— Eu acho que vou contar para os meus pais… Na verdade para a minha mãe que eu sou gay. — disse Lucca para o seu namorado, os dois estavam em uma lanchonete no shopping. Estavam esperando dar a hora do filme que queriam muito assistir.
— Pensei que você já tava certo disso. — disse Dario rindo.
— Sim, mas agora eu estou mais certo ainda disso.
— E quando vai ser isso?
— Eu não sei… — sussurrou Lucca. — Talvez nesse final de semana ainda, tenho sábado e domingo. Eu só quero me livrar disso logo.
— O que você acha que pode acontecer?
— Quando eu penso nisso, sempre tem duas histórias e em uma delas meus pais me aceitam numa boa e tudo acaba bem, tudo acaba em arco-íris e unicórnios.
— E na segunda história? — perguntou Dario.
— Eu sou expulso de casa e viro alcoólatra na minha vida adulta. — respondeu Lucca, suspirou e em seguida voltou a falar. — Eu só quero me livrar disso logo, quero poder ser gay, ser quem eu sou, sem ter medo de nada. Pode namorar sem ter que esconder dos meus pais… Enfim, e você? O que vem em sua mente quando pensa em sair do armário para os seus pais?
— Eu já te disse que fui estudar bem longe dos meus pais por causa disso, bem, isso é um dos motivos pelo o qual eu escolhi estudar longe deles, mas quando penso em mim saindo do armário para eles… Posso pensar em milhares de histórias, mas nenhuma acaba bem. Sabe, você tem duas teorias e, pelo menos, uma delas acaba bem.
— Desculpa…
— Tudo bem Lucca, mas é o seguinte, eu acho que você tem mais chances do que eu. Falando seriamente. — disse Dario sorrindo. — Então, se você quer sair do armário para os seus pais, vá em frente.
— Realmente acha que eu deveria fazer isso?
— Eu tenho quase certeza de que já te encorajei a fazer isso antes. — disse Dario com leve riso acompanhando sua fala.
— Tudo bem, então… — sorriu Lucca ficando mais animado para finalmente contar primeiro para a sua mãe sobre sua sexualidade. — Amanhã é sábado, certo? Vou fazer isso amanhã, então. Isso se meu pai não chegar de viagem, aí eu vou ter que esperar um dia que seja somente ela e eu em casa.
— Vai dar tudo certo. — Dario segurou a mão de Lucca, isso fez o coração do nosso protagonista acelerar e um sorriso aparecer em seu rosto. — Eu te amo…
As três palavras mágicas deixaram a boca do universitário e se instalaram nas bochechas do outro rapaz, deixando as mesmas rubras. Um misto de alegria e calor preenchia o corpo do mais novo que sem saber abriu um sorriso de canto a canto.
— Eu também te amo, Dario. — disse Lucca.
Olhou para todos os lados da lanchonete e quando se sentiu seguro se inclinou para cima do namorado e preencheu aqueles doces lábios com os seus, logo suas línguas se convidaram para uma dança.
Os dois ficaram em silêncio por alguns segundos após o beijo, mas não um silêncio constrangedor. Era um tipo de silêncio bom, calmo. Dario pegou seu celular e começou a ler algumas mensagens, então, ele quebrou o silêncio com uma pergunta direcionada ao seu namorado:
— Você ainda fala com o Arthur?
— Eu tento, mas tem uns dias que ele não me responde. — respondeu Lucca. — Por quê?
— Então você não sabe o que aconteceu com ele… — sussurrou.
— Eu acho que já ficou claro que eu não sei o que aconteceu com ele, Dario. Me conta… Por favor…
— Bem, eu não sei muito bem o que aconteceu porque ele não explicou para a gente…
— Espera, espera aí, Dario. — disse Lucca interrompendo o namorado. Como assim o Arthur, seu melhor amigo, havia contado para um monte de pessoas sobre algo que aconteceu com ele e que parecia muito sério, mas ainda não havia ido falar com ele, Lucca, que deveria ser seu melhor amigo. — Ele contou para a gente… Tipo, no plural? Para a gente, não só para você, mas para um grupo restrito de pessoas?
— Sim… — sussurrou Dario se arrependendo após observar com a atenção a reação do outro. — Se eu soubesse que você ficaria assim não teria te contado nada.
— Mas agora que contou, por favor, siga contado o que aconteceu com o Arthur. Acontecimento qual eu que, tecnicamente seria o meu melhor amigo, não fiquei sabendo.
Ainda arrependido de ter aberto sua boca, Dario suspirou e começou a contar as informações que tinha sobre o último acontecimento importante na vida de Arthur.
Começou pelo um tipo de ataque nervoso ou ansioso que Arthur havia passado, porém não conseguiu dar mais detalhes porque nem ele mesmo deu muitos detalhes do acontecimento, mas havia ficado muito mal e começou a frequentar uma psicóloga e depois disso começou um tratamento com medicamentos controlados para melhorar sua saúde mental. Quando Lucca questionou Dario sobre há quanto tempo isso aconteceu ou estava acontecendo, nem o namorado sabia dar a resposta exatamente, mas continuou a contar a história de Arthur. Também disse que o namoro do rapaz com a Letícia havia terminado por decorrência desse problema e da saúde mental, explicou que ele não estava se sentindo bem para continuar com o relacionamento e havia achado saudável tanto para ele quanto para a namorada darem um tempo. Só que Arthur acreditava que realmente havia acabado o namoro.
Muitas coisas poderiam ter passado na mente de Lucca nesse momento, como, por exemplo, ficar preocupado com o melhor amigo e deixar ele quieto porque parecia que precisava de um tempo ou, então, procurá-lo para tentar o ajudar e lhe dar apoio moral, porém não foi isso que aconteceu. O que Lucca sentiu quando soube da notícia, a primeira coisa que sentiu foi traição, mas por que traição? Bem, se sentiu um corno da amizade por ser o último que ficou sabendo do problema daquele que seria o seu melhor amigo. Sentiu como se a sua amizade não fosse nada e esses quase oito anos tivessem sigo jogados fora.
Se o seu melhor amigo estiver lutando para ficar mentalmente saudável e você se sentir traído por não ficar sabendo disso desde o começo, bem, acho que devemos rever um pouco os conceitos, pois corre o risco de estar sendo egoísta em relação aos sentimentos das outras pessoas.
Na verdade você estaria sendo bem egoísta em relação aos sentimentos dos demais.
Fazia um bom tempo que Lucca se encontrava parado em frente ao seu notebook, deveria estar finalizando um trabalho para ser entregue em dois dias, mas o assunto da situação da saúde mental de Arthur teimava em permanecer em seus pensamentos. Não se engane, pois os pensamentos estavam longe de ser altruístas e para ser bem sincero ele só iria pensar seriamente em como o seu “melhor amigo” estava, psicologicamente falando, depois de tirar seu enorme ego da frente dos pensamentos.
Isso só seria possível se Lucca fizesse a burrada de ir enfrentar Arthur sobre ter escondido a sua depressão dele.
Advinha só?
Foi exatamente isso que Lucca fez.
Arthur pareceu um pouco surpreso quando o amigo vizinho de rua bateu na porta do seu quarto sem antes avisar que estava chegando.
— Que faz aqui? — perguntou o adolescente de cabelos negros e grandes olhos brilhantes.
— Eu queria te ver… Conversar com você, sabe, ver como você estava. — explicou Lucca.
— E por que isso?
— Por quê? Bem… Deve ser porque eu fiquei sabendo pelo Dario que o meu melhor amigo, não… O meu suposto melhor amigo tinha tido um ataque e estava frequentando uma psicóloga ou psiquiatra, além de aparentemente ser diagnosticado com depressão… — suspirou depois de conseguir falar tudo o que queria para o outro rapaz.
Ambos ficaram em silêncio, dessa vez era um silêncio pesado. um olhando para o outro até que esse momento sem qualquer palavra dita somente com os barulhos vindos da rua como fundo foi quebrado com o suspiro de Arthur que começou a se explicar:
— Eu não te contei porque eu não queria que todo mundo soubesse, ia contar isso aos poucos para as pessoas, saca?
— Esse todo mundo sou eu, né? Porque tipo… Toda Santa Maria já deve ter ficado sabendo, mas eu…
Arthur interrompe e diz:
— Eu não entendi qual é o motivo de você estar chateado com isso, cara. — disse dando de ombros.
— Não sabe? — perguntou Lucca tentando ser irônico, mas havia conseguido ser um pouco agressivo além do necessário. — Você sempre diz que somos melhores amigos, como irmãos e tudo mais, mas não me conta uma coisa dessas… Conta pro Dario, pro pessoal do grupo de dança e os teus amigos otaku, mas eu…
— Mas isso não quer dizer nada, Lucca. Ainda te considero meu melhor amigo, como um irmão para mim.
O nosso protagonista não disse nada, tentou enxergar sinceridade na face do seu “melhor amigo”, mas decifrar ele sempre era uma ação impossível de ser feita por Lucca.
Não seria a primeira vez em que questionava a sua amizade com ele, lembra muito bem de uma época em que ainda era criança e estava no meio do ensino fundamental, quarto ou quinto ano. Era comum naquela época seus pais darem uma festa de aniversário para Lucca e convidarem as crianças do bairro, mas de todos os convidados Lucca estava mais ansioso pela a presença de Arthur e simplesmente o garoto decidiu não aparecer.
Deixou a casa do rapaz assim, sem falar nada e com uma magoa egoísta presa no coração. Ao mesmo tempo em que se sentia mal por fazer essa cena por causa da condição mental que Arthur se encontrava, a outra parte do seu cérebro dizia que aquilo aconteceu porque era assim que deveria ter sido.
— Eu não me arrependo, eu me senti traído como amigo e fui falar com ele. — disse Lucca sentado ao lado de seu namorado no campus da universidade federal. Apesar de estarem no meio do inverno naquele momento havia surgindo um belo sol naquele domingo e os dois aproveitaram para se verem mais uma vez na semana.
— Mas e a situação dele? Poderia complicar ela, você não acha? — perguntou Dario em um tom de preocupação.
— Mas não complicou. — disse Lucca rapidamente. — Ele sempre, sempre disse que somos melhores amigos, mas não pode contar uma coisa importante dessas pra mim? Eu tenho meu direito de ficar bravo, não acha?
— Bem, acho que tem direito sim. — disse o namorado fazendo uma breve pausa antes de lançar um novo tópico na conversa. — Então, conseguiu sair do armário para sua mãe?
— Consegui o quê?
— Você não disse que iria contar para sua mãe que é gay? Tipo, você fez essa afirmação duas vezes, pensei que já tinha feito.
— Ah sim, se eu tivesse saído do armário você já estaria sabendo meu amor. — disse Lucca não dando muita importância para o tema.
— Então?
— Então?
— Por que não fez? — perguntou Dario curioso.
— Ai, é que essa história toda do Arthur ocupou a minha mente e eu não tive tempo de me lembrar que eu queria contar para a minha mãe que sou gay, mas eu vou fazer isso porque também quero contar do nosso namoro e não ter mais que mentir sobre o que estou fazendo.
Dario murmurou alguma coisa incompreensível para Lucca, então, o rapaz estudante do ensino médio sorriu para o seu namorado e disse olhando dentro dos seus olhos:
— Eu te amo.
— Também tem amo. — respondeu o universitário com um sorriso também presente em seu rosto.
Selaram as declarações de amor com um beijo, os lábios conectando as energias um do outro enquanto a mão de Dario sobre o cangote de Lucca dita o caminho pelo qual aquele beijo deve caminhar. Finalizam o ato quando o folego já se encontrava escasso para os dois.
— Mas eu ainda tenho certeza de que você estava errado em ir falar com Arthur. — disse o universitário sorrindo retornando ao assunto anterior.
— Hmmm… — murmurou o estudante do ensino médio se afastando, mas ainda sorrindo. — Se eu estiver errado nessa situação, a vida vai me mostrar. Não precisa se preocupar.
Dario somente soltou uma risada amigável.
Trocaram o assunto rapidamente, porém a conversa não durou muito porque o clima agradável daquela tarde começou a dar lugar aos ventos frios das noites do meio do ano no Rio Grande do Sul. Os dois caminharam para a parada de ônibus do campus que se localizava ao lado da Casa do Estudante, enquanto o ônibus não aparecia os namorados continuaram com a conversa que havia sido interrompida pelo frio.
— Mas com certeza que, infelizmente, Go-Buster não faria tanto sucesso quanto Gokaiger em questão de brinquedos. Você viu o quanto de produtos que lançaram com essa série? Qualquer coisa que viesse depois de Gokaiger não faturaria tanto quanto ela. — disse Lucca abraçado no namorado por causa do frio, entraram em uma discussão sobre Super-Sentai, os super heróis coloridos do Japão.
— É, mas isso meio que impede de Go-Buster virar Power Rangers depois de Super Samurai, não? — perguntou Dario dando continuidade a conversa.
— O quê? Claro que não… Se não vir depois de Super Samurai vai vir no futuro, eu tenho certeza. Quem sabe em um filme ou quando a Saban perder os direitos sobre a franquia mais uma vez.
— Você é bem otimista sobre a franquia, não? — perguntou o universitário rindo.
— Claro que sim, como fã eu tenho que ser otimista sobre Power Rangers. Meus bebês merecem todo o sucesso do mundo, deveriam estar lá no topo com a Marvel e a DC. — neste instante o ônibus surgiu dobrando a rua. — Aí está o ônibus, acho que isso é um até mais meu amor.
Dario deu um rápido selinho em Lucca.
— Me manda uma mensagem quando chegar a tua casa, tudo bem? — o universitário pediu com um sorriso em seus lábios.
— Claro. Eu aviso sim meu amor.
Antes de entrar no ônibus Lucca deu outro beijo nos lábios do namorado.
Já dentro da condução e depois de pagar sua passagem, sentar em um dos bancos perto da única saído daquele ônibus, Lucca conectou os fones de ouvido ao seu celular e os posicionou nas entradas de suas orelhas, deixou o aleatório escolher a música que daria inicio a viagem.
Santa Maria é uma cidade pequena, sim, quase todas as viagens de ônibus fora do horário de pico davam menos que uma hora ao todo. Do campus da Universidade até o centro da cidade era uma das exceções e, às vezes, a viagem poderia durar alguns minutos a mais do que uma hora se fosse um dia de muito trânsito engarrafado.
As paisagens da viagem eram compostas por uma longa BR, algumas árvores, algumas ruas que davam entradas a outros bairros, revendedoras de carros, fábricas e etc.
Em um certo momento da viagem, o aleatório do celular de Lucca começou a tocar a música “Behind Blue Eyes”, música interpretada por Limp Bizkit, Lucca não era fã dessa banda, porém gostava muito da canção que tocava e ela fazia parte do álbum “MALHAÇÃO 2004 – Internacional” que ele havia baixado algumas semanas atrás de forma pirata na internet, pois não existe mais para comprar.
Aos poucos, conforme a letra ia sendo cantada, imagens de Arthur surgiam como flash nos pensamentos do nosso protagonista.
No one knows what it’s like to feel these feeling like I do and I blame you. — Voltou a memória de Luca um momento entre ele e Arthur, quando eram mais novos, estavam brincando no pátio da casa. Outra memória brotou: os dois em frente a televisão do quarto do melhor amigo assistindo ao filme “O Grito” do qual Arthur ficava desconfortável em relação ao menino japonês fantasma. E a letra da música continuou:
No one know how to say that they’re sorry and don’t worry I am not telling lies. — Agora memórias mais recentes passavam na mente de Lucca, para ser mais especifico, do dia em que ele foi tirar satisfação com Arthur por não ter lhe contado sobre ele estar frequentando uma psiquiatra e também tomando remédios, além, claro, da sua depressão. A culpa havia chegado e a sensação não era agradável.
— Por que essa música tá me fazendo pensar no Arthur? Nem é sobre amizade, é sobre… Droga, eu realmente tenho que ir pedir desculpas para ele, não? — pensava Lucca consigo mesmo. — Acho que antes de eu ir para casa vou chegar na casa do Arthur, minha consciência tá me incomodando como se eu tivesse cometido assassinato e acho que isso quer dizer que eu fui o errado da história, não?
Quando chegou ao centro da cidade, já estava mais escuro e mais frio, entretanto, para a sorte de Lucca assim que ele colocou seus pés na parada o ônibus o que passava na entrada de seu bairro tinha acabado de estacionar para que os passageiros embarcassem. Demorou por volta de vinte minutos para que o adolescente chegasse a rua onde seu bairro começava.
Passou reto pela sua casa e foi para o fim da rua, onde a casa de Arthur ficava.
Quem abriu a porta da casa foi a mãe de Arthur, uma mulher de estatura baixa e cabelos escuros. Quando Lucca perguntou se ele poderia conversar com o amigo a tia disse que infelizmente naquele momento não seria possível. Ela não deu muitas informações, mas o nosso protagonista sentiu que o seu amigo não deveria estar em uma das melhores fases da sua depressão. Isso acontecia com uma pessoa que se encontrava naquelas condições. Lucca se desculpou pelo incomodo e em seguida foi embora mais pensativo ao mesmo tempo em que se sentia ainda mais culpado pela a forma que falou com Arthur em seu último encontro.
No chuveiro do banheiro de sua casa, enquanto tomava um banho antes de ir se deitar, o rosto de Arthur retornou a mente de Lucca e aos poucos seu peito experimentou uma sensação de aquecimento que não era consequência da água quente que vinha do chuveiro elétrico. Ele ainda gostava do Arthur? Ainda existiam sentimentos dentro dele em relação ao melhor amigo? Não somente amizade, mas algo mais? Provavelmente sim, mas agora Lucca estava em um relacionamento sério com Dario e era melhor esconder o que sentia pelo o outro rapaz em um baú e o enterrar em seu subconsciente.
— Eu tenho que sair do armário… — sussurrou Lucca quando desligou o chuveiro.
Após se vestir com o tipo de roupa que geralmente usava para dormir, Lucca entrou no quarto da sua mãe, seu pai estava viajando a trabalho, então, aquela era uma noite agradável para sair do armário para a sua mãe, pelo menos isso. O coração do adolescente começou a bater mais forte mesmo antes de abrir a boca, tentava manter a calma, mas sentia a sua garganta fechar e o seu corpo esquentar de ansiedade.
— Aconteceu alguma coisa? — perguntou Julieta ao ver o filho parado na porta do quarto, ela estava terminando de dobrar algumas roupas para serem guardadas no guarda-roupas.
— E-eu… — a voz de Lucca saía tremida, sem muito volume. — Eu… Eu… Eu quero te contar uma coisa, mãe.
Essa séria, por muito tempo, a coisa mais difícil que ele teria que fazer em toda sua vida.
— O que houve meu filho?
— Euachoqueeuusougaymãe. — disse Lucca rapidamente, respirou fundo e disse mais uma vez. — Eu sou gay, mãe.
Julieta ficou em silêncio, o garoto sentiu-se como se estivesse sendo julgado pela a própria mãe.
— Meu Deus… — sussurrou Lucca sentindo as lágrimas deixarem seus olhos como se alguém houvesse ligado uma torneira que existia secretamente atrás dos seus olhos. — Eu… Eu di-disse…
A voz de Lucca falhou, ele só conseguia chorar enquanto a sua mãe não sabia o que deveria ser feito naquele momento. Ela largou a roupa que estava em suas mãos e se aproximou do filho, tentou sorrir, mas não conseguiu porque o choro do mais novo estava abalando os seus sentidos.
Então ela perguntou:
— Você tem certeza disso?
Lucca respondeu com uma afirmação de cabeça.
— Certo. — sorriu Julieta. — Lucca, me escuta… Lucca… — ela segurou o rosto do rapaz e olhou dentro dos seus olhos. — Eu sou tua mãe e não importa o que aconteça, eu sempre vou te amar. Tudo bem?
— Mas o meu pai… E-ele vai me odiar.
— Não, não… Seu pai também nunca vai deixar de te amar. Tudo bem? — sorriu a mulher. — Agora vem aqui, me abraça.
Os dois deram um forte abraço. Esse seria um dos raros momentos em que Lucca teria esse tipo de intimidade com a sua mãe. Um dos raros momentos, mas que ambos aproveitaram cada segundo até que o momento final. Pela a primeira vez, Lucca sentiu uma paz em seu interior. Ele voltaria a sentir isso? Não tinha certeza, mas queria.
— Eu vou dormir. — sussurrou Lucca.
— Boa noite. — disse Julieta observando o filho sair do quarto.
A mulher ficou vários minutos na mesma posição, refletindo sobre a sua vida. O que a condição do seu filho mudaria, bem, em como ela pensava nele nada, entretanto, ela ainda poderia ter um neto vindo dele um dia? Quem sabe, as coisas estão mudando muito nos últimos tempos. Existe adoção, barriga de aluguel e tudo mais, porém essas coisas não passaram pelas reflexões de Julieta. Ela não deixaria de amar o filho, mas demoraria a entender a condição sexual dele.
Naquela noite Lucca dormiu mais tranquilo por ter tirado um peso de suas costas, um peso que não deveria ser um peso. Por que temos que sair do armário e nos assumir? Não existe nada para ser assumido, somos seres humanos como quaisquer outros. Se nós nos apaixonamos pelo o mesmo sexo, ambos ou por pessoas que não se consideram de nenhum dos dois gêneros por qual motivo temos que dar satisfação disso? Ter que sair do armário, ter que se assumir e se revelar como se fossemos personagens dos quadrinhos do X-Men.
A nossa existência, como pessoas LGBTQ+ não deveria ser um peso… Algo a ser revelado porque fomos obrigados e esconder por culpa de uma sociedade que pensa tão pequeno e se preocupa com que outra pessoa faz em seu íntimo. Não estamos matando, estuprando ou comentando outros crimes, estamos amando, tentando amar e tentando viver uma vida digna como qualquer outro ser humano deveria viver.
Lucca dormiu sem esse peso em suas costas, mas ele deveria ter carregado o peso de ser quem ele realmente é?