Pela a manhã Lucca e seus primos ajudaram o avô a tirar os grãos duros de milho do sabugo para que os mesmos fossem triturados e em seguida serem servidos de alimento para as galinhas e os galos. Por volta de meio-dia o adolescente sentou na cama com o notebook em seu colo para dar uma olhada no que estava rolando no mundo virtual, mas a internet não queria estabilizar o sinal por nada naquele horário. Desistiu e foi dar uma volta pela a rua.
A internet estava oscilando muito durante os minutos e isso prejudicava a leitura das fanfics que acompanhava, a conexão péssima também influenciava na sua comunicação com seu amigo e nos momentos em que observava se alguma mensagem de Dario havia chegado, porém não fazia tanta questão deste último porque já foi um bom tempo desde a última vez em que Lucca teve uma conversa com o namorado. Enquanto caminhava e olhava para as árvores, suas folhas verdes, algumas com frutos maduros e outras com flores, o rapaz pensava se Dario não foi apenas uma ilusão sua… Se ele nunca existiu de fato.
Daria um bom enredo de romance, com certeza, mas a sua vida não era um.
Os seus primos estavam jogando futebol em um campo aberto com alguns garotos que moravam pelo o lugarejo, Lucca ficou sentado de longe observando a interação. Não pensava em se aproximar porque não queria mesmo e aqueles meninos não despertavam a sua intenção para uma interação amistosa. Era o bastante assistir ao jogo de longe e pensar como seria sua vida se fosse mais fácil para ele fazer amigos ou, então, como as coisas estariam desenrolando se Dario estivesse ali ou respondesse a sua mensagem.
Ai, ai, ai… Dario, Dario, Dario… O que o jovem universitário de dezoito anos estaria fazendo naquele momento na cidade onde nasceu? Estaria conversando com os pais? Estaria estudando, assistindo ou lendo alguma coisa? Ou, então, será que poderia estar fazendo companhia para alguém novo que havia acabado de conhecer no local onde cresceu, mas foi além de uma amizade… Muito além de uma amizade. — Não! Não, Dario não seria capaz daquilo ou seria?
Lembrou-se de como seu peito ficava apertado ao pensar em Arthur, estava sentido aquilo agora enquanto pensava no sumiço repentino do namorado. A força misteriosa apertando suas costelas e respectivamente sua respiração e o seu coração. Tudo o que havia vivido com o outro rapaz alguns meses atrás pareciam naquele instante um sonho, uma lembrança de uma vida passada. Era como se ele tivesse morrido, reencarnado e agora estava com as memórias de outra realidade presa em sua mente.
Dario parou de lhe responder aos poucos, como sabemos começou no Natal, mas persistiu durante a semana do ano novo e foi assim até aquele momento em que Lucca assistia seus primos jogando futebol com adolescentes desconhecidos. Completou um mês, sabia que em Março Dario retornaria para Santa Maria uma semana antes do começo das aulas na universidade federal e ali estava a sua esperança de que tudo era real, de que a teoria da ilusão fosse completamente um delírio seu.
— Tudo bem com você? — perguntou loiro enquanto sentava ao lado do nosso protagonista. Ainda era surpreendente qualquer interação de Higor com ele na visão de Lucca.
— Não muito, cansaço, sei lá… Saudades de casa.
— Mas aqui é tão bonito… Você quer dar uma volta comigo?
— Eu já dei muitas voltas hoje. — disse Lucca rindo.
Higor levantou e estendeu sua mão para o outro que ainda continuava sentado na grama, com um sorriso que parecia reluzir ainda mais seus olhos azuis, o loiro convidou Lucca a pegar sua mão e os dois irem cavalgar a cavalo. De primeira o nosso protagonista não compreendeu muito bem em que cavalos eles iriam montar, mas logo Higor explicou que ele trabalhava para o dono da mercearia que criava alguns cavalos na chácara em que vivia com a família. Como não havia nada melhor para fazer e o seu namorado não enviava mais mensagens e a internet parecia funcionar a base de lenha na região, Lucca aceitou o convite do rapaz loiro.
O caminho para a chácara do dono da mercearia foi silenciosa ambos não haviam muito para falar, afinal, não se viam desde o final do fundamental dois e algumas coisas ficaram pendentes entre eles. Pelo que poderia ser observado daquela interação é que eles não gostariam se resolver essa pendência. Lucca porque tinha medo do seu passado com o loiro e não queria enfrenta-lo e Higor sabia que tinha sido errado com o mais baixo, mas para resolver aquilo sabia que não deveria voltar às águas passadas.
A chácara do patrão de Higor era bem maior do que aquela que o terreno que os avós de Lucca compraram alguns anos atrás. Mais alguns hectares de terras poderíamos já classifica-la como um pequeno sítio, mas ainda não era o caso. Foram para os fundos onde estava o estábulo com os cavalos. O garoto dos olhos azuis preparou o primeiro cavalo — aquele em que montaria — e em seguida o mais manso para Lucca cavalgar. Com cuidado as duas montarias foram levadas para um campo aberto onde o moreno e o loiro poderiam andar em paz.
— Quer ajuda para montar? — perguntou Higor depois de preparar a sela no animal mais manso.
— Sim, por favor. — disse Lucca tentando sorrir. — Eu nunca montei em um cavalo…
— Poderia ter me dito antes, sabe. — disse Higor rindo em um tom de brincadeira. — Mas tudo bem, eu vou deixar o outro solto e ele acompanha a gente.
— A gente?
— Sim. Eu vou subir no mesmo cavalo que você, não seria seguro e certo da minha parte te deixar solto sem saber como controlar o animal e montado ao meu lado vai poder começar a aprender como se faz. — respondeu o loiro.
— Certo, então.
Lucca subiu primeiro com ajuda e em seguida Higor fez o mesmo, ficando atrás do mais gordinho. As mãos grandes do rapaz se encontraram com as mãos gordinhas do nosso protagonista e rapidamente a ensinaram como deveriam segurar as rédeas do cavalo com cuidado e precisão. A sensação de algo nostálgico e ao mesmo tempo novo retornou ao corpo de Lucca em forma de um grande arrepio elétrico, daquele momento até mais um futuro breve o adolescente havia esquecido Dario, Arhtur e das outras coisas. Sua vida passou de uma existência comum para uma fanfic das mais clichês, porém ela acabaria quando as suas férias no lugarejo acabassem e como o final seria?
Quando o animal começou a trotar, Lucca levou um leve susto e Higor riu da situação, logo a risada solitária ganhou uma companhia. O cavalo que o loiro montaria antes de saber que Lucca não sabia como cavalgar seguiu a dupla em passos lentos enquanto se divertiam pelo o campo aberto. Deixaram o cavalo beber água do açude, os dois animais. Ficaram sentados a beirada onde a água não alcançava.
— Tá estudando ainda? — perguntou Lucca.
— Sim, mas como a escola de ensino médio daqui mais próxima é em Formigueiro, às vezes fico com preguiça. E você? Tá cursando o ensino médio em que escola?
— Naquela escola que ficava umas ruas acima da nossa antiga, você sabe qual é?
— Sei sim. — respondeu Higor.
O silêncio voltou.
A mão do loiro tocou a do moreno, os olhares se encontraram e a rotação da Terra ficou mais lenta, o tempo havia parado para aquelas mentes. Higor se inclinou para beijar Lucca, aquilo foi alvo de vários sonhos do protagonista durante o ensino fundamental dois. De repente o rosto de Higor se transformou na face de Dario e como consequência ele posicionou suas duas mãos sobre o peitoral do loiro e o empurrou novamente para trás. Não era o certo a se fazer, ainda estava em um relacionamento.
— O que foi? — questionou o loiro surpreso. — Você gostava de mim antes, não?
— Sim. — respondeu Lucca. — Antes eu gostava e gostei por um tempo depois de tudo que aconteceu, mas agora eu não posso por mais que eu ainda queira te beijar.
— Como assim? Eu não estou entendendo.
— Eu tenho um namorado agora. — esboçou um sorriso amarelo. — Desculpa Higor, mas não podemos…
— Desculpa, eu não sabia que você estava namorando.
— Tudo bem, eu não disse nada para começo de conversa. — Lucca levantou do chão e em seguida disse: — Eu vou voltar a pé, tudo bem? Te vejo por aí…
O nosso protagonista saiu caminhando, deixou sentada a sua primeira paixão que iria realizar uma de suas fantasias a beirada do açude. Ao mesmo tempo em que sabia que fazia o certo em não ter beijado aqueles lábios rosados que um dia fizeram parte dos sonhos. Se ancorava em saber que era o certo mesmo que o namorado não estivesse respondendo suas mensagens e o contato limitado por causa da conexão do lugarejo, apesar de estar com medo de que por aquele distanciamento o relacionamento esfriasse e não tivesse mais salvação, mesmo assim… Mesmo assim Lucca não queria trair o seu primeiro namorado.
Lucca cruzou com Higor mais algumas vezes nos dias em que ficou no pequeno vilarejo, porém não tiveram nenhum contato mais profundo do que apenas comprimentos básicos do dia a dia. Os últimos dias de Lucca na chácara só não foram mais tranquilos porque ele ainda esperava ansiosamente por uma mensagem de Dario, queria uma resposta e saber o que estava acontecendo… Ele precisava de uma resposta, principalmente depois do quase beijo que ele de em sua paixonite do passado.
Quando voltasse para Santa Maria, iria pedir a ajuda de Arthur para tentar entender o que acontecia com Dario, claro que o seu melhor amigo o ajudaria com essa situação, afinal, são melhores amigos. — E como Arthur deveria estar depois de tanto tempo sem conseguir uma comunicação descente com o mundo fora daquele lugarejo? Lucca esperava que seu amigo estivesse melhor do que das últimas vezes em que o viu.
Quando chegou o dia de ir embora, sentiu um cansaço porque isso queria dizer que faltavam apenas algumas semanas para o início das aulas, mas se animou novamente quando percebeu que isso também queria dizer que logo mais Dario estaria de volta para o começo de mais um ano letivo na universidade. Agora mal via o momento em regressar para a sua casa.