. EXT.
Domênia continua agachada atrás de alguns barris. Está abraçada com a bolsa de Bridget. A demora de sua tutora começa a deixá-la preocupada. Se levanta brevemente, quando ouve passos vindo em sua direção. Volta a se agachar e tenta se esconder de quem está vindo.
Duas crianças, um menino e uma menina, de aproximadamente 10 anos, correm pelo beco em direção à rua. Passam por Domênia, mas não a veem. Domênia escuta parte da conversa.
MENINO
Pegaram a bruxa. Estão a levando pra fogueira agora.
MENINA
Vamos. Quero ver ela queimar.
Ao saírem do beco, Domênia se levanta e observa na direção que as crianças foram. Seu coração se aperta ao imaginar que a bruxa que elas falavam, pudesse ser Bridget. Sem pensar duas vezes, corre em direção às crianças.
CORTA PARA
CENA 06. PRAÇA. TARDE. EXT.
Uma multidão aglomerada em volta de uma fogueira montada no centro da praça da cidade. Homens, mulheres e crianças, gritam de euforia no momento que Bridget é amarrada em um tronco. Outras duas mulheres estão amarradas logo atrás. Após a saída dos guardas, crianças jogam tomates nas mulheres. Dois acabam acertando o braço e a perna de Bridget.
Domênia chega até a praça, mas se mantém distante da população. Esconde-se atrás de uma barraquinha de madeira. Consegue ver perfeitamente Bridget amarrada. Seu rosto se entristece.
DOMÊNIA
Senhora! (começa a chorar) Não, por favor não!
Bridget mantém um ar de superioridade mesmo se encontrando na atual situação. Olha para os rostos daquelas pessoas à sua frente, como se quisesse guardar na memória cada feição de felicidades deles. Ao olhar um pouco mais adiante, percebe uma garotinha escondida.
Domênia se levanta ao ver Bridget olhando em sua direção, acena. Uma expressão de preocupação surge no rosto de Bridget.
O padre (42 anos, estatura média, calvo) está na lateral da praça, junto com o rei e alguns soldados. Percebe a mudança súbita no rosto da bruxa. Olha na mesma direção que ela e vê a garotinha acenando.
PADRE
A garota!
Bridget percebe que Domênia foi descoberta.
BRIDGET (grita)
Corre, menina! Corre!!!
PADRE (aos guardas)
Peguem aquela garota. Ela é pupila da bruxa.
Cinco guardas correm em direção à Domênia. Ao vê-los vindo em sua direção, imediatamente a garota corre desesperada e entra no primeiro beco que aparece.
CORTA PARA
CENA 07. FLORESTA. TARDE. EXT.
Domênia vem correndo o mais rápido que pode. Ao ouvir alguns cavalos se aproximando, procura um lugar para se esconder. Encontra uma árvore bem robusta, corre até ela. Se agacha, se esconde e espera os guardas passarem. Ao perceber que foram embora, ela se levanta e corre na direção oposta à deles.
CORTA PARA
CENA 08. MONTANHA. NOITE. EXT.
Domênia continua correndo. Está cansada, mas ainda tem medo de estar sendo seguida por alguém. Acredita que naquele momento sua tutora já tenha sido queimada na fogueira. Corre até chegar em uma lápide. CAM destaca o nome talhado nela: “LISA MARTINS”. Domênia senta-se em frente a lápide, coloca a bolsa de couro ao lado. Chora ao lembrar de sua tutora.
DOMÊNIA
Estou sozinha de novo. (observa a lápide) Primeiro você. Agora minha tutora. (baixa a cabeça) Porque não posso ter ninguém comigo? Porque todos me abandonam?
Sons de gravetos quebrando são ouvidos atrás de uma moita. Domênia se levanta rapidamente, olha para trás assustada. Deixa a bolsa no chão.
DOMÊNIA (tom alto)
Quem está aí?
Olha atentamente para todos os lados. Não ver nada, tudo se mantém num profundo silêncio.
DOMÊNIA (tom alto)
Quem está aí?!
Se afasta da lápide, indo em direção a moita. Tudo continua em silêncio. Vira-se para a lápide e a bolsa de couro havia sumido. No lugar, o cubo com a esfera branca brilhando.
DOMÊNIA
O que?
Retorna rapidamente a lápide, se agacha. Observa o cubo brilhando a sua frente. O brilho parece hipnotizá-la. Leva calmamente sua mão até o objeto, o segura e o aproxima de seu rosto. Imediatamente uma luz branca e intensa preenche completamente o local. Ao retornar ao normal, Domênia havia desaparecido. CAM destaca mais uma vez a lápide.
CORTA PARA
CENA 09. LIXÃO. NOITE. EXT.
Legenda: Rio de Janeiro, Brasil. Abril de 1912.
Domênia cai em cima de alguns ferros velho. Bate forte a cabeça e fica desacordada. A sombra de um homem preenche parte de seu corpo. O homem vê o cubo brilhando na mão da garota. Caminha até ela, pega o objeto e vai embora na sequência.
CORTA PARA
CENA 10. AVENIDA. TARDE. EXT.
Legenda: Maringá, Brasil. Agosto de 2021.
Assustado, Cardoso corre até a calçada, tropeça, cai no chão e derruba o cubo um pouco adiante. Carlos e Marlon correm para ajudá-lo.
CARLOS
Você está bem, amigo? (o ajuda a se levantar) Se machucou?
MARLON
Cara, o que você estava fazendo no meio da avenida? Quer ser atropelado, é?
Cardoso reconhece Carlos, imediatamente o abraça.
CARDOSO
Que bom que encontrei você. Eu não sei o que aconteceu. Eu estava no seu quarto e de repente vim parar nesse lugar. (se lembra do cubo) O cubo.
Procura o objeto pelo chão. Carlos e Marlon se entreolham, sem entender o que está acontecendo. Após uma breve busca, encontra o cubo a poucos passos dele.
CARDOSO
Ali. (pega o objeto) Achei.
Volta para perto de Carlos e oferece o cubo para ele.
CARDOSO
Toma. Esse objeto é seu.
CARLOS
Isso não é meu não.
CARDOSO
É claro que é seu, Carlos. Estava no seu quarto.
Repara longos prédios ao redor, acha tudo fascinante. Assim como os veículos.
CARDOSO
Que tipo de veículos são esses?
MARLON
Você conhece esse maluco?
CARLOS
Eu não.
MARLON
Mas ele disse o seu o nome.
CARDOSO
Onde estamos?
CARLOS
Maringá!
CARDOSO
Maringá? Onde fica isso.
MARLON
Acho melhor deixarmos esse doido aí.
Puxa Carlos e se afastam. Cardoso o segue.
CARDOSO
Ei, seu cubo. Você não vai pegar?
CARLOS
Isso não é meu, amigo. Acho que você se confundiu.
CARDOSO
Você não se lembra de mim? Sou eu, o Cardoso. O cara que te levou até a pensão da minha tia.
MARLON
Tô dizendo que esse aí é maluco.
CARDOSO
Eu o ajudei quando estava precisando. Você vai me abandonar agora?
Carlos para de andar. O observa atentamente.
CARLOS
Eu realmente não te conheço. Tem certeza de que você não está me confundindo com alguém?
CARDOSO
Tenho. (se aproxima) Você é o Carlos Martins, não é? Pois bem, eu sou o Cardoso Martins. Temos o mesmo sobrenome.
MARLON
Que novidade. Quantas pessoas por aí, não tem o sobrenome igual.
CARDOSO
Eu encontrei esse cubo em seu quarto. (coloca na mão dele) Ele é seu.
Carlos observa o cubo. A esfera branca aumenta o brilho na mão dele.
MARLON (se aproxima)
Que objeto estranho é esse mesmo?
CARDOSO
Deve ser mágico. Eu acho. Já que me trouxe até aqui.
Volta a prestar atenção na cidade. Repara a vestimenta das pessoas.
MARLON
Será que essa esfera é diamante?
CARLOS (a Cardoso)
É… Cardoso, esse é o seu nome, certo? Desculpa, mas isso não é meu. Sinto muito. (coloca nas mãos dele)
CARDOSO
Se não é seu, então me ajude a encontrar o dono?
CARLOS
Eu bem que adoraria, mas estou indo pra casa agora. Acabei de sair do trabalho, preciso de um banho.
CARDOSO
Eu posso ir com você? Eu não conheço ninguém aqui. Nem sei onde exatamente é aqui. (fica um curto silêncio entre eles) Assim você pode aproveitar e me apresentar para a sua esposa e para a Lisa, sua filha.
CARLOS (confuso)
A gente se conhece?
CARDOSO
Se eu for com você, posso contar tudo no caminho.
Carlos fica sem saber o que fazer. Porém, algo em seu interior decide acreditar no rapaz.
CARDOSO
Então? Será que você pode me ajudar?
Carlos olha para Marlon, que dá de ombros.
MARLON
Não olhe pra mim. O maluco conhece você, não eu.
CORTA PARA
CENA 11. CASA DE CARLOS. SALA. NOITE. INT.
Carlos chega em casa, com Cardoso logo atrás. Ele parece maravilhado com o novo mundo.
CARDOSO
Quer dizer então que eu estou em 2021?
Carlos confirma que sim com a cabeça.
CARDOSO (pasmo)
Uau. Como isso é possível?
CARLOS
Eu que deveria saber?
Caminha até o sofá, Lisa entra na sala.
LISA
Hoje decidiu pegar o caminho mais longe, hein pai. (repara em Cardoso, se encanta por ele) Oi!
CARDOSO
Oi! Essa é a sua filha, Carlos?
CARLOS
Sim. (caminha até ela) Lisa, esse é o Cardoso. Um amigo que acabei de conhecer.
LISA (o cumprimenta)
Prazer. (sorri)
CARDOSO
Sua filha é muito linda.
LISA
Obrigada. Você também é bonito.
Cardoso se envergonha. Carlos nota o jeito estranho de sua filha. Domênia (com 50 anos) chega em casa e a primeira coisa que vê, é o cubo nas mãos de Cardoso.
DOMÊNIA (surpresa)
O cubo! Ele voltou!
CARLOS (estranha)
Você sabe que objeto é esse, Domênia?
Domênia olha para o marido, em seguida para Cardoso. Fica sem saber o que responder.
CORTA PARA
CENA 12. CASA DE AURORA. COZINHA. TARDE. INT.
Legenda: São Paulo, Brasil. Abril de 1986.
Domênia e Carlos estão sozinhos na cozinha. Carlos devora um pedaço de bolo, enquanto Domênia o observa.
DOMÊNIA (curiosa)
Então sua mãe nunca ensinou a você línguas estranhas? Ou a pronunciar palavras em latim? Algo do tipo?
Carlos para de comer por um momento. Lança um olhar de estranheza para as perguntas de Domênia.
CARLOS
Não. Minha mãe é professora de literatura, mas não passa essas coisas não. (volta a comer)
DOMÊNIA
Se ela é professora, é porque ela deve se lembrar de algumas coisas. Acho que eu só preciso fazê-la recuperar a memória. (tom baixo) Se eu tivesse meus poderes, poderia ajudá-la.
CARLOS (ri)
Você é engraçada, sabia?!
Domênia fica envergonhada com o comentário, desvia sua atenção para outro lugar.
CARLOS
Desculpa. É que nunca encontrei uma garota assim como você. (ri) Uma garota que conversa sozinha. (recebe um soco no ombro)
DOMÊNIA
E sua mãe devia ter lhe educado melhor. Ainda bem que eu a encontrei e vou ajudá-la com você.
CARLOS
Aí! (massageia o ombro) Isso doeu. E para sua informação eu estou bem grandinho, tá bem? Não preciso de nenhuma babá. Veja só, está até crescendo barba em mim. (aproxima o queixo)
DOMÊNIA
Não vejo nada.
Paulina entra na cozinha, encontra os dois se enturmando.
PAULIINA
Estou vendo que vocês estão se dando bem.
DOMÊNIA
Estou pronta para os seus ensinamentos, senhora.
Salta da cadeira, fica de frente para Paulina. É nítido a sua empolgação.
PAULINA
Escuta, Domênia. Antes de mais nada, não precisa ficar me chamando de senhora, está bem?! Pode me chamar de você. E outra coisa, seus pais devem estar preocupados. Então se você puder me passar algum telefone, para que eu possa ligar pra eles e dizer que você está aqui…
DOMÊNIA
Eu não tenho pais.
PAULINA
Como assim? Eles morreram, é isso?
DOMÊNIA
Minha mãe sim. Ela morreu quando eu tinha 05 anos. Não tenho muitas lembranças dela. Meu pai, eu nunca o conheci.
PAULINA
Você não tem nenhum parente ao qual posso ligar?
DOMÊNIA
Eu não tenho ninguém.
Paulina e Carlos se entreolham, sentem pena dela.
CORTA PARA
CENA 13. PENSÃO DAS FLORES. RECEPÇÃO. NOITE. INT.
Legenda: Montes Claros, Brasil. Agosto de 1947.
Carlos desce as escadas apressado e nervoso.
CARLOS
Dona Flores, por favor, me diz que foi a senhora que entrou no meu quarto, colocou uma muda de roupa em cima da cama e pegou um cubo deste tamanho, que estava em cima do criado mudo?!
FLORES
Eu não sei o que está falando, querido. O Cardoso não está com você? Ele que trouxe a muda de roupa.
CARLOS
O Cardoso veio aqui?
FLORES
Sim. Ele trouxe uma muda de roupa do pai dele pra você. Falei que você estava no quarto e ele subiu. Você não o viu?
CARLOS
Não. (pensativo) Espera… se o Cardoso entrou no meu quarto e se foi ele que colocou a muda de roupa na minha cama, então deve ter sido ele que pegou o cubo. (preocupado) Essa não!
CORTA PARA
CENA 14. CASA DE CARLOS. SALA. NOITE. INT.
Legenda: Maringá, Brasil. Agosto de 2021.
Domênia continua sem reação. Caminha até o marido, tenta ignorar o cubo na mão de Cardoso.
DOMÊNIA
Claro que não. (tenta mudar de assunto) Mas, quem é esse rapaz? É amigo seu, filha?
LISA
Não. Ele é amigo do papai.
CARLOS
Eu o conheci não tem muito tempo na rua. (no ouvido dela) Ele disse que me conhece e que veio de 1947.
Domênia fica boquiaberta. Tenta manter a calma em frente ao marido.
DOMÊNIA (a Cardoso)
E você veio parar aqui como?
CARDOSO
Esse cubo. De alguma forma eu o girei algumas vezes e vim parar aqui, em 2021. Maluco isso, não é?!
Lisa olha para seus pais, achando o visitante maluco.
LISA
Acho que o seu amigo aí, não deve bater muito bem não, pai.
DOMÊNIA
Você quer jantar com a gente?
Carlos e Lisa olham para Domênia, surpresos com o convite.
CARDOSO
Se não for incomodar?
DOMÊNIA
Que é isso. Será incomodo algum. Eu vou pra cozinha, ver o que posso fazer. Você me acompanha, filha?
LISA
Claro.
Domênia e Lisa vão para a cozinha. Cardoso e Carlos caminham até o sofá.
CORTA PARA
CENA 15. LIXÃO. DIA. EXT.
Legenda: Rio de Janeiro, Brasil. Abril de 1912 d. c.
Domênia desperta sentindo o calor dos ferros abaixo dela. Se levanta rapidamente, pula no chão. Esfrega os olhos e se lembra do aconteceu. Se assusta ao ver onde está, olha para o lado e não vê o cubo.
DOMÊNIA (assustada)
Essa não! Essa não, essa não, essa não! O cubo? Eu o perdi!
Caminha desesperada à procura do objeto.
DOMÊNIA
Não, não, não. (se desespera) Isso não pode está acontecendo.
CORTA PARA
CENA 16. CASA DE CARLOS. SALA. NOITE. INT.
Legenda: Maringá, Brasil. Agosto de 2021.
Domênia entra na sala e encontra Carlos e Cardoso conversando.
DOMÊNIA
Espero não ter demorado muito.
CARLOS
Até que não, amor.
Carlos e Cardoso se levantam, caminham até Domênia. Cardoso deixa o cubo sobre o sofá. Disfarçadamente, Domênia olha para o objeto.
CARLOS
Se vocês não se importam, vou só trocar de roupa e logo acompanho vocês.
DOMÊNIA
Tudo bem, a gente espera.
Domênia guia Cardoso em direção a cozinha, Carlos vai em direção ao quarto. Momentos depois, Domênia retorna para a sala, caminha até o sofá, pega o cubo e sai de casa.
CORTA PARA
CENA 17. CASA DE AURORA. QUARTO DE CARLOS. TARDE. INT.
Legenda: São Paulo, Brasil. Março de 1981.
Carlos (com 10 anos), brinca em seu quarto com alguns carrinhos sozinho. Uma luz intensa invade todo o cômodo. O garoto fecha os olhos, em proteção ao brilho. Ao voltar ao normal, o cubo com a esfera branca está à sua frente. Ao abrir os olhos, vê o objeto em meio aos seus pés. Deixa o carrinho de lado e o pega. Seus olhos ficam fascinados pelo brilho da esfera. Uma luz intensa preenche todo o cômodo novamente. Ao retornar ao normal, o garoto e o cubo sumiram.
CORTA PARA
CENA 18. LIXÃO. DIA. EXT.
Legenda: Rio de Janeiro, Brasil. Abril de 1912.
Domênia anda pelo lixão, desesperada. Chora por ter perdido o cubo. Ela está com fome e suja por ter procurado em meio a tanto lixo. Um brilho intenso aparece não tão distante dali. Ela corre em direção a luz e encontra Carlos com o cubo na mão. O garoto olha para os lados, não entende o que está acontecendo.
DOMÊNIA (furiosa)
Esse cubo é meu, seu ladrão.
Toma o cubo da mão dele. Fica aliviada por ter recuperado. Verifica se não está quebrado.
DOMÊNIA
Parece que está normal.
Carlos não sabe quem é a garota. Não sabe onde está. Está com medo e a única coisa que ele quer é…
CARLOS (chorando)
Eu quero a minha mãe!
FIM DO EPISÓDIO.