Yeda, Mônica e Babemco. Yeda, Mônica e Babemco. Yeda, Mônica e Babemco. Uma dança pela sala, uma valsa rodada, um olhar cabisbaixo, uma decepção, um cinismo. Yeda não acredita. Mônica não sabe onde está. Babemco caga para tudo.
— Você já era criminoso quando pagava os meus estudos? — questionou Yeda.
— Eu não preciso responder isso, minha… filha — ele diz, sarcástico.
— Não me chama de filha. Eu nunca vou ser sua filha.
Uma sala de espera. Um sofá vermelho. Revistas sobre ciência. Um bebedou que fazia alguns barulhos tentando quebrar o gelo. Uma luminária embutida. Clínica Genesis.
O técnico entrou com o resultado dos exames. Ele percebeu o clima tenso e pesado do ambiente.
— Temos o resultado. Vocês querem saber agora?
— Claro! — Yeda respondeu se colocando em pé.
— Bem considerando as proporções e estatísticas genéticas…
Yeda interrompe o homem — Só fala logo se essa cara é mesmo…enfim. Deu positivo ou não??? — ela é ríspida.
— Sim, com noventa e nove por cento de…
Ela puxa o resultado das mãos do técnico e em seguida sai da sala. Mônica pede desculpas com o olhar. Babemco sorri, satisfeito.
— Parabéns? — o técnico receoso
EPISÓDIO: CASO ENCERRADO
Quando a delegada chega em seu apartamento ela simplesmente coloca tudo abaixo. Todos os sonhos, projetos e aspirações foram por água abaixo. Ela se sentia suja carregando o sangue daquele criminoso. Ninguém poderia convencê-la a aceitar aquela situação, ninguém.
Licurgo até tentou conversar, mas, na frequência de revolta e loucura em que Yeda estava, era impossível buscar uma solução racional. Esse era o momento da explosão emocional e do desespero. E só tinha um jeito dela resolver isso. Acabando com a carreira.
Pela manhã, Yeda chega no Gabinete do Delegado Geral, e protocola o seu pedido de demissão. Ela preenche o relatório e precisa entregar para o doutor Diógenes, que agora ela sabe não ser seu pai.
Yeda entra na sala e vai em direção à mesa do homem. Ele está fumando um cigarro e observa a filha de maneira paternal.
Ela deixa o pedido de demissão sobre a mesa e retira o distintivo e a arma, entregando para o Delegado Geral.
— Você sabe que isso é um erro — ele afirma, cauteloso.
— Eu consigo conviver e assumir as consequências dos meus erros.
— Você conquistou a polícia com sua inteligência e força. Foi o seu suor que fez isso — ele diz, apontando para o distintivo.
— Alguém enxugava o meu suor enquanto eu estudava. E sem essa ajuda, eu não conseguiria. Mas, essa ajuda é suja e poluída, e eu não quero sujar minhas mãos.
— Eu conheço sua retidão. Mas, essa não é a hora para moralismo.
— Toda hora é hora para moralismo. Moralismo, como você diz, não é uma questão de tempo, mas uma questão de comportamento. Eu sou ética e isso não depende de tempo e circunstância.
— Você vai se arrepender.
— Não vou não.
Quando está prestes a deixar a sala do pai, o delegado Humberto aparece e fica diante de Yeda.
— Doutora Yeda. Você precisa pensar sobre essa decisão — diz Humberto.
— Eu já pensei. Sai da minha frente.
— E o caso Helena Melo? Ninguém é tão competente quanto você para resolver. Nós precisamos da sua ajuda.
— Eu não posso mais ajudar como delegada. Agora sai da minha frente, doutor Humberto — ela declara, decidida.
Humberto abre espaço e Yeda sai da sala. Ela não vai voltar atrás.
Nada. Babemco não quer nada. Seminu, vestindo um pijama de seda importado do Egito, ele baila pela oficina nos fundos da mansão. Em um som, Elvis Presley. No ar, fumaça de charuto. O cheiro de whiski e pólvora dançam pelo ambiente acompanhando Babemco em sua loucura.
O ex-CEO da Prime caminha de um lado para o outro carregando baterias velhas, fios, detonadores, ele está construindo algo.
Depois de apertar alguns parafusos, cortas cabos, e encaixar uma bateria velha, ele enche uma caixa de pólvora, depois liga dois fios que faíscam com energia e pronto! Sua obra está quase completa.
Dentro de uma caixa transparente, ele leva sua obra até o quintal e ordena que todos os funcionários se retirem do jardim.
Babemco puxa um cabo que está ligado a um detonador e vai se afastando aos poucos. Quando está uns dez metros distante do projeto, ele aperta o dispositivo, aguardando a grande explosão. Mas, nada acontece.
— Desgraça!
Apenas uma fumaça branca sobe de toda aquela parafernalha. O home retorna e leva a caixa de volta para a oficina.
— O que deu errado?
O capanga de Babemco vem se aproximando lentamente. Capeto está velho, cansado e curvado. Mas, ele é astuto e reconhece que o chefe não está bem.
O velhote entra na oficina e encara Babemco.
— No que está trabalhando? — pergunta Capeto, retirando um maço de cigarro do bolso.
— Construindo alguns artefatos.
— Eu até gosto de não ter tanto trabalho assim. Passo os dias com a minha neta. Jogo conversa fora com velhos amigos. Mas, até quando você vai ficar nessa, Babemco? Esse não é o seu estilo de vida. Você é o cara da ação, do pensamento rápido, da estratégia. O que tá acontecendo?
Babemco está segurando um alicate, mas, para para responder ao homem.
— Só me dá um tempo.
— Quanto tempo?
— Você acha que eu deveria ter falado com a Yeda antes? Ela não gosta de ser minha filha.
— Você tá mesmo preocupado com isso.
— Eu não sou um monstro, Capeto. Que merda! Eu me importo com meus filhos!
— Ela não é sua filha, droga.
Babemco dá a volta na oficina procurando um martelo.
— Filho é uma coisa séria. Sae de dentro de você — ele responde, indignado.
— Você quer o amor dela? É isso?
— Não!!! Definitivamente, não!
— Então porque a preocupação?
Babemco para e encara o nada.
— O que vai restar de mim, quando eu me for dessa terra?
Capeto sorri. — Então a questão é sobre você?
— Claro, droga! E tudo não é sobre nós nessa merda de vida?!
— De fato — concorda Capeto, dando uma baforada. — Mas, antes de pensar sobre o que você vai deixar, por que não pensar no que fazer hoje. Temos alguns passos para dar, agora.
— Não me venha com passos e essa merda toda. Eu quero descanso.
— Trouxe alguém pra falar com você.
Capeto se afasta e Logan entra em cena. Babemco fita o hacker e toma um susto.
— Mas, que merda esse desgraçado faz na minha casa? — questiona o homem, incrédulo.
Capeto se aproxima do chefe. — Calma! Esse é um momento delicado onde precisamos reunir forças contra um inimigo em comum. Aquela mulher te tirou a Prime e não devolveu as provas que tem contra você. Não é momento de relembrar velhas desavenças, mas de criar meios de vencer o oponente.
— Conversa fiada! Ele vai me apunhalar assim que tiver a oportunidade — diz Babemco, apontando para Logan.
— Eu quem deveria estar ressentido. Foi você que me apunhalou, seu traidor, oportunista! — devolve Logan.
Capeto se coloca no meio dos dois. — Vamos ser lógicos aqui. Babemco quer a empresa novamente e Logan também. Mas, a Prime está nas mãos daquela idiota. Esse é o momento que o destino preparou para que vocês pudessem trabalhar juntos e derrotar Jade. Vocês não enxergam?
— Não! — avisa Babemco.
Logan olha para Capeto e diz: — Eu te avisei que não daria certo. Foi boa a intenção, mas esse ai só pensa nele.
— Ainda bem que você sabe disso.
Logan dá meia-volta e sai da oficina. Capeto bufa, decepcionado. Babemco volta a cuidar de suas engrenagens.
O San Marino Hotel continua deslumbrante. Sua cobertura abriga um dos melhores restaurantes da cidade. E, naquela tarde, Bruno havia reservado o espaço somente para si e os seus convidados.
Quando deu treze horas, ele olhou rapidamente o relógio e aguardou seu principal convidado. Não esperou muito até que Babemco entrou no ambiente vestindo um terno cinza. Ele estava neutro, não queria mais desavenças.
Os dois sentaram e tomaram vinho. Babemco acendeu o seu charuto e pacientemente aguardou que o advogado tomasse a iniciativa. Porém, Bruno parecia nervoso, não falou muito, tomou mais um gole do vinho branco e pediu whisky. A tarde só estava começando.
— O que você quer? — deu início Babemco.
— Quero que você reaja!
— Inocente.
— Eu achei que você fosse montar um plano e se vingar da Jade.
— Pensou?
Bruno toma mais um gole da bebida. — Não posso esperar.
— Ainda bem que não — Babemco fala, levantando as mãos para o alto.
— Você vai ser candidato da oposição. Vai enfrentar a Jade nas urnas. Amanhã sua candidatura vai ser publicada nos principais meios de notícias.
Babemco gargalha, enquanto dá mais uma tragada em seu charuto.
— Só pode ser castigo.
— E, daqui a quinze dias vai ter o debate no canal 10. Você vai enfrentar a Jade e destruir ela em público, novamente — Bruno diz, em um tom neutro, sem expressar nenhuma emoção.
— Sua amiga não deve tá sabendo dessa sua jogada, não é?
— Não, ela não sabe de nada. Ela só vai saber quando eu permitir. E, lembre-se, as imagens de você matando Helena estão nas minhas mãos. Eu controlo tudo.
Babemco toma um gole do vinho e sorri para Bruno.
— Tem certeza que você quer que eu faça isso?
— Eu sei o que eu quero, e, sim, eu tenho certeza — responde o advogado.
Babemco observa a cidade pela janela do seu carro. Algumas gotas de chuva escorrem pela vidro. Ele está distante, sério e sem reação. Não sabe o que pensar e simplesmente não deseja nada. A apatia tomou de conta.
O bar é fétido e escuro. Algumas luzes amarelas iluminam as mesas do fundo. Capeto fuma um cigarro e come amendoins. Logan está de cabeça baixa tentando resolver um enigma em uma revista velha. Babemco chega e senta no meio dos dois.
— Nós temos um sério problema — anuncia Babemco.
— Então você conseguiu enxergar? — incita Logan.
— Você é podre — rebate o magnata.
— Parem com isso e vamos para o que importa — decreta o velho Capeto.
— O Bruno quer que eu seja candidato da oposição. Quer que eu concorra à vaga na prefeitura. No fundo ele também está contra a Jade.
— E, por que não negociamos com ele? — questiona o hacker.
— Ele tem sua agenda própria. Não quer nada conosco.
— É por isso que você me procurou?
— Podemos trabalhar juntos, desde que você tire o advogado do meu caminho — propõe Babemco.
Logan sorri, satisfeito.
— Isso vai ser a coisa mais fácil do mundo — diz Logan. — Eu vou hackear aquele desgraçado e acabar com a vida dele. Vamos por a Jade contra ele e minar as forças dele.
Babemco estende a mão para o hacker.— Temos um acordo?
— Temos um acordo!
Capeto sorri com a aliança dos inimigos
Os velhos amigos continuam a se perdoar e se reconhecer. Um perdeu a empresa, o outro a esposa. Um perdeu a dignidade, o outro a noção da realidade. Logan e Babemco: duas faces da mesma moeda.
O bar é o lugar do recomeço. Fumaça, cerveja barata, piadas machistas e gargalhadas barulhentas. Os três homens entram em uma espiral de total despreendimento. Como se fora aberto um lugar à parte na noção de espaço e tempo. Ali eram somente três velhos amigos que relembravam do passado e enchiam a cara, até que, Bruno entrou no lugar.
O advogado marchava calmo e inexpressivo em direção à mesa em que os três estavam. Babemco foi o primeiro a perceber.
— Mas, olha só quem veio nos fazer uma visita… — brincou Babemco, já embriagado.
Logan endireitou a postura como se preparando para o combate. Capeto terminou de tomar sua cerveja e fechou a expressão. “Não vinha coisa boa por aí”, pensava.
— Como vocês são previsíveis — Bruno, sarcástico.
— E você é um moleque prepotente. O que você sabe da vida seu filhadaputinha? — Logan, questionou indo para cima de Bruno.
— Pelo visto não dá pra aprender nada com um velho fracassado que volta pro amigo traidor. Você é ingênuo, Logan. E sai de perto de mim, senão te coloco na cadeia em dois tempos seu agressor de mulheres.
Logan preparou um soco, mas, foi contido pelo velho Capeto que tomou à frente. — Nós até te convidaríamos para sentar, mas, pelo visto você deve estar apressado. Qual o recado? — questionou Capeto.
— Me hackear? É esse o plano de vocês? Pedir ajuda de um idiota como o Logan? Sério, Babemco? Você achou que me pegaria nessa? — Bruno diz, sorrindo.
Marcelo entra e se coloca ao lado do advogado. Ele está confiante e as roupas sugerem um banho de loja recente.
— O recurso que você tinha, Babemco, eu tenho em dobro. Quando você pensar em dar um passo. Imagine que eu estou dois passos à frente. Eu planejo essa vingança há muito tempo.
Babemco somente observa, sem conseguir reagir.
— Você está nas minhas mãos agora, e não adianta espernear. Amanhã, você será o meu candidato e vai debater com a Jade na TV. Eu vou escrever seu script e você vai fazer tudo que eu disser, entendeu? — Bruno, ameaçador.
— O que eu posso fazer?
Bruno dá meia volta e sai do local. Os três homens observam sem dizer uma palavra. Mas, o ódio era palpável sobre a mesa.
— Ele está me hackeando — concluiu Babemco.
— Ele deve ter nos grampeado — disse Logan.
— Vamos limpar tudo. Esse desgraçado precisa parar — Capeto disse, destilando ódio.
O sol está à pino quando a praça Portugal é tomada por uma multidão. Bandeiras, cartazes, jingle, santinhos com a rosto de Jade estampado. Ela é a candidata com mais apoio popular, a que tem mais intenção de votos e com maiores chances de vitória. O povo aplaude e grita em euforia quando Jade aparece para discursar. Ela está tremendo, mas entende que precisa representar um ideal, uma aspiração, uma voz. E, esse é o principal papel dela no momento. Ser representante do povo lutar por eles.
— Eu vou vencer, mas não como uma conquista pessoal, mas sim, como resultado do esforço, da união e do poder do povo. Ser prefeita é o reflexo do poder que vocês têm e que me deram. Lutar por melhorias é o mínimo que eu possa fazer. Estou disposta a doar minha vida em prol dos seus benefícios e faria isso em qualquer circunstância como gratidão pela confiança em mim depositada. Eu sou o povo e sou do povo, trabalhando para o povo. Não contem comigo, mas trabalhem comigo para trazer a vitória do povo em todos os lugares e em qualquer situação. Juntos nós já somos vitoriosos! — Jade declara, empolgada.
O povo grita em completo loucura e excitação. A praça é tomada por uma energia cega, feroz e avassaladora. De fato, se a vitória não for de Jade, não será de mais ninguém. Ela tem a prefeitura nas mãos.
Porém, a euforia cessa e a empolgação acaba, quando um grupo de aproximadamente cem pessoas invade a praça Portugal. É a oposição que carrega bandeiras e cartazes com a foto estampada de Babemco. Sim, ele é o candidato da oposição. Sim, Jade fica supresa e assustada. Isso não pode ser possível.
— Ele está se aproximando — Bruno diz, ao pé do ouvido de Jade.
— Quem? — ela pergunta.
— Babemco. O nosso maior problema.
Jade o avista de longe. Ele caminha entre o povo sendo adorado como um deus. Com um terno amarelo, o homem caminha confiante e com um sorriso cínico sobe em outro palco e aguarda a montagem do som. É uma verdadeira guerra pública.
Os apoiadores de Jade entram em luta corporal contra a multidão que apoia Babemco, é um verdadeiro tumulto. A polícia é acionada. Cacetetes e spray de pimenta. O povo se dispersa. O alvoroço tem fim.
Ao chegar na sede do partido Gerard vai ao encontro de Jade.
— O que foi aquilo? — ela questiona preocupada.
— O Babemco tornou-se candidato da oposição.
Bruno levanta e com prazer acrescenta: — E ele foi convidado para o debate no Programa do Dial. Temos que estar preparados.
Jade automaticamente fica apreensiva. Enfrentar o Babemco mais uma vez em rede nacional. Ela não tem boas lembranças sobre isso.
Apartamento de Yeda. Tarde ensolarada. Clima abafado. A mulher digita algo em seu notebook quando Licurgo se aproxima.
Ele senta em uma poltrona e admira a mulher em seu ofício. Ela percebe o contato e para o que está fazendo.
— O que foi? — Yeda pergunta.
Licurgo sorri.
— Nada!
— Fala logo!
— Não tem nada pra falar.
— Eu sei o que você tá pensando — ela declara.
— Essa eu quero saber.
— Você não concorda com a minha demissão.
Ele fica sério e se inclina para frente pondo os antebraços sobre as pernas.
— Não concordo. Acho que você deveria continuar trabalhando. Você é muito boa no que faz. E, entrou na polícia estudando bastante, não foi?
— Sim. Estudei muito.
— Seria jogar uma vida fora. Uma carreira. Um sonho.
— Eu não posso voltar atrás. Não conseguiria conviver com a ideia de que o crime financiou meus estudos.
— Você conseguiria sacrificar a vida de uma pessoa para salvar uma multidão?
— Claro que não.
— Mas, eu tenho certeza que você se sacrificaria para salvar uma vida. Você entregaria sua vida para salvar uma multidão. Será que não vale a pena enfrentar esse dilema pra salvar outras vidas?
Yeda fechou a tela do computador e levantou pensativa. Em seguida, saiu do apartamento, deixando Licurgo sozinho.
Jade vai até até o edifício Plaza falar com Brutus, ela tem que saber do paradeiro do seu filho. Ao chegar no escritório, a mulher se depara com meia dúzia de hackers e Brutus que vem ao seu encontro.
— Onde está todo mundo?
— Foram embora. A missão acabou quando você assumiu a Prime. Muitos se sentiram traídos. Foi como se você tivesse se vendido para a empresa — ele explicou.
— Nada disso aconteceu.
— Eu sei.
Jade está impaciente.
— Você tem norícias da garota que está com meu filho?
— Ainda não.
— E sobre as fotos? Pegou alguém nas câmeras? Qual a origem daquelas fotos?
— Eu tô tentando quebrar os códigos e descobrir a origem. Parece que quem fez isso sabia que nós iríamos hackear.
— E, o desgraçado do Marcelo, já sabe onde ele está? Com certeza ele está por trás disso.
— Ainda não o encontrei. Mas, pode ter certeza que assim que eu o encontrar, vou acabar com a raça dele.
Depois da reunião com Jade, Brutus vai até a casa da mãe de Marcelo e aguarda o hacker. Depois de meia-hora, Marcelo chega e é surpreendido pela visita do ex-amigo.
— Que bom te encontrar, Marcelo. Precisamos conversar — Brutus diz, carregando Marcelo pelo braço até a calçada.
— Me solta!
— Que merda você fez, seu idiota! Eu confiei em você e cê faz uma merda dessas?! — ralha Brutus.
— A questão é o dinheiro, seu merda! Vocês não me pagam bem, como estou sendo pago agora!
— Quem tá te financiando, Marcelo? Diz logo! Quem tá por trás dessa sujeira toda?
Marcelo se desvencilha de Brutus e o enfrenta sem medo.
— Sai de perto de mim, senão você e toda sua familía vão sofrer as consequências.
— Eu não tenho medo das suas ameaças.
— Deveria ter.
Brutus declara determinado: — Fique sabendo que eu vou descobrir quem está por trás de tudo isso! E, aí eu quero ver como você vai sobreviver sem sua mesada, seu idiota!
Brutus se afasta deixando Marcelo preocupado.
Bruno toma um susto quando a campainha do seu apartamento toca. O advogado abre a porta e se surpreende com a presença de Jade.
Ela usa um blusão preto e está envolta em uma névoa de opressão e raiva. É visível a amargura em seu olhar.
O advogado tenta ser o mais amistoso possível, mas por dentro a vontade é de empurrá-la da sua varanda. É a última coisa que ele quer naquela noite: ouvir lamentos de Jade.
— O que houve? — ele pergunta, desinteressado.
Ela está apática e determinada.
— Você tava sabendo sobre o Babemco?
— Eu fiquei sabendo alguns minutos antes de você. Foi uma surpresa para mim também.
— Ele não desiste, né? Sempre no meu caminho, sempre em busca de me atingir. O que você acha que ele quer? Ser prefeito não é o objetivo. Ele só quer estar em oposição. Só quer ser um empecilho. Ele sabe que não tem chances de ganhar.
Bruno parece desconfiado. “Será que ela descobriu algo sobre ele?”, pensa com medo.
— Ele tá ficando maluco. Só vai gastar o pouco dinheiro que lhe resta.
— Huum, você acha que ele é maluco?
— Olha, Jade, eu não sei bem o que ele quer. Só sei que você não precisa se preocupar tanto. Essa vaga na Prefeitura já é sua. Não tem o que temer.
— Você acha mesmo? E o debate. Já é próxima semana. Ele vai estar lá novamente. Vai querer me detonar.
— Nós vamos estar prontos para tudo. Não esquenta.
— Verdade. É só me preparar e tudo vai dar certo — ela diz, olhando para longe, refletindo em mil coisas.
Bruno aguarda em silêncio na esperança da mulher encerrar aquele papo estranho.
— Eu andei pensando em algo — Jade fala, encarando o advogado.
Ele toma um susto. Se prepara para ser desmascarado.
— Dá pra evitar o Babemco dando uma de louco e tentando atrapalhar a minha candidatura. Sem falar que eu não quero ter que vê-lo no debate. Não me sinto pronta pra encarar aquele assassino. Na verdade, eu acho que agora é o momento de acabar com ele de uma vez. A Prime é minha, vou ser prefeita e Babemco não está com meu filho, então, por que mantê-lo livre quando podemos colocar ele atrás das grades?
— Muitca calma…
— Não, amigo. Essa não é hora pra ter calma. Estou sendo paciente demais, agora quero agir e acabar com o mal pela raíz. Onde estão as imagens do Babemco assassinando a Helena. Preciso desse arquivo imediatamente.
— Calma, Jade, o que você vai fazer?
— O que você acha? Eu vou na Polícia Federeal, na CIA, no diaboaquatro denunciar esse assassino filho da puta! Eu quero Babemco apodrecendo atrás das grades. Esse é o lugar dele. Lixo!
— Você não tá pensando bem!
— Vamo lá! Me devolve o arquivo, agora, Bruno!
O advogado se coloca firme diante de Jade.
— NÃO!
Ela olha surpresa para a reação dele.
— Com assim, não?
Ele tenta suavizar: — Não é o momento certo, ainda!
— Esse é o momento certo sim. E não interessa o que você pensa. Os arquivos são meus e quero agora! — ela exige.
— Não, Jade! Você não tá bem. Desde que você entrou aqui, eu percebi que você não tá no seu normal. Você não vai agir por impulso. Eu não vou te entregar o pendrive.
Jade caminha em direção ao escritório dele onde está o cofre.
— Abre a merda do cofre e me entrega o pendrive, agora Bruno! Eu não vou pedir novamente! — ela grita, enquanto esperneia nos braços dele.
— Você não sabe com quem o Cícero está. Pode ser algum cumplíce do Babemco. Nós ainda podemos ameaçá-lo enquanto estivermos com as imagens!
— Não importa! Eu não vou enfrentar esse desgraçado no debate, e eu quero que todo mundo saiba o assassino que ele é! Nós temos que entregar isso pra polícia!
— Não, não e não! — Bruno, enfático.
Jade se coloca contra o advogado.
— Então se prepare para me enfrentar também, seu idiota! — ela diz, cara a cara com o advogado.
— É sempre assim que você age com os amigos?
Jade dá as costas e sai do apartamento. Clima tenso no ar.
Jade dirige determinada até o apartamento de Yeda, aperta a campainha insistentemente e não consegue segurar a ansiedade ao bater na porta sem controle.
Licurgo lhe recebe com um ar de curiosidade.
— Boa noite! — ele diz, com uma calma relaxada.
— Eu preciso falar com a delegada! — Jade fala, esbaforida.
— Eu vou chamá-la. Senta ai, por favor.
O fazendeiro vai em direção da cozinha e prepara um chá. Em seguida, ele entrega a xícara para Jade.
Licurgo volta para o quintal onde se encontra um verdadeiro jardim. São vários jarros com plantas e flores diversos. O lugar é lindo. E, ele cuida de tudo com muito carinho.
— Me ajuda, por favor — ele pede, entregando uma tesoura para Jade.
A mulher deixa a xícara sobre a mesa de centro e vai ao encontro do fazendeiro.
— Eu não tive a oportunidade de te parabenizar pela conquista com a Prime e com a prefeitura. Fique muito feliz em saber que você conseguiu.
Ela sorri. — Obrigada. E eu não tive a oportunidade de te agradecer por me convencer a aceitar o desafio. Então, você tem participação em tudo isso.
Uma planta específica tem vários ramos que se interligam em uma verdadeira bola de lã. Licurgo segura alguns ramos enquanto pede que Jade corte um galho específico.
— Você precisa ter cuidado. Esses galhos têm espinhos — ele avisa.
— Logo eu? — ela se aproxima e suas mãos começam a tremer.
— Calma. É preciso exercitar a leveza e a serenidade. É o momento certo pra acalmar a alma.
Jade tenta cortar o galho sem perfurar a mão nos espinhos, mas, quanto mais tenta ser suave, mais suas mãos tremem de nervoso.
— Eu não consigo! — ela entrega a tesoura para ele.
— Um dia você vai conseguir — ele sorri.
— Onde está a delegada?
— Ela não está bem, Jade.
— É por conta da história do Babemco?
— Também.
Jade vai devagarzinho e entra no quarto de Yeda. A mulher está sentada olhando a rua pela janela.
— Podemos conversar — Jade incita.
Yeda olha para a mulher. Seu olhar é triste e vazio.
— Eu não tô pra papo.
Jade vai até ela e agarrando sua mão leva a mulher para fora do quarto.
— Que é isso? O que você tá fazendo? — Yeda se questiona.
— Vou te levar num lugar. Você vai gostar — Jade fala, tentando se animar.
As duas saem do apartamento e deixam Licurgo curioso. Pra onde será que elas vão?
Luzes de todas as cores. Música eletrônica. Gente jovem dançando. Bebidas, drogas e beijo na boca. A boate está lotada e a música é tão alta que é impossível ouvir alguém falando. Mesmo assim, Yeda se esforça pra entender a resposta de Jade.
— Por que estamos aqui?
— Se solta! Nós estamos precisando — Jade grita em meio à pancada eletrônica.
Yeda olha para Jade dançando desajeitada. Ela sente vontade de rir com a cena. Jade se joga na pista parecendo uma louca. Ela precisa expurgar os demônios do medo, da angustia e da frustração. A música sobe o volume e Jade aproveita para gritar o máximo que pode. Ela grita com todas as forças do seu ser. Ela quer tirar algo de dentro do peito através do grito e assim faz.
Yeda vai na onda e começa a gritar também. As duas parecem alucinadas no meio do salão. Todos ao redor parecem gritar algo reprimido também. Todos os gritos se unem e explodem em um vulcão de energia e bem-estar.
As duas se recolhem no bar.
— Isso é loucura! — Yeda grita.
— Eu sei!
Jade toma um gole de uma bebida e oferece o copo para Yeda.
— Tá melhor?
Yeda assente com a cabeça, enquanto limpa o canto da boca.
— Fazia tempos que eu não vinha pra um lugar assim — relata a ex-delegada.
— Quando eu tô muito mal, eu venho pra cá. Dou uns gritos e tudo melhora.
— É meio louco.
— É, mas funciona.
A música e a dança continuam como um pano de fundo. As mulheres agora estão no foco e no centro. Tudo que importa agora é sobre elas.
— Você sabe que não importa.
— O quê? — Yeda pergunta.
— Não importa você ser filha dele.
— O sangue dele corre nas minhas veias — ela mostra o antebraço.
— E daí?
— Ele é corrupto, é um homem ruim.
— Você acha que o que conta não é o caráter. E caráter não tem a ver com genética, mas com escolhas, com comportamento. Você não tem o mesmo caráter que ele. Você é melhor.
— Eu sei…
— Nós não escolhemos os nossos pais. Mas, a partir do momento que temos consciência de quem somos, podemos escolher como viveremos, quais nossos princípios e quem queremos ser de verdade. O Babemco não pode tirar essa escolha de você.
Yeda abraça Jade. As duas ficam assim por um bom tempo.
— Agora, eu preciso da sua ajuda — declara Jade, receosa.
— O que houve? — Yeda preocupada.
— Preciso que você me ajude a prender o Babemco.
— Como assim?
Yeda caminha a passos largos, claramente chateada, enquanto Jade vem logo atrás tentando alcançá-la.
— Espera, Yeda!
A rua está deserta. A noite de Recife parece cansada.
— Merda, Jade! Quantas vezes eu te perguntei se você tinha algo pra resolver o caso da Helena e você só negava?! Que droga! Agora você vem e me solta essa bomba?
— Eu não podia te falar das imagens. Eu tinha que garantir que o Babemco devolvesse o meu filho!
— Você tinha que ter confiado na polícia!
— É, mas não dá pra confiar nessa polícia! — grita Jade em desespero. — Você precisa me ajudar a prender o Babemco. Eu tenho as imagens dele matando Helena, Yeda, por favor!
A mulher se volta para Jade com muita raiva.
— Acontece que agora eu não posso te ajudar! Eu não sou mais delegada! E, obrigada por me dizer que o meu pai biológico também é um assassino. É um combo perfeito para uma sexta à noite! — esbraveja a ex-delegada.
— Ai que merda! Como assim você não é mais delegada?
Yeda respira, tentando voltar ao equilíbrio.
— Onde estão as imagens?
— Estão com o Bruno. Mas, ele não quer devolver.
— Ele não quer devolver? Por quê? — questiona Yeda.
As duas batem na porta insistentemente. Os vizinhos do apartamento de Bruno ficam assustados. Alguns põem a cabeça para fora tentando entender a confusão.
— Abre a merda dessa porta e vamos conversar, Bruno! — exige Yeda, aos berros.
Do outro lado da porta, Bruno responde: — Você tem algum mandado, delegada? Se não tiver pode ir embora, e se continuarem a gritar eu vou chamar a polícia.
— Você não vai escapar, Bruno! Abre essa porta e me entrega o pendrive! — Jade exige.
— Eu tô ligando pra polícia agora mesmo! — ele avisa, enquanto põe a ligação em viva voz.
Yeda encara Jade.
— Droga, Jade! Você consegue estragar qualquer coisa — ela dá a volta saindo do corredor.
— Pra onde você vai! Você tem que fazer alguma coisa. Arromba a porta! — Jade exige.
— Eu já te disse que não posso! Não sou mais delegada! E, se não sairmos daqui agora a polícia vai nos prender por importunação!
Os vizinhos reclamam do barulho. O lugar vira um espetáculo.
No edifício Plaza, Jade espreme Brutus na esperança de conseguir as imagens.
— Eu apaguei tudo! Foi você que pediu! — ele relembra.
— Eu sei, mas eu preciso do arquivo. Eu não posso chegar na polícia com as mãos vazias.
— Essa história nunca vai pra frente se não tivermos provas — avisa Yeda.
— Faz alguma coisa, Brutus! — Jade exige, em desespero.
— Infelizmente não posso recuperar aquelas imagens. Elas foram excluídas permanentemente.
— Droga! — esbraveja Jade. — Aquele idiota do Bruno vai se ver comigo!
As duas mulheres partem para o Décimo Terceiro Distrito de Polícia. A intenção é denunciar Babemco para o delegado Humberto. Ele é a última esperança para colocar o caso para frente e desmascarar o criminoso.
Ao entrarem no local, elas pedem para falar com o delegado titular que lhes recebe de prontidão.
— Em que posso ajudá-las — o delegado Humberto diz, encarando Jade e Yeda de alto a baixo.
— Nós viemos denunciar o Babemco. Temos novas informações sobre o caso Helena Melo.
— Interessante — declara Humberto.
— Eu consegui um vídeo com as imagens de Babemco atirando em Helena. É a prova concreta de que ele é o assassino dela — Yeda informa.
— Isso é sério? — ele pergunta.
— Como assim, Humberto. É claro que é sério!
— Você era a delegada titular do caso, e simplesmente jogou tudo pro alto e agora vem com uma bomba dessas. Como assim, Yeda? O que você acha que está fazendo?
— Eu tô tentando ajudar!
— Você deveria ter feito isso enquanto era delegada! Mas, o seu tempo acabou! Eu te avisei que não teria volta! Agora, essa informação é inútil. O caso foi encerrado.
— Humberto, por favor…
— O delegado Sergio tomou o caso Helena Melo e a perícia concluiu que o incêndio foi acidental. Helena morreu carbonizada — ele declara, convicto.
— Ela levou um tiro na testa — Jade fala, com raiva.
— O Sergio é cachorrinho do Babemco, como entregaram o caso pra ele? — Yeda questiona.
— O seu pai fez isso, Yeda.
— Não pode ser, Humberto. Nós precisamos fazer alguma coisa.
— Não dá. Caso encerrado, Yeda, caso encerrado.
As duas ficam estáticas percebendo que Babemco ganhou mais uma vez.