Ficou com as coisas que seu melhor amigo lhe disse durante a ajuda do mesmo após o seu momento pós-colapso nervoso. Lucca precisava muito procurar por uma ajuda profissional, mas ele não sabia por onde começar e com falar para buscar isso e, então, teve uma brilhante ideia… Que naquela época parecia muito com uma brilhante ideia. Tinha que resolver essa história de uma visita a uma psicóloga antes da próxima semana porque como já havia feito dezoito anos de idade e já passou pela triagem do exército brasileiro o adolescente teria que se apresentar para a base aérea da sua cidade. O medo de Lucca é que se ele não estivesse bem mentalmente falando até a próxima semana poderia ser preso.
Antes de decidir por procurar por uma ajuda Lucca pensou em se colocar em auto castigo por causa da coisa terrível que falou que faria com Rocco durante o momento em que se encontrava no seu colapso nervoso. O rapaz não tinha coragem para tirar sua própria vida, mas depois de dizer que faria seu amigo se matar, a mesma pessoa que passou por dois suicídios, Lucca começou a pensar que precisava de um castigo e assim começou a sua semana sem comer. Achava que restringir sua alimentação a zero comida e água seria um ótimo castigo e além de auto se colocar nessa situação após jurado seu amigo de morte durante o seu surto nervoso.
— Você não vai comer? — perguntou Julieta entrando no quarto do filho e deixando um prato com arroz, feijão e ovo frito sobre a mesa do computador. — Precisa me contar o que aconteceu para você estar assim.
— Não aconteceu nada. Só me deixa sozinho.
A mãe não fala nada e em seguida deixa o quarto.
Durante esse período de autoflagelação outras coisas começaram a passar pela mente do nosso protagonista. A sua mente viajou novamente até o inicio do ano quando não conseguiu uma vaga na universidade federal, realmente ele não estava bravo com a instituição e sim consigo mesmo por ter baixado tanto a sua guarda ao ponto de falhar na única coisa que teria que fazer naquele ano para prosseguir com seus planos de vida. Agora se via jogado em sua cama sem comer para se castigar e ainda na próxima semana teria que se apresentar na base aérea se não correria o risco de ser preso por traição a pátria.
Como encontraria uma psicóloga? Não sabia como as coisas aconteceriam nesse caso, mas sabia que existiam pessoas que o ajudariam na sua antiga escola assim como Arthur disse um dia atrás. Mas desistir da sua autoflagelação seria a coisa certa a se fazer? Não tinha certeza, entretanto no momento em que começou a pensar sobre a sua possível prisão como desertor por faltar ao seu encontro obrigatório na base aérea, Lucca começou a repensar nesse castigo que se auto se colocou.
Olhou o horário pelo seu aparelho celular e percebeu que sua antiga escola ainda estava aberta. Lembrou-se do que Arthur disse sobre procurar ajuda na instituição e que talvez a diretoria o ajudasse com alguma coisa. Levantou da cama com um pouco de dificuldade porque estava fraco e quando foi deixar seu quarto passou pelo o espelho, encarou se reflexo. Seus olhos estavam quase sendo quase completamente engolidos pelas bolsas roxas e sua boca seca. Tomou um copo de água antes de sair da sua casa, quando o líquido caiu em seu estomago sentiu um movimento estranho.
— Eu preciso de ajuda. — disse Lucca sentado de frente para a mesa da sua ex-diretora.
— Como assim? — perguntou a mulher.
— Eu… Eu fiz uma coisa horrível, disse coisas horríveis e acho que tive um ataque nervoso. Eu não lembro direito de como tudo aconteceu, mas lembro das minhas lágrimas que não paravam de sair… Minhas mãos tremendo. Acho que preciso conversar com um profissional.
— Entendi.
— Vocês não poderiam me indicar alguém? Me encaminhar… É que eu não sei como essas coisas funcionam.
— Tudo bem. — disse a diretora com voz calma. — Eu tenho uma irmã psicóloga, vou pedir para ela vir aqui te ajudar e conversar para ver do que você precisaria necessariamente. Tudo bem?
— Tudo. Obrigado. — sorriu Lucca sentindo-se mais aliviado.
Quando deixou o prédio da escola, o nosso protagonista se sentiu mais leva ao saber que em breve teria uma ajuda para iluminar seus pensamentos, porém ao mesmo começou a pensar se as coisas pelas quais estavam passando eram verdadeiras, essa sua dor e a sua forma de lidar com aquilo poderiam ser levadas a sério? Agora que deu uma aliviada em si mesmo começou a se perguntar se os seus sentimentos, suas reações valiam a pena receber atenção de um profissional. Não existiam pessoas com problemas maiores?
Quando retornou a sua casa, tomou um banho para se livrar da sensação de cansaço e derrota que impregnou o seu corpo após começar com seu castigo e durante o banho continuou pensando se os seus problemas pessoais eram válidos. Agora parecia tudo tão pequeno, tão exagerado e ao mesmo tempo sentia a necessidade de procurar ajuda.
No dia seguinte recebeu uma ligação da diretora da escola perguntando se ele poderia ir a tarde à instituição para se encontrar com a irmã dela, Lucca apareceu no horário marcado. Quando chegou a sua antiga escola Lucca foi direcionado a uma sala improvisada na biblioteca onde a irmã da sua ex-diretora o esperava com um caderno de anotações e uma garrafa de água quase vazia. Lucca não se sentiu confortável no primeiro momento, nem no segundo e muito menos no terceiro, mas continuou respondendo as perguntas da mulher após ele contar a história que, em seu julgamento, levaram ao seu colapso Tentava encontrar uma maneira de confiar nela para se sentir mais a vontade durante a conversa, mas não conseguia, alguma coisa lhe dizia para não seguir se encontrando com ela.
No fim da conversa a mulher entregou para Lucca a receita de um remédio de manipulação, disse que ele poderia comprar em uma farmácia que ficava no subsolo do shopping do calçadão e ainda lhe deu um cartão com três números, dois de celular e um fixo.
Depois que Lucca disse que é homossexual, durante a conversa a psicóloga irmã da diretora da escola insistiu no questionamento sobre o adolescente ter sido abusado na infância. Isso contribuiu para que o alarme de não confiança soasse na mente do nosso protagonista enquanto as demais perguntas dividiam espaço com a insistência sobre existir ou não um abuso no passado do rapaz.
Antes de ir à farmácia de manipulação Lucca conversou com sua amiga, Gabriela, sobre o que foi receitado pela psicóloga. Lucca sempre tinha um pé atrás com qualquer medicamente que lhe parecesse um placebo. Porém a garota lhe garantiu que o medicamento natural funcionava já que ela e sua mãe já usaram um remédio semelhante não muito longe no passado. Mesmo ainda existindo um questionamento sobre a funcionalidade do floral, o rapaz foi até o centro da cidade com a receita prescrita para realizar a compra.
— Mas na receita ela não especificou qual lírio é para ser usado. — disse a moça da farmácia de manipulação.
— Como assim? — perguntou Lucca confuso.
— Você sabe qual tipo de lírio é para ser usado?
— Não… Mas eu tenho o número dela, vou tentar ligar para ver isso. — respondeu o garoto sem jeito e em seguida pegou a receita novamente.
Sentou em um dos bancos da praça que localizada ao lado daquele shopping. Pegou o seu celular e em seguida digitou o primeiro número que foi impresso no cartão.
O número não existia. Tudo bem, Lucca tentou não deixar que aquilo o afetasse. Tentou o segundo número.
O número também não existia, mas ainda existia a última esperança que era o número de telefone fixo. Digitou rapidamente e revisou para ver se não existiam erros na digitação, chamou. Depois de alguns segundos com expectativa finalmente a ligação foi atendida, mas Lucca não poderia seguir aliviado por muito tempo:
— A Ligia está? Psicologa…
— Quem?
— Esse não é o número da Ligia?
— Não existe ninguém com esse nome aqui. — respondeu a voz do outro lado.
— Tudo bem. Desculpa.
Lucca encerrou a ligação e, então, ficou encarando o cartão de visita que lhe foi entregue no dia anterior. Sentiu como se uma mão sufocasse seu pulmão, tentou manter a calma, mas o que acabará de acontecer estava muito recente em sua memória para ser esquecido. Dario o enganou, possivelmente Rocco o enganou e agora Ligia havia o enganado também. Não poderia ter sido um erro? Mas que tipo de profissional entregaria um cartão com números errados e que não existiam? Levantou do banco e foi para a parada de ônibus. Tudo o que desejava naquele momento era sua cama, o clima estava frio e precisava um local escuro e quente para poder chorar.
…
Eram quatro horas da manhã quando acordou. Tinha que tomar banho, comer alguma coisa e em seguida seu pai o levaria até a base aérea — que ficava do outro lado da cidade — para sua primeira apresentação, Lucca achava que aquela seria a única, mas mais tarde foi pego de surpresa quando soube que teria que se apresentar mais vezes e acabou sendo mais vezes do que deveria porque em um dos dias marcados para a sua volta o rapaz esqueceu do seu RG. Deixar a carteira de identidade era um acontecimento que se repetia muitas vezes na vida de Lucca.
Essa função da base aérea ocupou todos os primeiros meses do ano e Lucca ficou em focado nisso. Quando lhe perguntavam se gostaria de entrar para a base aérea o adolescente respondia “Eu não quero, mas se me escolherem não vou ter muita opção, não é?”.
E assim os entrevistadores ficam trocando olhares para não rirem dele.
— Mas você quer? — perguntou Gabriela em uma tarde onde ela e Lucca se encontraram no centro da cidade, uma tarde de sol.
— Não. Eu não quero. Ai, não sei… Seria bom, né? Pelo menos eu ia ganhar dinheiro por ter sofrido no treinamento, sei lá, mas ao mesmo tempo eu não quero ficar na base aérea.
— Ainda bem que eu não sou obrigada a passar por isso. — disse a garota em um tom de brincadeira. Eles sentaram na sombra. — Vai fazer o ENEM esse ano?
— Não, ano que vem. Não me sinto pronto para esse ano, sabe? E você?
— Vou tentar esse ano de novo.
Dois meses mais tarde Lucca voltou à base aérea onde ficaria sabendo se iria ou não, em Agosto, retornar para iniciar o seu treinamento como cabo. Felizmente para Lucca ele foi dispensado e precisaria buscara a sua dispensa em Agosto e estaria livre. Mas não sabia até quando, porém naquele momento adianta estaria livre. Havia passado por mais uma fase em sua vida. O que iria acontecer a seguir?