CENA 1. CASTELO. SALA DE JANTAR. INT. NOITE
A família real está jantando. Alfredo e Morgana também estão na mesa. Alice troca olhares furiosos com Morgana. Se Augusto não estivesse ali, Alice com certeza teria enfiado a cara de Morgana na sopa quente.
AUGUSTO – Esse jantar está magnífico, não é mesmo?
MORGANA – Uma delícia, Majestade. Meu primo Alfredo sempre foi um primor na cozinha.
ALFREDO – Na verdade eu não vou para o fogão, priminha. Eu sou o mordomo, o chefe dos empregados.
MORGANA – Pois você deveria mostrar seus dotes para o rei. Majestade, ele faz uma torta salgada que é de comer rezando.
AUGUSTO – É mesmo? Eu adoraria experimentar. Está decidido. Amanhã o jantar é por conta do Alfredo.
Alfredo lança um sorriso amarelo.
Alguns minutos de silêncio depois, Daniela resolve quebrar o gelo.
DANIELA – Alice, não está gostando da comida?
ALICE – Claro que estou.
DANIELA – Pois parece que não. Está com uma cara de maracujá azedo.
Alice se enfurece.
ALICE – Agora chega! Eu não aguento mais sua petulância, sua garotinha sem educação! Você parece uma camponesa suja e mal educada, nem parece a princesa de Veseli! A família real francesa está chegando e o que vão pensar de nós? Que somos bárbaros. Um monte de abutres que não souberam nem educar a princesa do reino. E a culpa é sua, Augusto! Você não pôs limites à sua filha! Depois que a mamãezinha dela morreu você só soube mimá-la.
AUGUSTO – Alice, você está passando de todos os limites!
ALICE – Por quê? Só porque estou falando a verdade? Abre o olho! Daniela não é mais uma órfãzinha desamparada. Você tem 21 anos, garota. Já deveria ter se conformado que eu sou a nova rainha. Eu! A sua mamãezinha se foi. Morreu!
Daniela dá um belo tapa na cara de Alice.
Alice cai no chão.
ALICE – (levantando-se) Você vai se arrepender de ter feito isso. Vai levar a surra que seu pai deveria ter te dado há muito tempo.
E devolve o tapa, com mais força.
AUGUSTO – Alice, para!
ALICE – Não! Essa princesinha vai ter o que merece. (estapeia Daniela sem parar)
Augusto consegue conter Alice, que parece uma leoa enfurecida.
Morgana está assistindo essa cena toda e comenta.
MORGANA – (falando baixinho) Essa é a finesse da família real veselina. Minha vila de ciganos é muito mais civilizada que esse castelo.
CENA 2. MAR DO NORTE. NOITE
A viagem da Corte francesa continua, a passos de tartaruga.
CARLOTA – Eu não aguento mais esse enjoo. Capitão, eu quero dar uma pausa.
MARINHEIRO – Majestade, estamos no mar. Não tem como parar.
CARLOTA – Que droga! Quem teve essa ideia de que se pode viajar pelo mar? A minha carruagem é muito mais confortável e tranquila. Enquanto eu sofro aqui nesse balanço infernal, olha só o imprestável do meu filho. Dormindo como um anjo. Como pode? Aliás está todo mundo dormindo nesse barco, só eu acordada? Não pode. (pega uma panela e bate) Acoooooooorda!!! Acorda todo mundo!!
Os criados acordam, sonolentos. Rogério acorda assustado.
ROGÉRIO – O que foi? Invadiram, invadiram??
CARLOTA – Invadiram minha paciência! Isso é uma injustiça, todo mundo dormindo e só eu acordada!
ROGÉRIO – Mas por que você não está dormindo, mamãe?
CARLOTA – Esse balança balança está me matando. Maldita hora que tivemos essa ideia de virmos a esse fim de mundo chamado Veseli.
ROGÉRIO – A senhora sabe muito bem o motivo. Não podemos perder essa chance. Tenho que me casar com a princesa de Veseli. Vai ser um grande negócio para nós.
CARLOTA – Isso se você aguentar essa tal de princesa Daniela. Dizem que ela é uma selvagem.
ROGÉRIO – Comigo ela entrará nos eixos Pode escrever.
CENA 3.
Amanhece em Veseli.
CENA 4. IGREJA. JARDIM. DIA
Ramiro não tinha emprego fixo. Trabalhava de jardineiro e ia à casa de quem contratasse seus serviços. Hoje ele estava trabalhando nos jardins da igreja. Padre Luiz estava no pé dele.
LUIZ – Eu quero um serviço decente, Ramiro. Lembre-se de que essa é a casa de Deus.
RAMIRO – Eu sei, caramba.
LUIZ – E olha o vocabulário!
Nesse momento, o padre avista Guilhermina chegando com uma cesta de piquenique.
LUIZ – Olha lá, a jovem Guilhermina vem vindo. E trazendo quitutes. Não sabia que ela era boa na cozinha.
RAMIRO – Nem eu.
LUIZ – E por que você deveria saber?
RAMIRO – Porque estamos noivos.
LUIZ – Mesmo? Por que ninguém me contou?
RAMIRO – Porque ninguém é mexeriqueiro igual o senhor!
LUIZ – Ora, me respeite. Todos sabem que não gosto de saber da vida de ninguém. Mas como padre eu preciso para ajudar as pessoas a seguirem o caminho.
RAMIRO – (resmungando, sem que o padre escute) Sei. Esse padre gosta é de uma boa fofoca.
LUIZ – (para Guilhermina, que chegou) Olá, jovem Guilhermina. Veio me fazer uma visita.
GUILHERMINA – Hoje não, padre Luiz. Mas você também pode experimentar os bolinhos de chuva que fiz para o meu noivinho amado.
LUIZ – Ora, eu experimento sim, com prazer!
RAMIRO – Espere! Eu sou o noivo e ela fez os bolinhos para mim. Eu devo comer primeiro!
LUIZ – Então vá logo, seu resmungão.
Ramiro pega três bolinhos de uma vez e coloca tudo na boca. Cospe logo em seguida.
RAMIRO – Mas o que é isso? Você está tentando me envenenar?
GUILHERMINA – (sem entender) Mas o que foi que eu fiz?
RAMIRO – Não prova as comidas antes de dar para os outros? Você é burra ou o quê?
LUIZ – Não fale assim com a moça, seu troglodita. Isso não pode estar tão ruim assim.
Padre Luiz pega um bolinho e come cuidadosamente.
LUIZ – Ai meu Deus!
GUILHERMINA – Até o senhor, padre?
LUIZ – Você trocou o açúcar pelo sal, minha filha.
Guilhermina prova um e constata: é verdade. Os bolinhos estão um poço de sal.
GUILHERMINA – Eu não sei fazer nada direito!
E sai chorando.
Padre Luiz olha feio para Ramiro.
RAMIRO – O que foi?
LUIZ – Não se fala assim com uma moça. Muito menos com a moça a qual você vai se casar.
RAMIRO – Uma mulher que não sabe nem cozinhar não serve pra nada.
CENA 5. RUA DO POVOADO. DIA
Aos poucos a rua do povoado de Veseli vai ficando vazia. Os homens saem para o trabalho, a maioria na plantação de flores. As mulheres ficam em casa e já estão preparando o almoço. Maria era para estar no trabalho na sapataria, mas inventou uma desculpa de que estava doente e faltou ao dia de trabalho. Estava na janela observando a rua.
Odete estava preparando o almoço quando percebeu que acabou o sal. Normalmente ela pediria um pouco emprestado a Madalena. Mas como as duas não se falaram desde o barraco envolvendo os filhos Alexandre e Maria, ela resolveu ir comprar no mercado.
MARIA – É a minha chance. Preciso descobrir onde está.
Maria esperou Odete cruzar a rua inteira para entrar na sua casa, pela janela.
A casa, como ela esperava, estava vazia.
MARIA – Perfeito.
Ela entra no quarto de Odete e Feliciano. Revira tudo.
MARIA – Isso tem que estar aqui em algum lugar. Não é possível.
Nesse momento, Odete percebe que esqueceu o dinheiro e volta para buscar. Maria está a toda, procurando desesperadamente o que ela buscava, agora no quarto de Alexandre. Uns 5 minutos depois, lá estava Odete de volta em casa. Ela acha algo estranho.
ODETE – Ué, eu deixei a janela fechada, eu tenho certeza. Deve ter sido o vento que abriu.
Odete entra em casa. Maria escuta a porta da sala se fechando e fica desesperada.
ODETE – Onde foi que eu deixei o dinheiro mesmo?
Ela vai em direção à cozinha. Neste momento Maria esbarra na estante de Alexandre e deixa um livro cair. Odete ouve. Ela fica amedrontada.
ODETE – (baixinho) Ai meu Jesus Cristo! Tem um ladrão aqui em casa. O que eu faço, o que eu faço?
Odete pega uma panela e vai em direção ao quarto de Alexandre. Maria procura desesperadamente um lugar para se esconder. Entra dentro do guarda-roupa de Alexandre.
Odete entra de supetão no quarto.
ODETE – Quem está aí? Apareça seu covarde! Eu estou armada!
E aí o guarda-roupa de Alexandre desmorona e revela uma Maria que estava escondida.
Foco na cara de surpresa de Maria e Odete.