“LIGADOS PELO TEMPO”

CENA 01. PENSÃO DAS FLORES. RECEPÇÃO. NOITE. INT.


Legenda: Montes Claros, Brasil. Agosto de 1947.


Carlos anda de um lado para o outro, nervoso.


CARLOS

Essa não. Essa não. Essa não. 


FLORES (preocupada)

Aconteceu alguma coisa, querido?


Carlos caminha apressado em direção a escada, ignora a pergunta de dona Flores. Uma mulher entra na pensão. Ao vê-la entrar, Dona Flores sorri. O rosto da mulher não é revelado, sendo mostrado apenas suas costas.


FLORES (sorri)

Que bom vê-la por aqui, querida!


CORTA PARA


CENA 02. PENSÃO DAS FLORES. QUARTO. NOITE. INT.


Carlos entra desesperado em seu quarto. Anda de um lado para o outro.


CARLOS

Ele não pode ter usado o cubo. Se ele fez isso, para onde será que ele foi? Será que… será que é por isso que ele sumiu? Será que é por isso que minha avó nunca mais o viu? 


Alguém bate na porta. Carlos a abre e se surpreende com a pessoa do outro lado.


CARLOS 

Domênia!


DOMÊNIA

Olá, Carlos! Será que podemos conversar?


CORTA PARA


CENA 03. CASA DE CARLOS. SALA. NOITE. INT.


Legenda: Maringá, Brasil. Agosto de 2021.

 

Domênia chega em casa, nervosa. Carlos vem do quarto em direção a sala e encontra a esposa próxima a porta.


CARLOS

Vai sair, amor?


DOMÊNIA

Não. (se afasta da porta) Na verdade, alguém bateu e vim atender. 


CARLOS

Quem era?


DOMÊNIA

Engano. (segura a mão dele, sorri) Vamos? Não podemos deixar o convidado esperando.


CARLOS

Um convidado bem maluco. Ainda não entendi por que você o convidou para jantar com a gente?


DOMÊNIA

Ele disse que era seu amigo, achei que não teria problema algum.


CARLOS

Eu acabei de encontrar o maluco na rua. Como ele pode ser meu amigo?


DOMÊNIA

Eu o achei simpático, está bem. E vamos mudar de assunto, para não o deixar desconfortável. 


Ambos vão para a cozinha. Carlos não se lembra do cubo, que havia deixado na sala. 


CORTA PARA


CENA 04. LIXÃO. DIA. EXT.


Legenda: Rio de Janeiro, Brasil. Abril de 1912 d. c.


Carlos continua chorando. Domênia o observa, sem entender o desespero do garoto.


DOMÊNIA (furiosa)

Cadê a caixinha que estava com ele? Anda, eu a quero de volta.


Carlos não para de chorar. Irritada, Domênia vai até ele, o segura pela camisa.


DOMÊNIA

Quer parar de chorar, garoto. Anda, me devolve a caixinha. Onde ela está?


CARLOS (chora)

Eu quero a minha mãe! 


DOMÊNIA

E eu lá sei onde está sua mãe. (o solta) Mães não estão nem aí pros filhos. Elas só servem para nos abandonar.


Carlos continua chorando. Domênia se afasta, irritada.


DOMÊNIA

Deixa. Eu procuro sozinha. Ela deve estar por aqui. 


Olha para o cubo na sua mão, nota algo diferente nele.


DOMÊNIA

Espera… Esse cubo não é o meu. (olha para Carlos) O meu tem uma esfera azul. Onde você conseguiu esse cubo, garoto?


Carlos não dava a mínima para o que ela falava, continuava chorando pedindo a sua mãe.


CORTA PARA


CENA 05. PENSÃO DAS FLORES. QUARTO. NOITE. INT.


Legenda: Montes Claros, Brasil. Agosto de 1947.


Domênia entra no quarto, caminha até a cama. Carlos continua parado na porta, boquiaberto por ver sua esposa ali.


CARLOS

Domênia? Como você veio parar aqui? (fecha a porta)


DOMÊNIA

Eu sou a Domênia, mas não a Domênia que você conhece.


CARLOS (confuso)

Como assim? 


DOMÊNIA

Temos que conversar. Mas não aqui. Podemos ser ouvidos por minha irmã. 


CARLOS (confuso)

Sua irmã?


Domênia vira para o lado, estende a mão e diz algumas palavras em latim. Um círculo brilhante surge à sua frente. Carlos não acredita no que vê.


CARLOS (surpreso)

Como você fez isso?


DOMÊNIA

Venha comigo, por favor. (entra no círculo)


Carlos fica parado, perplexo com aquilo acontecendo a sua frente. Observar sua esposa sumido daquela maneira, o deixa paralisado ao lado da porta.


CARLOS

Domênia? Vo… você está aí? (dá alguns passos em direção ao círculo) Domênia?


Ela responde do outro lado.


DOMÊNIA (V.O.)

Venha logo, antes que a Flores entre no quarto!


Carlos fica sem reação ao lado do círculo. Dona Flores bate na porta. A mão de Domênia atravessa o círculo, puxando Carlos para o outro lado. Flores abre a porta do cômodo, no momento que o círculo desaparece. Ela entra, com um sorrisinho e uma bandeja nas mãos.


FLORES

Oi, licença. Trouxe um chá pra vocês. (vê o cômodo vazio) Irmã? Carlos? 


CORTA PARA


CENA 06. CASA DE CARLOS. SALA. NOITE. INT.


Legenda: Maringá, Brasil. Agosto de 2021.


Após o jantar, todos se reúnem na sala. Percebem o sumiço do cubo.


CARDOSO

Eu tenho certeza de que o coloquei aqui! (olha por baixo do sofá) Como ele desapareceu dessa maneira? (fica em pé)


CARLOS

Sim, eu também o vi o colocando aí do lado.


LISA

Será que ele não voltou sozinho pro passado?


CARDOSO (a Carlos)

Seria possível isso?


CARLOS

Eu devo saber? Foi você quem trouxe esse objeto. E mesmo assim, não tem como algo sumir assim sozinho. (repara a esposa quieta) Você não o viu, Domênia?


DOMÊNIA

Eu vi o mesmo que vocês.


CARDOSO

E agora? (senta-se no sofá) Se o cubo foi o que me trouxe aqui, como eu irei voltar para a minha família?


LISA

Você tá falando sério mesmo? 


Caminha até o sofá, senta-se ao lado dele. O encara com uma certa dúvida no olhar.


LISA

Apesar de todas as especulações sobre viagens no tempo, atualmente, a ciência não tem condições para desenvolver um aparelho que seja capaz disso. Então, é bem difícil de acreditar que algo tenha sido desenvolvido no século passado. 


CARDOSO

Vocês precisam acreditar em mim. (a Carlos) Eu sou de 1947. Eu o levei até a pensão de minha tia. Fui deixar umas peças de roupas do meu pai e ao entrar em seu quarto, acabei encontrando o cubo em suas coisas. Eu peguei nele e vim parar aqui.


CARLOS

Isso tá muito história de ficção científica. 


LISA

Eu também acho, papai. Embora, aquele cubo era um pouco estranho, convenhamos. Aquela esfera branca brilhando. Bem futurista. Espera aí… (pensa em algo) Talvez você esteja falando a verdade. 


Todos olham surpresos para Lisa. 


LISA

Talvez o objeto realmente não seja do papai. E sim de outra pessoa, de uma outra época que tenha entregado ao senhor.


CARLOS

Filha, eu nunca vi aquele cubo. Não faz sentido algum o que você está dizendo. 


Carlos senta-se no sofá. Domênia é a única que continua em pé, atenta a explicação da filha.


LISA

Talvez não o senhor de agora. (fica em pé) Mas, suponhamos que em um determinado período no tempo, alguém tenha aparecido para o senhor e tenha entregado o cubo em suas mãos. Daí, por algum motivo o senhor viaja até 1947, encontra esse rapaz lá e ele realmente o tenha levado para a pensão de sua tia. 


CARLOS

E porque eu viajaria pra 1947?


CARDOSO

Quando eu te encontrei, a gente conversou um pouco e você havia me dito que teria parado lá por acidente. 


LISA

Talvez o senhor tenha ido parar lá por engano. Assim como o Cardoso veio pra cá.


CARLOS

Tá, se isso for verdade, quer dizer então que o outro eu, o que conhece você de verdade, está preso em 1947?


LISA

Talvez não. Já que o cubo sumiu, talvez ele tenha voltado pra você. O outro você, no caso.


CARDOSO

E quanto a mim? Como eu vou voltar para a minha época? Eu tenho uma namorada e uma família me esperando. 


Carlos e Lisa se entreolham, não sabem o que dizer quanto a isso. Domênia continua parada ao lado do sofá, observa a filha com um leve sorriso no rosto. Fica feliz ao perceber que Lisa conseguiu chegar a uma conclusão dessa. 


CORTA PARA


CENA 07. CASA DE CARLOS. QUARTO DE HÓSPEDES. NOITE. INT.


Domênia prepara a cama do quarto para Cardoso. Ela pega algumas cobertas velhas e vai em direção a porta.


DOMÊNIA

Vou colocar essas aqui na máquina. Estão cheias de poeira.


CARDOSO

Desculpa pelo o incomodo. Se quiser, posso ajudá-la a lavar amanhã.


DOMÊNIA

Que educado da sua parte. (sorri) Mas não precisa, está bem. (abre a porta, encontra Lisa a sua frente)


LISA

Oi. (entra no quarto) A senhora precisa de alguma coisa?


DOMÊNIA

Eu estou indo levar essas cobertas sujas. Se você quiser fazer um pouco de companhia ao nosso visitante.


LISA

Tá, pode ser.


DOMÊNIA

Licença.


Ela sai do quarto, com um leve sorriso no rosto. Lisa fecha a porta e se aproxima de Cardoso. O percebe cabisbaixo.


LISA

Não fica assim. Nós vamos encontrar uma forma de te levar pra sua época.


CARDOSO

E se não encontrarmos? Já que foi você mesma, que disse que viagens no tempo hoje são praticamente impossíveis.


LISA

É, eu disse. Mas atualmente a ciência vem evoluindo rapidamente. Vai que, quando você acordar amanhã, não teremos a notícia de que viagens no tempo se tornou realidade.


CARDOSO

Pode ser. (senta-se na cama) Fico pensando como está Aurora? Eu disse que iria vê-la hoje à noite, provavelmente deve tá pensado que esqueci dela.


LISA

Você a ama muito?


CARDOSO (sorri)

Muito. Tenho medo de não poder vê-la mais.


Lisa caminha até a cama, senta-se ao lado e segura a mão dele.


LISA

Não se preocupa, está bem? Vamos encontrar uma forma de te mandar pra casa. 


Sorri, Cardoso se sente confortável ao lado dela.


CORTA PARA


CENA 08. CASA DE CARLOS. CORREDOR. NOITE. INT.


Domênia está encostada na porta, ouve tudo o que foi conversado lá dentro. Ela desencosta, caminha em direção a cozinha, com uma expressão feliz no rosto. 


CORTA PARA


CENA 09. CASA DE AURORA. QUARTO. NOITE. INT.


Legenda: Montes Claros, Brasil. Agosto de 1947.

 

Aurora está encostada na cabeceira da cama, com os braços ao redor de sua barriga. Está triste por Cardoso não a ter visitado, ao mesmo tempo, que parece preocupada.


CORTA PARA


CENA 10. LANCHONETE DA AURORA. DIA. INT.


Aurora limpa uma mesa, parece bem disposta. Um cliente entra, ela se anima na expectativa de ser Cardoso. Ao ver que não é, volta a limpar a mesa. A ausência por tanto tempo do namorado, começa a deixá-la preocupada.


CORTA PARA


CENA 11. LIXÃO. DIA. EXT.


Legenda: Rio de Janeiro, Brasil. Abril de 1912.


Carlos parou de chorar, embora ainda esteja triste, querendo sua mãe. Domênia continua ao lado dele, observa o cubo com a esfera branca em suas mãos.


DOMÊNIA

Eu tenho certeza de que a esfera era azul. Como ela pode ter mudado de cor? (a Carlos) Quem te deu esse cubo, garoto?


CARLOS

Eu não sei.


Domênia fica intrigada com a mudança de cor da esfera. O estômago de Carlos ronca. 


CARLOS

Estou com fome! 


DOMÊNIA

É… também estou. Passei o dia procurando esse em meio a tanto lixo e não parei pra comer nada. 


Olha ao redor, só vê lixo. Guarda o cubo em seu vestido. 


DOMÊNIA

Só que aqui não vamos encontrar comida. 


Caminha em busca de uma saída. Carlos, para não ficar sozinho, vai atrás dela.


CARLOS

Me espera!


CORTA PARA


CENA 12. RUA. DIA. EXT.


Carlos e Domênia caminham pela rua à procura de um lugar onde possam comer. Ambos observam o jeito apressado das pessoas, assim como os transportes e vestimentas. 


CARLOS (perdido)

Onde estamos?


DOMÊNIA

Também gostaria de saber. 


Algumas pessoas lançam olhares estranhos em direção à Domênia. Algumas até tentam manter distância da garota, ao passar por ela. Além de sua roupa diferente, ela está bastante suja.


CARLOS

Melhor você tomar um banho. As pessoas estão se afastando de você.


DOMÊNIA (irritada)

Porque não vai você tomar banho. Por que você está me seguindo, garoto? Você não disse que iria procurar a sua mãe? Pois então, vai lá, vai. Vai procurar a sua mamãe e me deixa aqui sozinha.


CARLOS (triste)

Eu não sei onde está minha mãe. 


DOMÊNIA

Me seguindo desse jeito, não tem como você saber mesmo não. 


Passam por uma padaria. Param de andar e ficam admirando os pães quentinhos e cheirosos pela vidraça do local. Domênia entra no ambiente, mas segundos depois é jogada pra fora por um funcionário.


FUNCIONÁRIO

Sai daqui sua morta de fome. Teu cheiro vai espantar os nossos fregueses. (enxota Carlos da entrada) Você também, garoto. Vaza daqui, anda. 


Carlos ajuda Domênia a se levantar. Ela observa o vendedor, com uma expressão de raiva no rosto. Os dois se afastam da padaria.


CARLOS

Eu falei que você precisava de um banho.


DOMÊNIA

Se eu soubesse magia, teria incendiado aquele infeliz ali mesmo.


CARLOS (assustado)

Você o que?!


Domênia não responde, apressa seus passos se afastando de Carlos. Ele a observa, se questiona se deveria ir atrás dela ou não.


CORTA PARA


CENA 13. CASA DE CARLOS. QUARTO DE HÓSPEDES. DIA. INT.


Legenda: Maringá, Brasil. Agosto de 2021.

 

Cardoso está sentado na cama, pensativo. Sente um aperto no peito, ao imaginar que nunca mais verá seus familiares, amigos e Aurora. Lisa bate na porta, entra na sequência.


LISA (feliz)

Oi, bom dia! Espero não ter te acordado?!


CARDOSO

Não, tudo bem. Na verdade, mal consegui dormir direito.


LISA

Percebe-se pela sua cara de sono.


CARDOSO

Dormi pouco. (Lisa senta-se ao lado dele) Mas foi o suficiente para organizar um pouco os últimos acontecimentos.


LISA

Bem, eu estou indo pra faculdade agora. Eu volto no final da tarde. Depois a gente pode pensar numa forma de te mandar de volta pra casa, está bem?! (segura a mão dele, sorri) Vou conversar com um professor meu, creio que ele poderá indicar um caminho pra isso.


CARDOSO

Ele entende de viagens no tempo?


LISA

Ele é muito bom em física, isso ao menos em tenho certeza. (ri)


CARDOSO

Espero que a física possa me ajudar. 


Lisa percebe o quanto ele está pra baixo.


CORTA PARA


CENA 14. SALA CIRCULAR. INT.


Legenda: Em algum lugar do tempo.


Carlos está parado em meio a uma grande sala circular. No teto, há uma pintura representando a origem do universo. De uma ponta, um pequeno círculo branco, seguido por desenhos de galáxias e outros corpos celestes. Da outra ponta, um círculo azul, também seguido por galáxias e outros corpos celestes. No centro, logo abaixo de Carlos, há um desenho de um grande círculo branco que conecta as duas extremidades. 


Domênia caminha em direção a dois altares, logo adiante. Carlos está boquiaberto com aquele local.


CARLOS (surpreso)

Que lugar é esse?


DOMÊNIA

Onde estamos não importa. 


O primeiro altar possui uma mesa branca. O segundo possui uma mesa azul. Acima de cada mesa, um quadro com um desenho de uma coruja e de um cervo, respectivamente. Domênia observa os quadros.


DOMÊNIA

Eu demorei pra entender o porquê vim parar nesse tempo. (vira-se para Carlos) Fiquei anos pensando que havia falhado na minha missão. Mas foi então que eu percebi o que estava acontecendo.


CARLOS (confuso)

O que tudo isso significa, Domênia. Que lugar é esse? O que você está fazendo aqui? Como viemos parar aqui? Será que você pode me explicar alguma coisa?


DOMÊNIA

Não se preocupa. Eu vou explicar tudo a você. (olha para os quadros) Pensei que segurar esse fardo sozinha fosse a escolha certa, mas eu estava errada. Logo eu percebi que desde o início… (a Carlos) …eu deveria ter confiado em você. Por isso, agora eu vou te contar toda a minha história!


FIM DO EPISÓDIO.

A Widcyber está devidamente autorizada pelo autor(a) para publicar este conteúdo. Não copie ou distribua conteúdos originais sem obter os direitos, plágio é crime.

Pesquisa de satisfação: Nos ajude a entender como estamos nos saindo por aqui.

Publicidade

Inscreva-se no WIDCYBER+

O novo canal da Widcyber no Youtube traz conteúdos exclusivos da plataforma em vídeo!

Inscreva-se já, e garanta acesso a nossas promocionais, trailers, aberturas e contos narrados.

Leia mais Histórias

>
Rolar para o topo