Naquele dia, passamos a noite na casa de Neusa Albuquerque, sinceramente ela me saiu como um verdadeiro anjo. Lá fomos alimentadas e acomodadas como visitas especiais. Cheguei a pensar: Merecemos tanto? Ela nem nos conhecia de verdade. Será que existem pessoas tão boas assim mesmo? Sempre fui descrente quanto a isso, mas as atitudes de dona Neusa me fizeram repensar.

Antes de dormir, fui matar a sede na cozinha. Pude perceber que na porta da geladeira, havia uma foto pendurada, nela estava um rapaz jovem e bonito, loiro de olhos esverdeados, realmente encantador, talvez pudesse ele ser o filho de dona Neusa, mas não vimos nem ninguém além dela mesma naquela casa enorme, inclusive ao chegarmos, presumi que ela deveria se sentir muito solitária a ponto de adotar a companhia de estranhos. Isso me intrigou, mesmo cansada do dia longo que tivemos, custei a dormir. Era a primeira vez em meus 20 anos de existência que dormiria fora de casa, enquanto, lutava contra a insônia, minha mãe se aliava ao sono, estava numa espécie de coma profundo que favorecia seu merecido descanso.

Algumas horas mais e senti o sol no rosto, percebi que havia dormido, não lembro do momento em que fechei os olhos, mas os abri de manhã. Minha mãe não estava mais ao meu lado, fiquei um pouco assustada e decidi procura-la imediatamente. Ouvi algumas risadas vindo da cozinha e decidi verificar:

– Camille! Bom dia querida. Dizia dona Neusa sorridente enquanto segurava sua xícara de café fresco.

– Bom dia. Respondi surpresa.

Minha mãe a estava servindo.

-Vem tomar um cafezinho. Convidou Neusa.

-Você estava dormindo tão profundo que decidi não te acordar, filha.

Explicou minha mãe.

-Estava? Questionei.

-Estava muito cansada. Acrescentou dona Neusa.

Dei um leve sorriso, eu não estava completamente feliz naquele momento, não conseguia disfarçar minha angústia.

-Sua mãe cozinha muito bem. Nossa, estou encantada. Elogiou dona Neusa.

-Obrigada, dona Neusa. Agradeceu minha mãe.

-Foi ela quem preparou o café dá manhã? Interroguei surpreendida.

Elas se olharam desconfiadas. Pensei: Minha mãe quis agradar, afinal de contas, teríamos dormido na rua se fosse aquela ajuda.

-Conversamos mais cedo e a Lucélia me contou tudo Camille, o que aconteceu com vocês ao chegarem aqui e me contou ainda sobre seu pai. Explicou dona Neusa segurando minhas mãos por cima da mesa.

-Sobre meu pai? Questionei.

Nem eu mesma sabia ao certo o que houve entre eles, o que causou a separação. Será que ela soube mesmo de tudo? Soube das coisas que nem eu poderia saber?

-Descobri que vocês não têm como voltar pra Manaus agora. Sua mãe se ofereceu a passar uns dias aqui, cozinhando pra mim. Às vezes esqueço de comer, tenho três lojas pra cuidar, vivo nessa casa sozinha e achei um ótima ideia continuar com a companhia de vocês.

-Vamos ficar? Questionei.

-Com o dinheiro que irei pagar a Lucélia, dará pra pagar suas passagens de volta. Vocês ficarão aqui me fazendo companhia.

Explicou dona Neusa.

Nesse momento pensei: Ela se sente tão sozinha… Mas e aquele jovem rapaz da foto que vi na porta da geladeira? Ainda não me senti íntima pra perguntar, então passei o olhar rapidamente pra geladeira e me acabei me surpreendendo, pois a foto dele não estava mais lá.

-O que acha filha? Podemos ficar? Perguntou minha mãe a fim de sabe minha opinião.

-Estamos precisando muito disso. Acho ótimo, muito obrigada dona Neusa, a senhora é um anjo que surgiu no momento certo. Agradeci acariciando as mãos dela.

-Pois é, quero que saiba que vamos fazer o possível pra lhe recompensar por essa ajuda toda. Não sei o que seria de nós.

-Eu também sei cozinhar. Afirmei empolgada.

-Verdade viu dona Neusa, essa menina tem não boa na cozinha. Vai me ajudar bastante. Acrescentou minha mãe.

-Que maravilha. Quer dizer então que não vou mais precisar comer fora, agora tenho duas cozinheiras de mão cheia em casa. Eu queria poder te dar uma vaga numa das lojas de roupa, Camille, mas já estou no limite de funcionários. Disse dona Neusa.

Seria maravilhoso conseguir um emprego naquele momento, mas fiquei feliz em saber que poderei ajudar minha mãe na casa e garantirmos assim nossa passagem de volta. Apesar de encontrar tantos pontos positivos em nossa “fada madrinha”, algo nela me intrigava, um mistério pairava sobre sua personalidade. Sempre fui boa em observar as pessoas que me cercam talvez pela minha serenidade e timidez. Naquela manhã logo após o café, dona Neusa saiu pra trabalhar e ficamos sozinhas na casa, eu estava louca pra perguntar o que minha mãe havia dito a então patroa, sobre meu pai.

-Você contou sobre o que aconteceu entre vocês, contou a alguém que acabamos de conhecer. Pressionei.

-Vocês quem? Desconversou ela.

-Entre você é meu pai. Você contou o que os separou! Exclamei chateada.

-Eu já lhe disse que o que seu pai fez não foi bom e não quero nem vou te contar porque não lhe acrescentará em nada. Não quero despertar em você sentimentos negativos sobre seu pai, afinal acima de tudo, ele é seu pai. Afirmou ela antes de sair dá cozinha e me deixar sozinha.

Nossa, depois de ouvir aquelas palavras, tive certeza de que ele havia feito algo muito errado, por que sentimentos negativos seriam despertados em mim?

Passei alguns minutos ali, na cozinha, sozinha. Senti uma presença por minhas costas e custei a me curvar pra verificar, era uma sensação indescritível, definitivamente alguém estava me observando, alguém estava parado atrás de mim. Criei coragem e constatei: Era um homem, e seu rosto não era desconhecido, pois era o mesmo que havia visto na noite passada, o mesmo rosto da foto pendurada na porta da geladeira.

 

CONTINUA….

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