CENA 1. CASTELO. INT. DIA
Continuação imediata da cena do capítulo anterior, com Armando expulsando a família real francesa do castelo.
ARMANDO – Não vão agir não? Saiam daqui! Agora!
CARLOTA – Isso é uma falta de cortesia enorme com um país amigo. Eu tenho certeza que o senhor não quer se indispor com a França.
ARMANDO – Primeiramente não é “senhor”, é Vossa Majestade. E segundo, não tenho medo de me indispor com a França. Entraria até em uma guerra com seu país, rainha.
Carlota começa a ficar furiosa.
CARLOTA – Está declarando guerra contra a França, Majestade?
ARMANDO – No momento não. Mas não descarto a possibilidade. Agora chega de conversa. Saia a senhora e seu filho mimado.
Falou do filho. Carlota não aguentou isso e explodiu.
CARLOTA (muito furiosa) O que está falando do meu filho??!!! Eu quero que repita o que disse. Cara a cara com ele. Ele é o herdeiro do trono de um dos maiores países da Europa ocidental. É bom respeitá-lo. E se não respeitá-lo quem está declarando guerra a Veseli sou eu!! E vou embora desse castelo tomado por golpe. Fique sabendo que o reino da França não reconhece o senhor como rei de Veseli.
E sai pisando duro.
Em outro lugar, Alice está confabulando com Alfredo.
ALICE – Precisamos fugir daqui?
ALFREDO – Como é? Vossa Majestade vai abandonar o castelo assim?
ALICE – Não viu o que Armando fez com Carlota? Pior, o que fez com Augusto e Daniela?
ALFREDO – E para onde vamos? Me desculpe, mas a senhora não é bem vista pela nobreza de Veseli. Eles sempre a acharam arrogante.
ALICE – Todos invejosos. Porque consegui me casar com o rei Augusto.
ALFREDO – Bem, isso não resolve o nosso problema. Estamos sem teto.
ALICE – Tem um lugar para onde podemos ir.
ALFREDO – Onde?
ALICE – No povoado.
Alfredo não entende o que Alice quer dizer. Pensa por um tempo e se espanta com a conclusão do raciocínio.
ALFREDO – Não. Não você tá louca? Nunca poderemos ir para lá.
ALICE – Não temos outro lugar. Venha, estamos perdendo tempo.
ALFREDO – Mas…
ALICE – Venha, Alfredo!
CENA 2. IGREJA. DIA
Maria foi à igreja se confessar com padre Luiz.
LUIZ – A senhorita tem certeza que não tem mais nada a confessar?
MARIA – Como assim? O que quer dizer, padre?
LUIZ – Nada. Se já terminou, tudo bem. Esses pecados não necessitam de penitência.
Fica um silêncio no ar por alguns segundos.
MARIA – Eu queria falar mais uma coisa com o padre.
LUIZ – O que é, minha filha?
MARIA – Quero marcar a data do meu casamento com Alexandre.
LUIZ – Claro, claro. Normalmente quando se vai marcar da data do casamento os noivos estão os dois presentes. Onde está Alexandre.
MARIA – Ele está se recuperando ainda do tiro que tomou. Fiquei sabendo que ele vai ser expulso do castelo.
LUIZ – O quê? Aquele desgraçado de Armando vai expulsar um doente em tratamento do castelo?!
MARIA – Padre Luiz, cuidado com a boca, ainda mais na presença de uma donzela.
LUIZ – Desculpe. É que o reino passará por um tempo sombrio. Peço a misericórdia de Deus para o nosso povo. Mas estávamos falando de seu casamento. Julgo mais prudente esperar a recuperação completa de Alexandre para marcarmos a data, senhorita Maria.
MARIA – Não! Quer dizer… Alexandre está de acordo com essa data. Ele também quer casar-se o quando antes.
LUIZ – Mesmo? Mas por que tanta pressa? É muito jovem ainda, Maria.
MARIA – Meu rosto parece jovem como um bebê, mas não sou tanto assim. O tempo passa para todos.
LUIZ – (desconfiado) Muito bem… e qual seria a melhor data.
MARIA – Daqui a 15 dias.
LUIZ – (espantado) Como?!
CENA 3. CASTELO. QUARTO DE CARLOTA E ROGÉRIO. DIA
Carlota e Rogério estão arrumando as malas. A rainha da França está furiosa.
CARLOTA – Nunca fui tão insultada em toda a minha vida. Esse regentezinho vai ver o que é o poder do exército francês.
ROGÉRIO – Mamãe, acho que precisa esfriar a cabeça. Não acho que a gente deva tomar uma decisão dessas assim de cabeça quente.
CARLOTA – Cala a boca, pirralho! Você não sabe de nada. E vai arrumando a mala aí, agora!
ROGÉRIO – Eu vou é esfriar a cabeça. Tchau.
CARLOTA – Espera, aonde você vai?
Rogério sai.
CARLOTA – Aposto que foi ver a princesa deposta. Agora ela não é de valia nenhuma para nós.
CENA 4. CASTELO. MASMORRAS. DIA
Não se podia saber se era dia ou noite nas masmorras do castelo. Daniela e Augusto estavam presos até agora sem comida e sem água. Daniela estava agitada.
DANIELA – Não é possível que não exista uma passagem secreta nessa droga de masmorra.
AUGUSTO – Muito difícil que tenha.
DANIELA – Deve ter, devemos procurar bem.
AUGUSTO – Não vou aguentar, sem beber, sem comer.
DANIELA Calma! Eu vou dar um jeito.
CENA 5. POVOADO. DIA
Aquela não era uma cena que o povoado de Veseli estava acostumado a ver. E nem nas maiores lendas poderiam contar o que as senhoras que estavam em casa naquela tarde viram. Bem no meio da rua, via-se ninguém mais ninguém menos que a antiga rainha do reino passando, com seu mordomo Alfredo, arrastando suas malas e trouxas das melhores roupas parisienses nas ruas empoeiradas do povoado. O que será que eles estavam fazendo ali? Alice e Alfredo tinham um endereço em mente. Foram direto a ele e bateram à porta de Odete.
CENA 6. CASA DE ODETE. DIA
Odete fica surpresa ao ver Alice.
ODETE – O que quer?
ALICE – Eu e Alfredo fomos expulsos do castelo por aquele tirano do Armando.
ODETE – E o que eu tenho com isso?
ALFREDO – Eu tenho certeza que a senhora tem muito a ver com isso. (Dá uma olhada ameaçadora a Odete)
Alice repreende o mordomo.
ALICE – Por favor, Alfredo, não estamos em condições de brigar com uma alma tão bondosa como a de Odete, não é?
ODETE – Entendi, então. Vocês querem ficar aqui? Na minha casa?
ALICE – O seu filho foi expulso do castelo também. Se nos unirmos podemos derrotar Armando.
ODETE – Não seja hipócrita, Alice.
ALICE – Então vamos para o assunto principal. Você quer discuti-lo aqui na rua ou vai me convidar para entrar?
ODETE – (com raiva) Entrem.
ALICE – (entrando, falando com Alfredo) Cuidado com as minhas malas, Alfredo. Tem vestidos aí que valem mais de um ano de seu salário.
Maria, que estava vendo toda a movimentação da porta de sua casa, ficou curiosa para saber o resto da conversa. Foi escutar atrás da porta de Odete.
CENA 7. CASTELO. MASMORRAS. DIA
Nem dava para saber se era dia ou noite nas frias e úmidas masmorras do castelo de Veseli. Até aquela hora os prisioneiros Daniela e Augusto não haviam comido nada. Mas alguém fora visitá-los, furando o bloqueio dos guardas e levando um lanche e água para os dois.
DANIELA – Você está sendo um anjo, Rogério.
ROGÉRIO – (com um sorriso de canto de boca) Fico feliz de não ser mais considerado um príncipe mimado pela princesa.
DANIELA – Ora, cala a boca!
AUGUSTO – Filha! Tenha mais gratidão pelo príncipe Rogério. Não sabemos até quando ele ficará aqui.
ROGÉRIO – É justamente sobre isso que eu vim falar com vocês. Armando expulsou todos do castelo. Todos, inclusive a rainha Alice.
AUGUSTO – Alice foi expulsa? E agora?
ROGÉRIO – As fofocas dizem que ela foi pedir abrigo com a mãe do moribundo que estava hospedado aqui.
DANIELA – Alexandre não é um moribundo! Ele levou um tiro tentando nos defender do ladrão Robin.
ROGÉRIO – Que seja. O que importa é que ele foi expulso também.
DANIELA – O quê?! Mas ele precisa continuar o tratamento!
ROGÉRIO – Sua preocupação excessiva com o plebeu me incomoda, meu amor.
DANIELA – Não é preocupação, é…
AUGUSTO – Já chega. Rogério não tem muito tempo até os guardas o descobrir aqui. Então me diga: que história é essa de Alice ficar hospedada na casa da mãe de Alexandre? De onde elas se conhecem?
ROGÉRIO – Não sei, Majestade. O que sei é que Armando já deu aviso para que saiamos daqui também. Mamãe está furiosa. Quer contatar o exército da França para declarar guerra a Veseli.
Ouve-se passos. Os guardas reais descobriram Rogério nas masmorras.
GUARDA – Novamente, príncipe? Eu terei que prender Vossa Alteza se continuar visitando os presos traidores.
ROGÉRIO – Não é necessário. Eu já estou de saída. Do castelo, inclusive. Coma todo o sanduíche, Daniela. E não esqueça de jogar tudo no lixo, está bem?
Depois que Rogério sai.
DANIELA – (comendo) Mas é um insolente mesmo. Quem ele pensa que… mas o que é isso?
Ela puxa de dentro do sanduíche um papel enrolado. Daniela abre e tem um recado de Rogério:
“Estamos sendo expulsos do castelo, mas não tema. Irei tirá-la das masmorras. Este tipo de masmorra é muito comum nos castelos da França. Sei como sair deles facilmente. A princesa precisa encontrar alguma passagem secreta. Elas normalmente ficam ao norte. Por isso escondi uma bússola no recipiente do lanche. Boa sorte, amor.”
DANIELA – (rindo) Não poderia deixar de fazer uma graça.
AUGUSTO – Esse príncipe é para casar mesmo, não é, minha filha?
DANIELA – Vamos deixar esse assunto para depois? Temos muito trabalho a fazer.
CENA 8. CASA DE LEOPOLDO. DIA
Leopoldo é um nobre que faz parte do Conselho dos Anciãos. Portanto, tem uma casa muito confortável. A casa fica no Rajskie Pole, bairro mais nobre do reino, bem próximo do castelo.
CARLOTA – Perfeito. Essa será a nossa nova casa, meu filho.
ROGÉRIO – A senhora falou com o senhor Leopoldo antes, mamãe?
CARLOTA – Claro que não. E nem precisaria, eles terão a honra de hospedar a rainha da França e o príncipe herdeiro.
Carlota bate à porta. Regiane, a governanta, atende.
REGIANE – O que deseja?
CARLOTA – Por favor, anuncie que Carlota Montpensier, rainha da França, ficará hospedada nesta casa, para a honra de Sir Leopoldo Kublowsky.
REGIANE – Como?
Carlota vai entrando na casa.
CARLOTA – Isso mesmo. O restante das malas está na carruagem. Vou entrando para o meu quarto. Mande uma empregada me preparar um banho de sais, por favor.
CENA 9. CASA DE ODETE. DIA
Alice e Alfredo já se instalaram na casa de Odete. Odete fez um chá para eles, a muito contragosto.
ALICE – Esse chá está divino, Odete. Muito bom mesmo. Muito melhor do que os que o Alfredo faz.
Alfredo lança um olhar para Alice, como que dizendo “não precisa puxar tanto o saco de Odete”.
ODETE – Bem, quanto tempo pretendem ficar aqui?
ALFREDO – Bem direta você, não é?
ODETE – Não gosto de fingir, Alfredo.
ALICE – Ah, gosta sim.
ODETE – Eu já falei para não tocarmos nesse assunto. Ainda mais aqui. Alexandre pode chegar a qualquer momento!
ALICE – Então você nos deixará ficar em sua casa quanto tempo precisarmos.
ODETE – Não pense que não tem nada a se explicar se essa história vier a público.
ALICE – Está me ameaçando? Eu devo refrescar a sua memória. Você aceitou ficar com ele por livre e espontânea vontade.
ODETE – Porque você ia jogar ele no rio! Eu não poderia deixar você matar seu próprio filho! Então eu o peguei para criar. Eu peguei Alexandre, o SEU filho que você iria matar!