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O Circo de Pennywise – Capítulo 2 – A Cidade de Le Dio

O Circo de Pennywise

Capítulo 2

A Cidade de Le Dio

Le Dio é no mínimo curiosa. Suas ruas são vibrantes, bem asfaltadas, com parques verdes e avenidas largas. Creio que seja difícil ver um acidente por essas bandas de cá, mesmo que o motorista suba na calçada e acerte uma das fachadas das lojas. Não consigo imaginar como seria se isso acontecesse. Os moradores ficariam uns dez minutos olhando umas para as outras. O povo me parece despreocupado, sem problemas. Uma comunidade pequena, mas feliz – eu acho.  

A casa da Tia Maitê fica no centro de Le Dio. Tem uma piscina nos fundos e um jardim na frente. Não é tão grande quanto a minha de São Paulo, mas cabe um monte de coisas  dentro dela.

Tio Heitor não disse mais nada sobre o Circo. Deixamos tudo no descampada. Mas desconfio que ficou cabreiro assim como eu. Faço de tudo para acreditar que é minha imaginação trabalhando em 220 volts. Aquilo é estranho,  mas é apenas um circo, Rafa.

Chegamos no final da manhã e Tia Maitê me espera no portão. Ela me dá aquele abraço de urso dos tempos do natal (de quando papai saía para comprar presentes e me levava junto).

_ Como foi a viagem, querido?

_ De boas, Tia.

Ela me beijou de novo. Tio Heitor tatuou um sorriso na cara, mas eu sei que continuava pensando no Circo. Eu já me esqueci dele. Agora só penso em pular na piscina.

_ Sua mãe ligou bem cedinho.

_ Sei. _ entortei a cara para o assunto.

_ Não seja duro com ela, Rafa. É só uma fase difícil, mas vai passar.

Vamos ter mesmo que falar sobre isso?

_ E o seu pai? Tem notícias dele?

Vamos ter que falar sobre o meu pai também?

_ Viajando com a menininha dele.

Tia Maitê olhou para o Tio Heitor. Pensam que sou idiota, que não entendo das coisas. Tenho conhecimento do que tá acontecendo lá em casa e da traição do papai. Que se dane! Não quero falar sobre isso e deveriam me respeitar.

_ O que tem para o almoço, amor? _ Perguntou Tio Heitor mudando o rumo da prosa.

_ Fiz algo especial para Rafa.

_ Oba! _ Corri pelo jardim. _ Cachorro quente!

***

Comi três cachorros quentes com o chá gelado do Maine. Tava gostoso por demais. Depois me sentei na sala para tomar sorvete e assistir um pouco de televisão. Não falamos sobre o circo. Nem pensei em voltar ao assunto. Não sou de me assustar com facilidade, mas a bandeira com a cara do palhaço era, no mínimo, trevosa.

Meu quarto fica no andar de cima. Havia muitos jogos e Legos para montar. Eu gostei de tudo. No entanto, não demoraria para que me matriculasse numa daquelas escolas chatas dos Estados Unidos – e com certeza, me obrigariam a falar o tal do inglês. Só que não vou me preocupar com isso agora. Quero mesmo é tomar um banho de piscina e aproveitar o sol para me bronzear.

Peguei as coisas da mochila e coloquei nos armários. Mamãe disse para trazer pouca coisa, que comprasse roupas quando chegasse ao Maine. Então não trouxe nenhuma sunga, mas um short levinho serviria para nadar na piscina. Peguei alguns brinquedos e fui para lá, a água estava quentinha. Nadei de uma lado para o outro umas três vezes. Havia um menino limpando o banheiro  do outro lado. Era pouca coisa mais velho que eu, porém, menor.

_ Hi! _ cumprimentei com um aceno.

_ Hi!

Percebi que tinha sotaque.

_ Você é do Maine? _ Perguntei em português só para ter certeza.

_ Não. Sou de São Paulo mesmo.

O que um menino do Brasil tava fazendo na casa da Tia Maitê?

_ Você mora por aqui?

_ Trabalhamos para Dona Maria Tereza. Moramos bem ali _ ele apontou para a casa dos fundos..

_ Quem trabalha? _ Perguntei sem entender direito.

_ Eu, minha mãe e minha irmã.

Ele continuava arrumando as coisas do banheiro.

_ Como se chama?

_ Beto.

Pensei logo nas brincadeiras que poderíamos fazer juntos.

_ Eu sou Rafa _ me apresentei sem que ele perguntasse. _ Você estuda, Beto?

_ Claro! _ Ele terminou de guardar as coisas que estavam do lado de fora do banheiro. _ Só que estamos de férias.

_ Sei – cheguei mais perto da borda da piscina. _ Aqui tem Cyber Café?

_ Não.

Beto não era de muita conversa.

_ Quantos anos você tem?

_ Quatorze.

Ele não quis saber minha idade. Dei de ombros.

_ E sua irmã?

_  Dezesseis.

_ Sei _ mordi os lábios porque fiquei curioso. _ Qual é o nome dela?

_ Isadora.

Nadei novamente pela borda da piscina. Beto limpava o chão quando tirei a cabeça da água.

_ Desculpa, eu não quis molhar o chão _ disse quando vi a bagunça que fiz.

_ Não esquenta _ Beto sorriu para mim. _ Não tem como entrar na piscina e não jogar água para fora.

_ Pode crê – sorri também.

Ele continuou limpando e eu nadando. Quando vermelho como um pimentão, puxei conversa de novo.

_ Sua mãe deixa você brincar comigo? _ Perguntei de supetão.

_ Acho que sim.

_ Tenho um monte de Lego para montar.

_ Legal!

A água ficou fria de repente. Comecei a tremer como uma vara de pescar com um peixe na ponta. Uma fumaça descia a rua com alguns malabares dançando dentro dela. Tinham pernas compridas e nariz vermelho (ninguém se equilibra assim numa perna de pau, cara! Ninguém!).

_ O que é aquilo? _ Perguntei para o menino.

_ Eu não sei.

Meu Deus!  A bandeira do palhaço. Era o circo do descampado.

Fiquei tão curioso quanto Beto. Corri com ele para o portão. Comecei a sentir calafrios no couro cabeludo. A cara pintada do equilibrista não era engraçada, assim como de suas dançarinas esqueléticas.

_ Uau! _ Beto saiu para a calçada. _ São tão magras.

Pareciam carrancas de filmes de terror e não artistas de um circo Um carro de som veio logo atrás com suas luzes azuis e um tilintar estridente. Percebi que flutuava na neblina sem nenhum pneu para impulsioná-lo.  

_ Olha aquilo?

Beto sorria para as bailarina. Dei de  ombros.

Pelo visto só eu conseguia ver  o sinistro naquilo. Creio que escutei um sussurro vindo de dentro do esgoto. Comecei a tremer como um boneco de posto de gasolina. O asfalto parecia trepidar, como se algo se mexesse nas entranhas da terra (ai ai ai … há terremotos no Maine?). Uma garota apareceu ao meu lado vestida de preto.

_ Um Circo em Le Dio? Só faltava essa.

Ela franziu a testa quando me viu ao lado de Beto. Tentei segura a tremedeira na frente dela. Só que a danada era bonita; bonita daquele jeito esquisito, saca? Daquele jeito que faz a gente olhar duas vezes para ela e nunca mais querer ver outra coisa. Bem trevoso para um menino tímido como eu.

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