Ao chegarem na fazenda Dois Rios, Inácio e Rafael são recebidos por Luana e Jacinta na sala do casarão. O tempo havia sido generoso com a fazendeira, ela não tinha mudado tanto com o passar dos anos enquanto a Jacinta se mantinha sua postura firme e disposta ao trabalho.

 —Meu amor que saudade. —beijou a fazendeira o marido.

—Também estava com saudades. —falou o fazendeiro a abraçando.

—Como foi a viagem? Os dois sabem que fico preocupada quando vocês se atrevem em participar de comitivas.

—A viagem foi boa, tia, foi longa e como toda viagem em comitiva é que o mais tem são estórias pra contar.

—Eu acabei de fazer a sopa paraguaia que você tanto gosta, Inácio. —disse a governanta.

—Que delícia, hein, eu estou com a fome daquelas. Vou tomar um banho e já volto para comer. —saindo e seguindo em direção a escada.

 —E para você, Rafael, já fiz o seu Tereré, eu vou buscar.

Inácio subia as escadas e Jacinta seguiu em direção a cozinha.

—Onde estão nossas filhas?

—Anahí está na aldeia e a Florzinha foi andar a cavalo.

—Como estão as coisas por aqui? —se senta na poltrona. —Nesses três meses que eu e Inácio ficamos fora.

—Tudo igual. —se sentou no sofá. — Fernanda apareceu na fazenda por esses dias.

—Como ela está?

—Bem, e claro também fica preocupada como eu por causa do Inácio está viajando neste pantanal adentro é muito perigoso, Rafael.

—Luana, você e Fernanda tem que entender que o Inácio já é um homem e não mais um guri. Ele sabe bem se virar sozinho tanto que das próximas comitivas ele irá sem mim.

—Com licença, Rafael. —entra Jacinta com o Tereré e o entrega.

—Nada melhor do que chegar em casa depois de uma longa viagem em comitiva e tomar um Tereré.

—Se precisarem de mim vou está na cozinha. —Jacinta se retira.

—E o Anderson? tem notícias dele?

—Ele apareceu faz uns dois meses.

—O que ele queria?

—O que mais ele quer em Corumbá?

—Fernanda.

—Então.

—Sabe o que eu acho mais estranho? É como o Anderson consegue nesse tempo todo esconder do outro filho a existência do Inácio.

—Rafael, eu acho que cada dia que se passa está perto de chegar o momento que Darlan vai descobrir que o Inácio existe.

—Por que você acha isso?

—Com toda essa tecnologia que está o mundo, as redes sociais, enfim, é fácil encontrar uma pessoa, os dados dela…

—Será que o Inácio já pensou em ele mesmo procurar o Darlan?

—Pode ser, ele nunca me disse nada, mas você sabe como é o Inácio. Ele cresceu na expectativa de conhecer o irmão e isso nunca aconteceu.

—O pior erro da vida do Anderson foi passar anos prometendo aquele guri que ele ia conhecer o irmão e nunca cumpriu.

—Concordo com você, amor. E imagino que será um choque para o outro filho saber que esses anos todos tem um irmão e que o pai não o reconhece.

—Não só o irmão, a família toda, né? O Darlan não conhece a gente e tudo é muito estranho pra mim porque eu tenho um sobrinho que nunca vi o rosto, não sei como ele é e nem a índole dele.

—Será que ele é como o Inácio, um bom rapaz, trabalhador e amoroso com a família?

—Luana, meu amor, vou ser bem sincero com você: eu tenho lá as minhas dúvidas. Não quero julgar os outros, porém, o que se pode esperar de um pessoa que é criada por uma mulher fútil como a Verônica e por um cara mentiroso e ambicioso como o Anderson?

 

Na mansão da família Gouveia em Campo Grande, estavam Tomás, sentado na cabeceira da mesa, Marcela, sentada na cadeira do lado direito do marido, Verônica sentada à frente da mãe e Anderson, sentado ao lado da esposa. A família tomava o café da manhã.

O desembargador Tomás se aposentou há alguns anos e fazia viagens com sua esposa e ocupava-se em lecionar aulas de direito nas faculdades. Marcela permanecia dedicada as suas obras de artes e a jardinagem. Anderson se tornou juiz de direito e nada mudou em sua aparência apenas alguns fios grisalhos em seus cabelos castanhos e ondulados e estava a maior parte do seu dia-a-dia usando terno. Verônica mudou o corte de cabelo no estilo Chanel e luzes em tons claros, e seu gênio forte havia piorado com grandes “espetáculos” de histerismos, ciúmes e exibicionismo.

—Como foram de viagem, meus sogros? —perguntou Anderson.

—Uma maravilha. Paris é incrível. Cada vez que vou para lá é uma nova descoberta. —respondeu Marcela.

—Marcela tem toda razão, não há um melhor lugar como Paris para uma nova lua de mel. —disse Tomás e acarinhou a mão da esposa.

—Aí que inveja eu tenho de vocês.

—Inveja por que, filha? —perguntou Marcela.

—Ah, vocês são muito perfeitos, é um casamento de fazer inveja a muitos. —olhou para Anderson. —Infelizmente nem todos tem essa sorte, não é Anderson? —disse com ironia.

Tomás e Marcela se olham e percebem o clima tenso entre a filha e o genro.

—Não acho que seja uma questão de sorte e sim de amor, respeito, carinho… —respondeu o marido.

—Fidelidade, isso! Fidelidade é o mais importante e é uma pena que nem todos sabem ser fieis. —falava Verônica provocando o marido.

De repente o celular de Anderson toca, ele o tira do bolso.

—É o Darlan. —atende o celular. —Alô, pode falar, filho. —faz o semblante de preocupado.  —Onde você está? Sei qual é. Eu vou passar por aí, conheço o delegado. Tá, tchau. —desligou.

—O que aconteceu? —perguntou a esposa.

—O Darlan está detido na delegacia.

—O quê? —falou a esposa.

—Como assim, meu neto, tá preso? —perguntou Marcela.

—Não foi nada grave. Ele brigou com um guarda de trânsito porque estacionou no lugar proibido e não quis pagar a multa, enfim, ele dando um soco no guarda e acabou sendo preso.

—Inacreditável que fizeram questão de multar o meu filho só porque estacionou onde não podia? Se ele fosse um bandido, um traficante e estuprador jamais seria preso tão facilmente. É por isso que esse país está como está.

—O que você vai fazer? —perguntou Tomás.

—Eu vou lá na delegacia, eu conheço o delegado de plantão, é meu amigo da época da faculdade, então, vou resolver esse mal entendido e tirar o Darlan de lá. —se levanta.

—Acha certo, Anderson? Seu filho errou e não é a primeira vez que ele arruma briga com guardas de trânsitos a última foi porque dirigia em alta velocidade e estava alcoolizado.

—Mas ora, papai, quer que o seu neto, o meu filho fique naquele lugar horrível e preso como um delinquente? Quer que o nome da nossa família fique mal falada na mídia? Isso será uma vergonha para nós.

—Ele tem que assumir o que faz. Já é um homem e age como um guri mimado. Por mim ele ficava lá e quem sabe assim começa a ter responsabilidades e cair na real.

—Papai, o senhor não tem coração. É o seu neto!

—Ah, Verônica, por favor. —falou Tomás.

—Mamãe, fala alguma coisa!

—Não me meta nisso. Você sabe que eu sempre discordei dessa forma como vocês criaram o Darlan, agora já está muito tarde para consertar.

—Anderson, meu amor, tire nosso filho, nosso baby daquele lugar asqueroso. —se levanta e fica de frente para ele.

—Não se preocupe que vou trazer nosso filho para casa. —a beijou.

Anderson saía da sala de estar.

—Veja só o que você está fazendo, Anderson, um dia vai se arrepender. —falou o sogro.

O genro parou ao seu lado.

—O Darlan é só um menino de vinte e poucos anos. Ele não fez por mal.

—Não dê ouvidos ao papai. Vai lá na delegacia e tire nosso filho de lá.

Anderson sai.

 —Papai, o senhor parece que quer prejudicar o próprio neto. —se senta na cadeira.

—Não, minha querida, o seu filho se prejudica sozinho e preste bem atenção no que estou dizendo: você e o Anderson ainda vão se arrepender.

—Quanto exagero, papai. —falou Verônica com deboche.

 

Em uma delegacia, um policial abre a cela onde estava Darlan que sai e ver o pai a sua frente.

—Nada melhor do que ser filho de um juiz. —abriu os braços e sorriu.

—Darlan, dessa vez passou por pouco, filho. A sorte é que o delegado é meu amigo, mas o cara é casca grossa e tive que convencê-lo que foi um passo errado seu. Guri não faça isso de novo, você já é reincidente, sua ficha está suja e assim vai fica mais difícil de limpar a tua barra.

—Pai, a culpa não foi minha, foi o merda daquele guarda que me provocou, aliás, quero acabar com raça daquele verme.

—Não se preocupe que eu depois procuro saber quem é esse guardinha metido a bosta e ele vai aprender a não se meter com um Barreto. Agora vamos para casa porque sua mãe está preocupada com você dando os famosos chiliques dela. ­—olhou para os lados desconfiado. —Vamos.

 

Anoiteceu no pantanal e na parte externa da fazenda Dois Rios acontecia no jardim uma moda de viola, alguns peões ao redor de uma fogueira. Rafael tocava sua viola e ao lado estava sua esposa e todos prestavam atenção à ele. Anahí, está com idade de vinte e cinco anos, cabelos cumpridos lisos e negros, olhos negros, pele vermelha, vestia um vestido de renda branco até o joelhos e sandálias. Ela se aproxima de Inácio que estava de costas conversando com alguns peões.

—Inácio.

Ele se vira e os dois se abraçam.

—Anahí, que saudade de você, guria. Como está?

Os dois caminham de mãos dadas.

—Bem. Hoje passei o dia todo na aldeia.

—A tia Luana me disse.

—Como foi de viagem?

—Foi boa, teve alguns momentos que pensei que a gente não ia conseguir passar pelo rio com o gado, mas não seria o pantanal se não tivesse algo assim.

—O pantanal é um mistério. É como a vida que a todo momento está a nós desafiar.

Rafael termina de tocar a viola e todos batem palmas.

—Aceita um desafio, Inácio? —perguntou Rafael em voz alta.

—Sim, aceito!

Inácio entra na roda, se senta ao lado do tio, lhe dão uma viola e começa a tocar.  Florzinha, uma adolescente de dezessete anos, cabelos cacheados e longos, pele branca, olhos cor de âmbar, esbelta, alta, vestida um vestido estampado vermelho e bota longa marrom, se aproxima de Anahí.

—Você viu o Lino?

—O Lino… —olhava ao redor o procurando. —está ali perto da varanda.

Florzinha olha para Lino, um rapaz com idade de vinte e três anos, usava uma blusa branca regata e calça jeans, chapéu de couro preto, botas, ele trabalhava como peão e auxiliava seu pai Expedito que havia se tornado capataz da fazenda.

Lino se encontrava em pé encostado na pilastra da varanda e fumando um cigarro de palha. Florzinha empolgada segue em direção a ele.

—O céu tão estrelado hoje, não é Lino?

O peão olha para cima e cruza os braços.

Pra mim tá tudo igual.

Florzinha tem um amor platônico por Lino e nem percebe esse sentimento dela por ele. O peão é um cara marrento, de pouca conversa e melhor amigo de Inácio.

—O que acha de dançar?

—Dançar? —riu. —Guria você diz cada coisa sem pé e sem cabeça.

Tânia se aproxima do filho.

—Lino, vem comigo ajudar colocar para fora umas caixas de bebidas que estão na cozinha.

, mãe.

Lino segue a mãe e entram no casarão.

—Ah, Lino, eu sonho tanto com seu beijo. —desapontada. —Mais uma oportunidade perdida de dá o meu primeiro beijo. —cruza os braços e sai irritada.

Inácio termina de toca e todos o aplaudem.

—Esse é o meu sobrinho, tão lindo. —beijou Luana o rosto de Inácio.

—Mandou bem, guri. Agora você canta e a gente toca junto.

—Vamos nessa. É o senhor quem manda, tio.

Inácio começa a cantar e a tocar e Rafael o acompanhava tocando a viola. Anahí e Florzinha se sentam ao lado de Luana e os assistem.

 

 

 

Na capital em uma boate estavam Darlan e Maurício, um capanga que trabalha com ele em seus negócios obscuros com garimpos ilegais, um homem que aparenta uns quarenta e poucos anos, pele branca, cabelos castanhos e cavanhaque e bigode, olhos verdes, estatura alta e robusto, usava um boné laranja, camisa xadrez azul e calça jeans e botas.

Os dois estavam sentados à uma mesa tomavam cervejas.

—Patrão, pode confiar que esse negócio vai dá muito lucro. Será tanto dinheiro que não vai ter mais onde botar e gastar. Nem todos os seus garimpos conseguiram extrair o que vamos extrair daquela nascente.

—Será mesmo que esta nascente existe? Pra mim isso me parece mais uma conversa fiada desse tal de Diogo.

—Se for mentira dele, essa será a sua última . —levanta a blusa e mostra uma arma pendurada na cintura.

—Preciso de dinheiro, preciso de mais ouro, mais diamantes, mais mineiro, mais, muito mais. Você sabe que os meus garimpos estão extraindo quase nenhum minero e preciso urgentemente encontrar outra mina nem que eu tenha que me arriscar nesta nascente.

Diogo se aproxima da mesa, é um homem de trinta e poucos anos, branco, cabelos ondulados e castanhos assim como a barba, vestia uma blusa branca, calça jeans, chapéu de couro preto e botas, alto e robusto.

—Seu Darlan? Sou Diogo, o Maurício me procurou dizendo que você quer informações sobre a nascente.

—Sim, me fala, o que sabe. —tira do bolso a carteira e joga um maço de dinheiro na mesa. —isso é o suficiente.

Diogo pega as notas de dinheiro e conta.

—É sim. Aqui tem mais do que ganhava um mês como peão em Corumbá.

—Espero que você esteja falando a verdade porque se não for, eu vou descobrir e vai ser pior pra você. —falou Maurício e depois levanta a blusa e mostra uma arma pendurada na cintura.

—A estória da nascente de Riacho Paraíso é verdade, muita gente acha que é mentira, que é lenda, mas não é.

—Riacho Paraíso, esse nome não me é estranho. —disse Darlan.

—A nascente fica entre a fronteira da Bolívia e do Brasil, um lugar muito distante e de difícil acesso.

—Como você tem tanta certeza que esse lugar existe? —perguntou Darlan.

—Eu conheço alguém que já esteve na nascente.

—Quem?—perguntou Darlan.

 

 

 

 

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