CENA 01. CASA HELENA. SALA. INT. DIA.

Helena e Amanda se encaram. Jairo está ao lado de Amanda. Todos de pé no centro da sala.

HELENA
Em vez de ir atrás do seu noivo, o que era a sua responsabilidade, resolve fugir com o motorista.

AMANDA
Fugi mesmo. Não suporto mais os seus mandos e desmandos. Será que não vê que tá destruindo a família toda com seu ódio pela Gioconda?

HELENA (grita)
Não fala nesse…

AMANDA (grita; corta)
Falo, sim! A gente podia ser feliz, se você não ficasse trazendo essa mulher aqui pra dentro, toda vez que solta veneno contra ela.

HELENA
Essa é boa! Agora sou eu que trago essa mulher? Seu pai, como sempre, é um santo.

AMANDA
Não, ele não é. Ele não tinha que procurar por ela. Mas você insiste em empurrar…

HELENA
Não vou admitir acusações desse tipo.

AMANDA
A verdade te incomoda, não é, mamãe?

HELENA
Verdade? Que verdade? Você não sabe de nada, garota!

AMANDA
Então me conta como começou essa história entre vocês. Assim talvez eu possa entender o porquê de você agir assim. Pra acabar com a felicidade dos seus próprios filhos.

HELENA
E você, Jairo? Espero que não tenha tocado um dedo nela, ou…

AMANDA (corta)
Não! Ele jamais me tocaria sem que eu deixasse. Sei me defender muito bem. Se bem que ele foi a única pessoa que me tratou como mereço nos últimos dias. Como um bom amigo.

HELENA
Foi só isso mesmo, Jairo?

JAIRO
Sim, dona Helena.

HELENA
Amanda, sobe e me deixa a sós com o Jairo.

CENA 02. CASA BRUNO. SALA. INT. DIA.

Bruno assiste à TV cabisbaixo. Rubens vem do corredor, enquanto termina de abotoar a camisa.

RUBENS
Combinei de me encontrar com a Leila na escola de música. Ela vai junto com uma amiga. Assim ninguém vai desconfiar da gente… (vê o estado de Bruno) Que cara é essa?

BRUNO
Nada, não.

RUBENS
Sofrendo de novo pela Gioconda? (pausa) Não vai me dizer que ela deu esperanças pra aquele rapaz?

BRUNO
Não, ainda não. Mas algo me diz que ela ficou mexida por ele.

RUBENS
Esquece essa mulher, Bruno. Ela nunca vai deixar de ser só sua amiga, de esfregar os namorados dela na sua cara.

BRUNO
Não posso. É mais forte do que eu.

RUBENS
Enquanto isso a vida vai passando. Só cuidado pra não acordar e se ver velho demais e sem tempo a mais.

CENA 03. MANSÃO ARMANDO. ESCRITÓRIO ARMANDO. INT. DIA.

Armando e Wilson conversam, sentados à mesa.

ARMANDO
Menos uma na minha cola. Já foi tarde.

WILSON
Você fala de sua mulher como se fosse uma qualquer.

ARMANDO
E era. Agora fazemos a encenação, enterramos a Soraya e o povo se comove com minha dor de marido sofrido. (ri) Meu filho deu notícias?

WILSON
Ainda não. Evaporou.

ARMANDO
Quando souber da mãe, ele vai aparecer. E vai ter o que merece.

WILSON
Não tá pensando em…

ARMANDO
Já deserdei o infeliz. Nesta casa ele não pisa mais. Sujou meu nome diante de toda a mídia.

CENA 04. APARTAMENTO GIOCONDA. QUARTO GIOCONDA. INT. DIA.

Gioconda veste um roupão por cima da camisola. Lena entra agitada com um celular na mão.

LENA
Gioconda! Se prepara!

GIOCONDA
O que houve, Lena? Que afobação!

LENA
Você nem imagina quem apareceu morta.

GIOCONDA
Está aí no celular? Deixa eu ver.

Gioconda olha para a notícia na tela. Fica chocada com o que lê.

CENA 05. JORNAL. REDAÇÃO. INT. DIA.

Jô acaba de chegar ao local. Joga a bolsa sobre a estação e fala ao celular.


É, eu soube… Pra mim tá muito óbvio… Ora, quem? O marido. Aquele pilantra do Armando Alighieri. (Raul se aproxima e ouve a conversa) Ele tava com o cu piscando de medo de a Soraya contar tudo o que sabe sobre ele… Sei lá!… Vou checar essa história até o fim… Tá, me liga. Tchau, Helô! (desliga)

RAUL
Você sempre de implicância com o Armando. Um dia você vai queimar sua língua com o que diz de um homem tão santo e generoso como ele.


Santo do pau oco, isso sim. Salafrário, ladrão, assassino.

RAUL
Você tá com inveja porque o povo se rendeu aos encantos de um líder carismático e protetor como há muito não havia. E trate de se acostumar, porque ele vai se candidatar à presidência. E vai vencer.


Não, se depender de mim. Não voto em bandido. Agora, se me dá licença, tenho muito trabalho pra fazer. Que tal uma história de bebê abandonado?

RAUL
Bem melhor! Taca muito dramalhão, que é pra comover os leitores. Eles adoram.


Adoram tanto, que eles votam em lobo em pele de cordeiro, né?

RAUL
Você não tem jeito! Enquanto você faz o seu serviço, vou dar uma passada no local do crime da Soraya. Fui!

JÔ (enquanto ele sai)
Já vai tarde.

Ela liga o notebook.

CENA 06. BOATE NOÊMIA. ESCRITÓRIO. INT. DIA.

Noêmia e Zoraide conversam sobre Soraya. A porta está entreaberta.

ZORAIDE
Já vai tarde? Que horror, Noêmia! A mulher foi brutalmente assassinada no meio da noite, logo depois do casamento do filho dela.

NOÊMIA
E eu com isso? Cavou a cova, e agora tá nele. Teve o que mereceu.

ZORAIDE
Ninguém merece um final desse, por pior que seja.

NOÊMIA
O final dela é muito pior do que pensa. Ela vai arder pra sempre no fogo do inferno, que é pra onde ela tinha que ir desde que…

Sonoplastia: suspense. Alice aparece pela fresta da porta e ouve a conversa.

ZORAIDE
Essa não é a Noêmia que conheço há muito tempo, alegre e espontânea, zelosa de sua filha querida.

NOÊMIA
Soraya e as amiguinhas dela me tiram do sério só de pensar. Por causa delas fiz as maiores besteiras da minha vida, e pago por elas até hoje. E digo mais: não vejo a hora de ver Helena, Estêvão e principalmente Gioconda mortos e enterrados. Só assim terei paz.

Alice fica assustada com o que ouve.

ZORAIDE
Isso lá é coisa que se fale, amiga?

NOÊMIA
É coisa que se fale, sim, quando uma jovem com toda uma vida pela frente se vê obrigada a ajudar uma mulherzinha a abandonar o bebê que acabou de ter, só pra não ficar falada na família. Você acha que eu queria fazer isso? Não! Fui obrigada. Se não fizesse, eu já estaria morta há muito tempo.

Alice começa a chorar e sai apressada. Noêmia e Zoraide ouvem passos.

ZORAIDE
Psiu! Ouviu?

NOÊMIA
Acho que alguém ouviu a gente.

Noêmia sai pela porta para ver se há alguém por perto; logo volta. A sonoplastia para.

ZORAIDE
Tinha alguém aí?

NOÊMIA (aflita)
Se tinha, sumiu. E ainda mais essa!

CENA 07. CASA HELENA. SALA. INT. DIA.

Helena esbofeteia Jairo.

HELENA
Isso é pra nunca mais se meter com minha filha.

JAIRO
Você tá louca?

HELENA
Tô! Tô louca! Louca de ódio, de raiva! Escuta aqui: se eu souber que está dando em cima da Amanda de novo, eu deixo você em pedacinhos.

ÂNGELA (entra, sem ouvir a conversa)
Dona Helena, com licença. Posso servir o almoço?

HELENA (grita)
O que está esperando, sua lerda? Claro que é pra servir o almoço. E você, motorista de merda, já está avisado.

Helena sai pelo corredor. No caminho, ela arranca com a mão uma planta do vaso e a joga no chão.

ÂNGELA
O casamento tirou a patroa do sério.

HELENA (VO, grita)
Eu tô ouvindo, hein?!

ÂNGELA
Jairo, faz um favor pra mim? Chama os patrões, enquanto eu sirvo o almoço.

JAIRO
Qualquer coisa que não seja ficar perto dela.

CENA 08. PENSÃO ZORAIDE. CORREDOR. INT. DIA.

Sandro e Germano conversam no corredor. Alice aparece apressada e chorosa, e se abraça a Sandro.

SANDRO
Estou a um passo de desmascarar minha mãe… Alice?

ALICE
Me abraça!

GERMANO
Com licença. Vou deixar vocês a sós. (sai de cena)

SANDRO
Está chorando. O que aconteceu?

ALICE
Minha mãe, Sandro. Minha mãe.

Alice chora copiosamente. Sandro a envolve em seus braços, consolando-a.

CENA 09. CASA HELENA. SALA JANTAR. INT. DIA.

Helena, Estêvão, Leila, Amanda e Zilda almoçam.

HELENA
Morreu?

ZILDA
De madrugada, no meio da estrada. Tiro a queima-roupa.

ESTÊVÃO
Meu Deus! Quem terá mandado matar a Soraya?

HELENA
Bandidos, assaltantes, ladrões… Qualquer um pode ter feito essa barbaridade.

AMANDA
Não sei, não. Isso tá muito esquisito.

LEILA
Concordo com a Amanda.

ZILDA
Que Deus tenha pena da alma da pobre moça. Filha, vou entrar em contato com o Armando e prestar solidariedade. Com licença. (sai)

LEILA
Já sabem quando vai ser o enterro?

ESTÊVÃO
Ainda não. Mas o velório começa às duas.

CENA 10. PENSÃO ZORAIDE. SALA. INT. DIA.

Sandro e Alice sentados no sofá, abraçados.

SANDRO
Tem certeza que não quer falar nada?

ALICE
Não quero te envolver nisso. Tenho que resolver com minha mãe. Já tô mais tranquila com você perto de mim.

SANDRO
Mas se quiser me contar, estou aqui.

ALICE
Obrigada, Sandro. Você é um amor.

Ela dá um selinho em Sandro. No mesmo instante, Zoraide e Noêmia entram e dão de cara com o casal.

ZORAIDE
O que você tem a fazer é terminar de arrumar o salão…

NOÊMIA (tom)
O que significa isso? Tira as mãos da minha filha.

ALICE
Ele é meu namorado.

NOÊMIA
Não, se depender de mim.

ZORAIDE
Noêmia, para com isso. Ele é um bom rapaz…

NOÊMIA (corta)
Eu não gosto.

SANDRO
Por que não? O que eu fiz pra senhora me querer longe da Alice?

NOÊMIA
Apareceu! Só isso. Ou some da vida dela, ou… Olha só como ela tá. No mínimo foi grosseiro com minha filha e…

ALICE
Não foi ele, e sim a senhora!

NOÊMIA
Como é que é? Ele tá fazendo a sua cabeça…

ALICE
Eu ouvi a conversa de vocês duas e vim me consolar com ele.

Noêmia e Zoraide ficam atônitas.

CENA 11. CAPELA. VELÓRIO SORAYA. INT. DIA.

Com roupa de luto e sentado numa cadeira, Armando finge estar arrasado com a morte de Soraya. É fotografado e assediado por diversos jornalistas, mas Wilson os afasta. Soraya deitada no caixão aberto. Jéssica observa do fundo.

WILSON
Ele não vai dar entrevistas. Respeitem a dor do doutor Armando. Ele acabou de passar por uma perda enorme.

Bruno, Rubens e Gioconda entram. Param em frente ao caixão por um tempo.

BRUNO
Que Deus a tenha.

RUBENS
Era muito bonita. Morreu jovem.

Gioconda se afasta dos amigos e vai até Armando.

GIOCONDA
Sinto muito, Armando. Digo, doutor Armando.

ARMANDO (falso)
Ela era uma grande esposa. Não sei o que vai ser de mim sem ela.

GIOCONDA
Também perdi meu marido há pouco tempo. É uma ferida que não cicatriza. Fábio era um homem formidável. (se ajoelha e pega nas mãos dele) Sou Gioconda Grimaldi. Estive no casamento do seu filho. Ele…

ARMANDO
Por favor, não tenho cabeça pra falar disso.

GIOCONDA
Me desculpe. Vou deixá-lo à vontade. Com licença.

Ela se levanta e é abordada por jornalistas.

JORNALISTA 1
Você conhecia Soraya Alighieri?

JORNALISTA 2 (quase ao mesmo tempo)
Como ela era na intimidade?

GIOCONDA
Estudamos juntas no colegial…

CENA 12. PENSÃO ZORAIDE. SALA. INT. DIA.

Alice continua a conversa com Sandro, Noêmia e Zoraide.

ALICE
Quero ficar a sós com minha mãe.

SANDRO
Estou no quarto. Se precisar, me chama.

ZORAIDE
Fiquem à vontade.

Sandro e Zoraide sobem as escadas e saem de cena.

ALICE
Por que escondeu algo tão grave de mim, mãe?

NOÊMIA
Queria te poupar. Essa história me faz mal até hoje. Quanto menos pessoas souberem, melhor.

ALICE
O que você fez foi crime. Pode ir pra cadeia.

NOÊMIA
Não posso mais. Já prescreveu. Mas as mulheres que me obrigaram a fazer o que não queria continuam a rondar nossa casa, a boate… Uma acabou de morrer, mas as outras… Filha, não queria te envergonhar.

ALICE
Não tô envergonhada. Tô magoada. Nunca pensei que pudesse… Faz quanto tempo?

NOÊMIA
Mais de trinta anos. Foi antes de eu conhecer o seu pai.

ALICE
E ele sabia?

NOÊMIA (chora)
Não. Nunca tive coragem de contar.

CENA 13. CAPELA. VELÓRIO SORAYA. INT. DIA.

Bruno e Gioconda conversam num canto, Wilson e Jéssica em outro. Rubens olha pra fora pela janela. Armando segue com o fingimento. Carlos Eduardo entra lentamente e se aproxima do caixão de Soraya. Se joga sobre ela e chora. Armando se torna irascível e levanta da cadeira.

ARMANDO
Como ousa aparecer aqui? Sai de cima da minha mulher!

CLOSES alternados entre Armando e Carlos Eduardo.

Efeito de fim de capítulo: imagem congela em Carlos Eduardo; FADE TO BLACK. Sonoplastia: vento.

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