Em um quarto, no hospital. Custódio observa Giza, inconsciente, estirada na cama, já medicada.

Custódio — Eu devia ter percebido que ela não estava bem. Gisa reclamou, algumas vezes. Dizia estar muito cansada, com frio. Achei que seria cansaço da viagem, do lugar, muito frio. — Fica perturbado. — Eu não devia ter saído e deixado ela sozinha. Não sei onde estava com a cabeça quando…

Afonso interfere: — Filho, você não precisa explicar nada. Você é adulto, responsável e sabe o que fez, e nada que dizer agora vai mudar alguma coisa. Apenas cuide da sua mulher para que ela fique boa novamente. Nisso que você deve pensar agora.

Noemi — Ela vai ficar boa, filho. Vamos rezar para isso. Não se sinta culpado pelo que aconteceu, apenas cuide dela como falou seu pai.

Custódio — Vou cuidar! Vou fazer o que tiver no meu alcance.

Afonso — Voltamos à noite para vê-la como está. Nada podemos fazer ficando aqui. Qualquer sinal manda nos avisar.

Custódio balança a cabeça que sim. Afonso e Noemi vão embora. Ele volta a atenção para Giza e sente agonia. Anda de um lado a outro, apreensivo.

Enfermeira aparece na porta. — Como está sua esposa, doutor? Acabei de ficar sabendo o que aconteceu.

Custódio — Poderia ficar com ela enquanto eu não voltar? Preciso resolver um assunto e tem que ser agora. Não quero deixar para depois.

Enfermeira — Pode ir tranquilo.

Custódio — Qualquer sinal dela, chama o doutor Pedro.

Enfermeira — Sim, senhor!

Custódio, em passos largos, caminho pelo corredor do hospital. Quando entra na sala de sua casa, para diante a fotografia do pai. Ele se vê menino.

Cristovam lhe coloca de pé na diva, abaixo de outra pintura, sem ser a foto dele. — Quero lhe mostrar um segredo, que tem atrás desse quadro.

Menino — O que é segredo?

Cristovam — Algo que nunca deve contar a ninguém. Tem que guardar somente com você o nosso segredo. — Tira o quadro e coloca ao lado.

O menino fica surpreso: — O que é isso?

Cristovam — O nosso segredo! Agora, preste atenção nos números que vou lhe dizer. São bem fáceis. Você não vai ter dificuldade para decorar. Então, repita comigo.

Girando a roleta, os dois conta — Cinco… quatro… três… dois… um… Pronto, abrimos o nosso segredo.

Cristovam pega um pequeno saco de couro, dentro do baú, e despeja várias joias e pedras preciosas em cima da mesa. Fala com o filho. – Isso vale uma fortuna. — pega uma pulseira de diamante e esmeralda – Está joia, por exemplo, ela vale mais que está casa inteira.

O menino fica curioso: — Como assim?

Cristovam — Caso, um dia você precisar vender, o valor, em dinheiro, dá para comprar outra casa igual a esta e tudo que tem dentro, ainda sobra muito dinheiro.

O menino pega a joia e observa.

Cristovam — Agora vamos guardar o nosso segredo. Meu e seu! Ninguém precisa saber que ele existe. Entendeu?

Menino faz sim, com a cabeça.

Cristovam — Repete comigo, e vamos fechar juntos o nosso segredo. São os menos números de trás para frente. Há! E tem outra detalhe que você precisa saber… Nunca mexa no nosso segredo. Faça isso, somente, no dia, em que realmente precisar. Tem que ser um bom motivo muito especial!

Juntos fecham o cofre.

Cristovam — Agora tente abrir sozinho para ver se aprendeu.

Custódio, deixando as lembranças de lado, começa abrir o cofre, como se ouvisse, ele, ainda menino, repedindo os números ditos pelo pai.

Ele pega o saco de couro, despeja parte, nas mãos, e fala, atento a foto de Cristovam. — Isso é mais que um caso especial, pai. Perdoe-me por ser dessa maneira. — Devolve tudo no saco de couro. Coloca a foto do pai no lugar, e sai pela porta da frente.

Raquel, deitada na cama, se assusta com a porta se abrindo de vez. — Doutor?

Custódio balança o saco, e joga as joias e diamantes, em cima dela. — É isso que você quer? Pois, pode ficar com uma parte da herança que meu pai me deixou. Pegue tudo e desapareça do meu caminho. — aponta ela, e bufa com ira. — Nunca mais, quero vê-la na minha frente.

Raquel, paralisada, fica sem entender o gesto dele.

Custódio começa jogar tudo pelo chão, procurando algo.

Raquel se coloca de pé, e segura ele: — Pare com isso, o que está fazendo? O que está procurando?

Custódio empurra-a com força para trás. — Solte-me demônio. Afasta-se de mim.

Raquel, sem esperar, cai bruscamente para trás, ele ainda grita: — Não vou deixar que faça da minha vida um inferno. E que maldita droga você colocou na minha bebida?

Raquel, no chão, em prantos, nada responde. Ele a segura bruscamente: — Responda a minha pergunta. O que foi que você colocou na minha bebida?

Raquel, quase sem voz — Não bebemos nada.

Custódio se afasta, ao se lembrar ter entregue a garrafa de vinho para Beto. — Meu Deus, o que fiz?! — E pega nela para ajudar a se levantar.

Raquel se encolhe, em pânico: — Não toque em mim! Pegue suas joias e vá embora daqui. Eu que não quero vê-lo nunca mais.

Custódio vê Estela, e outra mocinha, de pé na soleira. Elas assista a cena. Envergonhado ele saiu quase correndo, passando pelas duas, que lhe dão passagem.

Estela abraça Raquel, que chora descontrolada. — Desculpe, minha amiga, desculpa? Eu não devia ter avisado você ontem, que ele estava lhe procurando. A culpa foi minha, eu devia ter deixado o doutor ir embora, depois que ele falou com o Beto.

A mocinha começa pegar as joias em cima da cama, e esconder entre a roupa.

Estela voa em cima dela: — Dê-me as joias que você pegou.

Mocinha não se move. Estela grita: — Devolva todas as joias que você pegou, se não quiser que eu arranque seus cabelos.

A mocinha tira do meio dos seios uma, e coloca na mão de Estela. — Todas as que você pegou!

A mocinha tira outras, entre a roupa, e entrega-as.

Estela — Espero que não tenha ficado com nenhuma. — e torna berrar. — Agora desapareça daqui.

Mocinha corre. Estela coloca todas, dentro do saco, e fala com Raquel, ainda no chão, chorando. — Raquel, pegue essas joias e vá embora daqui.

Raquel não se manifesta.

Estela insiste — Para de chorar e me escute. Vá embora daqui. Vá viver a sua vida longe deste lugar. O doutor não merece você, que seria a última pessoa que ele deveria culpar pelo que está acontecendo com a mulher dele. Então, vá recomeçar sua vida longe desta casa. Longe do doutor. Longe do Beto, e faça isso agora, antes que ele chega e não deixe você sair. Você acabou de receber a chance de mudar a sua vida para sempre. Essas joias valem uma fortuna.

Raquel — Eu não quero nada que venha daquele homem. E eu sabia! Eu sabia, desde o início, que ele só ia me fazer sofrer.

Estela — Raquel, não me faça se sentir culpada, por favor. E o que você vai ganhar ficando nesta casa? Então, deixe de ser burra. Não desperdice a chance que acabou de receber. O Beto está louco da vida com você e com o doutor, por terem passado a noite juntos. E essas joias não vão fazer falta para o doutor, mas para você vai, e muito! Se você souber vendê-las, a quem vendê-las, nunca mais vai passar dificuldade na vida. Agora levante, e vai embora daqui. Venha, eu acompanho você até a porta.

Estela puxa ela pela mão. Quando ameaçam descer à escada, Beto entra pela porta da frente. Estela volta rápido, sem que Beto perceba, e entram no quarto dele, abre as portas do armário, e a porta da passagem secreta.

Raquel fica surpresa — O que é isso?

Estela — Uma passagem que vai dar no outro lado da rua. Passei por ela ontem, quando avisei você que o doutor estava aqui. Eu a coloquei nisso, Raquel, e vou ajudar a sair. Lembra do fantasma? Ele passou por esta passagem. Foi o Beto. Eu vi quando ele entrou pela porta da frente, naquele dia, assim que subi a escada com Augustinho. Minutos antes, Beto estava no salão.

Raquel — Não consigo acreditar ser ele. Estela você se enganou aquele dia quando…

Estela toma a frente — O Beto não vai deixar você em paz, se ficar aqui. Ele não queria perder você para o doutor. Ficou a noite inteira se remoendo de ciúmes, inveja e raiva. E você tem duas opções. Ficar nesta casa o resto da sua vida e ser obrigada fazer o que ele quiser, ou, ir embora de cabeça erguida, sem medo de recomeçar, longe dele e do irmão. Nenhum dos dois merece você.

Raquel ergue a cabeça, seca o rosto. — Então vamos embora daqui comigo. Eu sei que você veio parar neste lugar por acaso. É a sua chance também. – pega-a pelo braço. — Vamos, embora?

Estela — Não, Raquel! Não posso ir. O Beto sabe onde você mora, eu vou tentar segurá-lo até que você esteja longe.

Raquel — Você pode se dar mal, Estela. Eu sei que pode.

Estela — Não se preocupe comigo, eu não tenho medo do perigo. E se eu for embora agora de São Paulo, eu nunca vou encontrar o meu… – e para de falar ouvindo barulho.

Beto quem derruba um molho de chave, ele chegava em meio a escada.

Estela — Deve ser o Beto. Vá embora agora.

Raquel abri o saco de couro, pega algumas joias. — Fique com algumas, assim…

Estela — Não! Vá agora. – empurra Raquel e fecha a porta.

A mocinha chama Beto, que ameaça terminar de subir a escada. — Beto, seu irmão doutor esteve aqui. Brigou com Raquel. Acho que bateu nela.

Beto duvida: — Custódio fez isso?! Não acredito!

Mocinha — Ele trouxe um monte de joias. Pedras preciosas. Devem valer uma fortuna. Estavam esparramadas em cima da cama de Raquel. Daqui de baixo deu para ouvir os gritos dele, dizendo que não quer vê-la nunca mais.

Beto — E Raquel?

Naquele instante, Estela, nas pontas dos pés, passa correndo no corredor, e entra no quarto de Raquel. Ela suspira preocupada e aliviada, encostando para trás, na porta. Ameaça ir ao toalete, vê a pulseira que Cristovam mostra ao filho, caída no chão. Pega-a, e coloca dentro da roupa.

Beto entra, e não vendo Raquel vai ao toalete, e sem encontrar, pergunta a Estela, sentada na ponta da cama, paralisada: — Onde está Raquel?

Estela, tremula, nada responde.

Beto agarra-a, nos cabelos. — Eu lhe fiz uma pergunta, então responde, não me faça procurar Raquel pela casa.

Estela — Beto, você está me machucando!

Beto puxa com força os cabelos dela: — Não é essa a pergunta que lhe fiz!

Estela – Raquel foi embora! Já deve estar longe daqui.

Mocinha entrando no quarto, fala com Beto: — Mentira! Fiquei todo o tempo na sala. Raquel não desceu pela escada, muito menos pulou a janela. Não seria maluca a esse ponto. Deve estar escondida em um dos quartos.

Beto solta Estela e corre, descendo a escada. Pergunta para duas moças na sala. Elas estavam ali, quando ele entrou: — Raquel passou por aqui, enquanto entrei no quarto dela?

Eleonora — Não, eu não saí daqui!

No quarto, Estela, em estado de choque, permanecia sentada no lugar, levanta com Beto retornando. Ele se refere a mocinha, ainda ali. — Dê o fora. Vou ter um particular com Estela.

A mocinha sai. Beto pega Estela pelo pescoço, apertando com força. Uma sombra negra se coloca sobre ele que muda a fisionomia, ao falar com ela. — Eu vou procurar Raquel dentro desta casa, e se ela fugiu por onde estou imaginando, eu mato você. Raquel é uma barata tonta. Não teria a esperteza de fugir sozinha.

A sombra sussurra aos ouvidos de Beto — Mate-a agora. Não deixe para depois.

Estela se senti sufocada, como se visse outra cena semelhante, alguém lhe apertando a garganta.

Ezequiel surgi — Afaste-se satanás. Eu ordeno que deixe-os em paz.

Beto, paralisado, com olhos brilhantes continua apertar o pescoço de Estela.

Outros anjos chegam, entre eles Cristovam e Sara. Ela toma o corpo de Estela, enquanto Cristovam se coloca em Beto, e raios azulados se cruzam. Beto solta para trás. Estela tosse, para recuperar o folego.

A sombra ainda aos pés de Beto, segue-o, em direção a porta.

Estela — Beto, espere? Deixe Raquel em paz. Deixe a viver longe daqui. Não vai atrás dela.

Beto ainda com fisionomia estranha — Então, você ajudou ela fugir por onde estou imaginando.

Estela — Descobri, por onde entrou e fugiu o fantasma aquele dia. Vi você que entrou na sala, pela porta da frente, no momento, que subi a escada, e o doutor falou em seguida que alguém tinha batido na porta.

Beto — Eu podia ter matado você, por me decepcionar. Mas já que não fiz isso, e não encontrar Raquel, para que pague as dívidas que acumulou aqui dentro, você vai pagar em dobro, no lugar dela. E mesmo assim, vou continuar procurando até encontrá-la. Ninguém entra e sai da minha vida, como ela fez. Fui bonzinho com ela por causa do meu irmão, e já que Custódio a dispensou, eu quero Raquel de volta para limpar o chão que estou pisando, e também todas as joias do meu irmão, e o dinheiro que dei a ela.

Estela franzi o cenho e responde: — O lugar de Raquel não é aqui. Ela não pertence a este lugar.

Beto — Há, não?! Como você sabe? Qual de vocês também não pertencem a este lugar? Você vive dizendo que um dia a sua sorte irá mudar. Tanto que estou surpreso não ter fugido com Raquel.

Estela tira a pulseira entre a roupa e estende a ele. — Todas as joias tinham valores bem alto. Eu encontrei essa daqui, no chão, assim que Raquel saiu. Ela vale uma fortuna. Compra essa casa, tudo que tem dentro e ainda sobra mais que o dobro.

Beto ri: — Não fala bobagem, garota. Eu nunca soube que Custódio tinha joias tão valiosas assim. Ele nunca tocou no assunto, e eu sei tudo que ele tem.

Estela – Conheço valores! Meu pai era… Bom, não interessa quem era meu pai. O que interessa é que está joia paga mil vezes o valor que Raquel lhe deve. — coloca-a na mão dele. — Ela é sua! Estou lhe dando em troca de deixar Raquel em paz.

Beto observa a pulseira. — Se vale tanto assim, como você está dizendo, é um motivo a mais para que eu vá atrás de Raquel. Que terá que dividir comigo, a metade, em troca de deixá-la em paz, pagando a dívida comigo.

Estela brava — Eu já estou lhe pagando a dívida de Raquel. Estou fazendo isso pela amizade que estive com ela aqui dentro.

Beto gargalha: — Você está me dando essa joia em troca da sua amizade com Raquel? Estou surpreso com você, Estela, se gostava de Raquel tanto assim, porque não fugiu com ela?

Estela — Tenho meus motivos para continuar em São Paulo. E se você tem pelo menos um pouco de sentimentos pelo seu irmão, que pediu que Raquel desaparecesse da vida dele, deixe-a viver longe daqui, como quiser. Longe do seu irmão. E você não saiu perdendo financeiramente, a dívida dela já está bem paga. Quem sabe, essa joia ficou para trás para que eu lhe entregasse, porque se eu tivesse encontrado antes de Raquel sair, teria entregue a ela.

Beto observa Estela, e mostra a joia: — E me entregou, pela amizade que você e Raquel tiveram aqui dentro? Em troca da dívida dela comigo?

Estela — Sim!

Beto — Vou mandar avaliar o preço, e ver se valeu o seu esforço. – Joga-a para cima e pega. — Em nome da amizade. – ri – É! Acho que ainda preciso aprender muita coisa nesta vida. Uma delas é o preço de uma amizade. Até mais, minha linda! — volta. — Há, e se a joia for mesmo valiosa, dou minha palavra que deixo Raquel em paz, em nome da nossa amizade, e da amizade que sempre tive com Custódio. — e rindo sai.

Estela suspira aliviada, senta na ponta da cama e lembra as palavras de Beto. “Eu quero Raquel de volta para limpar o chão que estou pisando, e também todas as joias do meu irmão, e o dinheiro que dei a ela.”

Rapidamente, Estela começa procurar debaixo do colchão, do travesseiro e por último dentro do vaso. Ela chora de alegria, encontrando o dinheiro. — Meu Deus, obrigada! Obrigada, meu Deus. Minha sorte está mudando, eu levaria anos, para juntar esse dinheiro.

Raquel, naquele momento chega no barraco onde mora os pais. — Mãe? Pai? Cadê vocês?

Laura aparece pela porta do fundo. Seca as mãos molhadas. — Raquel? Não esperava você.

Raquel — Cadê meu pai?

Laura — Está trabalhando de faxineiro lá na padaria. O português deu emprego a ele, faz 15 dias hoje. Ganha até gorjeta dos freguês. Nossa sorte está mudando fia. Eu estava acabando de lavar roupa. Consegui quatro patroas, e já que você apareceu, podia larga a vida que escolheu e voltar pra casa.

Raquel — A senhora ainda quer voltar pra Goiás?

Laura — Nem penso mais nisso.

Raquel — Eu ajudo a senhora fazer as malas e vamos sair daqui agora. A gente passa na padaria e pega o pai.

Laura – Mas…,

Raquel – Não podemos perder tempo. Eu explico no caminho.

Custódio, no hospital, desabafa com Dudu, enquanto olham Giza, estirada na cama, inconsciente. – Não sei ainda o que aconteceu comigo. Quando vi Raquel pela primeira vez, fiquei louco por ela. Casei-me com Giza, pensamento na outra, tanto que a deixei na festa do casamento sozinha, como você já sabe. Enquanto eu viaja, meu pensamento estava aqui. Não conseguia parar de pensar em Raquel, e não pensei duas vezes antes de ir atrás dela, assim que chegamos de viagem.

Dudu — Posso lhe dizer o que penso?

Custódio — Sim! Mas, já cortei o mal pela raiz. Pela vida da minha mulher eu prometo a mim mesmo que não vai acontecer de novo. Acabou! Eu sei que fiz loucuras.

Dudu – Você não errou fazendo o que fez. — aponta Giza — Seu erro foi com essa daqui. Você devia ter dito não, a ela, no altar, já que estava balançado pela outra. Não concorda comigo?

Custódio encara os olhos do irmão.

Beto entra no quarto.

Custódio: — Beto, por favor, não quero vê-lo aqui! Vá embora!

Beto não se manifesta, olhando seriamente os irmãos.

Eduardo: — Beto, faça o que ele pediu. Dá um tempo. Agora não é hora de você aparecer.

Beto — Eu vim saber como está minha cunhada.

Eduardo quem responde: — Ainda inconsciente, mais bem!

Beto — Isso mesmo doutor? Giza está bem! Fora de perigo?

Custódio – Não saiu os resultados dos exames ainda. Mas aparentemente ela está bem. Apenas dormindo, não sei quando vai acordar, ou se vai acordar!

Beto bate na madeira da cama: — Claro que vai! Pensamento positivo! Como sempre diz nosso pai à esperança deve ser última a morrer. E, sinto muito pelo que está acontecendo com a sua mulher. — sorri, com deboche. — Fiquei sabendo da fortuna que deu para Raquel desaparecer da sua vida. E ela desapareceu mesmo.

Custódio — Não quero falar disso, Beto. Raquel é assunto encerrado. E se já que deu o seu recado pode ir embora.

Beto fica sério. Pega a pulseira do bolso. — De todas as joias que o doutor deu para Raquel, essa ficou no chão. Uma das moças encontrou. O nome dela é Estela. Ajudou Raquel fugir da casa, eu não teria deixado Raquel ir, se tivesse chegado à tempo. Eu estava na rua, vendo outro negócio, quando o doutor chegou na casa.

Custódio – Beto, eu não quero saber o que aconteceu.

Dudu ameaça dizer algo.

Beto se refere a ele, falando primeiro: — Quando você esteve lá na casa, me pediu para analisar os sofrimentos que nossos antepassados já sofreram.

Dudu — O que isso tem agora, com o que está acontecendo?

Beto — Confesso que fiquei uma fera, quando descobri que Raquel havia fugido. Tanto, que quase a matei enforcada. Fiquei totalmente fora de mim, como se alguma coisa ruim me dominasse. E não sei como, Estela conseguiu se livrar das minhas mãos. A força dela, foi maior que a minha. Foi maior que o meu ódio. Maior que a minha ira.

Dudu — Beto, isso é muito sério.

Beto — Eu sei! Tanto que estou aqui me desabafando.

Custódio e Dudu, calados observa Beto, que acrescenta, olhos fixos em Custódio: — Eu também menti, quando lhe falei que não sabia do endereço dos pais de Raquel. Eu fui conhecer eles….

Dá pausa: — Quando Raquel chegou na casa, contou uma história que eu não acreditei. Achei que era artimanhas para tentar conquistar o doutor. Ela já sabia da brincadeira e com quem seria… Bom, resumindo… Raquel aceitou ir morar na casa apenas para juntar um bom dinheiro e voltar para Goiás com os pais. Eles estavam vivendo na miséria aqui em São Paulo, e pretendiam voltar a trabalhar na roça, em uma fazenda, onde viviam antes.

Custódio — Creio, então, que fiz uma boa caridade a ela e aos pais.

Beto — Um pai que se negou em deixar a filha para trás, mesmo eu entregando a ele uma boa quantia em dinheiro. O qual mandou ela me devolver depois.

Custódio relembra o momento em que Raquel, em prantos, lhe pede: — Não toque em mim! Pegue suas joias e vá embora daqui. Eu que não quero vê-lo nunca mais.

Beto — Eu sempre achei que um amor assim, de um pai para o filho, não seria real.

Dudu — Beto, nosso pai sempre teve, e ainda têm muito amor pelos filhos dele.

Beto — Dudu, caso um dia o nosso pai descobrir que montei aquela casa, você garante que ele não vai me condenar?

Dudu olha o chão, sem saber a resposta.

Beto — O pai de Raquel, mostrou o amor dele pela filha ser maior que qualquer fortuna que poderia ter na vida. Um homem de idade avançada, doente e sem expectativa de conseguir um bom emprego.

Giza, naquele momento, de pé ao lado dos três, também ouve a conversa. Ela volta ter uma nova regressão espiritual.

Ela se vê em um quarto, diante do espelho, penteando os longos cabelos claros, falando alegremente com as mulheres da casa.

Adalgisa — Duvido que tenha sobrado alguma coisa de Custódio para oferecer a esposa. Queria ser um pernilongo, para estar lá, e ver que desculpas deu a ela.

Moça espanhola — Você está agindo com maldades, menina, e pode se dar mal.

Moça, brasileira — Melhor tomar cuidado. O que pretende fazer pode não dar certo, e quem vai perder no final, será você mesma. Custódio é um homem reservado. Depois que conheceu Raquel, sempre pensou duas vezes, antes de levar uma de nós para cama.

Outra moça brasileira — Custódio se apaixonou por Raquel desde quando a conheceu, e não escondeu isso de ninguém. Uma vez, antes mesmo Custódio conhecer Raquel, pedi a ele que se casasse comigo. Sabe o que Custódio me respondeu? Que se casaria somente com a mulher que amasse de verdade. E se ele se casou, foi por amor.

Adalgisa — Vocês estão com inveja, essa é a verdade. E não entrei nesta brincadeira para perder. Um dia, terei Custódio somente para mim. Podem apostar nisso.

Ela volta a se olhar no espelho, encarando os próprios olhos azuis: — Não sou qualquer uma, como Custódio está pensando. Caso contrário, eu já teria entrado nesta vida faz tempo. Eu sempre me preservei, apesar das oportunidades que tive. Todos me acham linda. Maravilhosa, e isso é uma dádiva que Deus me deu. E sempre desejei, um dia, conquistar com a minha beleza um homem rico, milionário. — Vira-se para as amigas — Ainda serei uma rainha, banhada de ouro, diamantes, com tudo que um homem possa me oferecer em troca do meu amor, e do encantamento da minha beleza. Eu já encontrei o homem que quero, e vocês sabem quem é. O único problema é a esposa dele que vou ter que enfrentar no meu caminho. Pena, que não conheci Custódio antes, eu não teria deixado se casar.

Espanhola rindo — Bem que você tentou impedir o casamento dos dois, e não deu certo.

Moça 1 rindo — Mesmo fazendo o que você fez, principalmente depois do casório, onde ele está nesta hora? A caminho de uma longa viagem de lua de mel com a esposa.

Moça 2 — Melhor admitir, Adalgisa, que perdeu. Sua dádiva não conquistou o coração do bonitão. Se você quis segurá-lo, para acabar com o casamento, não deu certo.

Adalgisa — Podem rir a vontade, não me importo! Custódio vai voltar para os meus braços. E, grande coisa o casamento dele, que acabou ficando comigo, invés de voltar para a esposa. — Ri satisfeita. — Como será que ficou Raquel sozinha, dando explicações aos convidados pelo sumiço do noivo? Eu não queria estar na pele dela, nunca! E quando eles voltarem de viagem, vou mostrar ao Custódio que sou melhor que ela, em tudo, até ele se cansar de Raquel, e ficar de vez comigo. Se isso não acontecer, vou exigir metade de tudo que ele der a ela, isso porque sou boazinha, se não, ia querer tudo, até mesmo o que Raquel herdar do pai. — e vendo Marta chegar no quarto, se alegra, falando com prazer. — Tudo que eu conseguir, serei grata a minha professora e madrinha Marta de Campos que… — E se cala.

Marta lhe faz um gesto leve, sem que as outras percebam, pedindo que se cale, e manda as moças se retirarem do quarto. — Vão procurar o que fazer, em vez de ficarem vadiando.

Assim que ficam sozinhas, Marta fica brava também com Adalgisa. — Não deveria falar desse assunto na frente das moças que tem línguas soltas. Já pensou se Custódio descobre que tudo é uma armação. Principalmente que mentiu a respeito do seu pai, que vai matá-la, quando souber onde você está.

Pega o pente e começa a pentear os cabelos da moça.

Marta continua — Você tem que tomar cuidado para não colocar tudo a perder, antes mesmo de começar. Um gesto errado e tudo acaba por água abaixo, e adeus os seus sonhos. Porque acabou garota, o que você tinha de mais precioso para conquistar o homem rico que desejava. Ou, pensa ainda que vai conseguir uma vida de rainha aqui dentro? Trabalhando duro, sujeitando a qualquer tipo de homem para conseguir alguns trocados. A sorte bateu na sua porta, e não a jogue pela janela. Quando Custódio voltar de viagem, deverá encontrá-la de barriga. Custódio dá muito valor a família, e não vai aceitar ter um filho perdido pelo mundo. Imaginou você, em uma casa maravilhosa. Uma que possa ser inteiramente sua de verdade, de papel passado? Você tem que convencer Custódio a isso. Faça charme. Faça chantagens até conseguir a casa. Uma mansão de presente. Um filho será a sua fonte segura para herdar toda a fortuna de Custódio. Através desse filho, você vai conseguir tudo o que imaginou.

Adalgisa se olha outra vez no espelho. — Pensando bem, eu queria estar no lugar de Raquel, como esposa.

Marta — Se contenta em ser a outra, Adalgisa, porque esposa dele você nunca será. Não deu certo o primeiro passo. Custódio acabou se casando com Raquel, e isso não podia ter acontecido, mas aconteceu. Custódio não vai deixar ela agora, para ficar com você. Falo isso de experiência própria. Roberto nunca deixou a esposa para ficar comigo. O pior ainda, é dividir com a mulher dele e aos filhos, cada tostão que sai de dentro desta casa. A idiota da esposa dele pensa que o marido dá um duro lascado para levar o pão de cada dia para casa.

Adalgisa — Você e Roberto ainda não me disseram quanto vão querer pelo que eu conseguir tirar do Custódio?

Marta, ainda escova os cabelos de Adalgisa: — Vamos falar nisso quando Custódio voltar de viagem. O que você precisa mesmo é estar com um filho dele no ventre, quando ele chegar. Assim, entraremos para o segundo plano, o definitivo da sua vida. E tem outra coisa que me esqueci de lhe dizer. Falei para o Roberto que você nunca se importou com dinheiro, e que pretendia se casar com qualquer um para ter uma vida honesta, e você falhou feio, perdendo a chance de se casar com um homem rico e bonito. Você devia ter colocado uma dose maior na bebida dele, assim, ele não teria acordado em tempo de se casar com Raquel.

Adalgisa — Coloquei a dose que você mandou.

Marta — Então, Raquel deve ser uma moça de muita sorte. Vai ver o casamento entre os dois estava marcado, em algum lugar, acontecer, porque a dose que lhe entreguei era para o Custódio estar dormindo até agora. Não era para ele acordar naquela hora, tanto que pensei que você tinha colocado metade da dose.

Naquele instante, Roberto Lacerda, entra no quarto. — Adivinha a notícia que tenho, garota?

Adalgisa mexe os ombros, sem saber.

Roberto — Custódio foi e já voltou?

Adalgisa — Como assim?

Roberto Lacerda — O que você aprontou com o meu amigo que não seguiu viagem com Raquel?

Adalgisa se emociona — Ele não foi viajar?

Roberto Lacerda — Pelo que entendi, Custódio e Raquel não se entenderam. Ele não entrou em detalhes, mas deu a entender que foi coisa muito séria o que aconteceu, e vai voltar a lhe procurar. Custódio se comoveu com a sua história de pobreza. Me pediu para procurar o seu pai e ajudá-lo. O pior que ele acreditou na sua mentira. — aponta Adalgisa — Vê bem o que vai fazer garota, eu não quero ver o meu amigo sofrendo por sua causa.

Giza, se sente frágil, ao voltar a realidade. Encara Beto, dizendo ao doutor.

Beto — Eu teria ido atrás de Raquel, se Estela não me entregasse a joia, em troca de deixar Raquel em paz. E o pior é que Estela conhece o valor que tem essa peça. Então, eu ainda me pergunto: Como que uma moça que vive naquele lugar, pode conhecer o preço de uma joia tão valiosa? E entregou a mim, em nome da amizade que teve com Raquel.

Ele caminha, e se aproxima do corpo de Giza, inerte na maca, se colocando ao lado do espirito dela.

Beto — Estela deixou de mudar a própria vida, simplesmente por amizade a uma pessoa, e poderia ter morrido por ela. Isso me surpreendeu e muito. Nada, do que eu já ouvi, das histórias, do que aconteceu com a nossa família me comoveu. É natural pai e filhos não se entenderem. É natural brigas entre irmãos. É natural um pai ou uma mãe morrer, deixando filhos ainda indefesos, nas mãos de outras pessoas.

Aponta Custódio que ainda o olhava sério. — Você é um exemplo desses, que perdeu o pai e a mãe quando ainda era pequeno… E vejo ser tão natural marido e esposa não terem pelo outro o amor que deveriam ter. Eu presencio isso todas as noites. Muitos homens, inclusive você foi buscar nos braços de Raquel um amor maior que não encontrava com a sua mulher. Mas, também existe o homem fiel. Nosso pai é um exemplo. Eu aprendi admirar o amor dele pela nossa mãe. Um amor verdadeiro, que nada é capaz de destruir.

Olha Dudu — É tão natural o amor entre irmãos. E você é um exemplo desse amor, que tem por mim, pelo Custódio e nossas irmãs. E o seu amor de filho pelo nosso pai, pela nossa mãe. Mas, uma amizade é muito pouco para uma pessoa que não tem nada, não ser uma vida perdida, abrir mão da chance de mudar o seu destino. Dar a volta por cima e recomeçar… Entregar essa chance, a alguém, simplesmente em nome da amizade. Isso sim, mexeu comigo! E agora eu entendo o significado da palavra amor. Amor por uma pessoa que somos capaz de dar a vida, sem esperar algo em troca. Hoje, entendi o resumo do livro sagrado que o nosso pai, um dia, colocou em nossas mãos. E vocês dois se lembram disso. Um presente de Natal que ele deu igual a nós três.

Dudu — Deus entregou seu único filho por amor a humanidade, sem diferença de cor, raça ou religião. Apenas com o único objetivo que todos amem um ao outro com o mesmo amor.

Beto pega a mão de Custódio e coloca a joia: — Vou rezar para que a minha cunhada fique bem. Que vocês dois possam ser felizes de verdade.

Vira-se para Dudu — Amanhã, podemos voltar a conversar? Ando pensando naquilo que você me sugeriu. De colocar as meninas para costurar em vez de… — E se cala, vendo Custódio fechar os olhos, apertadamente. — Bom, procuro você na fábrica e conversamos melhor depois. Melhor, podemos conversar na hora do seu almoço? E não diz nada ao nosso pai, por enquanto. Quero fazer surpresa. Quero que ele também tenha muito orgulho de mim, como tem de você dois.

Eduardo sai atrás dele, e no corredor chama: — Beto? — bate no peito do irmão e o elogia: — Estou orgulho de você. Eu sabia que um dia, iria descobrir o verdadeiro homem que estava escondido dentro de você. Fiquei muito aborrecido quando você montou aquela casa. Não é coisa que um homem de bem faça. Que ama a vida que tem. Que ama a família dele. Todos nós o amamos muito. Eu o amo muito, meu irmão, e quero o melhor a você. Estou feliz agora, com o caminho correto que você está escolhendo, e Deus vai recompensá-lo muito. Tenho certeza que vai.

Beto — Eu sei! Estou com a alma leve, como se eu tivesse asas para voar, e sei que posso voar.

Dudu — Devagar e com os pés no chão, é bem melhor.

Beto — Eu vou mudar, meu irmão, para o melhor.

Dudu — Você já mudou. Já é outra pessoa. Dá para perceber no seu jeito de sorrir e falar.

Beto — Volta e fica com o Custódio. Não deixe ele sozinho. Ele precisa outra vez, de ajuda, para continuar de pé, pelo que está passando. Você sempre o ajudou melhor que eu, que só acabou atrapalhando a felicidade dele por conta de uma brincadeira.

Dudu — Custódio está passando o ele tem que passar. Ninguém passa por outro, aquilo que não lhe pertence. Temos o livre arbítrio de escolher o caminho entre o certo e o errado. Como você está fazendo. Custódio também escolheu o errado, como você também escolheu. A mudança dele, será bem mais complicado que a sua. Ele devia ter dito não para a Giza, em vez de ter aceito ela como esposa, já que a outra mexeu tanto com ele.

Beto — Não foi só com ele. Foi comigo também.

Rapidamente Beto volta na porta do quarto e chama a atenção de Custódio. Ele media a temperatura de Giza.

Beto – Custódio eu quero ser sincero com você. Pela amizade que sempre tivemos. Fui eu que bati na porta do quarto aquele dia. E não um fantasma como pensaram. Eu não queria que você e Raquel ficassem juntos. Foi a maneira que encontrei de separá-los. Eu também me apaixonei por ela, desde o primeiro momento que a vi.

Custódio — Você é livre para se casar com ela, se quiser.

Beto — Isso quer dizer que…

Custódio — Acabou! Não existe mais nada entre eu e Raquel.

Beto — Eu sinto muito, por ter colocado ela no seu caminho. — acena — A gente volta a se ver. Parentes sempre acabam se encontrando pelos caminhos da vida. A gente se vê amanhã, Dudu, na hora do seu almoço.

Dudu — Estarei esperando.

Eduardo, fica parado no corredor do hospital e segue Beto com o olhar. Estende uma das mãos em direção ao irmão. — Que Jesus continue iluminando sua mente e os seus passos.

Ezequiel surgi ao lado dele, e responde: — Amém!

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