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O Vazio que Habita em Mim – Capitulo 18: O Pecado Bate a Porta

A noite chegou e com ela as novas regras entraram em vigor. O toque de recolher e a revista da noite ocorreram o apagar das luzes. Silencio.

Alex e eu ficamos diante da porta da cela aberta esperando um dos guardas terminarem a contagem e efetuar a revista, uns tremores inesperados percorreu meu corpo quando o homem a minha frente me tocou entre as pernas a procura de algo incomum.

— Luzes apagadas em trinta minutos. — Disse o guarda trancando a porta.

Alex deitou-se na cama de cima e observou o teto por um tempo antes de voltar sua atenção para mim.

— Primeira vez?

— Primeira vez? — Repeti.

— É… sua primeira cana, não é?

— Como sabe?

— O seu jeito entrega tudo. — Ele havia virado de bruços e agora me encarava com a cabeça para baixo.

— Como assim?

— Você é tímido, se esconde atrás dos seus amigos. E agiu estranho na hora da revista. Coisa de novato.

— Entendi…, é. Eu sou novo aqui.

— Percebi. Então fica esperto novato, coisas estranhas acontecem por aqui.

— Que tipo de coisas? — Perguntei intrigado.

— Uma hora você vai ver essas coisas acontecendo. Então fica esperto. — Ele retrucou deitando-se em sua cama, e dando aquela conversa por encerrada eu fiz o mesmo.

Foi difícil dormir em uma cama depois que você se acostuma a dormir em um papelão no chão. Tudo ali era macio demais, mesmo para asa condições do lugar. Assim eu demorei um pouco a dormir, mas antes que eu me desse conta…

… Ele apareceu.

 

 

 

— Oi Mick! — Álvaro me disse sorrindo, pondo a cara na porta. — Sua mãe tá ai?

— No trabalho. — Respondi sem tirar os olhos da TV.

— Entendo… E ela te deixou sozinho?

— Não né… A Amanda tá lá dentro.

— Você ta vendo o que?

— A Amanda ta vendo a novela, eu só coloquei ai enquanto ela não vem.

— Chato né?

— Um pouco, mas ela disse que ia faze brigadeiro, se eu deixasse ela assistir à novela, e eu poderia brincar na rua antes da mamãe chegar?

— Ah… e o que ela está fazendo lá dentro?

Sem que eu percebesse ele já havia entrado em casa, como de costume, e havia se sentado ao meu lado com as pernas cruzadas.

— Não sei… — Respondi, sem olhar para ele. — Um rapaz da escola dela ligou.

— Namorado?

— O que é isso?

— É quando um menino não sai da casa da menina, ou vive ligando pra ela toda hora, sabe!

— Ah, tá. Tipo… você e a mamãe?

— Mais ou menos isso.

— O que os namorados fazem?

— O que todo mundo faz. — Ele deu um sorriso. — Será que ela vai demorar?

— Não sei. Por quê?

Ele me olhou de um jeito estranho antes de fazer a pergunta:

— Você quer brincar?

— De que? — Perguntei, finalmente tirando os olhos do desenho que eu assistia.

— Não sei… Que tal CAVALINHO?

— Tá!

— Preparado?

— Sim!

— Antes você tem que olhar o que a Amanda tá fazendo.

— Tá bom!

Eu me levantei às pressas fui até a cozinha, e espiei por detrás da parede, e lá estava ela sentada na mesa da cozinha parecendo boba, sorrindo e suspirando.

— Ela continua la feito boba! — Respondi.

— Senta aqui. — Ele disse batendo nas próprias pernas. — E se segura, pois o cavalo está doido para trotar!

 

 

 

Em pouco tempo nos havíamos nos habituado ao sistema do lugar…

Nossos horários eram regrados e sempre pontuais. Ou se estava lá para comer aquela gororoba, que eles serviam como, “refeição balanceada” ou se passava fome até a próxima refeição.

Éramos obrigados a assistir as aulas da manhã e da tarde além de participar três vezes por semana de sessões de aconselhamento e terapia de grupo, promovido pela professora Joana.

Tínhamos direito ao banho de sol, fazíamos exercícios regularmente e podíamos transitar livremente por todas as alas do lugar, nossos quartos só eram fechados as oito da noite, quando as luzes se apagavam.

Para começar tudo de novo as 6:00 da manhã do dia seguinte.

Alex acabou se tornando um grande companheiro lá dentro, nos ensinando em quem confiar, o que fazer para se dar bem ali dentro e talvez cair nas graças de uma das gangues e o que não fazer para não ir para a solitária.

O tempo na solitária não passava, dias… horas… minutos… segundos, era impossível dizer com certeza quanto tempo alguém passava ali dentro. O mal cheiro das fezes e da urina se misturava ao mofo do ar já rarefeito, as sessões de tortura física e psicológica duravam horas, os contêineres de aço ficavam na parte de traz dos alojamentos onde não havia sombra. Durante um calor dos infernos e a noite o frio comparável ao da morte.

Se prestássemos bastante atenção era possível ouvir os choros das crianças malcomportadas no ato disciplinar. Em media esses atos duravam uns dois ou três dias, e o garoto em questão ficava algum tempo manso até a poeira esfriar.

Muitas vezes, alguns garotos eram levados pelos guardas sem nenhuma explicação, e voltavam algum tempo depois, uns chorando, outros com ódio, e outros machucados, mas nenhum deles falava nada.

O silencio era a única resposta que tínhamos.

Alex nos explicou que esses sumiços eram acerto de conta das gangues, que vinham de fora

Algumas noites também era um mistério para muitos de nós, se fizéssemos silencio, podíamos ouvir batidas, gemidos, choros e risos de desdém.

Aos mais novos era dito pelos guardas que o espirito de um garoto ainda assombrava uma das selas da solitária, e era o lamento dele que nos escutávamos a noite.

Certa noite Alex confirmou minhas suspeitas.

— Cuidado com o Adão… Ele tem estado de olho em você!

— Isso eu já sei… — Respondi fechando a cara.

 

 

O Sr. Adão Albuquerque Gurgel de Almeida era aquele típico assistente social bonzinho e sorridente, que apertava sua mão e o convidava a se sentar em seu escritório para ouvir os seus problemas.

Ate ai tudo bem, pelo que eu sabia esse era o papel do assistente social, cuidar para que as pessoas se sintam acolhidas, para assim ajudar a cuidar de seus problemas. O que nenhum de nós sabia era que Adão tinha um lado obscuro.

Quando chegamos ele foi o primeiro a nos receber antes mesmo de qualquer coisa. Bastante atencioso Ele nos encheu de perguntas sobre tudo, nossos pais, como nós havíamos ido parar nas ruas e porquê nós tínhamos ido parar lá? Seu interesse em nós era incomum, isso para não dizer bizarro.

Ele fez questão de nos avaliar com os olhos, depois alguns toques e passadas de mãos despercebidas.

Seus olhos eram como os dele … Frios e cheios de malicia. E depois de alguns dias lá dentro eu comecei a entender o porquê.

Para toda a sociedade, para os programas de TV que nos visitam e para os gestores do lugar Adão é um poço de bondade, homem integro e amoroso, sempre sorrindo e pronto para ajudar o próximo. Mas para nós os internos Adão é o assistente do diabo.

Não se engane com aqueles que se mostram solidários e interessados demais. Eles vão querer algo em troca. Eles sempre querem!

Álvaro me ensinou isso da pior forma possível.

Adão usava sua influência e seus contatos dentro da instituição para se aproximar e vigiar os detentos novatos e assim ter livre acesso ali dentro quando bem entendesse.

O suborno era sua maior arma.

A corrupção rolava solta dentro da casa de correção para menores, tudo por causa do bom e velho jeitinho brasileiro, qualquer um tinha o que quisesse ali dentro, desde uma folga das aulas, das terapias ou até mesmo drogas.

Bastava apenas que se pagasse um preço.

Com as gangues ali tudo era fácil, se algum detento quisesse algo de fora, bastava encontrar o guarda certo e propor um acordo que poderia ser pago em dinheiro, drogas ou sexo, dependendo da pessoa com quem era feito o acordo.

Para Adão era sempre a mesma coisa, depois dele os outros pervertidos tinham vez. Ele gostava dos meninos mais jovens entre dez e treze anos, e para o meu azar eu me encaixava nesse perfil.

Se eu não fizesse alguma coisa bem rápido cedo ou tarde eu seria mais uma de suas vítimas e entraria na lista das concubinas do assistente do diabo.-” ”>-‘.’ ”>

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