Ao mesmo tempo em que Lucca estava em função de ir até a base aérea da sua cidade realizar os testes e preencher formulários de inscrições para no fim saber se iria ou não ser chamado para o serviço militar, sua história com Arthur ainda estava sendo desenrolada. Durante o período que Lucca ficou com seu emocional fragilizado depois do seu surto, depois de lembrar-se da coisa horrível que disse que faria com Rocco e ainda depois do que passou com os números errados no cartão de visita da psicóloga, Arthur estava com uma namorada nova que chamou a atenção de Gabriela.
Por ainda estar fragilizado emocionalmente, o nosso protagonista escolheu não comparecer naquele ano ao evento que reunia os nerds, otakus e tudo mais da cidade de Santa Maria na antiga estação ferroviária. Como não precisava pagar entrada porque o uso do local era liberado de forma gratuita pela a prefeitura nesse evento reuniam mais pessoas.
Gabriela se preparou por meses para participar daquele evento, tinha começado ainda no inicio do ano a desenhar e produzir o seu cosplay de Mulher-Maravilha, sua super-heroína favorita. Foi acompanhada do seu namorado que frequenta o curso de letras da universidade federal. Como sempre a programação da reunião da cultura geek da pequena cidade do coração do Rio Grande do Sul começou no inicio da tarde e o aglomerado de pessoas foi chegando aos poucos. O casal caminhou um pouco por dentro do evento onde estavam os artistas, as bancadas de algumas lojas geeks da cidade vendendo canecas, botons, ursos, livros, mangás e hqs, foram para a parte onde estavam vendendo comida e depois voltaram para o lado de fora e sentaram na sombra.
— Olha lá o Arthur. — disse Gabriela quando avistou o garoto com seu grupo de amigos e a sua nova namorada.
— Quem? — o namorado perguntou.
— Arthur. Aquele amigo… “amigo” do Lucca que eles já, sabe, se pegaram. — a garota tentou explicar, mas o seu companheiro ainda não havia sacado a situação. — Tudo bem, vou explicar desde o começo. O Lucca e ele são amigos, tem um tempo já… E, bem, eles já transaram várias vezes, porém eu acho que o Arthur gosta do Lucca, mas não quer admitir, sabe? Ele sempre procura o Lucca para os dois ficarem de novo quando tá solteiro.
— O Lucca gosta dele?
— Sim, mas ele ainda não contou.
— Então, mas se ele gosta mesmo dele como ele vai saber se o Lucca não conta?
— O quê? Não, você não entendeu… Enfim, mas eu não gosto do Arthur e nem dos amigos dele. O Lucca já chegou até mim muitas vezes sofrendo porque gosta dele, eu não entendo o que ele viu no Arthur… Mas infelizmente gosta dele, tudo seria mais fácil se o Arthur também enxergasse que ele gosta do Lucca também.
— Ou que o Lucca finalmente abrisse o jogo.
…
Se via em mais uma situação que se tornou corriqueira desde que transou com Arthur pela a primeira vez. Sempre que acontecia não conseguia compreender os motivos, como sempre uma semana atrás ele passou uma ótima tarde ao lado do seu melhor amigo com os fazendo sexo e em seguida, uma semana depois, descobriu que Arthur estava namorando uma nova garota. Sempre acontecia assim e quando acontecia, geralmente, se sentia usado pelo outro.
Quando sua amizade com ele havia se tornado algo mais sexual do que amigável? Quando foi que deixou esse sentimento por Arthur cresceu tanto mesmo o outro não dando nenhuma abertura para que o mesmo florescesse? Como já era de praxe, se encontrava cheio de questionamentos de situações que se colocou por conta própria.
Tinha medo de revelar que seus sentimentos iam além de uma simples amizade, de um simples tesão e que se encontrava apaixonado de corpo e alma pelo seu melhor amigo. Se contasse para Arthur que gostava dele, Lucca possuía o medo do rapaz deixar de falar com ele por ter escondido o sentimento por tanto tempo. Não queria perder uma amizade de longos anos, sabia que sofreria muito até esquecer que um dia foi amigo de Arthur e de que um dia já compartilhou seu corpo com ele.
Sempre quando Arthur aparecia com uma nova namorada — após os dois rapazes terem transado uma semana atrás —, Lucca dizia para si mesmo que da próxima vez não cederia aos avanços do outro rapaz para conseguir sexo, porém não conseguia resistir por muito tempo porque o ímã que ligava ele a Arthur era muito forte. Todavia a situação estava ficando cada vez mais difícil de sustentar. Mantinha os pensamentos de que a próxima vez seria a sua vez de ter a sua paixão correspondida. As esperanças não morreram nem quando Lucca obteve uma responde negativa de Arthur ao perguntar se ele namoraria outros homens.
…
Arthur havia se revelado pansexual no inicio daquele ano.
“tá fazendo o q?” Arthur havia enviado uma mensagem para Lucca.
“nada”
“por quê?”
Respondeu Lucca e o melhor amigo enviou em seguida:
“quer vir aqui em casa?”
“pra gente se ver”
“já já chego aí”
Respondeu Lucca e não demorou muito para que ele batesse na porta da casa que foi aberta por Arthur, estavam sozinhos e o nosso protagonista já sabia como que aquilo poderia acabar. Em certo momento Arthur sentou ao lado de Lucca na cama, seus braços se encontraram e em um movimento rápido o jovem mais cheinho levantou da cama ficando de frente para o amigo que continuou sentado.
Lucca apertou o seu punho criando coragem.
— Tenho que te dizer uma coisa, Arthur.
— O quê?
— A gente não pode mais transar… Um com o outro.
— Por quê?
— Eu deveria ter dito isso antes para você, mas eu não posso mais continuar fazendo sexo com você porque eu te… Eu estou apaixonado por você.
Arthur ficou em silêncio.
— Faz quanto… Por quanto tempo você está apaixonado por mim?
— Acho que desde sempre. Mas comecei a ter noção disse depois que a gente transou pela primeira vez.
Arthur levantou da cama, andou de um lado para o outro do quarto enquanto passava a mão em seus cabelos, nervoso com aquela descoberta e sem saber exatamente o que dizer.
— Por que não me disse antes?
— Por quê? — questionou Lucca como se a resposta fosse obvia. — Você sempre tava namorando, no começo você falava que era hetero e demorou para se descobrir, mas principalmente porque eu tinha medo de que se você descobrisse… Deixasse de ser meu amigo.
— Poderia ter me dito isso antes, as coisas poderiam ser diferentes.
— Diferentes como?
— Não sei, não sei… Quem sabe poderia ter acontecido…
Lucca encarou Arthur com uma expressão de reprovação, notou um tom de brincadeira na hora em que o rapaz falou a última frase.
— Não faz piada com isso, por favor, já foi difícil de dizer e agora… E agora isso.
— Eu não fiz piada.
Um silêncio constrangedor preencheu a sala como uma nevoa no meio de uma estrada deserta, os dois ficaram mal com aquela conversa. Lucca por finalmente ter aberto seu coração e Arthur por não ter desconfiado do que havia acontecendo ao longo dos anos.
— É melhor eu ir embora.
— Tudo bem… — sussurrou o rapaz de olhos grandes.
— Arthur.
— Sim?
— Acho que a gente tem que ficar um bom tempo sem se falar, sem se ver… Vai ser bom para eu colocar minha cabeça no lugar e para você poder fingir que essa noite nunca aconteceu.
— Você… — Arthur desviou seu olhar, tentando encontrar um ponto fixo para encarar e escolheu o chão. — Tem certeza de que é isso que… Que você quer? — voltou a encarar o amigo.
— Se eu tenho certeza? Arthur… Acabei de dizer que estou apaixonado por você, você diz que eu poderia ter falado mais cedo e poderia ser diferente. Diferente como? Não precisa responder porque é melhor eu não saber como esse diferente seria. Acha que eu vou conseguir conversar com você ou te ver antes de esquecer essa paixão e sobrar só a amizade?
— Tudo bem então. — limpou o pouco de água que queria sair dos seus olhos, sentou em sua cama e observou Lucca deixar seu quarto, talvez pela última vez.
Enquanto fazia a pequena caminhada até sua casa, o nosso protagonista entrou no chat do grupo com os amigos que havia feito durante o tempo que jogou o RPG de Glee, pessoas quais ele queria levar para toda sua vida. Avisou que havia contado para Arthur que estava apaixonado por ele e não demorou muito para que as mensagens surgissem pedindo o resto da história. Lucca explicou aos poucos o que havia acontecido da conversa e de sua decisão final. Em seguida contou para Gabriela e repetiu a sua explicação feita no grupo anterior.
O que aconteceria no futuro? Não poderia ter certeza. Aquele poderia ser o fim da sua amizade com Arthur ou, então, sobreviveria aquilo. Existia uma chance deles se tornarem um casal no futuro? Naquela noite Lucca pensava que sim, mas aos poucos ele entenderia que isso não seria uma coisa possível de acontecer ao mesmo em tempo que também entenderia aos poucos que essa paixão ficaria sempre lá guardada em seu peito.
