132— O velho ta chamando… — A voz de Quim me acordou de meu pesadelo.
— Que? — Perguntei desnorteado.
— A gente vai ser transferido. — Pepeu completou.
Olhei para a porta da cela aberta cujo policial de cara carrancuda esperava a nossa saída.
— Bora moleque, eu não tenho o dia todo. — Ele disse batendo na grade.
Duas pessoas nos esperavam na sala do delegado. O homem era magro, tinha cerca de trinta anos, usando roupas finas, a mulher, um pouco a cima do peso estava sentada de pernas cruzadas também vestida de forma elegante, usava um vestido rodado estampado que acentuavam perfeitamente suas curvas, nos pés um salto que a deixava alguns centímetros mais alta que seu companheiro.
—… aqui e aqui. — O delegado dava instruções para o homem que continuava a assinar e rubricar papeis. — agora eles são todos seus.
— Podemos ir então? — Perguntou a mulher levantando-se e vindo em nossa direção.
— Claro. — Respondeu o homem.
— Sargento, escolte-os até a viatura por favor. — Ordenou o delegado.
O soldado de plantão bateu continência e com apenas um olhar nos indicou a direção da porta. Nos três obedecemos sem questionar, caminhando em silencio até o carro.
Do lado de fora a luz em excesso quase queimou meus olhos, meus companheiros já habituados cobriam o rosto com as mãos. Em silencio entramos no carro e assim permanecemos até chegar ao nosso destino final.
Esqueça tudo o que você viu nos filmes sobre os reformatórios. É tudo muito pior, pode acreditar.
Depois de passar pela revista, fomos fichados novamente e levados para o vestiário onde tomamos banho, vestimos as roupas do lugar – um macacão cinza e botas pretas pesadas – recebemos nossos produtos de higiene – sabonete, escova de dente, creme dental, e duas toalhas de banho, – além de passar algum tempo ouvindo as explicações de um homem velho e cansado demais de como funcionava a casa de correção onde ficaríamos um bom tempo.
Horários e mais horários a seguir.
O café era servido as 7:00, o almoço as 11:00 e o jantar as 18:00, caso você perdesse algum desses horários teria de esperar até a próxima refeição, o que não é lá grande coisa. Além disso, tínhamos de estudar e trabalhar meio período. Depois fomos apresentados a um garoto gordinho e cheio de espinhas que foi instruído pelo guarda a ser nosso guia.
Alex nos levou pelas celas, mostrou onde Pepeu e Quim dividiriam uma cela e eu ficaria com ele duas celas depois da deles.
Assim como os garotos eu apenas coloquei minhas coisas na cama que estava vaga e sai, o lugar era um pouco apertado, composto por três camas, uma pia e um vaso sanitário.
Enquanto andávamos os guardas passavam vistoriando o movimento, cochichando e rindo. Alguns deles nos encaravam como se quisessem nos fuzilar com os olhos.
Alex nos mostrou o banheiro, as salas de aula onde teríamos aulas pela manhã referentes ao ensino fundamental ou médio, dependendo de onde o detento havia parado os estudos, e a tarde algum curso profissionalizante ou trabalhos manuais dependendo da escolha de cada um, o caminho para a enfermaria onde fizemos nosso exame médico, o buraco onde ficavam os detentos problemáticos e por fim o refeitório.
As coisas começaram bem, pelo menos até Pepeu e Quim “tentarem se enturmar”, isso depois do nosso guia sumir de uma hora para outra.
— Chegamos vadias! — Os dois gritaram juntos ao chegarmos no refeitório.
Todos os olhares se voltaram para nós três, e como se nada estivesse acontecendo, os dois começaram a andar pelo refeitório até onde estava sendo servida a comida. Eu os acompanhei, como se minha vida dependesse daquilo.
No fim dependia!
— Relaxa Mick! — Pepeu me pediu quando entramos na fila. — Aqui é território neutro, ninguém vai tentar nada com a gente.
— Cuidado com os agentes, — disse Alex – eles é que são o problema aqui.
— Já sabemos! — Quim respondeu.
— Bora pra mesa. — Pepeu me deu um cutucão, me trazendo de volta para a realidade.
Passamos por várias mesas até encontrar uma que estivesse vaga para nós três. Enquanto passávamos todos os garotos nos encaravam por alguns segundos e depois voltavam sua atenção para o prato a sua frente.
— Posso me sentar aqui? — ele perguntou ele colocando a bandeja sobre a mesa. Como nenhum de nós se opôs a isso o garoto sentou.
— Qual é o esquema? — Quim perguntou sem rodeios.
— Bem simples. — Disse Alex pondo uma colherada de purê na boca. — São três garotos por cela, aulas de manhã, tarefas a tarde…
— Não esse esquema… — interrompeu Pepeu.
— Certo…, O Lucas, o Leo e o santo Cristo é quem tomam conta do lugar. Ou vocês entram num grupo ou vão sofrer nas mãos dos guardas.
— Santo Cristo? — Perguntei
— É, que nem a música sabe… a do Renato.
— João… — Pepeu interrompeu.
— Os três controlam as drogas aqui dentro, compram e vendem favores além de facilitar nossas vidas com os guardas.
— De qual grupo você é, e como a gente entra?
— Ei…Ei… Ei… Não é assim que funciona. — Alex respondeu apressadamente. – Eles te escolhem.
— Enquanto isso? — Perguntei. — Você tenta sobreviver dentro desse inferno.-” ”>-‘.’ ”>