CENA 01. CASA HELENA. SALA JANTAR. INT. NOITE.

Helena, Estêvão e Zilda jantam.

HELENA (a Estêvão)
E você? Não vai falar nada? Ou quer que eu pergunte como foi a sua visita e a de Carlos Eduardo na casa da meretriz?

Sonoplastia: suspense. Estêvão encara Helena e tenta disfarçar.

ESTÊVÃO
Seu ódio pela Gioconda é tão grande, que adora deu pra inventar coisas.

HELENA
Não estou inventando, e você sabe muito bem. E nem pense em perguntar pros nossos filhos, porque meu informante é outro.

ESTÊVÃO
Não vou discutir com você. Fui à casa dela, sim, e foi muito melhor do que ter que olhar pra sua cara.

HELENA (joga suco na cara de Estêvão)
Canalha! Não tem um pingo de vergonha?

ESTÊVÃO
De ainda estar casado com você, tenho muita. Perdi a fome. Boa noite, Zilda. (sai)

ZILDA
Mais uma vez você extrapolou, Helena. Não se dá conta de que você é quem aproxima seu marido da Gioconda?

HELENA
Não acredito que agora vai me culpar pelas asneiras que o Estêvão fez a vida toda e ainda faz. Pensei que a vagabunda tivesse aprendido a lição, mas vejo que continua a mesma imoral de sempre. Vadia devoradora de homens. E agora se aproveita do futuro marido da minha filha.

ZILDA
Acho que você está vendo coisa onde não tem. Com licença. Também perdi a fome.

Zilda também sai. Helena pensativa.

CENA 02. ESCOLA DE MÚSICA. SALA BRUNO. INT. NOITE.

Bruno guarda documentos dentro de uma pasta. Alice bate à porta e entra na sala.

BRUNO
Alice, ainda por aqui?

ALICE
A última aula terminou agora. Acho que teremos um grande violinista em breve.

BRUNO
O aluno de São Paulo, não é isso?

ALICE
Ele mesmo. Está encantado com o Rio e já pensa em se mudar de vez. Se não fosse a violência, eu daria o maior apoio.

BRUNO
Vejo que você tá muito alegrinha? O motivo se chama Sandro?

ALICE
Não consigo esconder nada de você, não é? Ai, ele me faz tão bem. Desde que o Sandro apareceu, minha vida mudou pra melhor. Acordo feliz da vida, não tenho mais pesadelos… Só minha mãe que não aprova o namoro, pra variar.

BRUNO
Noêmia e sua teimosia. Ela continua com aquela ideia de tirar você daqui e de perto do patrão assediador?

ALICE
Continua. Minha mãe não muda.

BRUNO
Pronto! Terminei. Quer carona até sua casa?

ALICE
Minha mãe ficou na boate, então vou querer sim.

BRUNO
Vem comigo. O carro tá ali no estacionamento.

Ambos saem juntos. Bruno apaga a luz e fecha a porta por fora.

CENA 03. BOATE NOÊMIA. SALÃO. INT. NOITE.

Música: On The Run – Billy Ocean. Os frequentadores dançam na pista – imagens mostradas entre CORTES DESCONTÍNUOS durante vinte segundos. CAM passa para o balcão, onde estão Noêmia e Zoraide.

NOÊMIA
Alice vai direto pra casa. Hoje ele tem muita aula pra dar.

ZORAIDE
Mas isso não é ótimo? Soube que a quantidade de alunos aumentou muito, e que o Bruno tem lucrado bastante. Assim como você aqui na boate.

NOÊMIA
Não me compare com esse Don Juan de merda. Meu trabalho é digno, e eu não preciso dar em cima de ninguém.

ZORAIDE
Muito menos o Bruno. Você precisa parar de implicar com ele, amiga.

NOÊMIA
Não, enquanto minha menina estiver trabalhando com ele.

ZORAIDE
Tá bom, mãe coruja! Não está mais aqui quem falou. (pausa) E a Gioconda? Tem visto?

NOÊMIA
Deus me livre! (faz sinal da cruz) Essa eu não quero mais ver na minha vida. Devia ter morrido lá na Europa e nos raios que a partam. Ela e as duas coleguinhas.

CENA 04. RUA. CARRO GIOCONDA. EXT. NOITE.

A música para. Sandro dirige o carro, e Gioconda está a seu lado.

GIOCONDA
Conheço a Noêmia desde que era menina. Ela era um pouco mais velha que eu. Tinha acabado de se formar em enfermagem. Depois me mudei pra Itália, onde nasci, e nunca mais vi a Noêmia.

SANDRO
E agora ela é minha sogra. Tô namorando a filha dela.

GIOCONDA
Pelo amor de Deus, toma cuidado! Se ela descobre que você é meu segurança, ela pode fazer alguma loucura contra nós dois e até contra a filha.

SANDRO
Por que está falando assim? Ela mal me conhece, e mal deve lembrar de você.

GIOCONDA
Ela se lembra muito bem de mim. Nos reencontramos no dia da reinauguração da boate dela, e ela não gostou nada.

SANDRO
Mas você fez alguma coisa que a deixou com raiva ou com ódio? Ou ela fez pra você?

GIOCONDA
Uma longa história. Não vale a pena contar e te envolver nisso. Foi algo muito grave que fiz e que deixou marcas em muita gente; inclusive nela.

SANDRO
Então o negócio é sério mesmo.

CENA 05. PENSÃO ZORAIDE. QUARTO JÔ. INT. NOITE.

Jô e Vicky conversam. A segunda pinta as unhas dos pés, sentada na cama. A outra anda de um lado a outro, enquanto fala com Vicky.

VICKY
Nada ainda sobre as buscas do Sandro?


Pois é. Eu, ele e o Bruno tentamos achar em um monte de maternidades e orfanatos pela cidade, mas nenhum sinal até agora. Não sei por quê, mas ele foi abandonado pela mãe, e algum cúmplice deu um jeito de apagar as pistas.

VICKY
Por que acha isso?


Intuição de jornalista. De uns tempos pra cá, venho tentando ligar as pistas que Sandro deixa escapar quando fica agitado, nervoso, e também as reações do Bruno e da Gioconda. Tem algo muito esquisito com esses dois, e não sei o que é. Acredito que eles podem estar envolvidos de alguma forma.

VICKY
Isso é muita viagem da sua cabeça, amiga.


Não sei, não. Gioconda parece saber muito mais do que fala. A história dela é muito estranha, por si só. (o celular toca; ela atende) Alô?… Sim, sou eu mesma. Me chame de Jô… Isso mesmo… Revelações sobre Armando Alighieri… Olha só! Se for brincadeira de mau gosto… Mas ela não é a mulher dele?

VICKY (curiosa)
O que foi, Jô?


Tá… No jornal. Sabe onde é?… Fico esperando… Obrigada. Boa noite. (desliga e guarda o celular; a Vicky) Tô passada! A mulher do Armando tá a fim de me contar tudo do marido.

VICKY
Isso tem cara de bote que ele quer dar em você.


Não tenho medo dele. Vamos ver o que ela quer. Tem cara de mulher traída querendo vingança.

CENA 06. CASA HELENA. FRENTE. EXT. NOITE.

O carro de Rubens para em frente à casa. Leila sai do carro, dá volta e beija Rubens através da janela aberta.

RUBENS
A gente se fala amanhã?

LEILA
Acho que sim. Te ligo.

Ela se vira e dá de cara com Helena, à espera no portão.

HELENA
Então é assim, Leila?

LEILA
Mãe?

HELENA (grita)
Já pra dentro! Agora!

RUBENS
Fica calma, Helena. Só estamos namorando…

HELENA (corta)
Namorando? Você estava seduzindo minha filha, cafajeste. Ou se afasta dela, ou chamo a polícia.

RUBENS
Ela já é de maior e está comigo por vontade própria. Pena que tem uma mãe louca…

HELENA (dá um tapa em Rubens)
Nunca mais apareça perto da Leila. Você não me conhece, nem sabe do que sou capaz. Some daqui, ou mando prendê-lo agora mesmo. Cafajeste!

LEILA (de trás do portão)
Vai embora, Rubens!

RUBENS
Te ligo amanhã, Leila.

Ele liga o carro e parte. Helena entra pelo portão. Pega Leila pelo braço e a arrasta pra dentro de casa.

CENA 07. CASA HELENA. SALA. INT. NOITE.

Helena entra com Leila. Estêvão e Zilda ficam chocados com a reação da primeira. Leila se solta.

LEILA
Ele não estava fazendo nada comigo, mãe.

HELENA
Amanhã mesmo vou arrumar um marido pra você não arrastar nossa família pra lama.

LEILA
Não preciso de marido, nem de reputação. Preciso de amor. Coisa que você nunca me deu e que nunca teve.

HELENA (esbofeteia Leila)
Cala a boca, ordinária! Você não sabe um pingo da minha vida e não tem o direito de me julgar.

ESTÊVÃO
E você não tem o direito de encostar a mão na nossa filha. É por causa disso que ninguém mais quer ficar perto de você.

Zilda abraça Leila. Ambas vão para um canto.

HELENA
Não tenho culpa de ser humilhada, traída e desrespeitada pelo meu marido todo santo dia. Tenho o direito de querer o melhor para os meus filhos. Aquele gigolô não chega mais perto da Leila. Ai de você, Estêvão, se aproximar esses dois de novo. Vai ter o mesmo fim do marido da sua queridinha italiana. A cova. (grita) Jairo!

ESTÊVÃO
Vai sair a essa hora?

HELENA
Ao contrário de vocês, sou uma mulher livre e digna.

JAIRO (entra)
A senhora me chamou, dona Helena?

HELENA
Prepara o carro. Tenho coisas a fazer. O casamento de Leila não pode esperar.

CENA 08. RIO DE JANEIRO. PRAIA COPACABANA. EXT. DIA.

Música: Christie’s Medley – David Christie. Pessoas caminham no calçadão. Jovens surfam. Mulheres tomam banho de sol deitadas na areia. Homens jogam vôlei. Duas adolescentes dançam e ouvem música no fone de ouvido. Uma moça passeia com vários cães.

CENA 09. JORNAL. REDAÇÃO. INT. DIA.

A música continua tocando, agora no rádio do jornal. Jô entra no local e vai até sua estação. Põe a bolsa sobre a mesa e liga o notebook. Conversa com uma repórter jovem e loura.


Até que enfim um pouco de música por aqui.

REPÓRTER
Programa de flashback da Rádio Carioca News. Só toca música dos anos 80.


E pensar que a qualidade das músicas vem decaindo com o tempo.

REPÓRTER
Nem me fala. Não aguento mais ouvir One Direction e Anitta. Minha irmã é tiete louca.


Que horror!

Sonoplastia: suspense. Soraya surge e para na entrada da redação. Observa a conversa entre as duas moças.

SORAYA
Com licença. Vocês sabem quem é Jô Mendes?


Sou eu mesma.

SORAYA (se aproxima)
Sou Soraya, aquela que marcou uma reunião com você. (pausa) Podemos conversar num lugar mais discreto?


Claro! Me acompanha. Tem uma sala ali no fundo.

Jô faz um sinal para a repórter, sem que Soraya perceba. Jô e Soraya vão em direção a uma sala no final do corredor.

CENA 10. AQUAPAPER. SALA ARMANDO. INT. DIA.

A sonoplastia continua. Armando conversa ao celular. Não percebe que está sendo espionado por Jéssica, que está por trás da porta entreaberta.

ARMANDO
Quero o serviço pra sábado, logo depois do casamento do meu filho. Ela tem que morrer… Não aceito erros.

Ele desliga o celular e guarda no bolso do paletó. Jéssica fecha a porta por fora, sem ele perceber. Armando se senta à mesa e começa a analisar documentos.

CENA 11. JORNAL. SALA DE REUNIÕES. INT. DIA.

A sonoplastia segue. Soraya e Jô conversam sentadas.

SORAYA
Muitas das fazendas são frutos de golpes contra pequenos fazendeiros. Pobres endividados que tentam a sorte na mesa de jogo. Armando e um cúmplice trapaceiam com cartas na manga e conseguem vencer. Os miseráveis são obrigados a deixarem suas fazendas, muitas vezes á força e até á bala. Isso quando não aproveita pra estuprar as mulheres e as filhas.


Sabia que seu marido era ambicioso, mas não que fosse tão asqueroso.

SORAYA
Nunca falei nada antes, pois sempre amei a vida de esposa rica e poderosa. Agora me arrependo desses anos todos de humilhações e de indiferenças. Ontem ele tentou me matar. Consegue ver a marca no meu pescoço?


Nítido como sangue. Vale a pena denunciá-lo na delegacia da mulher. Claro que talvez não tenha nenhum resultado, pois ele é muito poderoso. Mas vale a pena tentar. Nunca se cale diante da violência doméstica. Nenhuma vida confortável deveria custar a infelicidade ao lado de um ser tão cruel.

SORAYA
Pena que cheguei a essa conclusão tarde demais.


Nunca é tarde demais para fazer justiça contra quem merece. (pausa) Você tem como provar os esquemas dele contra os fazendeiros?

SORAYA
Até tenho, mas precisaria de tempo pra reunir as provas. Não posso deixar que ele, o secretário e os comparsas desconfiem.


Secretário?

SORAYA
Wilson. Compactua com tudo que o Armando planeja. Me vigia o tempo todo, a mando do meu marido.


Me conta tudo em detalhes, pra eu poder te ajudar.

Soraya e Jô seguem a conversa com áudio em FADE.

CENA 12. RUA. EXT. DIA.

Noêmia e Zoraide andam pela rua. Olham as vitrines das lojas.

ZORAIDE
Que blusinha linda! Acho que vou comprar.

NOÊMIA
Na volta, pois agora você vai me ajudar com as toalhas pra decoração da festa do Raul;

ZORAIDE
Tá, mas não vamos demorar, se não ela some. Vai que outra compra antes?

Helena, de óculos escuros e com postura arrogante, anda apressada. Esbarra em Noêmia, quase derrubando-a no chão.

NOÊMIA
Não tem educação, não, madame?

HELENA (se vira para as outras duas, tom)
Como é que é? Sabe com quem está falando?

NOÊMIA
Só podia mesmo ser você, Helena.

HELENA
Não posso acreditar! Quanto mais problemas tenho, mais problemas me aparecem. Por que não some da minha vida, enfermeira?

NOÊMIA
Era o que eu tava tentando fazer desde… aquele dia.

ZORAIDE
Estamos no meio da rua…

HELENA (tom)
Não falo com crioula!

ZORAIDE (dá um tapa em Helena)
Aqui a crioula! Isso é pra aprender a respeitar as pessoas como elas são!

NOÊMIA
Deixa, Zô. Essa aí sempre teve o narizinho empinado. Vai acabar sozinha, como sempre mereceu. Da próxima vez, finge que não me conhece. Vamos, Zô!

HELENA
Você me paga, Noêmia! E você também!

Noêmia e Zoraide se afastam. Helena põe a mão no rosto, pensativa e raivosa.

CENA 13. MANSÃO ARMANDO. FRENTE. EXT. DIA.

Música: Lady In Red – Chris de Burgh. Letreiro: “Dias depois”. Imagem da fachada da mansão.

CENA 14. MANSÃO ARMANDO. QUARTO CARLOS EDUARDO. INT. DIA.

A música para. Amanda se vê no espelho, aos prantos, com o vestido de noiva. Leila está por trás dela.

LEILA
Chegou o dia, minha irmã.

AMANDA
O dia do meu enterro como mulher; como gente.

LEILA
E a próxima sou eu.

AMANDA
Por que nossa mãe age assim contra nós, que somos suas filhas?

LEILA
Ela está fora de si, Amanda. (pausa; ouvem passos do lado de fora) Acho que a maquiadora já chegou. Para de chorar, ou depois vai borrar a cara toda.

AMANDA
Minha vontade é essa mesma. Entrar na igreja com cara de palhaça, só pra nossa mãe ver o que tá fazendo.

LEILA
Não vai adiantar. Ela e o Armando querem o casamento de qualquer maneira.

AMANDA
E o Carlos Eduardo? Onde ele está?

A maquiadora bate à porta e entra.

CENA 15. APARTAMENTO GIOCONDA. SALA. INT. DIA.

Toca a campainha. Gioconda vem do corredor.

GIOCONDA
Lena? Você está aí?

Ela mesma abre a porta. É Carlos Eduardo, nitidamente apaixonado por ela.

CARLOS EDUARDO
Posso entrar?

Trocam olhares. CLOSES sucessivos.

Efeito de fim de capítulo: imagem congela em Estêvão; FADE TO BLACK. Sonoplastia: vento.

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