Fábrica. Tecelagem. Várias pessoas trabalhando na produção de tecidos.

Geraldo se aproxima de Moreira, concertando uma das máquinas: — E aí, Moreira, a máquina não vai funcionar hoje também? Faz duas horas que você está mexendo nela, meu serviço está atrasado.

Moreira seca o suor da testa, liga a máquina e fala com arrogância. — A donzela é toda sua, pode trabalhar à vontade.

Geraldo o elogia: — Devo admitir, você entende bem de máquinas. Ontem, disse que não tinha concerto. Queria botar fogo nela.

Moreira, ainda suava muito, foi agressivo. — Vou botar fogo em outra. Tirei a peça dela e arrumei a sua, cansei de ver você parado na minha frente. — o aponta. — Vê se toma mais cuidado, a máquina é de ferro, mas quebra. — e vai saindo.

Geraldo — Espera, Moreira? Posso não entender de máquinas. Minha especialidade é matéria, é o que as máquinas produzem. E sei, que você não gosta de mim. Implica comigo todas as vezes que a máquina para. Pensa que faço de propósito, só para ficar parado, recebendo suas broncas.

Afonso, um pouco distante, ouvia a conversa.

Moreira — O dono da fábrica quem deve descobrir se isso é verdade ou não.

Geraldo — Moreira, não vou levar em consideração o que você acabou de dizer. E quer ouvir a verdade? Eu também não vou com a sua cara nenhum pouco, mas fazer o quê? Moramos no mesmo bairro, na mesma rua, trabalhamos no mesmo lugar, onde um depende do trabalho do outro. Eu, não penso em parar de trabalhar aqui. Gosto do que faço. Dependo desse emprego para o sustento da minha família, como também você, então, porque não tentamos se entender um pouco?

Moreira — Vou ganhar o quê, com isso? Aumento de salário? Não! Você não é meu patrão, é um assalariado como eu, então, vamos continuar trabalhando. Você faz o seu serviço e eu o meu.

Geraldo indo a máquina — Combinado!

Moreira — É a quinta vez que a sua máquina quebra essa semana, e se ela parar de novo, sou obrigado a falar com o patrão para colocar outro, mais competente no seu lugar. Você é o único que quebra a máquina um dia sim, e, no outro também.

Moreira sai, mas retorna com Geraldo lhe dizendo com deboche. — Vai ver é falta de competência de quem não sabe arrumar direito. Ou, deixa alguma parafuso solto, para dizer que fui eu que quebrei, para implicar comigo depois.

Moreira funga: — Vou fingir que não ouvi o que disse, pra não quebrar a sua cara, e ir nos dois para o olho da rua.

Geraldo — Chumbo trocado não dói. E para você saber que podemos ser amigos, sim, fiquei sabendo que você se tornou pai de menina. Como eu tenho um garotinho, que vai fazer um ano daqui duas semanas. O que me diz de comprometê-los desde já, para uma vida conjugal futura?

Moreira — Não vou criar uma filha com gosto, e depois entregá-la a qualquer um.

Geraldo se irrita: — Não estou falando de qualquer um. Estou falando do meu filho.

Moreira — E eu falo pela minha. O homem para se casar com ela, um dia, vai ter que ser muito macho para merecê-la.

Geraldo ameaça retrucar.

Afonso chega: — Não está na hora dos dois pararem com essa discussão?

Geraldo — O Moreira que começou. Eu ainda estou tentando ser amigo dele.

Moreira — Tudo bem, aceito a sua proposta. E como sabemos que um homem nasce com a obrigação de tratar, cuidar bem de uma esposa, e, se vamos comprometer nossos filhos desde já, não me importo, nenhum pouco, dividir os gastos que tem com o seu, com a minha filha também.

Geraldo liga a máquina: — Maneira justa! Volto a pensar nisso quando meu filho for adulto e escolher ele mesmo a mulher com quem vai querer se casar. Espero não ser com a sua filha, porque se for, vamos brigar e feio.

Moreira — Com o seu filho, Maria jamais vai se casar. Escrevo isso e assino embaixo.

Geraldo — Eu também faço o mesmo. O senhor vai ser testemunha disso!

Afonso. — Não vou ser testemunha de nada. Os dois estão discutindo por um futuro que pertence aos filhos de vocês. Deixa a vida falar por eles, sem intriga entre os dois. Tentam se entender pelo menos no ambiente de trabalho.

Geraldo — Não vou mais me rebaixar para ficar amigo de ninguém. E tem mais, se a minha máquina quebrar de novo, não vou comunicar o Moreira. Vou sentar e esperar a vontade dele. E o senhor quem decide depois, quem está certo ou errado. Agora vamos trabalhar. Acabou a nossa conversa.

Afonso ri, balança a cabeça negando.

Moreira — Ele vive quebrando a máquina de propósito, e pelo jeito o senhor vai ficar do lado dele.

Afonso — Não estou do lado de ninguém. E para evitar confusão, quando a máquina do Geraldo parar, ele me avisa, eu falo com você, e um, não precisa ficar discutindo com o outro. Os dois são livres para brigar lá fora, aqui dentro não. Estamos combinados?

Moreira — Aí, manda o fulaninho dar uma volta enquanto arrumo a máquina, assim, não fico olhando a cara dele. Com licença. — E sai, indo dar manutenção em outra máquina.

Geraldo mostra a língua.

Afonso — Espero que não faz isso pra mim, quando lhe viro as costas.

Geraldo — O Moreira implica com tudo que faço. Até parece ele meu patrão. — naquele instante a máquina para. Geraldo liga e nada, desliga e liga novamente e nada. Olha para Afonso. — Fiz alguma coisa errada?

Afonso — Deixe eu ver. — Ele tenta ligar a máquina, várias vezes, e nada. — Vá na cozinha tomar um café, enquanto chamo o Moreira, se for defeito da máquina mando trocar.

Geraldo se afasta. Afonso chama: — Moreira, a máquina parou de novo.

Moreira, assim que chega liga o botão, a máquina funciona.

Afonso fica intrigado: — Como fez isso?

Moreira — Não fiz nada. Só liguei a máquina que estava desligada.

Afonso — Eu liguei a máquina e ela não funcionou!

Moreira — O que faço? Vou discutir com o senhor também que é meu patrão! A máquina está funcionando. — Moreira desliga e a liga novamente.

Afonso coça a cabeça. — Eu que lhe pergunto o que faço? Demito você e o Geraldo, ou aguento os dois brigando por causa de uma máquina? Ou boto fogo nela?

Moreira, vendo Geraldo chegar. — Vou maneirar na discussão, se ele não me provocar.

Geraldo — Eu que provoco? O patrão viu que a máquina parou sozinha. Eu não botei a mão nela.

Moreira — O patrão também viu que a máquina voltou a funcionar sem eu precisar fazer nada, só liguei o botão que estava desligado.

Afonso — Sabem de uma coisa? Enquanto não me derem prejuízo com a discussão de vocês, podem discutir a vontade. Só não se matão aqui dentro, eu não vou indenizar a família de ninguém. Então pensem nisso! — e se retira.

Dudu se refere ao pai. — Agora entendi a razão do Geraldo e Moreira sempre discutirem um com o outro.

Afonso, observa Maria e Luiz conversando — E os dois nunca mais tocaram no nome daqueles dois. Acho que estão esperando vê-los juntos, e quando isso acontecer, vão se tornar bons amigos, ou, vão se matar de vez.

Dudu — O que o senhor sugere?

Afonso olha dentro do barracão. Vê Moreira falando com amigos. Geraldo, em outra mesa, fala com um casal. — Deixa o Luiz e a Maria namorar um pouco. Os pais estão distraídos. Bom, eu fico de olho neles e se vierem para cá, dou sinal e você avisa o casalzinho. — ameaça sair, mas volta — O Beto, não voltou?

Dudu — Não!

Afonso — Infelizmente tenho que reconhecer que Roberto é um caso perdido.

Dudu — Não fala assim, pai. Jamais deve perder a fé.

Afonso — Agradeço a Deus por me dar um filho como você. Tenho certeza, que nunca vai me decepcionar. Quanto ao seu irmão, acabei de perder a esperança. Bom, vou ficar com a sua mãe.

Dudu não se move. Segue o pai com o olhar. Depois retorna para o casalzinho conversando animados.

Uma sombra negra, se levanta ao lado de Moreira, e sopra as ouvidos dele: — Onde está sua filha, porque não vai procurá-la?

Moreira — Dora, a Maria não está demorando demais? Você devia ter acompanhado ela.

Dora — Moreira, você agora vai dar de implicar com a sua filha também?

Sombra, ainda aos ouvidos dele. — Luiz também não está com os pais.

Moreira estica os olhos, para onde Geraldo e Mirtes estão. Sente coceira no pé da orelha. Levanta e diz para Dora. — Vou dar uma volta. Cansei de ficar sentado.

Ezequiel se coloca ao lado de Dudu, e refere-se ao casal. — Maria e Luiz também precisam da sua ajuda. A briga de Moreira e Geraldo vem de outra época. Por partes, os dois foram responsáveis pela separação do casal. Roberto e Custódio também tiveram suas culpas, pelo rompimento no grande Círculo de vidas: das Almas Gêmeas, que deixaram de viver o amor predestinado, levando-os a dor e sofrimento, por várias gerações.

Pequenos reflexos luminosos surgem do espaços, se colocando no alto, diante de Luiz e Maria. Ezequiel se apressa: — Moreira está vindo. — E sopra o rosto do rapaz.

Dudu olha para trás e vê Moreira na direção do casal. Vê Afonso distraído, conversando com Noemi e Clara. Rapidamente se aproxima. Maria é a primeira vê-lo.

Dudu — Seu pai está vindo.

Maria agradece e corre, direção oposta de Moreira. Ele para passos à frente, mira Luiz e Dudu. Vê Maria do outro lado, conversando com uma amiga, da mesma idade.

Luiz, pálido — Obrigado, senhor Dudu. Graças ao senhor, eu e a Maria não fomos pegos pelo pai dela.

Dudu brica — Senhor está no Céu. Para os amigos pode ser Dudu.

Luiz — O senhor é patrão do meu pai. Não fica bem eu chamá-lo assim. Pode ser Edu.

Dudu sorri — Como quiser. Menos de senhor.

Luiz — Pequei uma rosa de um vaso, e dei pra Maria. Espero não ter feito errado.

Dudu — Não fez nenhuma falta. Bem romântico da sua parte.

Luiz — Quando eu e a Maria se casar, vamos fazer uma festa igual a esta. Vamos enfeitar tudo com rosas, como seu irmão e a noiva fizeram.

Dudu — Então, o namoro é sério mesmo, para começarem a pensar na decoração da festa.

Luiz — Sim! Hoje faz um ano que estamos namorando.

Dudu surpreso. — Está falando sério? E como vai ser quando seu pai e Moreira descobrirem?

Luiz — Caso eles nunca venham se entender, eu e a Maria já combinamos de se casar escondidos, e vamos morar bem longe deles. Vou arrumar um emprego e começar a guardar o que puder, assim, nunca vou precisar do meu pai e do senhor Moreira pra nada. Quero a minha vida e da Maria totalmente independente deles.

Dudu fica pensativo.

Ezequiel sussurra aos ouvidos dele: — Seu irmão Roberto não irá voltar ao trabalho na fábrica. De a vaga ao menino. Você não vai se arrepender. Luiz traz experiências dos estudos que teve, de outras eras.

Dudu — Você quer mesmo um trabalho?

Luiz — Falei com a Maria, segunda feira vou começar a procurar. Sei que vai ser difícil encontrar um, nas horas vagas. Não quero parar o estudo, para não aborrecer o meu pai, ele se esforça em pagar os meus estudos e vem guardado parte do salário, faz tempo, para pagar minha faculdade de bacharel. Não quero desapontar ele para não ser contra meu casamento com a Maria.

Dudu — Você vai longe com essa sua boa vontade. Mas, estudar e trabalhar são duas coisas difícil de sintonizar. Tiro exemplo do meu irmão Custódio. Ele passava o dia todo estudando para ser o médico que é hoje. Estudar para ser bacharel não vai ser diferente.

Luiz — Seu pai é rico! Pode pagar os estudos do seu irmão.

Dudu — A fábrica tem um monte de herdeiros. Meu avô não poupou ter filhos, e cada final de mês, a fatia continua sendo dividida com toda família, acaba sobrando bem pouco, para cada um.

Luiz — Entendi! O doutor Custódio também teve que trabalhar para ajudar a pagar os estudos dele? Mas como ele fazia isso? Trabalhava durante a noite? Por que o senhor falou que ele passava o dia inteiro estudando.

Dudu — Estou surpreso com seu raciocínio rápido. Mas, não é bem assim o que aconteceu com o Custódio. Ele recebeu herança do pai biológico e pagou, ele mesmo os estudos. E se você quer mesmo começar a trabalhar, preciso de um ajudante no escritório. Meu irmão Roberto quem me ajudava, caiu fora, não quer saber de trabalhar na fábrica. Posso lhe ensinar o serviço que era dele. Você pode ir depois do horário que sair da escola. Costumo trabalhar até tarde da noite.

Luiz — Está falando sério?

Dudu — Numa condições. Quero ser o primeiro padrinho convidado para o seu casamento com a Maria.

Luiz — Já está convidado.

O dia amanhece.

Afonso, dormindo na cama, se vê entrando em um barracão (semelhante ao barracão da fábrica), se aproxima de Custódio, sentado, olhos fixos em um revolver, em cima da mesa. Custódio não se move. Afonso senta de frente, e também observa a arma.

Afonso — O que pretende fazer com esta arma, se matar?

Custódio, ainda atento no revolver. — Matar o seu filho Roberto, quando ele entrar por aquela porta.

Afonso pula na cama, acordando. Levanta, lava o rosto e logo chega na cozinha.

Meio espantado observa Dudu, Tainá, Clara e Noemi, sentadas ao redores da mesa. Todos tomam café da manhã.

Dudu – Bom dia, pai.

Noemi – Que ar espantado é esse, Afonso? Parece que viu fantasma.

Afonso, sentado ao lado da esposa, entre Noemi e Dudu. – Tive um pesadelo, com o Custódio. — vira-se para o filho — O que seu irmão aprontou com o Custódio? No sonho que tive. Custódio muito abalado, tinha um revolver carregado, em cima da mesa, esperando o Roberto para matá-lo.

Noemi se benze. — Cruz credo, Afonso, que sonho bobo é esse?

Dudu, enquanto mastiga o pão que havia colocado na boca. Lembra as últimas palavras de Custódio “Desculpa em lhe dizer Dudu. Mas se um dia o Beto estiver morrendo, quero estar bem longe daqui. — vê Afonso vir na direção dele, acena, saindo — Quem sabe, um dia a gente se encontra de novo. Adeus meu irmão”.

Afonso — O Roberto até entendo, eu sempre imaginei que ele poderia aprontar alguma coisa errado. O comportamento dele não é novidade. E não falei nada ontem, mas vi o Custódio sair quase correndo para não falar comigo. E, estou me sentindo sufocado, com a impressão que falhei na educação que dei ao Roberto. Quanto ao Custódio, agora ele já tem definitivo alguém especial como família, e logo vem os filhos e não mais precisa de mim como pai. — E se refere a Dudu — Me diz o que sabe. Assim estarei preparado para quando os dois aparecer.

Dudu — O senhor ficou muito preocupado com os dois. Por isso teve o sonho.

Afonso — Não foi isso que perguntei. O que você está escondendo de mim?

Dudu calmamente responde — Pai, não estou escondendo nada. E, o que está acontecendo, não têm nada a ver com a educação que o senhor deu a nós. O Custódio sabe disso, o Roberto também.

Noemi mostra a mão aberta — Tem cinco dedos, nenhum é igual. Todos são conduzidos pela mesma mão. Estou incluindo o Custódio também. Eu nunca vi você tratá-lo diferente, desde o dia em que ele entrou, pela primeira vez, dentro desta casa.

Dudu se alegre — A mãe acabou de dar a resposta certa. — fica de pé — Vou dar uma volta. Bom, vou conversar com o Beto e saber direito o que aconteceu.

Afonso — Então, você sabe onde seu irmão está morando e o que está fazendo?

Dudu — Sei!

Afonso levanta — Vamos nós dois falar com ele.

Dudu — Melhor o senhor deixar passar um pouco, assim vai estar mais calmo, e não vai acabar se desentendendo com o Beto.

Afonso — Não vou brigar com o seu irmão. Eu só quero uma explicação pelo que aconteceu.

Dudu senta novamente, pega outro pedaço de pão. — Então, vamos esperar o Beto aparecer e o senhor conversa com ele aqui em casa. — sorri — Está bem assim?

Afonso — Impressão minha, ou você não quer me levar onde está seu irmão? Meu faro de pai diz que ele não está fazendo coisa boa.

Dudu pensa e calmamente responde — Cedo ou tarde o senhor vai descobrir o que vem aprontando o Beto, só não quero que seja por mim. Jamais quero que vocês dois brigam, e, eu fazendo parte dessa briga. Não vou dizer o que ele está fazendo e muito menos vou levá-lo onde ele está.

Afonso — Caso você ver o seu irmão cair no fogo, vai deixar ele se queimar?

Dudu — Claro que não, pai! Para salvar o meu irmão, sou capaz de pular no mesmo fogo. Tanto que já dei conselhos a ele muitas vezes, o Custódio também. Os dois já discutiram por causa disso, mas o Roberto não quer ouvir ninguém, Está fazendo o que dá na cabeça e não vai ouvir o senhor…

Afonso balança a cabeça negando.

Dudu — Pense no que aconteceu lá traz. Quando Custódio passou a chamá-lo de pai, com a mesma admiração que ainda tem pelo pai dele. Por esse amor e por esse respeito, Custódio vai voltar a procurá-lo. Quando a magoa passar, vai lembrar que o senhor está aqui, de braços aberto, para recebê-lo, independente do que aconteceu ontem.

Afonso desapontado senta novamente — Então faz tempo que o Roberto anda aprontando, você e o Custódio sabia e não me contaram nada.

Dudu — Custódio pensa do mesmo jeito que eu.

Afonso — E o Custódio viajar sem se despedir de mim, está relacionado com o que anda fazendo o Beto?

Dudu — Sim! Outro dia o Beto me disse que ia fazer uma festa de despedida de solteiro para o Custódio. Como não aprovo o que ele está fazendo, dispensei o convite e duvidei que Custódio fosse. Bom, o que sei, Custódio não ficou na festa.

Afonso — Ele nada explicou quando apareceu no hospital depois. Falou que não era nada grave. Que eu e sua mãe não precisava se preocupar com Beto, que estava bem, mas não quis entrar em detalhes.

Dudu — Para o senhor ver, Custódio também jamais vai colocar o senhor contra o Beto, caso contrário, teria lhe dito o que realmente aconteceu. E, se eu não tivesse ficado trabalhando na fábrica até tarde aquele dia, teria prevenido o Custódio, que era armação do Beto, para levá-lo até o local da festa.

Afonso pensa — Só espero ele não estar envolvido com drogas. Que não mate. Que não roube nada de ninguém, principalmente do Custódio, que já está avisado, faz muito tempo para não dar um tostão a nenhum de vocês. Cada um tem que batalhar, suar a camisa para merecer o pão que come e a vida que tem. O resto vem em dobro depois.

Dudu — Essa é a maior admiração que Custódio tem do senhor, pai! Que o ensinou o valor na vida. Tanto, que se tornou em doutor para salvar vidas.

Noemi orgulhosa — Assim ajudaria outras crianças, não perderem o pai. Pelo menos iria fazer o que estava ao alcance dele.

Afonso — E órfãos, poderiam não ter a mesma sorte que ele, de encontrar uma família que pudesse amar de verdade, com o mesmo amor que ele recebia da família adotiva. Ainda me lembro dessas palavras dele, quando decidiu voltar para a escola, e não mais fugir de lá.

Ezequiel, se colocando ao lado de Dudu, fala aos ouvidos dele. — Vá falar com o seu irmão Roberto. Tem que ser agora.

Dudu levanta — Vou ver se encontro o Roberto. Preciso ter uma boa conversa com ele, e não vou esperar ele aparecer. Tem que ser agora. Como sempre diz o senhor. Nunca deixe para depois o que se pode fazer na hora.

Afonso observa a esposa — Nós dois já sabíamos que o Beto podia nos dar muita dor de cabeça. Lembra de quando ele nasceu?

Noemi faz um chamego no esposo. — Nunca devemos perder a paciência. Como dizia meu pai. A paciência é uma virtude. Um dom que podemos ter. Vale muito mais uma conversa bem dita. Que uma surra de chicote.

Dudu que chegava a porta, volta — Gostei mãe, de ouvir isso!

Afonso para Dudu — Eu discordo com as palavras que eram do seu avô. Você mesmo não falou a pouco que o Beto não escuta ninguém? Ele sempre faz tudo que dá na cabeça, eu tenho medo que ele faça alguém sofrer e que também sofra pelas consequências.

Clara, todo o tempo ao lado deles, faz parte da conversa, fala com Afonso. — Suas palavras me fez lembrar as mesmas palavras do nosso pai. Eu ainda era criança, mas nunca esqueci, ouvindo ele desabafar, com a minha mãe, dizendo: Meu pai sempre faz tudo o que vem pela cabeça. Ele não respeita os sentimentos das pessoas, e não mede as consequências.

Noemi acrescenta — Ele amava tanto aquele pai. Que chorou como criança, quando soube que o pai estava morto, mesmo depois dele lhe causar tanto sofrimento. — vira-se para Afonso — Que Deus permita que nosso filho Roberto não tenha herdado nada de ruim do bisavô — olha Dudu — Como você herdou a bondade, a paciência e tudo de bom que era meu pai. Um homem correto, justo que foi punido pelo pai por amar demais, onde o pai não conhecia nenhum sentimento de amor. Roberto Lacerda era um homem vazio, sem sentimentos, capaz de matar qualquer um que passasse no seu caminho. Para ele o dinheiro, o poder estava à cima de tudo.

Clara – Lembro-me das palavras dele, quando voltei para a fazenda, depois da loucura que meu esposo fez com ele e o nosso filho Zequinha.

Clara relembra a tragédia. Minutos antes, abraçada a mãe, chora de emoção: — Minha mãe! Quero lhe dizer que sempre desejei que fosse minha verdadeira mãe, Francisca, principalmente depois que meu filho nasceu. Eu sabia que tudo o que conhecia sobre mim estava errado.

Francisca também se emocionada — Eu sei, minha filha. Você não imagina como eu, seu pai sofremos muito por causa disso.

Clara — Onde está o meu pai? Quero tanto ver ele. Tenho tanta saudade.

Francisca não responde, vendo o fogo surgir do outro lado. Todos correm.

Caio segura Glória, impedindo-a de se aproximar do fogo.

Glória grita em desespero pelo pai.

Francisca e Noemi seguram Clara, que também grita em desespero sem acreditar no que vê.

Todos caem de joelhos ao chão, arrasados, enquanto os corpos são devorados pelo fogo.

Chegando na fazenda com Francisca, Eduardo Lacerda, com seus (80 anos) vai ao encontro da filha. Em lágrimas se abraçam.

Clara, deitada na diva, com a cabeça no colo do pai, lamenta: — Por que Robson fez aquilo com ele e o filho? Por que não me matou, junto, assim, agora eu não estaria com tanta dor em meu peito!

Eduardo Lacerda — Agora sim! Acredito que na terra é o paraíso, onde podemos ser felizes, nem que seja por algumas horas. Mas também é o inferno, onde existe dor e tudo mais que um ser humano possa sofrer. O homem carrega dentro do peito o poder de Deus e maldição do diabo.

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