As coisas aconteceram rápido demais, a raiva tomou conta de meus atos e eu agi por impulso, depois do primeiro golpe, um misto de ódio e prazer tomou conta de mim.
O sangue jorrava ainda mais rápido a cada novo ferimento que eu causava nele, antes que eu pudesse se dar conta aquilo já havia sido feito, o corpo inerte de Álvaro jazia diante de mim. Foram vinte e seis facadas seguidas em seu abdome, um mar de sangue fluía de seu corpo sujando todo o chão abaixo dele.
Não tinha como alguém sobreviver aquilo.
Fiquei ali parado alguns tempo, vendo-o agonizar. Meu corpo todo tremia eu larguei a faca sentei no chão e abracei as minhas pernas.
Eu matei um homem! Minha ficha finalmente caiu.
Eu tinha que fugir. Eu havia matado um homem … O que iria acontecer comigo agora?
Esse era o único pensamento que invadia minha mente. Se alguém me visse ali eu iria direto para um reformatório.
Minhas mãos tremulas deixaram a faca cair, o cheiro ferroso do sangue invadia minhas narinas. Eu tinha pouco tempo.
Corri até os fundos da casa onde tirei toda a roupa mergulhada em sangue, tomei um banho rápido para tirar aquela podridão do meu corpo. Corri até o quarto troquei de roupas e fiquei ali por um tempo pensando no que eu havia feito.
Anos imaginando como eu faria aquilo, calculando, esperando. E finalmente aconteceu, eu tomei coragem e agora o mundo estava livre de um monstro.
“Eu vou para a prisão” – Pensei comigo mesmo. Se alguém o visse ali eu estaria perdido. Eu tinha pouco tempo para pensar em alguma coisa.
Tirei da velha mochila os materiais escolares fui até a gaveta da cômoda peguei alguma mudas de roupa que acabei jogando de qualquer jeito dentro da bolsa. Voltei para a sala e dando uma última olhada pela nele constatei o inevitável.
Sim, Álvaro estava morto!
Revirei em seus bolsos, procurando por algum dinheiro, acabei encontrando alguns trocados que não durariam muito. Eu teria que ir bem mais longe dessa vez.
Corri até o quarto de mamãe revirei todos moveis, bolsas e os possíveis locais em que eu sabia que ela guardava alguma coisa. O senhor colmeia, meu querido amigo ainda era o esconderijo perfeito. Peguei-o no berço de Bernardo. Dei uma última olhada em tudo antes de finalmente partir.
Andei de um lado para o outro sem saber para onde ir parei por algum tempo na sorveteria perto do colégio.
Eu precisava daquilo.
— Vai jogar Mick? — Perguntou-me Yago, dono do estabelecimento. — Quem perder paga?
O Yago era um cara legal, a pesar de ser uns dez anos mais velho do que eu, ele era o típico gamer que qualquer garoto de onze anos gostaria de ser. Vivia falando sobre os jogos que seriam lançados futuramente, franquias inteiras que ele viu crescer. Sempre tinha algo novo que ele fazia questão de trazer para a gente.
— É… — Respondi sorrindo.
Larguei a mochila num canto e peguei o controle.
— Calma cara. Ta com medo é?
— Eu não.
— E por que aa tremedeira?
— Cala a boca da START logo.
— Ok!
Jogamos por horas a fio, todos faziam fila para jogar com o Yago. Ele era tipo o paizão da molecada, sempre fazendo campeonatos de jogos que sempre começavam assim “quem perder paga”. No fim eu não tive que pagar por nada, fiquei por lá até a hora de fechar.
Depois andei mais uma vez sem rumo pelas ruas da cidade, até me dar conta de que eu não tinha para onde ir. Todos os meus amigos diriam a minha mãe caso eu aparecesse por lá, e com certeza já estavam a minha procura.
Fui a uma praça afastada da cidade, famosa pelas coisas ruins que aconteciam ali. Era um lugar lindo durante o dia, cheio de bancos, crianças brincando, casais namorando se divertindo. Eu passei muito do meu tempo livre lá brincando e me divertindo. Nunca tinha vivenciado a noite naquele lugar.
Ninguém me procuraria ali.
Como já era esperado, não tinha quase ninguém ali àquela hora da noite. O lugar era mal iluminado, poucas lâmpadas realmente funcionavam, apenas alguns casais namoravam ou andavam de mãos dadas.
Caminhai por alguns minutos mais para dentro da praça, mais ao fundo algumas formações rochosas antigas serviam como atração turística, pois elas davam direto no rio que abastecia a cidade. E era justamente ali que as “coisas” aconteciam.
Eu ouvi alguns gritos, batidas e gemidos estranhos vindos de trás de uma pedra grande em formato de gruta, ao me aproximar notei a silhueta de duas pessoas mal iluminadas em cima de uma das pedras. Tentei me aproximar um pouco mais, mas fui tomado pelo medo.
— Ei menino! — Gritou um homem vindo em minha direção. – Você tem fogo?
—… que? — Minhas pernas tremiam, meu corpo não se movia.
— Fogo. Você tem?
Ver aquele homem diante de mim, me fez lembrar dele. E a única coisa que me veio à mente foi, me proteger. Sem pensar duas vezes avancei na direção daquele homem com os punhos a mostra.
— Cê tá doido moleque.
— Eu não tenho nada pra você! — Gritei e sai correndo.
Ali era meu lugar agora, pelo menos por aquela noite. Procurei um lugar afastado dos gritos e das pessoas que estavam vagabundando por ali. Encontrei um lugarzinho pequeno e bem protegido próximo a um banheiro desativado.
Joguei a mochila no chão e me deitei com as mãos na cabeça e fiquei olhando o céu até finalmente adormecer de cansaço.