Episódio 8: Mal de Família

Não considero exagero quando ouço alguém dizendo: “Antes um estranho, que um parente”!

– Estamos morando no Rio de Janeiro, nem sabíamos que vocês estavam aqui. Disse meu tio, Jocélio.

– Soubemos de tudo hoje! Explicou a tia Marinha

– Como souberam? Quem contou? Achei que estivessem muito bem escondidos…

Tio Jocélio preparava-se pra responder quando o interrompi:

– O engraçado é que ninguém lhes avisou sobre a nossa chegada aqui, mas pra dar essa notícia terrível, souberam muito rapidamente como encontra-los. Estamos há meses aqui. Falei com segurança, afinal, estava indignada.

– Pedimos desculpa, olha nós estamos muito abalados. Arrasados por não ter tido a oportunidade de rever nossa irmã em vida, poder abraça-la, matar um pouco da saudade que guardamos por tantos anos. Dizia tia Marinha, chorando.

Meu olhar era fixo no choro da tia Marinha, logo ele se refletia a mim me fazendo derramar mais algumas lágrimas, eu só lembrava de nossos momentos juntas, como grandes amigas e confidentes.

– Era nossa irmã, Camille. Estamos sem chão. Tenha certeza se tivéssemos  ideia que vocês estavam aqui, teríamos  vindo. Precisamos falar com você, precisamos te ajudar no que for preciso! Acrescentou o tio Jocélio.

– Tudo bem, Camille? Quem são vocês? Aproximou-se dizendo dona Neusa, após sair do carro intrigada.

– São meus tios dona Neusa, irmãos da minha mãe.

– Ah! Então depois de morta, a sua mãe ficou visível pra eles? Vão embora! Chegaram tarde demais ! Reclamou dona Neusa, irritada.

– Quem é essa mulher? Camille, somos seus tios, sua família. Estamos aqui pra te ajudar.

– Não, desculpem. Vocês eu não conheço! Ela, “essa mulher” como você disse, é minha família agora, ela esteve o tempo todo ao nosso lado, quando precisamos. Declarei em defesa da dona Neusa, logo depois me afastei dando as costas e logo ouvi um resmungo ” Mal agradecida”. Nesse momento parei, virei-me diante o casal e questionei:

– Que grau de amor sentiam pela irmã de vocês? Não sei, mas Deus é oniciente e com certeza saberá a resposta.

– Chega, vamos embora Marinha, existem pessoas que definitivamente não merecem ser ajudadas. Respondeu o tio Jocélio, completamente transtornado enquanto puxava a irmã pelo braço afastando-se de nós.

– Aí amiga, que cara grosso! Olha vamos embora, você realmente não precisa deles.

– Querida, você vai continuar lá em casa, ouviu? Desculpe meu descontrole, mas tá na cara que eles já sabiam há muito tempo que vocês estavam na cidade. Não quiseram ajudar , foi isso o que aconteceu.

– Obrigado por intervir, também percebi um certo cinismo.

– O João Victor e eu vamos visitar os pais dele em Vitória hoje a noite. Vamos ? Se não vou acabar me atrasando. Disse Viviane.

– Sim, sim, vamos! Já, já vai escurecer.

Tentei dormir, mas não a tirava cabeça, sua cama ainda estava alí, no mesmo quarto que o meu. O quarto onde tagarelavamos por um bom tempo antes de dormir, estava em um silêncio deprimente. Ja passava das 23 horas quando resolvi ir ate varanda, talvez me sentisse melhor com a brisa calma no rosto e o som dos grilos.

Ao olhar pro jardim, me assustei. Ricardo, o misterioso e bonito rapaz por quem me encantei há alguns dias estava lá, ele acenava pra mim e sorria entusiasmado em me ver. Retribui o sorriso e desci até o jardim, estava tarde e frio. Fiquei meio intrigada por ele estar ali espreitando, mas medo não senti, algo naquele moço me deixava muito tranquila, sempre que o vi, me senti protegida de alguma maneira. Com ele me sentia segura. Ricardo já me esperava sentado no banco do jardim.

– Você me assustou, homem! Falei, enrolada num sobretudo.

– Estava louco pra te ver, fiquei sabendo sobre sua mãe, eu sinto muito. Declarou ele.

– Obrigada, minha maior perda! Mas, como soube? Respondi lhe olhando nos olhos.

– A cidade é pequena, aqui não precisa nem de jornal local. Tudo corre boca a boca! Explicou ele.

– Está tarde, o que fazia aqui, sozinho? Questionei, envergonhada.

– Eu queria te ver, faz um não nos vimos, desde a festa da cidade semana passada.

– Você é tão… Misterioso… Hora some, hora aparece do nada. Também gostei muito de você. Sabe, eu cheguei a pensar que você fosse um fantasma.

Ele gargalhou, estava zombando de mim:

– Sério, achei que você fosse o filho morto da dona Neusa. Expliquei.

– Nossa!!! Camille que loucura. Olha, toca aqui, tô vivo! Disse ele, colocando minha mão em seu braço.

– É que tinha uma foto sua, pendurada na geladeira dela.

– Sério? Perguntou ele parecendo estar preocupado.

– Sim, que cara é essa? Questionei intrigada.

– Uma foto minha, e o que houve com ela? Perguntou ele, tenso.

– Sumiu! Mas, esquece!

– Estou aqui, Camille! A essa hora, nesse frio… por você! Sei que está muito triste pelo o que aconteceu com sua mãe, por todo o sofrimento na doença e agora com o pior de tudo, a morte dela. Estou aqui, porque quero que saiba que pode contar comigo, no que for preciso, seja em um abraço, uma palavra amiga, ou….

Calou-se.

E eu estava impressionada com suas palavras, não sei se estava apenas me seduzindo, mas não pareceu. Ele demonstrava sinceridade no olhar e isso me fez cometer uma ação repentina, mas que com certeza selou nossa relação: Nossos olhares eram penetrantes, o frio substituiu-se por um calor que vinha de dentro para fora, ápice foi inevitável, nos beijamos, e naquele momentos o mundo exterior havia sido esquecido.

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