A Maldição de Villeneuve

Temporada 01

Capítulo I – Vida no campo

“Si vous apprenez à aimer quelqu’un, et que cet amour est réciproque, jusqu’à ce que le dernier pétale tombe, le sort est brisé. Sinon, il sera condamné à rester comme la bête qui est, pour toujours.”

Damien

Faz cinco anos desde que nossa vida mudou drasticamente. Desde que nossa mãe adoeceu pela peste e veio a falecer. Foi uma época muito dura para todos nós, principalmente para mim, por ser o filho mais novo. Tivemos que nos mudar para fugir da doença que assolava o país, fomos para um lugar chamado de Villeneuve, uma vila no interior onde tínhamos parentes.

Papai sofreu demais com a perda de mamãe. Apesar de nos amar e se esforçar para cuidar de três filhos, a tristeza o consumiu e, eu sentia, parte dele havia se quebrado por dentro. Aquilo foi a nossa ruína. Antes um rico comerciante, perdemos tudo graças à má administração dele. Dia e noite eu ouvia minhas irmãs o culpando sem piedade, cobrando a ele que continuasse a realizar seus caprichos de damas da alta sociedade que elas não eram mais. Acho que eu fui o único a entender que era impossível para ele se manter de pé, quando ele sentia que não havia mais chão.

Eu tive que amadurecer mais cedo para ajudá-lo, porque se dependesse de minhas irmãs morreríamos de fome. Sentindo-se menos solitário com a minha ajuda, não conseguimos recuperar nossas finanças, mas nos reerguemos o suficiente para levar uma vida confortável a quatro.

Bem, confortável para meus padrões. Ter um teto e comida já era o suficiente para mim, além dos livros que eu havia conseguido salvar na mudança. No entanto, sempre tínhamos que nos apertar porque Angelique queria um vestido novo ou Fleur precisava de outra jóia em sua coleção. E meu pai sempre acatava aqueles pedidos, por mais absurdos e abusivos que pudessem ser. Apesar de serem minhas irmãs, e de eu amá-las, aquilo me enchia de raiva. Para não descontar em alguém, preferia sair de casa e me ocupar com alguma coisa.

Assim, revezava meu tempo em diversas tarefas. Às vezes as ajudava a fazer algum serviço da casa, como limpar, lavar e cozinhar (elas sempre tentavam empurrar todo o trabalho para mim). Aprendi a plantar e cuidar da horta graças aos ensinamentos de vizinhos e, na outra parte do tempo, ajudava papai como podia em suas negociações.

Mas, se tinha alguma coisa que eu não levava o menor jeito, era para caçadas. Adorava um belo assado, não minto, mas eu não conseguia me ver abatendo algo mais que uma galinha ou coelho. E, quanto mais eu me recusava àquilo, mais meu primo insistia.

— Você precisa aprender uma profissão decente, uma profissão de homem! — Gaston me perturbava.

— E mercador não é válido para as duas coisas? — Eu indaguei com um livro em mãos, em uma de minhas poucas horas vagas.

— Isso não é uma profissão confiável, veja o que aconteceu com seu pai.

Engoli seco para conter a raiva e não retruquei. Sabia que aquele bronco não fazia por mal para me deixar triste ou bravo, só não tinha o mínimo de tato na hora de falar.

— Você devia aprender a ser lenhador. Ou caçador como eu, não é mesmo, Lefou? — Ele perguntou e se virou para o amigo.

Lefou era um garoto franzino e gordinho que seguia meu primo para onde ele ia, como um cãozinho leal. Minhas irmãs o chamavam de vira-lata.

— Sim, Gaston. — O gordinho concordou veementemente.

— Viu? — Meu primo voltou a me olhar. — Por que não larga isso daí e me deixa te ensinar como usar um mosquete?

— Porque, talvez, eu não queira aprender?

— Bobagem. Você não pensa que um dia vai ter esposa e filhos para cuidar? Um cervo tem bastante carne pra comer e couro para vender e realizar os caprichos de uma mulher. E a cabeça é um belo troféu, você viu a que eu doei para a estalagem?

Eu revirei os olhos e fechei o livro, já farto daquela conversa. Se não cortasse logo o assunto, sabia que falariam por horas.

— Eu adoraria ouvir mais sobre isso… — Menti. — Mas eu tenho coisas mais importantes a fazer.

— E o que seria mais importante do que isso?

Qualquer coisa?” Me contive de perguntar.

— Papai irá viajar, vou ajudá-lo a preparar tudo.

— Ah. — Gaston fez uma careta. Eu sabia que ele desprezava a profissão de meu pai. Éramos primos por parte de mãe, meus parentes o culpavam pela morte dela. — Que seja. Até mais. Vamos, Lefou.

— Tchau, Damien. — Ele me cumprimentou e seguiu apressado atrás de Gaston.

— Tchau. — Murmurei aliviado por eles finalmente terem partido e voltei para casa, havia saído para ler perto do bosque, achando que teria paz e sossego.

Papai já havia atrelado a carroça ao cavalo e eu ajudei a carregar as últimas mercadorias. Ele não era velho, mas seu semblante estava cansado e desgastado pelo que acontecera nos últimos anos.

— Obrigado, meu filho. — Ele sorriu ao notar que eu o observava.

— Pai, tem certeza que não quer que eu vá com o senhor? — Perguntei, preocupado.

 — Não é necessário. — Ele afagou meus cabelos. — Prefiro que fique aqui e cuide de suas irmãs. Pode fazer isso?

— Sim, senhor.

— Ótimo. Então creio que já possa partir.

— Pode trazer um vestido novo para mim? Um de cetim rosa? — Angelique correu para fora e enlaçou o braço de meu pai, no tão conhecido gesto chantagista.

— Eu quero um anel para combinar com os brincos que trouxe da última vez, papai. — Fleur surgiu descendo correndo as escadas e agarrou o outro braço dele.

— Eu trarei se puder, prometo

Rolei os olhos e suspirei. Eu sabia que ele traria, mesmo que não pudesse. Elas se aproveitavam do coração mole dele e da culpa que sentia pela morte de mamãe, que ele tentava compensar através daqueles presentes.

— E você, meu filho, deseja algo?

Um novo livro.” Pensei, mas não disse nada. Eu não queria que o orçamento dele se apertasse ainda mais.

— Não, pai. Só quero que o senhor volte são e salvo.

— Certo. — Ele afagou de novo meus cabelos. — Fiquem bem.

Dei um leve sorriso e fiquei acenando com minhas irmãs enquanto o víamos se afastar. Quando ele já havia sumido no horizonte, meu coração se apertou dentro do peito. Eu tinha um mal pressentimento sobre aquela viagem.

Próximo Capítulo

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